sábado, 31 de outubro de 2015

DocLisboa - Festival Internacional de Cinema 2015: os vencedores

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Competição Internacional
Grande Prémio Cidade de Lisboa: Il Solengo, de Alessio Rigo de Righi e Matteo Zoppis
Prémio SPA do Júri: Babor Casanova, de Karim Sayad
Menção Honrosa do Júri: A Glória de Fazer Cinema em Portugal, de Manuel Mozos
Prémio RTP para Melhor Documentário de Investigação: And When I Die I Won’t Stay Dead, de Billy Woodberry
Prémio FCSH para Melhor Primeira Obra transversal às Competições e Riscos: Dead Slow Ahead, de Mauro Herce
Menção Honrosa para Melhor Primeira Obra: 88:88, de Isiah Medina
Prémio Íngreme do Júri Universidades: Dead Slow Ahead, de Mauro Herce
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Competição Portuguesa
Prémio Liscont para Melhor Filme: Rio Corgo, de Maya Kosa e Sérgio da Costa
Prémio Íngreme do Júri: Talvez Deserto Talvez Universo, de Karen Akerman e Miguel Seabra Vasconcelos
Menção Honrosa do Júri: Setil, de Tiago Siopa
Prémio Escola António Arroio para o Melhor Filme da Competição Portuguesa: Talvez Deserto Talvez Universo, de Karen Akerman e Miguel Seabra Vasconcelos
Prémio do Público - Prémio Jornal Público para Melhor Filme Português transversal a Competição, Riscos e Heart Beat: Phil Mendrix, de Paulo Abreu
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Killies (2015)

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Killies de David Rebordão é uma curta-metragem portuguesa de ficção e a perfeita para a noite de Halloween que hoje se comemora.
Muppet-Face (Nuno Crespo) decide transmitir em directo o seu novo desporto, e esperar que os visitantes da sua página credibilizem o seu trabalho com o maior número de visitas possível. Paula (Erica Rodrigues) irá ajudá-lo... mas não da forma que ele espera.
Com o impacto das novas tecnologias e o livre acesso que todos têm às mesmas, o que aconteceria se alguém decidisse em nome de uma qualquer fama utilizá-las de forma a difundir a sua mente retorcida?
Numa curta-metragem que insere o espectador em todo um imaginário de morte e bizarria, Killies transfigura-se num potencial video snuff que não o chega a ser não deixando, no entanto, de conter alguns elementos que levam a uma curiosidade mórbida sobre o momento seguinte. Sabendo que a morte - ou salvamento - de "outro" pode ser determinada por um número de visitantes record, a questão principal que é então auto-colocada é apenas uma... terminaríamos nós de assistir a este potencial assassinato em directo se isso salvasse a vida daquela vítima ou, por sua vez, sentiríamos que deveríamos deixar este espectáculo terminar e sermos testemunhas reais dos seus efeitos finais?
Tal como uma selfie que regista em fotografia um momento específico, os killies são a forma como este psicopata decide registas os seus momentos... Os momentos em que a dor e a tortura alheia - meros espectáculos televisivos que acompanhamos em qualquer boletim noticiário - podem ser registados e ser considerados como uma arte - para "Muppet-Face" - são neste agora tornados num videoblog que detalhadamente informa sobre um qualquer momento macabro mais ou menos planeado mas, no entanto, o que acontece quando os planos de uma mente retorcida acabam por não sair como ela esperava? Que os psicopatas o são ninguém duvida, mas será que todas as eventuais vítimas o são na realidade?
Uma das questões mais interessantes de Killies é não tanto a forma como um qualquer psicopata pode utilizar as redes sociais para difundir os seus actos - afinal esta difusão mais não é do que uma prova contra o próprio - mas sim a forma como essas mesmas redes sociais que todos nós utilizamos podem ser uma perigosa arma que nos identifica e permite a nossa localização de forma fácil e eficaz... muitas vezes pelas próprias "mãos", na medida em que muitos as utilizam para denunciar a sua privacidade, os seus espaços e principalmente os seus hábitos tão desejados pelos predadores. A esta questão apenas uma fácil e simples resposta... necessitaremos nós de expôr toda a nossa vida num espaço que não só não controlamos como, em muitos casos, não sabemos sequer quem está do outro lado a controlá-la?
Com uma intenção interessante na perspectiva de vídeo de terror - com algum realismo - e que recupera o clima do saudoso A Curva (2004) do mesmo realizador, Killies apenas "peca" por um inesperado volte face ao terror e ao suspense que prometia, abraçando nos últimos instantes uma comédia que dispensaríamos assumindo-se, no entanto, como um sólido regresso de Rebordão ao cinema de género depois do já referido A Curva e O Assalto (2014).
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7 / 10
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quinta-feira, 29 de outubro de 2015

Shortcutz Viseu - Sessão #61

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Depois de uma breve pausa, o Shortcutz Viseu está de volta para a sua Sessão #61 onde na secção Curtas em Competição serão exibidos os filmes curtos Éden, de Fábio Freitas e Doce Lar, de Nuno Baltazar que estará presente para apresentar a sua obra.
Finalmente no segmento Shortcutz Around the World será exibida a curta-metragem romena Distance, de Andra Chiriac.
Assim e para mais uma noite de bom cinema em formato curto, o lugar para estar na noite de sexta-feira depois das 22 horas é o Carmo'81, na Rua do Carmo, em Viseu.
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quarta-feira, 28 de outubro de 2015

Bikini (2014)

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Bikini de Óscar Bernàcer é uma curta-metragem de ficção espanhola que levam o espectador a uma viagem pelos anos 50 do século passado a uma Espanha franquista.
O Alcaide de Benidorm tem um grave problema que sabe apenas poder ser resolvido pelo caudillo. Numa viagem de lambreta até Madrid, Pedro Zaragoza (Sergio Caballero) tenta a sua sorte no palácio onde espera por uma intensa conversa com Franco (Carlos Areces) e Carmen Polo (Rosario Pardo), mulher do general com o fim de permitir que em nome do turismo na região seja permitido o uso do bikini nas praias. Em tempos de crise há que saber inovar.
Num tom de comédia ligeira e muito sóbria, Bernàcer também autor do argumento, constrói uma história divertida e com um humor muito mordaz para com a sociedade espanhola da época que prende o espectador desde o primeiro instante. Ao contrário do ambiente recriado em Bikini - austero e impessoal - esta comédia pretende retirar sorrisos pelos absurdos de situação e contrastes que se fazem sentir nas suas personagens. De um lado um homem desesperado por conseguir fazer do seu mandato algo memorável... Do outro, um homem que deu vida à última ditadura fascista da Europa Ocidental e que representava todo um "exemplo" (podre) de moral e bons costumes. Se para "Pedro" o segredo é conquistar com argumentos irredutíveis o casal - não esquecer que "D. Carmen" é um importante elemento desta história, para ela e para "Franco" o importante é manter uma imagem de moral e bons costumes com os quais o bikini vai interferir "directamente".
Assim, num jogo de aparências e inuendos, aquilo que conta é a utilização da palavra certa, da aparência em contraste com a realidade e a sugestão necessária para garantir que não se entra em nenhum conflito com aquilo que tão acerrimamente defendem no seu dia-a-dia. Numa avaliação mais moderna... que se danem os bons costumes quando não olhando para eles podem entrar rios de dinheiro que sustentem o regime. No fundo... tudo se compra... até a própria moral.
De registo ainda o eterno provincionalismo das ditaduras que consideram que tudo o que fazem ou detêm é melhor do que qualquer modernidade vinda do estrangeiro, aqui representado pela introdução do próprio bikini, das motos estrangeiras ou até de um festival da canção espanhola que, segundo "D. Carmen"... "é bem melhor do que o de San Remo, em Itália".
Bikini é assim uma paródia ligeira mas não inocente ao antigo regime espanhol... Uma forma de através da comédia o criticar e fazer realçar todas as pequenas grandes contradições numa sociedade que se clamava detentora de bons costumes mas que, ao mesmo tempo, violava todas as suas convicções em nome do dinheiro e de um desenvolvimento que se fazia chegar a outras partes do mundo de forma tranquila e não ofensiva. É ainda a história de como as instituições que se clamam sérias, conservadoras e detentoras de uma moral (in)existente se deixam levar - de forma extremamente fácil - pela boa aplicação de um conjunto de palavras sedutoras e que induzindo a sugestão é conquistada pela tranquila normalidade do exterior (que condenou) fazendo crer que toda a inovação partiu da sua própria vontade.
Notáveis as interpretações de Sergio Caballero como o Alcaide propenso à modernidade, bem como as de Carlos Areces e Rosario Pardo como o casal "ditador" com o qual o espectador não consegue deixar de simpatizar - perigosíssima esta simpatia pela ditadura - pela sua assumida postura contraditória desde o primeiro instante não esquecendo, claro está, os elementos técnicos que conferem uma perfeição temporal a Bikini, nomeadamente a direcção artística de Uxua Castelló, a caracterização de Raquel Coronado e o guarda-roupa de Irene Orts, e sem esquecer a direcção de fotografia de Gabriel Guerra que transforma toda a dinâmica desta curta-metragem ao entregar inicialmente um ar de esperança aquando da estadia na praia e um aspecto tenebroso aquando da estadia no Palácio do Pardo, em Madrid sede do poder da ditadura e detentor da "moral".
"Two thumbs up" para Bikini que consegue parodiar a ditadura através da forma como defende algo diferente do que promove e para o génio de Óscar Bernàcer que dirige com rigor uma das melhores curtas-metragens do último ano.
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9 / 10
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Straight Outta Compton (2015)

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Straight Outta Compton de F. Gary Gray é uma longa-metragem norte-americana e uma das mais falada para esta próxima temporada de prémios que se aproxima.
Vindo das ruas de Compton, Los Angeles, os NWA emergem das ruas conturbadas de uma cidade a braços com sérios problemas raciais.
A braços com vidas marcadas pela marginalidade, droga e falta de oportunidades, Ice Cube (O'Shea Jackson Jr.), Dr. Dre (Corey Hawkins) e Eazy-E (Jason Mitchell) decidem levar a sério a sua veia musical e tentar a sorte num mundo que não os reconhece enquanto artistas e falar dos seus problemas, das suas vidas, das suas disputas e principalmente das questões e preconceitos que os afectam enquanto artistas afro-americanos.
Ainda que Straight Outta Compton seja aquele filme do momento - no que diz respeito aos Estados Unidos - muito dominado por questões raciais que parecem ainda hoje abalar as fundações do país, o que é certo é que para lá das suas fronteiras esta é uma história perfeitamente banal e difícil de vingar sendo ainda, por vezes, excessivamente longa para a mensagem que pretende transmitir. Ainda que a realidade do "bairro", do desrespeito pela multiculturalidade, dos gangs armados ou até mesmo da falta de oportunidade em "ser alguém" explícita nesta realidade norte-americana seja um problema que afecta tantas outras sociedades, a verdade é que se distancia ferozmente daquilo que aqui conhecemos. Enquanto na sociedade norte-americana existe uma certa tendência para acreditar no sonho e no alcance do mesmo, tal não acontece em qualquer sociedade europeia onde implicitamente esse sonho não passa disso. Assim, se por um lado podemos identificar problemas comuns não é menos verdade que a sua resolução ou tentativa de diferem de forma radical entre os dois lados do Atlântico tornando a proximidade a esta longa-metragem difícil e por momentos incompreensível.
O bairro como o elemento principal de onde todos saem mas do qual nunca se esquecem mantendo para sempre uma ligação inviolável - mas apenas acentuada nos momentos de crise onde todos parecem não ter outro local ao qual recorrer - é assim o ponto de partida para um conjunto de realidades que tendo o mesmo percurso se distanciam na forma como o desfecham. Para uns o poder do dinheiro, da fama, glória e reconhecimento mais não é do que a ponto de partida para uma vida de vícios que têm como resultado último a perdição e a (auto-)condenação de onde será impossível fugir. Alguns destes nomes ainda que conhecidos nos Estados Unidos pecam, uma vez mais, por não se internacionalizar para lá de meios específicos que seguem as respectivas carreiras - sim, é um facto que qualquer um de nós conhece Ice Cube mas quantos de nós conhecerão realmente a sua história? - e, dessa forma, Straight Outta Compton não deixa de ser outra coisa que não "mais um filme de bairro". Sexo, drogas, violência e excessos dominam esta história - real - sendo que o que achei de mais interessante neste filme acaba por ser aquilo que se torna num ponto de partida - mais básico - quando na realidade deveria ser o elemento mais forte de toda esta dinâmica, ou seja, a questão racial. Todos nós recordamos o caso Rodney King e a sentença que os seus agressores tiveram - nenhuma - e ainda que esta seja uma questão de fundo central, não é menos verdade que se torna quase como um elemento de ocasião e pouco relevante para a história do grupo de amigos que, no fundo, mais não exigia do que a sua plena igualdade face aos demais cidadãos.
Interessante pela forma como recupera uma época específica e a já referida questão racial sempre presente neste género de histórias mas, ao mesmo tempo Straight Outta Compton está longe de se afirmar como um filme marcante no género principalmente se nos recordarmos de Boyz n the Hood, de John Singleton (1991) ou até mesmo como um dos mais significativo do ano limitando-se a exibir um conjunto de interpretações protagonistas essas sim que se destacam pelo seu empenho e excelência e uma banda-sonora que faz denotar alguns dos temas mais emblemáticos do Hip Hop.
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"Ice Cube: Speak a little truth and people lose their minds."
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5 / 10
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Vazio (2015)

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Vazio de Bruno Gascon é uma curta-metragem portuguesa de ficção que habilmente une o thriller, o suspense e o terror urbano contemporâneo.
Segundo dados da Organização Mundial de Saúde, mais de trezentos milhões de pessoas sofrem de depressão estando perto do milhão aqueles que decidem por um fim ao seu sofrimento não tendo, na sua maioria, chegado a receber qualquer tipo de tratamento ou apoio psicológico.
Esta é a história de um deles. Este homem (Jorge Cruz) deambula por aquilo que se assemelha ao que resta da sua vida. Conseguirá ele resistir a todas as provações que lhe são colocadas?
Joana Domingues e Bruno Gascon assinam o argumento deste filme que se enquadra de forma perfeita naquilo que o espectador poderá facilmente considerar o melhor exemplo do terror real, ou seja, à semelhança do que já havia acontecido com Boy - a anterior curta-metragem de Gascon - aqui, uma vez mais, longe de qualquer subterfúgio ou inuendo sobre a presença de uma qualquer entidade sobrenatural, o verdadeiro medo surge aquando da presença daqueles demónios que se apoderam da mente humana e a dominam sem qualquer dó ou piedade. Aqui, esse demónio é o "Vazio".
Este "vazio" - de esperanças, de objectivos, de amor próprio, auto-afirmação, cumplicidade familiar ou de sucesso familiar - assume-se como o último grande mal que chega de forma não anunciada mas ferozmente desesperante e mortal colhendo as mentes mais sensíveis e frágeis delas fazendo o "nada". No final, para este "homem", a sua existência prende-se apenas e só com uma questão: que faz ele "aqui"?!
Sem alguém com quem falar, uma família que entenda o seu desespero ou um trabalho no qual não só não ascende profissionalmente como também é considerado como um zero dispensável, este homem mais não é do que um entre muitos... Grupo esse que tenta resistir de uma ou de outra forma mas que percebe que por muito que tente sobreviver todos os seus actos ou intenções são rapidamente absorvidos por um mundo que simplesmente deles não quer saber. Com "nada" por alcançar e um crescente "vazio", este - entre tantos outros - percebe que não tem nada a perder sucedendo-se uma espiral de negatividade que contribui para o seu total anulamento e aniquilamento.
Um dos momentos mais curiosos de Vazio - para lá da sua óbvia mensagem - foi um talvez não intencional momento em que ao ligar para uma linha de apoio a voz que o "recebe" parecer oca, distante e como que se tratasse de um favor indesejado que agora tem de retribuir. "Sempre só" pensa este homem - e com razão - quando confirma que tudo à volta da sua existência é um conjunto de pessoas, actos e acontecimentos que o reprimem pela sua existência e pelo seu afundamento. Tantas vezes se repente a um Homem que ele é um inútil que, eventualmente, ele acaba por acreditar que realmente o é.
Quando se perde o respeito - próprio - tudo se perde. Quando nada se tem que almejar... para quê existir? E quando esta existência nada importa... porque não arrastar alguém também para o mesmo buraco? Aquele alguém que "nos" diminuiu, insultou, desdenhou... Aquele alguém que é possivelmente o motivo de todos os problemas, de todas as angústias e de todos os insucessos...
Prisioneiro de uma cela sem grades que se encontra dentro da sua própria cabeça, este homem é a encarnação de um desespero sem limites, de algo vazio e vão... de algo sem sentido, oco e distante. Preso ao seu próprio insucesso - pessoal e profissional - e refém de alguém - todos - que não o quer ou deseja e que encontra apenas na extinção a resolução de todos os seus problemas.
Com uma forte interpretação de Jorge Cruz como um homem sem destino preso na sua própria insignificância - sentida e provocada - e uma breve mas mordaz participação de Duarte Grilo como um patrão sem escrúpulos - ode aos tempos modernos - numa Lisboa nunca antes sentida como tão fria, Vazio é uma afirmação de um mundo presente mas distante... que a todos aproxima mas que ao mesmo tempo os distancia exigindo sempre mais, sempre um pouco mais que nunca é suficiente ou satisfatório e que por isso corrompe, distancia e finalmente mata... pelo vazio de aspirações, de entrega, de cumplicidade, de objectivos, de sucesso e finalmente pelo vazio maior... aquele que se sente por não se ter sentido nada daquilo que se esperou.
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"Ele: Não há nada mais perigoso que um homem que não é ninguém."
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8 / 10
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Naufragando por los 30 (2014)

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Naufragando por los 30 de Miguel B é uma curta-metragem de ficção espanhola que nos retrata a aparentemente triste vida de Luisra, um trintão viciado em fast food e redes sociais nas quais procura desesperadamente o amor da sua vida.
Quando parece já não ter mais esperança eis que surge a mensagem de Olaf...
Num mundo onde tudo parece efémero e tão ou mais rápido quanto a fast food que confere a "Luisra" algumas energias, Naufragando por los 30 é assim um igualmente breve relato sobre a curta duração que as "relações" modernas têm. É neste ponto que o espectador entra em directo conflito com esta história pois a definição de "relação" mais não é do que um qualquer encontro fortuito que se estabelece através de uma qualquer rede social onde dos dois lados da "barricada" pouco mais existe do que uma foto e um texto breve - qual nota de intenções - sobre os desejos, sonhos e aspirações de cada um... Como se tal bastasse para os poder resumir.
Se por ventura estes sonhos e desejos se resumem a uma breve nota de rodapé transmissível por uma rede social e limitando-se a essa mesma condição, então o espectador entra no segundo dilema... qual indiferencializada está a sociedade moderna que chegou ao ponto de "conhecer" alguém apenas e só através de um extremamente limitativo e impessoal computador?! Existirá vida - para "Luisra" - que esteja para lá do seu computador pessoal?!
"Luisra" é assim a encarnação de uma geração que, nos seus trinta, se anula de uma vida "lá fora", onde existem pessoas reais e não as suas fotografias. Onde a interacção prima como a única forma de conhecer - ou excluir - os demais baseado em fundamentos aceitáveis para uma sociedade que se diz e clama como moderna. Assim, ao apenas interagir por detrás de um computador e de uma fotografia que ele exibe - e que na prática pode ser de qualquer pessoa real (sendo o que está do outro lado) ou imaginada (outra pessoa qualquer) - "Luisra" vive de obsessão em obsessão alimentando o seu prazer única e exclusivamente pela libido que a fotografia lhe provoca... ou não... e partindo de imediato para uma próxima "vítima" que considera ser "o tal".
Num ciclo vicioso onde não se vislumbra o fim, Naufragando por los 30 é um breve relato sobre a forma como as redes sociais tanto nos aproximam ao outro lado do mundo como, ao mesmo tempo, nos distanciam daqueles que estão ao virar da esquina limitando a interacção social fazendo do Homem um animal solitário, dependente e obsessivo.
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6 / 10
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terça-feira, 27 de outubro de 2015

European Film Awards 2015: os primeiros vencedores

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A Academia Europeia de Cinema anunciou hoje os seis primeiros troféus que distinguem as categorias técnicas de Fotografia, Montagem, Design de Produção, Guarda-Roupa, Música e Som nos European Film Awards relativos ao cinema europeu estreado durante o corrente ano.
Os vencedores anunciados são assim:
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Prémio Carlo di Palma - Fotgrafia: Martin Gschlacht, Ich Seh Ich Seh
Montagem: Jacek Drosio, Ciało
Design de Produção: Sylvie Olivé, Le Tout Nouveau Testament
Guarda-Roupa: Sarah Blenkinsop, The Lobster
Música: Cat's Eyes, The Duke of Burgundy
Som: Vasco Pimentel e Miguel Martins, As Mil e Uma Noites - Volume I: O Inquieto, Volume II: O Desolado e Volume III: O Encantado
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De destacar assim o prémio atribuído à trilogia As Mil e Uma Noites, de Miguel Gomes que está não só na lista de potenciais nomeados aos EFA revelados no próximo dia 7 de Novembro aquando do decorrer do Festival de Cinema Europeu de Sevilha cujos vencedores serão anunciados no dia 12 de Dezembro numa cerimónia a realizar em Berlim, na Alemanha, como também está entre os premiados o Volume II: O Desolado, o candidato de Portugal ao Oscar de Melhor Filme Estrangeiro bem como ao Goya da Academia Espanhola de Cinema para o Melhor Filme Ibero-Americano.
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sábado, 24 de outubro de 2015

Maureen O'Hara

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1920 - 2015
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sexta-feira, 23 de outubro de 2015

Área de Contenção - Encontros Internacionais de Cinema Fantástico e de Horror do Cartaxo 2015: selecção oficial

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Selecção Oficial
Paranoia Park, de Bruno Mercier (França)
…In The Dark, de David Spaltro (EUA)
Slit Mouth Woman in L.A., de Takeshi Sone (EUA/Japão)
III, de Pavel Khvaleev (Rússia)
Candlestick, de Christopher Presswell (Reino Unido)
Buenas Manos, de Francisco Bendomir (Argentina)
Caradecaballo, de Marc Martínez Jordán (Espanha)
Te Voy a Hacer Gritar, de Filip Martinovic (Espanha/Sérvia)
Mi Vanidad, de Francisco Bautista Reyes (México)
Los Caminos del Señor, Eduardo M. Clorio (México)
Mr. Dentonn, de Ivan Villamel Sanchez (Espanha)
The Girl, de Shashwati Talukdar (India)
Fumer Tue, de Lionel Kaplan (França)
Plantae, de Antonio Bayardo (México)
Under the Hood, de Guido Franken (Holanda)
I'm Christian Okoli, de Cyrus Trafford (Reino Unido)
Analiens, de Joaquin Gil (Espanha)
3 Wise Monkeys, de Miguel Ángel Font Bisier (Espanha)
Cold, de Iván Martín Ruedas (Espanha)
La Última Voluntad de Emilio Cancela, de David  Caiña Pérez (Espanha)
Judas, de Joel Caetano (Brasil)
The Peripheral, de JT Seaton (EUA)
A Tricky Treat, de Patricia Chica (Canadá)
Eat My Shit, de Eduardo Casanova (Espanha)
Moustache from the Moon, de Sélim Atmane (França)
The Cart, de Patrik Eriksson (Polónia)
Naranjito, de Ignacio F. Rodó (Espanha)
The Outcasts, de Tim Ellrich (Alemanha)
Fishtale, de Guy Shahaf (Israel)
Manias, de Santiago Capuz (Espanha)
Mosaic Man, de Tomohiko Iwasaki (Japão)
Dinner For Few, de Nassos Vakalis (Grécia)
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Selecção Oficial Nacional
Maria, de Joana Viegas
Gasolina, de João Teixeira
O Efeito Isaías, de Ramon de los Santos
Arcana, de Jerónimo Ribeiro Rocha
A Tua Plateia, de Óscar Faria
Ermida, de Vasco Esteves
Bolor Negro, de Marta Pessoa
Bilis Negra, de Nuno Sá Pessoa
Terra 2084, de Nuno Sá Pessoa
The Bad Girl, de Ricardo Machado
Se o Dia Chegar, de Pedro Santasmarinas
Os Palpites de Regina, de Diogo Figueira
Anjo Negro, de Pedro Horta
The Punishment, de Nelson Ferreira
Noturna, de Pedro Farate
Killies, de David Rebordão
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Monstros Debaixo da Cama
El Don de los Espejos, de Mara Soler Guitián (México)
Jerminación, de Paúl  Gómez López (México)
Milk, de Elizabeth Liu Xiujun Liu (Singapura)
Route 52, de Jacinth Tan Yi Ting e Tok Xue Yi (Singapura)
The Belief, de Amir Vahedi (Azerbeijão)
Lingo, de Vicente Nirō (Portugal)
That's Mine!, de Maryam Kashkoolinia (Irão)
Entrevista de Emprego, de Thiago Penteado (Brasil)
Kia Rex, de Yandong Qiu (EUA)
Princess, de Eileen NTU (Singapura)
Klementhro, de Ben Mitchell (Reino Unido)
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Out of the Box
Be My Cat: A Film For Annie, de Adrian Țofei (Roménia)
Spammer, de John Iwasz (EUA)
Kokeshi, de Paolo Del Fiol (Itália)
Withdrawal, de M. Myrdal Muda (Indonésia)
Game Over, de Cyrus Trafford (Reino Unido)
Contagious, de Antti Jänkälä (Finlândia)
Did you Bring Protection?, de Kyle Kelley (EUA)
Inferno, de Ángel López (México)
Glass, de Rob Carpenter (Canadá)
Slit, de Colin Clarke (EUA)
Total Animal III, de Tristan Guerlotté (França)
Silent Phantom, de Matt Harris-Freeth (Reino Unido)
Hellhounds, de Alessandro Correa (Brasil)
Adam Minus Eve, de Aurélia Mengin (França)
Magnificent Kaaboom!!!, de Zachary T. Whitmore (EUA)
The Wolves, de Dominique Rochon (Canadá)
Steve: Death Collector, de Missy Dawn (EUA)
Killer Rack, de Gregory Lamberson (EUA)
Høsten, de Kim Sønderholm (Dinamarca)
Alba, de Lucas Castán (Espanha)
Cabrito, de Luciano de Azevedo (Brasil)
El Buen Mal, de Jokin Urruticoechea (Espanha)
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terça-feira, 20 de outubro de 2015

FICSAM - Festival Internacional de Cinema e Saúde Mental 2015: os vencedores


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Ficção Nacional - Longas-Metragens
1º lugar: A Porta 21, de João Marco
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Ficção Nacional - Curtas-Metragens
1º lugar: Sintoma de Ausência, de Carlos Melim
2º lugar: Marta, de Bernardo Gomes de Almeida
3º lugar: Anjo Negro, de Pedro Horta
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Documentário Nacional - Longas-Metragens
1º lugar: Pára-me de Repente o Pensamento, de Jorge Pelicano
2º lugar: Dr. Adrian e os Cinco Senhores, de Francisco Moura Relvas
3º lugar: Shoulder the Lion, de Patryk Rebisz e Erinnisse Rebisz
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Documentário Nacional - Curtas-Metragens
1º lugar: White Wash Poetry, de Leif Lonne e Sofia Trincão
2º lugar: I Love Haiti, de Jorgen Johansen
3º lugar: Homebound, de Thomas O'Leary Jeffery
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Ficção Internacional - Curtas-Metragens
1º lugar: Raspberries, de Morgan Davidsen
2º lugar: Catalina and the Sun, de Anna Paula Honig
3º lugar: Un Dia Cualquiera, de Nayra Sanz Fuentes e Ruines du Temps, de Peteul Mathieu
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Escolas
1º lugar: A Sam, de Ruzena Rausova - Academy of Arts in Banska Bystrica (Eslováquia/República Checa)
2º lugar: Bárbaras Cenas, de Marcelo Fiorini - UNIFAE (Brasil)
3º lugar: Oobe, de Joana Maria Sousa e Manuel Carneiro - Universidade Lusófona de Humanidades e Tecnologias (Portugal)
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Animação
1º lugar: Nunca Habla, de Jorge Moraga Jimenez e Manuel Torres Barzabal
2º lugar: The Lost Mariner, de Tess Martin
3º lugar: A Bigger Man, de Cristian Wiesenfeld
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Videoclip
1º lugar: Carpe Jugular, de Stanicke Kai
2º lugar: Kronnen - Fotos de lo que Fuimos, de Francisco Javier
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Por Aqui Tudo Bem (2011)

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Por Aqui Tudo Bem de Pocas Pascoal é uma longa-metragem portuguesa que nos conta a história de Alda (Ciomara Morais) e Maria (Cheila Lima), duas irmãs angolanas refugiadas no Portugal de 1980 fugidas da guerra civil que assolou o seu país natal.
Sózinhas em Lisboa, as duas irmãs encontram um conjunto de situações que as deixa não só deslocadas no espaço como numa constante fuga dos inúmeros problemas com que deparam, assim como numa eterna espera pela mãe que ficou detida em Angola. Numa luta pela sua preservação e sobrevivência, Alda e Maria tornam-se mulheres adultas antes do seu tempo como a única forma de resistir aos dilemas que lhes são colocados.
A longa-metragem de Pocas Pascoal chega - apesar dos seus já quatro anos de finalização - numa interessante altura na medida em que faz uma reflexão pertinente sobre o drama dos refugiados de guerra bem como sobre uma ainda não explorada temática como é aquela da descolonização ou, pelo menos, dos seus efeitos imediatos como a guerra civil no caso angolano.
Se por um lado Por Aqui Tudo Bem leva o espectador a uma análise - ainda que por vezes tímida - da vivência na Angola pós-independência devastada pela já referida guerra civil, não é menos verdade que aqui se centra essencialmente nas experiências de duas jovens que afastadas do seu meio e perdidas num mundo completamente novo e diferente tentam resistir e sobreviver apesar das adversidades que chegam sob diferentes formas. Por um lado temos a xenofobia e racismo presente em alguns elementos da dita sociedade portuguesa expressa por comentários de repúdio pela sua presença mas, ao mesmo tempo, não deixa de ser verdade que as próprias "Alda" e "Maria" se sentem estrangeiras num país que deveria - na prática - também ser o seu visto que, aquando do seu nascimento e afastando os dilemas políticas e sociais, Angola também era Portugal. No entanto para elas Portugal é - era - o opressor... Aquele Estado que entrou no seu e roubou e despojou dos seus recursos tendo de seguida saído sem regra ou controle. Não menos verdade, no entanto, que o que ficou não dignificou aqueles que chamou de "seus".
É assim que nesta nova sociedade também ela saída de uma ditadura opressora e destabilizadora, "Alda" e "Maria" tentam encontrar um lugar - o seu - enquanto esperam pela mãe detida pelas autoridades angolanas com a suspeita de ser membro de um dos lados. É esta luta pela sobrevivência que as leva a fugir de um para outro local tentando encontrar um lar que nunca chega. Primeiro numa pensão pouco amistosa, depois num contentor de um qualquer lugar em construção e finalmente como "ocupas" de um prédio na margem sul do Tejo que, como para tantos outros, se transforma naquilo de mais perto podem chamar de seu. Num local desconhecido e sem amigos, as duas irmãs encontram assim refúgio junto de "Alice", uma costureira vinda de Angola que acaba por encarnar os dois lados de uma mesma moeda, ou seja, se inicialmente é amistosa e as acompanha para aquela que poderá ser a sua nova etapa, não é menos verdade que rapidamente mostra um seu lado mais escuro e sombrio desprezando as duas jovens como se elas fossem um seu inimigo ou uma vã recordação do tal passada que também ela havia deixado em Luanda. Perseguidas por aquele que é agora o seu país e perdidas num que o fora, as irmãs estão num limbo que não lhes permite encontrar qualquer segurança... e Portugal acaba por se transformar nesse mesmo limbo. Deixou-as entrar para escaparem de uma guerra que lhes daria um destino igual ao dos pais - mãe detida e pai desaparecido - mas ao mesmo tempo não as reconhece como integrantes desta sociedade que agora se preparava para das os seus primeiros passos europeus.
É neste processo que ambas descobrem não só a sua sexualidade como a eterna amizade que sempre as irá unir independentemente do local em que se encontrem como principalmente lhes mostra que são mulheres livres, adultas, independentes e capazes de resistir à maior das provações... que é a própria vida.
Num processo que as coloca - e aos demais jovens a que se referem que vieram para Portugal para fugir ao serviço militar e à guerra civil - como refugiadas dentro de um país que fora seu - ou que deveria ter sido pela situação política de Angola enquanto parte integrante de Portugal à altura do seu nascimento - Por Aqui Tudo Bem tenta mostrar o lado sombrio de todo este processo que nunca reconheceu os seus cidadãos nascidos nas antigas colónias - o que as teria deixado numa situação de igualdade para com aqueles que no território europeu nasceram - mas também esse mesmo lado sombrio na África de origem onde seriam perseguidas devido ao "lado" da guerra no qual se "encontravam". Este tal limbo demonstra que nunca tem um fim.
No entanto o momento mais enigmático de Por Aqui Tudo Bem - e infelizmente aquele que acaba por não ser mais explorado - chega após as duas jovens terem já abandonado o apartamento que ocuparam e que é então ocupado por outro homem. Se associarmos este momento ao eterno dilema das irmãs que não sabem do paradeiro do seu pai, o espectador questiona-se se este homem que agora aparece não poderá ser esse progenitor desejado e que agora por uma trágica ironia do destino continua "desaparecido" para as filhas.
Em suma, Por Aqui Tudo Bem recupera o imaginário do pós-descolonização portuguesa que tão timidamente tem surgido na indústria televisiva/cinematográfica nacional e sobre os milhares de vidas que afectou de uma ou outra forma tendo, no entanto, transformado radicalmente cada uma delas. Da descolonização à guerra civil, do racismo e xenofobia aos estigmas deixados de parte a parte sem esquecer que todos estes elementos se conjugam no seio da vida de duas jovens em plena auto-transformação da adolescência pueril à idade adulta onde todas as decisões têm de ser tomadas e formalizadas.
De forma inocente mas pessoal, Por Aqui Tudo Bem assume-se como uma obra cinematográfica que deverá ser considerada pelo público e que poderia (poderá) ser a primeira de muitas que abordem esse passado ainda desconhecido da História de Portugal e de Angola.
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7 / 10
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Yoná Magalhães

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1935 - 2015
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Y en el Séptimo Día (2014)

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Y en el Séptimo Día de Michael Raphan é uma curta-metragem de ficção espanhola que leva o espectador a uma enérgica, romântica e por vezes desesperante viagem aos primeiros de um casal enquanto marido e mulher.
A lua-de-mel é suposto ser aquele conjunto de dias em que tudo corre de forma perfeita para um casal que celebra a sua vida em conjunto. Mas, quão fácil será para estas duas pessoas cansarem-se da mútua companhia e de uma perspectiva de "toda a vida"?
Desde o Dia 1 em que tudo é uma novidade e a viagem para o outro lado do mundo constituem a mais recente conquista de um casal que se ama, até ao Dia 7 em que todas as novidades já foram ultrapassadas e onde os silêncios constrangem a harmonia existente entre a dupla especialmente quando parece que são se vão tornar num trio inesperado.
A incerteza de um futuro não planeado e a vontade dele ser - para ela - sempre uma garantia, faz com que ambos se dividam a respeito daquilo que se pode e quer ter... incluindo a eventual maternidade. Assim, o espectador é colocado perante um dilema... sobreviverá este casamento para lá da sua descendência que poderá não chegar neste momento ou, por sua vez, irá ela continuar com um eterno sentimento de rejeição das suas vontades trazendo ao mundo um filho que parece não desejar?
Simpática e reflexiva nos seus breves instantes, Y en el Séptimo Día explana as vontades e desejos não cumpridos de um casal que habituado à mútua convivência esqueceu o significado da partilha e da entrega a favor das suas vontades individuais onde um - aparenta - estar em detrimento em relação ao outro. Quando a aventura e a esperança deram lugar à rotina e ao "habitual", poderá este jovem casal junto desde tempos que já nem os próprios recordam continuar a sua união? Ou será esta lua-de-mel o princípio de um fim já anunciado?
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7 / 10
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Diola, el Viaje (2014)

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Diola, el Viaje de Antonio Sarmiento é uma curta-metragem documental espanhola que nos relata as intermináveis viagens de alguns emigrantes de etnia Diola vindos de África para a Europa - mais concretamente Espanha - com a ideia de um El Dorado que lhes possa conferir um melhor nível de vida do que aquele que têm na sua região.
Desde as suas histórias pessoais - de e com sentimentos à mistura se considerarmos que relatam não só os seus dramas no novo território como também a memória daqueles que deixaram para trás -, este documentário confere ainda ao espectador uma interessante abordagem à recepção que este têm não através dos testemunhos de adultos que sente os efeitos da crise económica mas sim dos seus filhos que em entrevista escolar tecem as suas considerações sobre as suas - e dos pais - dificuldades considerando que esta emigração é a causa dos seus problemas.
Sentido e um importante relato sobre a crise - social, económica e cultural - pela qual a Europa atravessa, Diola, el Viaje é assim um documento sobre a actualidade escondida de um continente que não quer encarar os seus problemas e principalmente sobre aqueles que encontram por cá o seu porto de abrigo económico e a possibilidade de uma vida melhor manifestando todo um conjunto de incertezas que vivem em silêncio.
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7 / 10
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quarta-feira, 14 de outubro de 2015

Admirador Secreto (2015)

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Admirador Secreto de Roberto Pérez Toledo é uma curta-metragem espanhola de ficção que une duas formas de comunicação muito particulares, ou seja, se por um lado falamos de uma obra cinematográfica, por outro temos uma em que a comunicação postal escrita está em evidência através de Carla (Sandra Martín), a única mulher de um grupo de quatro amigos que partilham um apartamento.
Quando Carla recebe misteriosas cartas de um admirador secreto que deixam os três moradores masculinos (Miguel Ángel Bellido, Yerai León e Ventura Rodríguez) com as mais variadas e distintas reacções, será importante saber quem as enviou ou perceber para quem são realmente dirigidas?
Presente no argumento desta que é a sua mais recente curta-metragem como que de uma assinatura pessoal enquanto director e criador de histórias, as relações humanas ganham uma vez mais uma dimensão pouco simplista na vontade de relatar como elas se podem processar. Roberto Pérez Toledo tem uma extensa carreira enquanto realizador e argumentista, e em todos os seus trabalhos que por aqui já tive o prazer de comentar denota-se uma acentuada preocupação em contar como as relações humanas se desenrolam pelo prazer de contar uma história que faça não só pensar como também sentir todos os pequenos grandes entraves que se podem esconder por detrás de olhares mais ou menos reveladores. No fundo, as suas personagens transmitem aquilo que pelo qual todos nós (des)esperamos... ser amados incondicionalmente por "aquela" pessoa que está invariavelmente ao nosso lado e à qual - secretamente - dedicamos toda a nossa existência e razão de viver.
Com um igualmente apurado sentido de ironia e comédia, as suas histórias são contadas não pelo dramatismo da mesma mas sim com um humor quase cândido que suaviza a tal "dor" do amor não correspondido ou não conhecido aqui registado pelas três desconcertadas e mordazes interpretações de Bellido, León e Rodríguez que funcionam como os velhos do Restelo capazes de, com algum desdém, alertar para situações que, bem analisadas, poderiam constituir alguma preocupação.
Numa altura em que a comunicação chega à distância de um click, livre - pensamos nós - de qualquer confusão ou extravio, o espectador pergunta-se, no entanto, onde está a magia de receber uma carta, escrita à mão e onde muito também pela letra se conseguem perceber motivações, sentimentos e estados de espírito daqueles que nos escrevem e encaram aquele momento como algo pessoal e directamente relacionado com a pessoa a quem a escrevem.
Inteligente não só pela forma como expõe as dinâmicas de uma potencial relação - nunca sabemos se se concretiza - como também pelo humor e dramatismo que incute às suas personagens, transformando os espaços em vazios que não interferem com a dinâmica da história mas que os influenciam pela forma como tudo, em pequenos instantes, se transforma e revela num mesmo local. Já o disse aqui e reafirmo... Roberto Pérez Toledo é um mestre a contar histórias e um do qual seguramente continuaremos a ouvir falar muito pelo futuro.
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8 / 10
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terça-feira, 13 de outubro de 2015

Res Pública (2014)

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Res Pública de Manuel Valls é uma curta-metragem de ficção espanhola que leva ao espectador ao interior de uma intriga política e à revelação de um passado que se pode demonstrar não tão claro e moralista como aparenta ser.
Pablo (Manuel Valls) é o representante de um partido acostumado ao poder. Acostumado de tal forma que julga que as suas acções não lhe trarão qualquer consequência. Ele é intocável.
No entanto, é quando Ana (Lucrecia Cervelló) demonstra querer ascender rapidamente na sua carreira que os erros passados de Pablo parecer querer ressurgir. Irá ele pagar o seu preço?
Com um argumento escrito também por Valls, Res Pública não poderia ser um filme mais actual não só pela sua perspectiva da vida política tão escondida dos olhos públicos mas que "responde" a tantas questões colocadas pelo eleitorado e pela sociedade em geral, mas também pela forma como mais ou menos subtilmente expõe os podres daqueles que se deixam corromper pelo poder bem como aqueles tidos por quem chega com grandes ilusões e se deixa levar pela mesma trama de intrigas que começou por condenar.
Num mundo que não permite qualquer tipo de jogo fraco, Res Pública tece assim uma questão essencial... Até onde cada um está disposto a ir para se fazer valer num mundo impiedoso?
E para responder a esta questão temos por um lado "Pablo" e por outro "Ana". Se o primeiro tem uma vida estabilizada e é, de uma ou outra forma, uma figura respeitada em sociedade, não é menos verdade que o seu passado esconde algo do qual ele não se orgulha e tem um confesso receio que se torne público e que pode abalar toda a sua "saudável" estabilidade caso seja descoberto. E quando julgamos que "Ana" chega para desmascarar este passado exigindo assim um nível de transparência que faltou até então, percebemos que esta está disposta a continuar a esconder esse passado se lhe fôr garantida uma ascenção profissional que de outra forma lhe seria impossível de alcançar. Desta forma, e tendo em conta a ideia de que uma mão lava a outra, ambos se comprometem e condicionam a sua já pouca falta de integridade selando um "contrato" que irá a partir desse momento vinculá-los a um jogo de silenciosa estratégia.
Mas Res Pública não é apenas uma meditação política mas também social na medida em que durante a tensa mas pacífica negociação entre "Pablo" e "Ana" revelam aquilo que todos nós preferimos não "saber", ou seja, o quão fácil é controlar os demais. É quando ambos revelam que temem que se descubra o passado e a actual negociata que verbalizam sobre como controlar o público uma vez que a imprensa já está nas suas mãos. O espectador - também de forma serena - questiona-se então sobre a imparcialidade e isenção de uma comunicação social que pode estar controlada e, como sua consequência directa, como estar toda uma população informada e actualizada se a dita imprensa está comprometida. Num jogo de acção e reacção só nos resta uma certeza... (in)voluntariamente estamos todos comprometidos.
No final, e quase imperceptível e silencioso, fica o drama daqueles que sofreram. As vítimas que escondem também em silêncio a sua mágoa e vergonha anulando a sua presença num mundo que não só os esqueceu como torturou e deitou fora. Os seus corpos enfraquecidos lentamente apagam-se enquanto floresce a mentira e a violência de outros que chegaram ao poder, que mandam, que mentem, corrompem e eliminam... com a facilidade de quem pode, quer e faz e as interpretações de Valls e Cervelló são astutas e poderosas para nos demonstrar que ou se tem poder... ou se é eliminado. Não existe meio termo.
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8 / 10
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Naciye (2015)

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Naciye de Lutfu Emre Cicek - também o autor do argumento - é uma longa-metragem turca de suspense que nos insere na algo frágil relação de Bertan (Gorkem Mertsoz) e Bengi (Esin Harvey). Estando Bengi grávida de uma criança, os dois deslocam-se para uma casa alugada numa zona pacífica junto à praia onde ela deverá terminar a sua gravidez e fortalecer a relação entre ambos.
No entanto, aquilo com o qual ninguém contava é que esta residência estivesse ainda ocupada por Naciye (Derya Alabora), a sua antiga proprietária que recusa de lá sair ou de receber qualquer tipo de hóspedes.
A premissa inicial de Naciye que remete o espectador para o imaginário de casa assombrada não por espíritos mas pelos trágicos acontecimentos do passado que a condicionaram é imediatamente desperto quando nas cenas iniciais lhe é revelado que a sua sinistra ocupante esconde mais do que a violência dos seus actos parece demonstrar. No entanto, é esta mesma violência que, ao mesmo tempo, condiciona também o filme e a sua credibilidade ao ser exposta com algum amadorismo e falta de crédito dramático não só no acto como principalmente nas interpretações dos actores que as interpretam.
Quando um espectador fiel ao género suspense/thriller se predispõe a assistir a uma longa-metragem do género, existem um conjunto de requisitos mínimos que são obrigatórios, nomeadamente as interpretações que têm de ser levados ao extremos mas sob o efeito da intensidade dos mesmo, ou seja, se é para parecer alucinado... que se seja de facto. Não é possível permanecer pela história apenas com aparências que são imediatamente "cortadas" por uma música - nem sempre bem sucedida - de alguém que parece estar num bar a beber uns copos com os amigos, e os traumas que permanecem entre quatro paredes têm, também eles, de estar reflectidos no ambiente geral do espaço. Aqui, nenhum deles marca presença.
Se por um lado o espectador entende quais são os verdadeiros mistérios de "Naciye" e da sua família cujo passado é marcado pela violência física e pelo incesto, não é menos verdade que a sua história se perde por um conjunto de inuendos, suposições e confirmações que apenas chegam no final e tacitamente expostas no enredo de forma a que todos as consigam perceber. Se por um lado o espectador gosta e entende as explicações, por outro o suspense não funciona porque nada fica implícito e os vilões mais se aproximam de vítimas de um dilema sociedade vs. comunidade sendo ambas fechadas sobre si mesmas vivendo alegremente na política do "don't ask... don't tell...".
As interpretações são desta forma - também elas - muito frágeis e no limite. Secundários a mais sendo na maior parte das situações perfeitamente dispensáveis, outros tantos que surgem onde - também neles - a suposição sobre "quem são?" permanece no ar, e aqueles que deveriam estar no centro da história, nomeadamente a "Naciye" de Derya Alabora acabam por não expôr todo o seu potencial limitando-se ao que está... "by the book"...
No final a única coisa mais positiva pelo qual consigo destacar Naciye é o sub-enredo que não sendo devidamente explorado acaba por justificar não só os comportamentos da personagem homónima como também aquele tido pelos principais que se deslocam para aquela casa, ou seja, a violência. Existe uma constante violência física e psicológica inerente a todas estas personagens quer através do incesto explícito mais perto do final desta longa-metragem mas também aquele físico exposto ora através da tortura ora através de comportamentos abusivos onde a exposição de força é uma constante. Não sendo explorado e aqui apresentado apenas como "algo" que surge, é esta mesma violência que consegue destacar - mal - este filme ao ponto do espectador poder por breves momentos questionar-se sobre até que ponto não é a violência o motor para a perpetuação de sucessivos comportamentos disfuncionais quando alguém está a ela exposto desde jovem idade permanecendo como um único "real" vínculo entre os indivíduos.
Sendo este o ponto mais interessante de Naciye acaba também por ser aquele que mais o debilita por não se explorar devidamente e ao qual se junta uma fragilidade não só interpretativa como principalmente técnica que fazem desta longa-metragem turca uma aposta arriscada... e muito pouco superada.
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3 / 10
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European Film Awards 2015 - Filme de Animação: os nomeados

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A Academia Europeia de Cinema divulgou hoje as três longa-metragens de animação nomeadas aos seus prémios anuais a entregar numa cerimónia que se irá realizar no dia 12 de Dezembro em Berlim, na Alemanha.
As longa-metragens nomeadas foram seleccionadas a partir de uma lista fornecida pela CARTOON - Associação Europeia de Cinema de Animação bem como por submissões individuais tendo as nomeações sido decididas por um comité composto Antonio Saura (Academia Europeia de Cinema), pelos especialistas de animação Marcel Jean (Festival de Cinema de Annecy) e Anja Šošić (Human Ark), e ainda por Petteri Pasanen (Anima Vitae), Iain Harvey (The Illuminated Film Company) e Jacques-Rémy Girerd (realizador), sendo estes últimos três representantes da CARTOON. E as nomeações são:
  • Adama, de Simon Rouby (França)
  • Shaun the Sheep The Movie, de Richard Starzak e Mark Burton (Reino Unido/França)
  • Song of the Sea, de Tomm Moore (Irlanda/Bélgica/Dinamarca/França/Luxemburgo)
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Ruído (2014)

Ruído de Ricardo Ibáñez Ruíz é uma curta-metragem experimental de ficção espanhola que tece uma breve relação entre a afirmação individual de cada um de nós no mundo a partir do exacto momento em que chegamos ao mesmo.
O ruído que dá mote a esta curta-metragem é algo que a todos nos acompanha desde os primeiros instantes. Seja pelo choro, som da nossa voz ou o riso que ocasionalmente nos acompanha. No entanto o que acontece quando este é sobreposto pelo silêncio de pensamentos vagos e perdidos no tempo?
Ricardo Ibáñez Ruíz cria esta história cujo significado podemos atribuir a uma estreita relação que a passagem do tempo cria com o esquecimento de certos momentos - mesmo aqueles que são mais marcantes na vida de qualquer pessoa - sendo que são guardadas memórias das imagens mas não dos referidos sons que as acompanham e fazem "brilhar".
Ainda que com um claro objectivo sobre essa referida ligação passado e presente (sendo este situado no futuro), Ruído não permanece num domínio experimental que não desenvolve suficientemente o seu enredo deixando claramente toda a sua simbologia para uma interpretação unicamente delineada pelo espectador que resulta unicamente se este estabelecer uma ligação com essa mensagem situação assim num limbo entre aceitação e rejeição.
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3 / 10
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sábado, 10 de outubro de 2015

Deolinda Rodrigues

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1924 - 2015
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sexta-feira, 9 de outubro de 2015

Shortcutz Viseu - vencedor de Setembro

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O Shortcutz Viseu anunciou o vencedor do mês de Setembro sendo este a curta-metragem O Silêncio Entre Duas Canções, de Mónica Lima.
A curta-metragem que conta com as interpretações principais de Joana de Verona e de Miguel Nunes é assim a segunda vencedora mensal a competir pelo prémio de Melhor Curta-Metragem do Ano juntando-se a Deus Providenciará, de Luís Porto, a vencedora do mês de Agosto.
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quinta-feira, 8 de outubro de 2015

A Drop of Blood (2015)

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A Drop of Blood de Bekim Guri é uma curta-metragem de ficção kosovar que se insere num âmbito de drama social ao retratar o tema de uma violência doméstica vivida em silêncio.
A filha tem de proteger a honra da família. Esta honra passa pela sua pureza e pelo respeito das ordens familiares que a entregam a um homem escolhido pela família. Se este elo de respeito é quebrado... o marido pode pôr termo à vergonha a que foi sujeito... matando-a. É com esta premissa que se desenvolve toda uma história contada no silêncio de quatro paredes que abafam o que ali se passa do mundo exterior.
Nada pior para alguém do que viver no medo de que a sua liberdade esteja condicionada e, dentro daquela casa, percebemos que as três mulheres que nela habitam o sentem e vivem já de longa data. Se a mãe tenta remediar a situação com curas milagrosas que não funcionam a longo prazo num silêncio que se percebe poder vir a ser prejudicial para ela, não é menos verdade que as duas filhas - que eventualmente cresceram no mesmo ambiente - o sentem e pressentem para o seu futuro.
Tudo começa com a revolta de uma das filhas que pinta os lábios ao preparar-se para uma noite com o namorado. De casamento preparado pelo pai, ela sente que a sua vida é mais do que aquilo que lhe está programado e na rebeldia que a idade lhe confere, deseja decidir sobre a sua vida mesmo contra as regras que a "honra" lhe ditam.
Por perto está uma irmã mais velha que parece uma observadora silenciosa e psicologicamente distante e uma mãe que fala sobre a tradição, a honra e os valores impostos pelo chefe da casa. É neste contexto que as três mulheres falam e que as revelações revelam o que aquelas quatro paredes escondem... as feridas, os tormentos, a violência - física e psicológica - e as reais traições de que todas têm, no fundo, sido vítimas... sempre silenciosas.
Aquela casa que deveria ser o primeiro e mais importante espaço de segurança para estas mulheres revela-se como a sua prisão "segura", aquele espaço que todas sabem ser o único ao qual podem recorrer mas que, ao mesmo tempo, as condiciona na sua existência e no seu sofrimento. Quanto tudo o que têm é a amargura da vida, como podem elas confiar no que seja que pode aparecer pela sua frente?
A Drop of Blood é assim um retrato mordaz e desarmante sobre a traição maior, ou seja, aquela perpetrada no seio de um lar e da família que é o grupo primária de confiança de qualquer indivíduo. No final o espectador questiona-se sobre a sua própria formação, sobre a sua vida e como esta poderia ser completamente diferente se tivesse nascido na porta do lado, no país vizinho ou numa cultura assumidamente diferente da sua onde os valores e as tradições podem diferir drasticamente.
Bekim Guri, que já nos havia entregue a esmagadora curta-metragem Heshtje, chega agora com este seu novo trabalho onde, uma vez mais, desafia as noções de uma cultura - ou daquilo que dela resta - demonstrando que o recurso último da sobrevivência humana pode muito bem residir na morte do "outro" pelas mãos de um "eu" que já foi morto - psicologicamente pelo menos - primeiro. À semelhança daquilo que já havia documentado com Heshtje, Bekim Guri procura assim uma vez mais demonstrar que medo e liberdade andam curiosamente de mãos dadas e que só na isenção do primeiro se poderá verdadeiramente encontrar o segundo.
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8 / 10
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...Y Emplumaré Mis Alas (2015)

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...Y Emplumaré Mis Alas de Jafet Molina Martínez é uma curta-metragem de animação mexicana que une em breves oito minutos o sagrado e o profano numa curiosa e estranha ambiência.
Uma figura demoníaca curva-se e lamento pelo espaço sombrio em que se encontra... Mas um dia observa um anjo vindo dos céus e dele recolhe uma pena que cai. Poderá ele alguma vez ascender aos céus?
Num registo de animação que vive não só da sua excelentemente executada música que cria um ambiente fiel ao mais digno dos filmes de terror e suspense, ...Y Emplumaré Mis Alas cria uma curioso história que nos deixa na dúvida sobre quem será o verdadeiro receptáculo do mal.
Se não deixa de ser verdade que ...Y Emplumaré Mis Alas nos apresenta uma figura macabra e de forma assustadora, não é menos verdade que cedo percebemos ser um ser sofrido pelas amarguras do local em que se encontra desprovido de qualquer sinal de vida. É quando se curva perante a sua própria desgraça que o espectador percebe que este - outrora - anjo está agora caído em desgraça mantendo a estrutura das suas asas mas estando estas despojadas das penas que o poderiam fazer voar.
Abandonado à sua sorte, é quando uma luz vinda do céu que revela outro ser que poderia eventualmente ser da sua espécie, que ele ganha esperança - curiosa escolha de palavra se pensarmos no local sombrio em que se encontra - e que em clamor dá graças pela figura - feminina - que vislumbra.
É quando uma pena cai e que ele a agarra que os seus sonhos voltam a emergir ao pensar que poderá uma vez mais - deduzimos que seja esse o seu desejo - ascender aos céus de onde foi afastado por uma ou outra circunstância que nunca é revelada ao espectador.
É com o avolumar das penas que emanam luz que consegue finalmente voar mas como tudo o que não é natural... rapidamente se perde. Numa ascenção tão rápida quanto aquela feita por Ícaro - a quem o sol queimou as asas - também este demónio é afastado de um caminho para a glória do céu por lá chegar pela fraude de um conjunto de asas que não são as suas.
Se por um lado o espectador se questiona sobre quem é realmente mau - aquele que tem uma aparência mais disforme ou aquele que confere uma esperança para de seguida a retirar impiedosamente -, por outro fica também a questão sobre o porquê de se encontram naquele espaço desprovido de vida e de glória e o seu aspecto ser tão repelente e diferente daquele que emana luz e vida. A glória não estará ao alcance de todos mas será que aqueles que a têm devem exibi-la e usá-la em desprimor dos demais?
De realização, argumento, animação e música original a cargo de Jafet Molina Martínez, ...Y Emplumaré Mis Alas revela-se como uma curiosa animação que coloca em confronto o bem e o mal mantendo, no entanto, em suspenso sobre qual das duas personagens encarnam os diferentes polos... porque nem sempre o que é belo é bom... nem tão pouco o que aparenta ser hediondo é sinal da encarnação do mal... ou será?
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8 / 10
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¿Quién es Libertad Lionetti? (2014)

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¿Quién es Libertad Lionetti?, de J.K. Álvarez é uma curta-metragem de ficção espanhola que situa o espectador no futuro ano de 2051 onde perante uma sala de aula extremamente ordenada e multicultural, alguns alunos revelam desconhecer o passado do planeta.
Quem foi Libertad Lionetti (Arianna Fortes)? Quem foi Sandy West (Ángel de Miguel)? Como foi que, em 2016, se iniciou a Terceira Guerra Mundial, aquela que opôs ciência e religião?
De anónimo par romântico a casal protagonista da maior revolução mundial, o romance que existia entre Sandy e Libertad estaria longe de fazer imaginar a importância que ambos teriam no mundo como em 2051 o conhecem... Mas, quem são estas duas tão importantes personagens que definiram a emergência de um novo mundo?
O argumento também da autoria de J.K. Álvarez para lá de se inserir o espectador numa dinâmica futurista onde a sociedade é o resultado da recuperação de uma guerra que opôs todas as mais básicas convicções da Humanidade quer na fé que sentiam ter que nos conhecimentos científicos que lhes garantiam uma maior proximidade com a realidade de "então".
Depois da desgraça que assolou a vida de "Sandy" e de "Libertad", ele tornou-se num pária dessa mesma sociedade. Num vulto fantasmagórico que passou a vaguear pela terra sem qualquer objectivo, propósito ou amor próprio afastado do mundo e de tudo aquilo que o mesmo representava. No entanto aquilo com o qual o espectador é aqui confrontado é com a hipótese de poder existir algo mais para lá da morte... Poderá existir uma nova vida com referências novas a partir de um momento que no passado "imediato" foi negativo? Poderá existir memória desse passado? Ou, mais importante ainda, poderá existir um futuro? Será a morte a última barreira... a última etapa? Ou será que para lá dessa mesma barreira existe uma possibilidade de existir uma continuidade que garanta a todos uma segunda oportunidade?
É com base nesta premissa que se desenvolve a guerra de todas as guerras. Aquela que abala todas as convicções fundamentais e que faz o Homem regredir à sua base opondo religião e ciência... opondo factos a mitos e dividindo uma sociedade que já se fazia sentir abalada por toda uma constante descrença - não esquecer que tudo isto é relatado numa sala de aula no histórico dia 11 de Setembro. Num mundo em que a morte pode ser travada ou até regredida, o que acontece se "Libertad" fôr, afinal a primeira de muitas pessoas que volta a viver colocando em causa tudo aquilo que se conheceu até então? É no reino das segundas oportunidades, que então todos desejam, uns confirmam e outros negam que a desgraça atinge proporções mundiais.
Apesar de Arianna Fortes encarnar a personagem que dá título e mote a toda esta curta-metragem é, no entanto, Ángel de Miguel que a agarra desde o primeiro instante inicialmente como o jovem apaixonado e que descobre ter todo o resto da vida à sua frente, que se desgraça pela perda do amor da sua vida e que finalmente o recupera tornando-se numa inesperadamente referência de uma revolução de mentes e principalmente da Humanidade.
Ainda que uma curta-metragem bem estruturada tanto a nível de argumento como das interpretações e de elementos técnicos como a sua montagem e fotografia, ¿Quién es Libertad Lionetti? deixa aquela quase "necessidade" de conhecer mais detalhes sobre o desenrolar do conflito e aquilo que sucedeu até chegarmos ao momento inicial onde a sociedade aparenta ser uma vez mais tranquila e ordeira. Em suma, o potencial para que ¿Quién es Libertad Lionetti? se torne um filme não tão curto existe... e certamente o espectador agradecia.
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8 / 10
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White Lock (2015)

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White Lock de Mark Datuin - também argumentista - é uma curta-metragem de ficção canadiana que nos remete para um pequeno grupo de pessoas atormentados por uma tragédia e pelas consequências que daí surgem.
Drew (Brandon James Sim) perde a sua bolsa de estudos enquanto Dulce (Savannah Basley) tem a hipótese de continuar os seus. No entanto, enquanto tenta manter a relação com Keemo (Andre Guantanamo) que está envolvido num problema judicial.
Valerio (David Emanuel) escuta até à saturação os comentários de uma outrora atencionsa Sharon (Annie Fairfoul) que agora parece desesperada por atenção, enquanto ele próprio olha para um casal que parecia irradiar o significado daquilo que é o amor.
As vidas de todos eles estão interligadas através de um trágico acontecimento do qual se tornam apenas uma breve e instantânea memória... conseguirá algum deles sobreviver?
Num argumento que cruza e interliga um conjunto de histórias sobre a perda e o desamor, Mark Datuin reflecte sobre a momentânea felicidade de uns pode estar directamente relacionada com a tristeza de outros numa sociedade que parece não perdoar as falhas alheias e que as penaliza sem olhar a rostos e a casos mas sim às ditaduras dos números e do desumanismo. Enquanto esta é a premissa principal de White Lock, não deixa de ser verdade que ao mesmo tempo centra a sua atenção sobre um conjunto de personagens que de imediato parecem - aos olhos do espectador - como sendo disfuncionais a viver num universo paralelo difícil de compreender e onde os seus problemas os vão consumindo de forma lenta e desgastante. É apenas quando o espectador percebe a real dimensão da ligação entre "Valerio" - por um lado - e "Keemo", "Drew" e "Sharon" - por outro - que se entende como as vidas destas quatro personagens estão interligadas de forma absoluta.
A tragédia pode criar elos e ligações difíceis de compreender ou até mesmo aceitar, mas não deixa de ser verdade que uma vez criados jamais poderão ser quebrados modificando radicalmente as vidas daqueles que por ela são afectados. De sonhos de sucesso e aplausos, aos da manutenção de um grande amor sem esquecer aqueles desejos de uma carreira académica de excelência para a qual tanto se lutou, apenas algo grave demais poderia impedir qualquer um de os concretizar. E uma vez não conseguida essa concretização, a alma vive num limbo ou num purgatório convencida de que os irá ter mas sem ter modo de lutar pelos mesmos como se de uma pena sem fim se tratasse.
Ainda que o argumento de Mark Datuin introduza ao espectador um elevado número de personagens que exigem a sua máxima atenção para entender desde o início a sua real ligação, não é menos verdade que é no final que todas as dúvidas se dissipam e o espectador compreende todos os pequenos enredos e elos que se criam. Enredo esse que é apimentado por uma direcção de fotografia de Matvey Stavitsky que os coloca a todos - personagens e espectador - num plano mais etéreo e transcendente.
Simpática e com um conjunto de personagens que oscilam entre o "fora deste mundo" e aqueles que nele têm os pés bem assentes, White Lock tece uma reflexão sobre as escolhas que fazemos, as oportunidades que temos e as barreiras que pelo caminho são colocadas.
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7 / 10
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O Tesouro (2013)

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O Tesouro de Gonçalo Silva e Marcantónio del Carlo é uma curta-metragem de ficção portuguesa baseada no conto homónimo de Eça de Queirós no qual três irmãos Bal (Nuno Melo), Rui (Nuno Pardal) e Guilhas (Diogo Lopes) - em fuga de uma perseguição - encontram um tesouro perdido que imediatamente reclamam.
Em O Tesouro adaptado aos tempos modernos, os três irmãos refugiam-se numa vinha onde encontram o capataz Óscar (Joaquim Nicolau) que lhes oferece trabalho para Luís (José Martins), pai da excêntrica Dina (Sara Barros Leitão). Mas, quando a sede de riqueza ultrapassa os limites conseguindo a ganância tomar controlo da mente humana... poderão os três irmãos escapar do infortúnio que os espera?
Livremente adaptado de Eça de Queirós, O Tesouro centra a sua atenção no interior norte do país onde no meio da apanha da uva e do bailarico da aldeia se encontra mais básica condição humana que com uma aparente fortuna em mãos esquece toda a solidariedade pela qual tenha eventualmente pregado. Aqui, longe desta pregação, estes três irmãos já de si potenciais degenerados da sociedade entregam-se aos mais vis dos sentimentos querendo sempre um pouco mais para juntar ao muito que já têm.
Mas aquilo que o argumento de Marcantónio del Carlo, Gonçalo Silva e Tito Olías pressupõe é que no seio de um ambiente manifestamente hostil como aquele ao qual vão parar... serão estes três irmãos "amantes" da transgressão à lei os piores imorais? Pelo seio da sua imoralidade e falta de valores, o espectador é ao mesmo tempo confrontado com alguns ditos correntes destes anos que vivemos onde a falta de trabalho é igualada ao desinteresse por trabalhar e onde todos têm de ser sujeitos - ou sujeitarem-se - a tudo para poder sobreviver. Assim, se de um lado sabemos e percebemos que temos três irmãos que vivem de esquema em esquema e que não se trata de mera sobrevivência mas sim de ganância absoluta - e que o comprovem os seus actos após descobrirem o tesouro -, não é menos verdade que aqueles que inicialmente os acolhem também não primam pela excelência e benevolência dos seus actos. É desta forma que no final o espectador fica com a verdadeira questão... quem é - se é que alguém - realmente bom?
Com uma direcção musical interessante que recupera o popular português pelas mãos de André do Áudio e uma direcção de fotografia que recolhe as melhores cores e entardeceres do Douro, O Tesouro é assim a primeira de duas recentes adaptações do conto popular de Eça de Queirós que reflecte sobretudo sobre a essência do Homem... esquecendo ou ultrapassando qualquer tipo de laços, uniões ou empatias...
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7 / 10
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