Primavera, Verão, Outono, Inverno... e Primavera de Kim Ki-duk é uma longa-metragem de co-produção sul-coreana-germânica que levam o espectador a uma viagem ao interior de uma floresta na Coreia onde um mestre Budista educa moralmente uma jovem criança para que esta cresça com um sentido de compaixão superior ao da sociedade que "lá fora" se propaga com valores duvidosos para com a sua consciência.
Sem exposição para com o exterior, é já em adolescente que tem o primeiro contacto com outras pessoas e com uma jovem que permanece no mesmo templo flutuante em que ele se encontra e com ela, desenvolve os seus primeiros e únicos contactos sexuais que poderão colocar em risco todos os valores morais que até então lhe foram conferidos. Poderá e conseguirá ele resistir às provocações vindas do exterior mantendo a sua consciência contemplativa acima de uma sociedade que não conhece?
Dividido em cinco segmentos respeitando, cada um deles, um processo ou etapa no desenvolvimento humano e social de um indivíduo, o argumento da autoria do próprio realizador - e também actor desta longa-metragem - inicia o seu percurso com a Primavera de um jovem que, dividido na sua condição de aprendiz e criança, recebe os ensinamentos de um mestre dedicado ao mesmo tempo que os transgride dando corpo à irracionalidade de uma criança que experimenta e tenta viver pequenas descobertas de uma vida ainda não definida. Da segunda etapa, ou o Verão que finalmente chega, o espectador acompanha o despertar de um jovem adolescente para uma sexualidade até então apenas observada nas serpentes existentes na floresta vizinha do tempo flutuante em que vive, e que experimenta com uma jovem - a única que conhece - que com ele irá partilhar a mesma habitação.
Do Verão ao Outono no qual este jovem regressa ao templo que abandonara para perseguir o amor da sua vida numa sociedade desumana para a qual não estaria preparado. Da sociedade à marginalização da sua consciência e sentimentos adulterados para uma radicalização dos mesmos dando lugar ao lado "humano" que o seu mestre tanto pretendia moldar e a uma forçada detenção que chega depois de um crime hediondo, rapidamente Bom Yeoreum Gaeul Gyeoul Geurigo Bom dá lugar à sua última etapa - ou estação - que com o Inverno vê este agora homem chegar e transformar-se num adulto que se quer redimir com o passado e formação que abandonara. A Primavera, tal como todos os ciclos, chega finalmente transformando-o agora no mestre que em tempos também ele tivera.
Tal como todos os ciclos e, no fundo, como o próprio ano, Bom Yeoreum Gaeul Gyeoul Geurigo Bom dá corpo a uma tradição cíclica que o espectador presencia não só como o passar dos trezentos e sessenta e cinco (ou seis) dias físicos mas principalmente a transformação do Homem enquanto tal, ou seja, o seu crescimento não só físico como intelectual e emocional de criança ao homem que se transforma como resultado das experiências vividas e experimentadas. De criança em plena aprendizagem que não distingue o Bem do Mal que o rodeia - e principalmente daquele que o próprio pode provocar e proporcionar - ao adolescente que experimenta a (sua) sexualidade pela primeira vez terminando no homem que violentamente o consumou e por ele pagou enquanto um crime na sociedade em que, mais tarde, tentou viver.
Mas Bom Yeoreum Gaeul Gyeoul Geurigo Bom é também um olhar aos elementos naturais que circundam e que espreitam o jovem monge sempre de muito perto. Da floresta que o abraça em todo o seu redor protegendo-o das ameaças que uma sociedade do outro lado está pronta para lhe impingir sem esquecer os pequenos elementos judaico-cristãos (num filme budista) que denotam o despertar da já referida sexualidade personificada pela presença constante de serpentes que copulam e (o) tentam a um prazer desconhecido e encarnado pela jovem que, já na sua adolescência, partilha a mesma casa e o mesmo espaço que ele. Elemento feminino este que, aliás, apenas surge com esta jovem (e breves momentos com a sua mãe), e dele está vedado nunca cruzando os olhares do espectador de forma tão explícita como aqui. Refira-se que a única outra vez em que surge uma mulher neste filme é quando o então já adulto monge volta ao templo flutuante para o próprio assumir funções de mentor de outra criança ali deixada por uma mãe não identificada e que por força dos elementos naturais também definha no mesmo lago congelado.
Elementar, contemplativo e uma pura reflexão sobre a moral, o sacrifício, a tentação e da forma como todos influenciam o crescimento e a formação de uma criança escudada da constante interacção das mesmas, Bom Yeoreum Gaeul Gyeoul Geurigo Bom é um filme que demora a criar uma empatia com o espectador não habituado ao referido estilo de cinematografia, à demora evolução dos acontecimentos que, no entanto, se anunciam trágicos desde o primeiro instante e, sobretudo, pela forma como os avisos sobre os perigos que o rodeiam não surgirem da forma mais evidente. De pequenos apontamentos moralistas e filosóficos inerentes ao desfolhar de uma estação mais primaveril às duras consequências invernais de punição e sofrimento, Bom Yeoreum Gaeul Gyeoul Geurigo Bom relata um ano, tal como uma vida, nas suas vertentes de ganho e sobretudo naquelas em que o Homem, tal como a vida, pagam pelos devaneios não planeados mas que suscitam duras consequências àqueles que os atravessam.
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