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Cada Um o Seu Cinema é um filme colectivo elaborado por um vasto conjunto de realizadores que tiveram, e têm tid, o seu próprio espaço e destaque no Festival Internacional de Cinema de Cannes e que aqui colaboraram para a realização de vários segmentos que, no seu ponto de vista, celebram aquilo que os une... o cinema no seu 60º aniversário.
Trois Minutes, de Théo Angelopoulos, Recrudescence, de Olivier Assayas, , The Last Dating Show, de Bille August, The Lady Bug, de Jane Campion, 47 Ans Après, de Youssef Chahine, Zhanxiou Village, de Chen Kaige, No Translation Needed, de Michael Cimino, World Cinema, Joel Coen e Ethan Coen, At the Suicide of the Last Jew in the World in the Last Cinema in the World, de David Cronenberg, Dans l'Obscurité, de Jean-Pierre Dardenne e Luc Dardenne, Rencontre Unique, de Manoel de Oliveira, Cinéma d'Eté, de Raymond Depardon, Artaud Double Bill, de Atom Egoyan, Le Dibbouk de Haifa, de Amos Gitai, Anna, de Alejandro González Iñárritu, The Electric Princess House, de Hou Hsiao-hsien, La Fonderie, de Aki Kaurismäki, Where is my Romeo?, de Abbas Kiarostami, One Fine Day, de Takeshi Kitano, Dans le Noir, de Andrei Konchalovsky, Cinéma de Boulevard, de Claude Lelouch, Happy Ending, de Ken Loach, Absurda, de David Lynch, Diaro di uno Spettatore, de Nanni Moretti, Cinéma Erotique, de Roman Polanski, Le Don, de Raoul Ruiz, A 8 944 km de Cannes, de Walter Salles, Irtebak, de Elia Suleiman, It's a Dream, de Tsai Ming-liang, First Kiss, de Gus Van Sant, Occupations, de Lars Von Trier, War in Peace, de Wim Wenders, I Travelled 9000 km To Give It To You, de Wong Kar Wai e En Regardant le Film, de Yimou Zhang são os segmentos que dão vida a esta obra, e que compõem à sua própria maneira a visão destes realizadores sobre a arte da qual todos fazem parte.
Sem uma aparente relação entre si, com a devida excepção anteriormente referida sobre a celebração da Sétima Arte, estes diversos segmentos destacam-se pela própria expressividade da filmografia de cada um dos referidos realizadores e, alguns deles, destacam-se também por uma invulgar sensibilidade que os faz sobressair de um lote tão extenso e reputado como este que foi aqui apresentado.
Dito isto, vou permitir-me enunciar alguns dos que achei mais bem conseguidos pela emoção que conseguem transmitir sobre a essência daquilo que os próprios celebram. Anna, de Alejandro González Iñárritu que nos conta a história de uma jovem (Luisa Williams) que se encontra a assistir a um filme que a deixa perfeitamente emocionada com o que aparentemente vê no grande ecrã... até ao momento em que percebemos que ela é cega e é um amigo que lhe relata o que decorre no mesmo. Sem aguentar a força e o impacto dos momentos que lhe são relatados "Anna" sai da sala de cinema onde se desfaz num pranto. Dando continuidade a esta linha emotiva já apresentada nas suas anteriores obra, Iñárritu consegue uma vez mais comunicar com o espectador e transmitir uma mensagem poderosa com a qual facilmente nos poderemos identificar ao mesmo tempo que homenageia o poder do cinema e as marcas que este nos conseguem deixar mesmo que, como este caso concreto, não se o consiga literalmente ver, num ambiente enaltecido pela brilhante fotogradia de Emmanuel Lubezki.
Um fundo idêntico tem o segmento Zhanxiou Village de Chen Kaige, onde acompanhamos um grupo de crianças que consegue encontrar uma forma de poder ver um dos génios cinematográficos de todos os tempos como Charlie Chaplin sendo que, quando descobertos, um deles não foge revelando ser também ele cego mas fortemente influenciado pelo poder das imagens que não consegue observar.
Rencontre Unique, o segmento filmado por Manoel de Oliveira que recria o encontro entre o Papa João XXIII e o Presidente Soviético Krustchev, o qual é captado muito teatralmente pelas câmaras que se encontravam presente no local. Talvez um dos segmentos que aparentemente mais "foge" à homensagem ao cinema mas que, no entanto, comprova ser um dos seus mais fortes testemunhos.
Finalmente dois dos momentos mais bem conseguidos na vertente cómica são, em primeiro lugar, Cinéma Erotique de Roman Polanski, onde nem tudo o que parece se vem a confirmar. Somos colocados dentro de uma sala de cinema onde passam imagens do filme Emmanuelle que é assistido por um casal e por um estranho homem que na parte de trás da sala não pára de gemer. Enquanto todo o seu comportamento aparenta uma coisa, rapidamente descobrimos que a realidade é bem mais problemática do que aquela que somos induzidos a pensar. Finalmente temos o segmento Occupations de Lars Von Trier onde voltamos a uma sala de cinema cheia de pessoas, e onde um dos ocupantes decide começar a falar da sua vida ao seu "vizinho", interpretado pelo próprio Von Trier, que facilmente se farta daquela incómoda presença decidindo então fazer justiça pelas suas próprias mãos... literalmente.
Todos os segmentos são interessantes e oportunas mensagens de amor à Sétima Arte. Cada um delas com a sua devida importância e destaque, cuja acção se desenrola nos mais diversos locais tendo sempre como pano de fundo uma qualquer sala de cinema mais ou menos perdida no tempo e no espaço mas onde diariamente se faz magia capaz de transportar os seus espectadores para os mais distintos e diversos locais do mundo (ou fora dele), demonstrando assim a importância que ele tem nos mais diversos locais, como podemos constatar por exemplo através do segmento War in Peace de Wim Wenders que transmite uma mensagem anti-guerra num conflito que foi marcado por uma durante décadas.
Cada Um o Seu Cinema é um filme, ou conglomerado de curtas-metragens, diferente mas que estranhamente e com a quantidade diversificada de estilos e histórias consegue aos poucos cativar a nossa atenção e tornar-nos dependentes da ideia sobre o que virá a seguir. Alguns de nós poderão sentir-se perdidos com o que vão ver, mas muitos outros irão certamente ficar fascinados com o poder que as imagens e alguns dos segmentos conseguem transmitir não só pela sua história como pela capacidade emotiva que algumas das imagens possuem.
Se à partida poderia considerar-me "alérgico" ao formato, não é menos verdadeiro dizer que no final fiquei rendido ao resultado que daqui adveio e do qual me tornei fã. Um filme diferente, é certo, mas é exactamente por esta possibilidade da diferença que o cinema (sobre)vive, e ao fim de tantos anos continua a conquistar-nos sem qualquer reserva.
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8 / 10
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