terça-feira, 11 de agosto de 2015

O Pátio das Cantigas (2015)

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O Pátio das Cantigas de Leonel Vieira é uma longa-metragem portuguesa e o primeiro de três remakes de clássicos portugueses da já ida década de 40 do século passado, ao qual se seguirão O Leão da Estrela em 2015 e A Canção de Lisboa em 2016.
Num bairro típico de Lisboa onde todos se conhecem e convivem no seio das suas tristezas e alegrias, os sonhos de alguns dos seus habitantes confundem-se com os de todos os demais. No seio de toda a trama temos Evaristo (Miguel Guilherme), dono de uma mercearia gournet perdido de amores por Rosa (Dânia Neto) que está, por sua vez, mal de amores com Narciso (César Mourão). À sua volta, todo um conjunto de enredos que demonstra que este bairro típico, mas muito alternativo, da capital vive muito para lá do que as festividades dos santos populares podem proporcionar.
Pedro Varela adapta o argumento original de 1942 da autoria de Vasco Santana, António Lopes Ribeiro e Francisco Ribeiro e recria sim as vivências de um então bairro popular de Lisboa transformando-o naquilo que se equaciona - em alguma medida - ao século XXI do mesmo. Já não temos mercearia típica mas sim gourmet nem tão pouco uma certa ingenuidade de então que é agora reencarnada com o cinismo e alguma hipocrisia destes novos tempos em personagens tipo sedentas de poder, fama e dinheiro... e onde vale tudo. Se no original de '42 o espectador assistia ao desenrolar das relações permitidas na época onde o amor e a afectividade tinham de ser às claras para que todos testemunhassem as boas intenções alheias - fruto do regime então vivido - neste O Pátio das Cantigas de 2015, a sexualidade é não vivida no calor e na intensidade da noite como também se espelham as realidades - então - escondidas, onde nem a saudosa "Maria da Graça" (Oceana Basílio) vinda do Brasil para o seu bairro Lisboeta deixa de denotar a sua homossexualidade em pela representação Shakespeariana.
Que a sexualidade existe e que faz parte do dia-a-dia todos nós sabemos mas, no entanto, o espectador é obrigado a questionar-se sobre os seus propósitos narrativos quando na prática apenas parece existir para atrair um mais vasto público... Propósito este falhado quando não só se encontra descontextualizado e despropositado como já o vimos melhor enquadrado e com lógica - se é que o sexo o deve ter - em milhentos outros filmes. Dito isto... "não havia necessidade"...
Com alguns elementos típicos nomeadamente no que diz respeito à celebração das festas populares de Lisboa ou até mesmo uma certa tentativa de recriar o espírito de bairro - na vizinhança, na decoração dos apartamentos e ainda no convívio entre moradores -, não é menos verdade que O Pátio das Cantigas peca por uma extensa dispersão de personagens bem como por um total e completa ausência de uma estrutura narrativa que consiga credibilizar a maioria das mesmas. Se esta obra tinha como objectivo o tal conceito de remake daquela dos anos 40, não é menos verdade que apenas consegue transportar essa vivência de bairro para o século XXI esquecendo a essência das personagens originais, ou seja, não existe tanto uma transposição das mesmas mas sim a sua recriação para se enquadrarem na realidade do presente. Dito isto, o espectador mais atento questiona-se se existia necessidade de criar enredos alternativos cujo único propósito é credibilizar estas personagens que, na prática, são nulas e sem qualquer importância para o filme apenas dando "vida" a referida vizinhança mas atropelando-se com uma total desconexão de histórias, momentos ou qualquer sentido. É certo que Lisboa ganha o dono do hostel que também é carteiro (Manuel Marques), a sua cozinheira que também é vendedora de sapatos (Dânia Neto), as oportunistas do bairro que nunca irão chegar a lado algum (Sara Matos e Bruna Quintas) e até o bombeiro desatento e a divorciada sem estima (Rui Unas e Anabela Moreira) mas, ainda assim, precisaria esta história de tantas personagens que se anulam e atropelam em momentos inconsequentes que não só não conseguem ser desenvolvidos como para lá disso conseguem ser por momentos absurdas?!
Aqueles que deveriam ser protagonistas o "Narciso" de César Mourão e o "Evaristo" de Miguel Guilherme, perdem-se nesta história graças a essa avalanche de personagens. Mourão constrói uma pobre e muito barata imitação de Vasco Santana, e nem o eterno momento homem versus candeeiro consegue ter qualquer "carisma" ou marca para o futuro, e o "Evaristo" de Miguel Guilherme que na altura de António Silva era uma personagem tipo não só da época como do cinema declamatório português é aqui uma caricatura - igualmente pobre - de alguém com um sério problema na sua fala que mais parece ser alguém com prisão de ventre e que tenta descontroladamente controlar-se. Miguel Guilherme que sai de 2015 com uma intensa e seguríssima interpretação secundária em Capitão Falcão aparece aqui com um registo que oscila entre o absurdo/cómico e o irrelevante.
O que se salva de O Pátio das Cantigas versão 2015?! Pouco... Francamente muito pouco. Para lá de um registo secundário interessante e bem composto a cargo de Rui Unas - o bombeiro "Carlos" tem a sua graça - e de um sentido cheiro a século XXI - um condutor de tuk tuk como meio e método de vida e a presença dos actuais hostel com os seus sempre presentes turistas espanhóis (quase mudos) - há ainda a vontade de mostrar Lisboa como a tal cidade multicultural deste século... Portugueses, brasileiros, espanhóis e indianos, todos co-habitam nesta Lisboa moderna num filme que até se dá ao luxo de terminar com um momento musical à Bollywood que, ainda que "enfiado" neste argumento não deixa de estar bem executado e ser um dos momentos mais simpáticos do filme que se quisesse realmente ter primado pela originalidade teria começado por aqui e não por uma recriação barata de um clássico do cinema português.
Que é, esteja ou venha a ser o "maior sucesso do ano no cinema português"... não tenho a menor das dúvidas... mas está longe - muito longe - de se distanciar daquela corrente cinematográfica onde se inserem títulos como 7 Pecados Rurais, Sei Lá, Eclipse em Portugal ou Ruas Rivais... muito público... mas muito pouca parra... e menos ainda conteúdo...
Se existia expectativa quanto a este título, a sua confirmação veio apenas permitir a extrapolação sobre o que aí vem no final do ano com O Leão da Estrela e depois em 2016 com A Canção de Lisboa... que é como quem diz... medo... muito medo.
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