sábado, 14 de setembro de 2019

Canção de Embalar (2019)

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Canção de Embalar de João Pedro Frazão (Portugal) é uma das dez curtas-metragens portuguesas nomeadas ao Prémio MOTELx nesta décima-terceira edição do festival que amanhã termina no Cinema São Jorge, em Lisboa.
Madalena (Beatriz Frazão) é odiada pela madrasta (Ana Mafalda). Madalena sempre sentiu a culpa do incêndio que matou o pai e que a madrasta não a deixa esquecer. Poderá ela continuar a resistir a uma vida onde a culpa a dominou?!
Visualmente rica e capaz de recriar tanto graças aos seus interiores como exteriores não só a atmosfera de um filme de terror como também um que centra a sua acção numa época passada, Canção de Embalar replica o esperado ambiente de um filme de terror tradicional... um acto de amor, o ciúme e a traição, um ambiente agreste e gótico onde as energias e os sentimentos desenvolvem um demónio interior que apenas espera o momento indicado para dar corpo às suas manifestações.
Uma vez confirmado este ambiente, que poderia ser romântico em boa parte graças ao espaço em que é filmado é em Sintra mas que mais se assume como medieval e gótico, Canção de Embalar reside essencialmente nas duas interpretações protagonistas a cargo de Beatriz Frazão e Ana Mafalda. Se da jovem Frazão predomina a linguagem corporal que a apresentam como uma jovem vítima dos caprichos de uma mulher mais velha a quem serve, já Ana Mafalda apresenta-se como aquela que é mais física e psicologicamente violenta fazendo do espaço e da jovem enteada aquilo que o seu sentimento de traição matrimonial a impele.
Ainda que praticamente centrada em pequenos espaços não aproveitando muito do potencial e um todo que havia sido inicialmente apresentado - a Serra de Sintra e as suas sombrias propriedades para muito poderiam contribuir -, esta curta-metragem é assim dominada pela carga emotiva apresentada pelas duas actrizes e por uma enigmática direcção de fotografia que fecha todo o ambiente numa claustrofobia quase angustiante e que não permite o espectador experimentar ou "viver" todos os pequenos recantos que são assim revelados pelo realizador. Sabemos que os espaços estão lá mas apenas a sensação da sua presença permite imaginar o que estará para "lá" daquilo que a câmara mostra.
Beatriz Frazão, inicialmente terna e uma assumida vítima nas garras de um mal maior, releva-se lentamente a um espectador curioso sobre o seu destino, uma vez que o passado acaba por ser revelado pela própria condição em que se encontra, enquanto que Ana Mafalda é a esperada vilã de um todo o mal poderá surgir a qualquer instante. No entanto, a grande surpresa desta curta-metragem reside no facto de que nem todas as vilãs o serão para sempre ou todas as vítimas tão inocentes como inicialmente se apresentam.
Curiosa pela sua dinâmica de filme gótico num claro e positivo apontamento do realizador que consegue transmitir ao espectador essa atmosfera em tão pouco tempo de duração, Canção de Embalar não consegue, no entanto, transformar-se naquele filme memorável (ou referência) do género capaz de abrir portas para uma maior exploração do mesmo ou até apresentar uma "madrasta" intensa mas mais sombria que a interpretação de Ana Mafalda pedia... sabemos que todo o potencial está lá... mas é pouco tempo para todo o seu esperado esplendor.
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5 / 10
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