sábado, 30 de setembro de 2017

Festival Internacional de Cinema de San Sebastián 2017: os vencedores

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Terminou hoje a mais recente edição do Festival Internacional de Cinema de San Sebastián que premiou a mais recente obra de James Franco, The Disaster Artist com o seu troféu máximo. São os vencedores:
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Selecção Oficial
Concha de Oro: The Disaster Artist, de James Franco (EUA)
Prémio Especial do Júri: Handia, de Aitor Arregi e Jon Garaño (Espanha)
Menção Especial: So Help Me God, de Jean Libon e Yves Hinant (França/Bélgica)
Realização: Anahí Berneri, Alanis (Argentina)
Actor: Bogdan Dumitrache, Pororoca (Roménia)
Actriz: Sofía Gala, Alanis (Argentina)
Argumento: Diego Lerman e María Meira, Una Especia de Família (Argentina)
Fotografia: Florian Ballhäus, Der Hauptmann (Alemanha/Polónia/Portugal/França)
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Nuevos Directores
Filme: Le Semeur, de Marine Francen (França)
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Zabaltegi-Tabakalera
Filme: Braguino, de Clément Cogitore (França)
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Horizontes Latinos
Filme: Los Perros, de Marcela Said (Chile)
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Prémios Paralelos
FIPRESCI: Life and Nothing More, de Antonio Méndez.Esparza (Espanha)
SIGNIS: Life and Nothing More, de Antonio Méndez-Esparza (Espanha)
Prémio do Público: Three Billboards Outside Ebbing, Missouri, de Martin McDonagh (Reino Unido/EUA)
Prémio do Público - Filme Europeu: Jusqu'à la Garde, de Xavier Legrand (França)
Prémio Cine en Construcción: Ferrugem, de Aly Muritiba (Brasil)
Prémio da Juventude: Matar a Jesús, de Laura Mora (Colômbia)
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Villaviciosa de al Lado (2016)

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Villaviciosa de al Lado de Nacho G. Velilla é uma longa-metragem espanhola de comédia que conta a história da pequena comunidade de Villaviciosa famosa pelas suas termas que atraíam um elevado número de turistas até ao dia em que um é acidentalmente morto nas mesmas.
Com o encerramento das termas e iminente falência da comunidade, tudo ganha um novo contorno quando Mari (Carmen Machi) a dona do bordel local, ganha o El Gordo.
O realizador em colaboração com Oriol Capel, David S. Olivas e Antonio Sánchez recuperam a tradicional comédia espanhola naquela que é uma ligeira e bem disposta longa-metragem que, sem pretensões a mais, se assume como um simpático momento de descontracção cinematográfica. Num ritmo que faz adivinhar que tudo está prestes a ruir, Villaviciosa de al Lado começa por apresentar aquela que aparenta ser a tranquila e pacífica vida de uma vila interior, até ao momento em que o espectador conhece todos os não tão velhos ressentimentos que povoam as mentes daqueles que nela vivem. Numa comunidade que se crê sacro-santa e onde todos os valores e bons costumes são respeitados, aquilo que emerge é que, no final, todos se respeitam apenas por questões de aparência e não pela crença de que ali... todos são iguais. Nem o padre é moralista, nem todos os casamentos são fiéis ou tão pouco as prostitutas lá da vila são, afinal, bichos imorais e destruidoras de casamentos. Como diz a "Mari" de Machi a seu tempo... "un pueblo no muere de viejo... muere de enfermo".
Os momentos mais interessantes de uma história que é banal, regular e em boa medida esperada pois afinal, vive de um elevado conjunto de lugares comuns, acabam por ser aqueles que se constituem como as maiores concentrações de humor - aquilo que em doses bem contadas -, nomeadamente aqueles (breves) em que o espectador é levado até ao interior da "casa de meninas" - brilhante o segmento de introdução à sexologia - e também às inúmeras desventuras de um conjunto de habitantes que se deixam levar pela agonia de uma sobrevivência que parece ter os seus dias contados.
No entanto, se é real que Villaviciosa de al Lado consegue revelar o lado mais humano de todas estas improváveis personagens, este "real" não vem apenas acompanhado dos seus momentos mais fraternos e altruístas mas também de uma certa cumplicidade com os prazeres mais íntimos da auto-promoção. Afinal, quantos deles esperam realmente o bem da sua pequena comunidade e não um certo enriquecimento que os consiga promover e manter no status que detêm distinguindo-se, dessa forma, de todos os demais que pouco têm e sobre quem eles acham que devem continuar sem ter?! "Mari", uma mulher marcada pela tragédia e acometida pela tragédia mas condenada à opinião alheia, tem agora a sua oportunidade de se distanciar daqueles que lhe apontaram o dedo e fazer justiça numa comunidade que lhe virou as costas mas que, na sombra e no silêncio, continuou a viver com a sua presença e alguns até com os favores e serviços que o seu "negócio" prestava.
Típico retrato de uma qualquer pequena comunidade onde as aparências valem tudo, onde o dinheiro consegue falar mais alto e os desfavorecidos continuam sempre a ser a base de uma pirâmide social que descrimina, Villaviciosa de al Lado destaca-se por simpáticas e interessantes interpretações que espelham os diversos estratos e "postos" de uma vila isolada na sua própria imagem destacando uma imparável María Cruickshank como "Jezabel", uma das prostituas de "Mari" capaz de levar à loucura o mais tímido dos homens.
Com uma certa positividade inerente a todo o seu conteúdo, do argumento às personagens, Villaviciosa de al Lado tenta ser inocentemente moralista - não existe de todo a vontade de pregar moral mas sim revelar que todos podem ser bons e maus dependendo das condições das suas vidas passadas e presentes -, o espectador tem aqui uma história divertida, bem conduzida dentro do género e personagens capazes de realizar o seu próprio filme onde seriam, certamente, estrelas de Hollywood.
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"Mari: Dime algo muy muy sucio!
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Sole: Caca! Caca! Caca!"
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4 / 10
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sexta-feira, 29 de setembro de 2017

La Reina de España (2016)

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A Rainha de Espanha de Fernando Trueba é uma longa-metragem espanhola que foi uma das mais nomeadas à última edição dos Goya da Academia Espanhola de Cinema e a sequela de La Niña de Tus Ojos (1998), um dos filmes mais premiados do respectivo ano que agora se encontra prestes a estrear no país.
Quase vinte anos depois de La Niña de Tus Ojos, encontramos Macarena Granada (Penélope Cruz) como uma estrela de Hollywood. De regresso à sua Espanha natal para as filmagens de uma longa-metragem sobre Isabel, a Católica, Macarena reencontra todo o elenco do seu anterior filme espanhol bem como enfrenta o regresso de Blas Fontiveros (Antonio Resines), o seu realizador e antigo amante.
Numa Espanha agora dominada pelo regime franquista, onde os sonhos foram destruídos e a esperança adiada, conseguirá este grupo de profissionais de cinema resistir aos ventos de mais uma ditadura?
Se com La Niña de Tus Ojos (1998) encontramos uma companhia de actores e profissionais de cinema embebidos num espírito de esperança revolucionária capaz de fazer mover montanhas - ainda que para o espectador esta realidade estava longe de concretizar-se pelo seu conhecimento da História do país - e, no fundo, sendo esta esperança o directo resultado da magia possível de ser executada com a concretização do seu filme, a realidade é que o contexto do qual saem da Espanha de então é tão amistosa como aquela que vão encontrar na Alemanha nazi onde a brutalidade e a repressão representavam o ideal de uma nova ordem que iria dominar os destinos dos dois países - e da Europa - durante muitos anos, com La Reina de España a realidade agora confirmada do país contrasta com o resto do mundo. Encontramos uma Espanha desmotivada e enclausurada na ditadura e um mundo "lá fora" onde a esperança volta a fazer parte do sonho (possível) daqueles que o conhecem.
Os dois filmes distanciam-se assim do contexto social em que foram "feitos". Da Europa dos anos 30 onde tudo se vislumbrava negro e repressor onde o tal sonhos deixava de existir de La Niña de Tus Ojos à realidade ainda triste de uma Espanha enclausurada de La Reina de España. Os dois distanciam-se portanto to contexto em que o mundo se encontra mas aproximam-se pela realidade sentida de uma Espanha que estava perdida agora com a confirmação de uma ditadura que mata o sonho, que mata a imaginação e ainda que permite o (cinema) social como tema de uma comédia manobrada e trabalhada para agradar. O mundo "lá fora" mudou... mas mantém-se a mesma opressão para aqueles que agora têm de viver com ela sem hipótese de conhecer esse mesmo mundo.
Em La Reina de España encontramos as mesmas personagens. Agora figuras forçadas de um regime hóstil para o qual a imagem é tudo o que conta, controlados pela arbitrariedade de uma censura operante e permissivos à mensagem subliminar que tentavam passar, ambos (con)vivem com o tal sonho perdido na sua memória. Mais velhos, com menos expectativas e com realidades próximas que tentam esconder com a cumplicidade que os caracteriza, Trueba cria um conjunto de perfeitas personagens exemplares do regime de então. Vidas perfeitas - e previsivelmente privilegiadas - que, no entanto, ocultam as suas preferências políticas, ideológicas e sexuais, todas elas consideradas inimigas de um Estado castrador e controlador. Se com La Niña de Tus Ojos existia o sonho de criar pelo cinema, em La Reina de España existe a necessidade de criar - dentro dos parâmetros permitidos - como forma de subsistir num mundo onde apenas sabem fazer o que conhecem.
Se em 1998 Trueba conseguiu impôr um pouco dessa magia do cinema muito graças aos desejos deste grupo de profissionais e amigos que imaginavam que criavam um mundo melhor que os distanciava das amarguras de uma Guerra Civil, conferindo-lhes humor, dramatismo, paixão e ilusão, em La Reina de España temos sim a confirmação de "Macarena" (Cruz) como uma actriz dentro do star system de Hollywood que, no entanto, vive o desgosto de um pai perdido nas garras franquistas e uma Espanha distante e ausente do seu destino... no fundo, uma filha que não consegue encontrar o seu lar e apenas ali regressa como um elemento agora naturalizado norte-americana e, como tal, impossível de deter e manobrar como mais um dos seus bonecos. Se então Trueba criou uma história que olhava para a Alemanha nazi como o regime brutal que foi, agora recupera o imaginário de uma Espanha franquista dominadora e igualmente opressiva. Se num assistimos à brutalidade contra os judeus, agora temo-la contra os indivíduos supostos simpatizantes comunistas e, como tal, inimigos do Estado. Mas ainda temos tempo para reflexões McCartistas norte-americanas, para afirmações contra o franquismo e em prol de uma liberdade ainda distante e sobretudo um hino pela cúmplice amizade que um conjunto de amigos não esqueceu ou perdeu mesmo com os anos passados - no filme tal como na realidade distanciam-nos dezoito anos -, mas também pela memória daqueles que vieram de toda a parte do mundo para lutar por uma Espanha plural como desejava a então República da década de '30.
Temos ainda tempo para um frente-a-frente entre "Franco" e "Macarena"... a santa/actriz e o político. A libertária e o ditador. A mulher e o homem (políticos?!) que se confrontam como um directo reflexo de uma sociedade dividida entre estigmas e pressupostos. O ditador que se impõe (e impôs) durante muitos mais anos (mais vinte) e a mulher actriz símbolo de uma liberdade (individual, sexual e até política), que tinha voz fora de um país onde já não era bem-vinda mas que ainda tem como seu... eternamente seu - não é por razão ao acaso que a sua interpretação em La Reina de España é enquanto Isabel, a Católica... mulher chegada a Granada (o apelido da sua personagem), terra recentemente conquistada aos muçulmanos ocupantes.
Com alguma da magia de La Niña de Tus Ojos já perdida. La Reina de España consegue, manter uma certa empatia com o seu espectador pela recuperação quase intacta das personagens que o conseguiram encantar no final do século passado - que é, como quem diz... há toda uma vida atrás - perdendo, no entanto, algum misticismo e graciosidade que então impunham... talvez a confirmação do seu regime, a compreensão de que a Espanha que idealizaram não é aquela em que vivem ou até mesmo o desencanto natural que o avanço da idade comporta, transformou-os (a todos) no tal adulto que os anos assumem e não nas "crianças" que esperavam sempre ser. Diz-se que quem regressa de uma guerra é toda uma pessoa diferente daquela que para ela partiu... La Reina de España confirma que esta afirmação é verdade... uma vez vistos os seus horrores e jamais se poderá encarar a vida de uma forma cor-de-rosa.
Graciosa como sempre, Penélope Cruz suporta o filme como sendo seu - tal a cumplicidade sentida com quem está por detrás da câmara -, mas são os secundários como Loles León ou Antonio Resines - também ele apagado e desligado da intensidade dramática que o caracterizam - que dão algum espírito a uma história que talvez não seja o final esperado para o sucesso que foi La Niña de Tus Ojos. Mas, ainda assim, La Reina de España é o filme que se impunha fazer... onde e quem são eles quase vinte anos depois do seu grande sucesso e da confirmação de que o mundo (seu) poderia ser algo diferente. Triste e potencialmente desencantado, La Reina de España apenas emerge de uma sombra pelo imaginário do sonho que o cinema pode transmitir... não que o filme seja cinzento mas assim o é o seu universo, o seu mundo e o rumo que o mesmo ainda iria tomar.
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6 / 10
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quinta-feira, 28 de setembro de 2017

Antonio Isasi-Isasmendi

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1927 - 2017
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quarta-feira, 27 de setembro de 2017

Hugh Hefner

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1926 - 2017
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terça-feira, 26 de setembro de 2017

European Film Awards 2017 - curtas-metragens nomeadas

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Foram hoje divulgadas pela Academia Europeia de Cinema as quinze curtas-metragens nomeadas ao European Film Award na respectiva categoria. Provenientes de um conjunto de festivais aderentes à Academia, as quinze curtas-metragens nomeadas provêm de quinze países diferentes incluindo dois extra Europa.
São as nomeadas:
  • Copa-Loca, de Christos Massalas (Grécia) - Sarajevo
  • Los Desheredados, de Laura Ferrés (Espanha) - Vila do Conde
  • En la Boca, de Matteo Gariglio (Suíça/Argentina) - Cracóvia
  • Fight on a Swedish Beach!!, de Simon Vahlne (Suécia) - Valladolid
  • Gros Chagrin, de Céline Devaux (França) - Veneza
  • Havêrk, de Rûken Tekes (Turquia) - Drama
  • Os Humores Artificiais, de Gabriel Abrantes (Portugal) - Berlim
  • Information Skies, de Metahaven (Holanda/Coreia do Sul) - Roterdão
  • Jeunes Hommes à la Fenêtre, de Loukianos Moshonas (França) - Locarno
  • Love, de Réka Bucsi (Hungria/França) - Uppsala
  • The Party, de Andrea Harkin (Irlanda) - Cork
  • Scris/Nescris, de Adrian Silisteanu (Roménia) - Tampere
  • Timecode, de Juanjo Giménez (Espanha) - Ghent
  • Ugly, de Redbear Easterman e Nikita Diakur (Alemanha) - Bristol
  • Wannabe, de Jannis Lenz (Áustria/Alemanha) - Clermont-Ferrand
O vencedor desta, e das demais categorias, será conhecido numa cerimónia a realizar no próximo dia 9 de Dezembro em Berlim, na Alemanha.
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domingo, 24 de setembro de 2017

La Folle Histoire de Max et Léon (2016)

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A Louca História de Max e Leon de Jonathan Barré é uma longa-metragem franco-belga que relata a cúmplice e longa amizade entre Max (David Marsais) e Léon (Grégoire Ludig), durante o mais conturbado período da História Europeia... a Segunda Guerra Mundial.
O realizador e os dois actores protagonistas escrevem o argumento desta história que é desde o primeiro instante, um hino a uma loucura sem fim capaz de fazer inveja ao mais frenético conto de Baz Luhrmann. Da juventude em que o bullying os aproximou aos anos loucos da adolescência e enquanto jovens adultos, "Max" e "Léon" são dois homens capazes de aproveitar a vida ao seu máximo e não se arrependendo de nenhuns dos momentos pelos quais passam. É, no entanto, no dia em que estala o conflito que opôs França à Alemanha - e estes para com todo o mundo - que a sua vida de folia e diversão parece ter chegado a um final.
Se Luhrmann já aqui foi referido - e o espectador que queira ver este La Folle Histoire de Max et Léon compreenderá fácil e rapidamente -, então cedo a palavra "folle" representará muito (senão tudo) daquilo que esta longa-metragem tem para oferecer. Aquilo que se inicia como uma comédia com potencial para retratar a amizade longa e duradoura entre dois homens e que permite ao espectador vislumbrar algum encanto desses anos loucos onde tudo parece possível, o que é certo é que com os momentos iniciais do conflito onde a sua paz é finalmente perturbada, é esperada alguma componente dramática que, no entanto, dá lugar a uma comédia de impossíveis apenas capaz de fazer rivalidade com um Home Alone (1990), de Chris Columbus deixando no ar a única e possível questão... "a sério que é por este caminho que se pretende levar este filme?!"...
De viagens pelo interior de uma Europa devastada a passeios pelo Canal da Mancha rumo a uma Inglaterra onde ninguém parecia muito preocupado em confirmar identidades, de emissões da BBC que ninguém aparenta controlar a troca de guarda-roupa que ora os coloca como tropas aliadas ora como oficiais nazis, "Max" e "Léon" vivem numa correria mais desgastante que um moroso documentário sobre a técnica de fazer baínhas em vestidos renascentistas... A ideia da comédia até tem os seus momentos de interesse pontual onde se explora algum ridículo colaboracionismo francês ou um tentado humor britânico com piadas subtis e mais inteligentes mas, no entanto, no meio de tanta confusão que coloca uma qualquer aldeia da Gália como uma lugar sacro-santo... o espectador perde não só a noção de tudo o que se passa à sua volta como principalmente da esperada dinâmica que seria de criar entre personagens e destas com o ambiente tumultuoso que se fazia sentir na época em questão.
Se o absurdo não fosse já uma constante não perceptível, eis que chega o momento em que se transforma um campo de prisioneiros de guerra num não tão elaborado momento musical (não tão) digno da Broadway cujo único propósito foi ocultar uma tentativa de fuga e criar um certo ambiente descontraído no referido espaço onde germânicos invasores e franceses ocupados são, afinal, compinchas metidos numa situação delicada. Não me assusta ou incomoda que se tente utilizar a comédia para contar história dramáticas que a mente humana não ousa pensar - Roberto Benigni teve o seu brilhante e único La Vita è Bella (1997) -, mas La Folle Histoire de Max et Léon revela que esse tal humor dramático e inteligente nem sempre é uma constante.
É, no entanto, nos secundários que residem alguns dos pontos fortes desta longa-metragem, nomeadamente no "Commandant Beaulieu" de Jonathan Cohen que se revela como um militar capaz de dar cor ao seu exibicionismo para agradar aos seus irmãos de armas, um Dominique Pinon enérgico como sempre que se revela como um inesperado líder da Resistência, entre outros assim como na sua componente técnica como a direcção de fotografia da autoria de Sascha Wernik que confere a esta longa uma atmosfera digna de um filme dos anos 40... mas a cores, e ainda à direcção artística e de guarda-roupa ou mesmo a caracterização que levam o espectador a uma viagem pela referida época.
Com um potencial extraordinário que, no entanto, se deixou levar pelo lado mais fácil e desprotegido da comédia, La Folle Histoire de Max et Léon perde-se em todo o seu ritmo frenético que não soube conter, limitando-se a um lado mais jocoso de uma história sempre séria ainda que, por breves e pontuais momentos, consiga surpreender o espectador com alguma originalidade nas situações recriadas... afinal quantos de nós já não se sentiram heróis face ao perigo e imaginamos actos de uma proeza desmesurada... quantos já não se viram em caminhos mais "apertados" e dispostos a tudo para sobreviver ou mesmo, quantos já não se encontraram no lugar certo na hora certa... naquele exacto momento em que toda a História está prestes a mudar? - pois... aqui talvez não... e é esse o problema dos nossos dois protagonistas... é que por muito invulgar e inesperada que seja a sua odisseia... demasiadas coincidências em pouco mais de noventa minutos... é realmente coincidência a mais.
Distrai e entretém durante alguns momentos, mas esta "Folle Histoire" pretendeu ser mais do que aquilo que, na prática, conseguiu ser mantendo-se apenas, tal como o nome indica... uma história (realmente) louca.
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5 / 10
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sábado, 23 de setembro de 2017

Jan Tríska

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1936 - 2017
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Charles Bradley

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1948 - 2017
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QueerLisboa - Festival Internacional de Cinema Queer 2017: os vencedores

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Terminou hoje a vigésima-primeira edição do QueerLisboa - Festival Internacional de Cinema Queer que decorreu no Cinema São Jorge, em Lisboa desde o passado dia 15 de Setembro.
Foram os vencedores:
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Competição de Longas-Metragens
Longa-Metragem: Los Objetos Amorosos, de Adrián Silvestre (Espanha)

Menção Especial: Corpo Elétrico, de Marcelo Caetano (Brasil)
Prémio do Público: Close-Knit, de Naoko Ogigami (Japão)
Actor: Owen Campbell, As You Are (EUA)
Actriz: Laura Rojas Godoy e Nicole Costa, Los Objetos Amorosos (Espanha)
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Competição de Documentários
Documentário: Small Talk, de Hui-Chen Huang (Taiwan)
Menção Especial: Vivir y Otras Ficciones, de Jo Sol (Espanha)
Prémio do Público: Entre os Homens de Bem, de Caio Cavechini e Carlos Juliano Barros (Brasil)
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Competição de Curtas-Metragens
Curta-Metragem: Les Îles, de Yann Gonzalez (França)
Menção Especial: Coelho Mau, de Carlos Conceição (Portugal/França)
Prémio do Público: Tailor, de Calí dos Anjos (Brasil)
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Competição In My Shorts
Prémio Melhor Curta-Metragem de Escola: Étage X, de Francy Fabritz (Alemanha)
Menção Especial: Loris Sta Bene, de Simone Bozzelli (Itália) e Rute, de Ricardo Branco (Portugal)
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Competição Queer Art
Filme: Occidental, de Neïl Beloufa (França)
Menção Especial: A Destruição de Bernardet, de Claudia Priscilla e Pedro Marques (Brasil)

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quarta-feira, 20 de setembro de 2017

Quand on a 17 Ans (2016)

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Quando se tem 17 Anos de André Téchiné é uma longa-metragem francesa presente na secção Panorama - Longas-Metragens da vigésima-primeira edição do QueerLisboa - Festival Internacional de Cinema Queer que decorre no Cinema São Jorge, em Lisboa até ao próximo dia 23 de Setembro.
Damien (Kacey Mottet Klein) vive com a mãe Marianne (Sandrine Kiberlain) enquanto cumpre mais uma missão militar no estrangeiro. Na escola sofre o acosso sistemático de Thomas (Corentin Fila) e os dois acabam por por em prática a sua agressividade. Quando a mãe de Damien começa a tratar a de Thomas que se encontra doente, os dois rapazes começam a privar mais de perto e aquilo que era uma tumultuosa relação começa a exibir alguns sinais de cumplicidade. Será esta crescente empatia algo mais do que uma não tão simples amizade?
Depois de obras como Barocco (1976), Rendez-vous (1985), Les Roseaux Sauvages (1994) ou Les Temps qui Changent (2004), André Téchiné regressa com a sua mais recente longa-metragem cujo argumento também assina em colaboração com Céline Sciamma sobre a problemática relação entre dois jovens vindos de dois mundos distintos. Por um lado o espectador encontra "Damien", um rapaz apenas criado pela mãe devido à distância das missões militares que levam o pai para o outro lado do mundo, desenvolvendo um lado mais sentimental que é visto pelos outros - pelo menos por "Thomas" - como fruto de uma prepotência que abomina. Do outro lado temos "Thomas", filho adoptado de um casal que trabalha numa quinta nas montanhas e que vê na sua diferença (a família adoptiva), o motivo pelo qual é inferior aos demais na sua comunidade. Ambos filhos de lares e de famílias que os amam, tanto "Damien" como "Thomas" são, em última análise, marginais dentro de um mesmo espaço tendo aquilo que consideram como as suas diferenças as justificações para, no fundo, serem mais parecidos do que ambicionam ser... Se ao primeiro falta um pai presente ao outro falta a capacidade de poder aproveitar uma juventude tal como ela é... livre de trabalhos e responsabilidades que façam dele um jovem como todos os demais. No fundo, ambos assumem papéis de expressividade mais adultos do que o que são tendo, dessa forma, mais responsabilidade perante o lar do que a esperada de dois jovens ainda na adolescência.
Dividido em três segmentos distintos, Quand on a 17 Ans inicia com o primeiro trimestre escolar onde a relação entre os dois jovens é crua, máscula e tida à lei de uma agressividade que ninguém consegue explicar. Funcionando como uma aprendizagem  - do espectador - a respeito dos mesmos, percebemos que ambos são o elemento marginal dentro dos parâmetros impostos pelos próprios colegas que os negligenciam e ignoram. E, se esta marginalização faz de "Damien" um jovem que se destaca na sua carreira académica mas na prática pouco social, "Thomas" destaca-se nas áreas mais práticas do tratamento de uma quinta onde se vê a constituir carreira mantendo-se, também ele, anti-social para tudo o que demais o rodeia.
De um segundo trimestre onde começam a respeitar o espaço alheio - acabam por viver ambos na casa de "Damien" como forma de facilitar a vida escolar de "Thomas" e poder servir de forma a que os dois se entendam dentro do mesmo local - mas no qual onde o espectador fica também a conhecer o fascínio e atracção sexual que o primeiro sente em relação ao segundo, este é também o segmento onde compreendemos que para lá de um qualquer desejo reprimido dos dois, existe uma atracção que os impede de se distanciarem, algo que os atrai e repele na mesma proporção mas que impede de tornar esse afastamento como algo final e definitivo. O mesmo segmento em que existe a primeira atracção sentimental/sexual e que por medo ao tido como "proibido" é inocentemente repelido pela força mas que deixa a certeza de que o sentimento existe e é dinâmico, a um terceiro e último trimestre onde a crise e a tormenta dão lugar a uma aproximação e a um desejo cumprido. O segmento em que se confirma a perda e a necessidade de sentir que existe algo mais para lá dela. O momento em que finalmente se compreende que o que existe não será apenas um acto de momento mas sim a confirmação de um desejo e de um amor - talvez ainda algo pueril e adolescente - que os irá manter unidos para sempre.
Mottet Klein e Fila têm duas fortes e dinâmicas interpretações que comprovam que a diferença - imaginária ou não - é eliminada pela força de um sentimento maior... Seja amor, atracção física ou mesmo atracção sentimental ou fruto de um "algo" que o outro tem e que se deseja - que no caso de "Thomas" pode estar intimamente relacionado com a relação familiar que "Damien" tem e que ele não sente dentro da sua casa apesar do espectador compreender que ele é amado pelos seus pais -, a relação entre os dois é maravilhosamente interpretada por dois jovens actores que terão certamente um futuro promissor da arte da representação e que aqui conseguem dar uma alma - por vezes perturbada - às suas personagens mas que é ultrapassada pela força e calor de uma empatia que cresce lentamente e que os une irremediavelmente. No entanto, é Sandrine Kiberlain que tem a interpretação mais marcante desta ternamente violenta longa-metragem, comprovado inicialmente pela capacidade de perdoar e acolher um jovem que sabe ter agredido fisicamente o seu filho e que depois se desfaz nos braços de ambos quando a própria sente que a perda lhe bateu à porta. A sua contenção constante que nem uma morte inesperada quebra, é subitamente interrompida num tenso e arrepiante momento em que vê, à distância, aquele que é o amor da sua vida afastado para sempre dos seus braços e impossibilitada de a ele recorrer comprovando que ainda que perto... a ausência de afecto e de cumplicidade a marcam e a condenam (inicialmente) a uma incapacidade de viver.
Sem grandes momentos de ostentação sentimental e, no fundo, um drama capaz de viver de momentos equilibrados entre a tensão física e psicológica - sobretudo a tida na perspectiva de "Thomas" sobre o mundo que sente estar a condená-lo a cada passo - Quand on a 17 Ans consegue afirmar-se como aquela obra em que os dois protagonistas estão no seu coming of age sem nunca extrapolar considerações sobre os seus actos, sobre as suas escolhas ou mesmo sobre a sua forma de encarar esse tal mundo onde todos têm - aos olhos dos demais - de encarnar um papel social que lhe foi conferido para desempenhar no momento em que nasceram.
Digno de destacar ainda a direcção de fotografia de Julien Hirsch que lhe confere um certo ambiente equivalente ao constante frio que se parece fazer sentir na pequena vila francesa, sem esquecer a música original de Alexis Rault que caminha ao ritmo dos sentimentos dos dois jovens, Quand on a 17 Ans é uma (mais uma) interessante e agradável surpresa deste festival este ano e uma das mais suavemente emocionantes longas-metragens do cinema francês que chega finalmente ao nosso país comprovando - não que existissem dúvidas - da qualidade de transmissão de sentimentos e pensamentos que o cinema de Téchiné sempre conseguiu transmitir.
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8 / 10
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terça-feira, 19 de setembro de 2017

Jake LaMotta

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1921 - 2017
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segunda-feira, 18 de setembro de 2017

As You Are (2016)

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As You Are de Miles Joris-Peyrafitte é uma longa-metragem norte-americana e uma das que se encontra na Competição Oficial da vigésima-primeira edição do QueerLisboa - Festival Internacional de Cinema Queer que decorre até ao próximo dia 21 no Cinema São Jorge, em Lisboa.
Jack (Owen Campbell) é um adolescente solitário. Metido nos seus assuntos e distante de qualquer comportamento social, a sua vida é subitamente alterada quando Karen (Mary Stuart Masterson), a sua mãe, inicia uma relação com Tom (Scott Cohen), que eventualmente se muda para a sua casa juntamente com Mark (Charlie Heaton), o seu filho. Mark é um jovem cujo comportamento é a total antítese de Jack e aquilo que parecia estar condenado cedo se desenvolve enquanto uma sólida e cúmplice amizade.
No entanto, quando Sarah (Amandla Stenberg) se junta ao par, as emoções e os sentimentos alteram-se gerando um ciúme com o qual não será fácil lidar. Estará esta relação entre Jack e Mark para lá de uma cumplicidade fraterna? Poderá ela existir além da relação fraterna que de ambos se espera?
As You Are cujo argumento é da autoria de Joris-Peyrafitte em colaboração com Madison Harrison tem como base directa a curta-metragem do realizador As a Friend (2014) e explora a relação de dois jovens - "Jack" e "Mark" - através daquilo que inicialmente compreendemos como um interrogatório policial fruto de um qualquer evento que sucedeu na vida de ambos. É através dos vários testemunhos que o espectador não só observa a relação tida entre todos os intervenientes como também ganha conhecimento sobre a relação que os dois jovens desenvolvem. Inicialmente tidos como dois opostos que poderiam eventualmente complementar as lacunas que cada um tinha, o comportamento de ambos desenvolve-se muito rapidamente para uma relação cúmplice, de alguma posse não assumida e até mesmo de um carinho que ultrapassa os limites fraternos que seriam de esperar.
Se esta cumplicidade é um factor predominante em toda a longa-metragem, a ela vem associada o desenvolvimento - ou despertar - sentimental e sexual que sentem. Inadaptados para um qualquer mundo exterior que o espectador nunca chega a conhecer, aquilo que nos é revelada é que a empatia sentimental entre ambos é notória e crescente. "Jack" e "Mark" não se comportam como dois meros amigos mas sim como dois silenciados apaixonados que sentem na proximidade do outro a segurança afectiva que, até então, nunca havia sido garantida.
Os desenvolvimentos que o espectador acompanha, e que cada vez mais revelam o acontecimento de algo trágico - e que facilmente se compreende sobre quem -, fazem denotar as frágeis e inexperientes emoções de tantos jovens incapazes de compreender os seus sentimentos, o despertar de uma vida sentimental, afectiva e até mesmo sexual e a sua inadaptação a uma rejeição. No entanto, esta rejeição não chega sob a forma de falta desse sentimento mas sim pelo medo sentido da incompreensão dos ditos adultos que, ao mesmo tempo, gera uma revolta e violência nestes para com os mais novos e nos jovens para consigo próprios na medida em que repudiam os seus sentimentos e os afectos que lhes podem conferir uma vida sentimental saudável e em plenos crescimento.
Mas esta tensão não é exclusiva dos jovens. Pelo contrário, "Karen", a personagem interpretada por uma saudosa Mary Stuart Masterson é o exemplo de uma jovem mãe solteira, repleta de vida e amor para dar - e receber na igual proporção - que espera pela oportunidade de uma relação duradoura, capaz de a completar (e ao seu filho) na ausência de um marido, pai e companheiro que não só imponha as regras sociais como também a elas se adapte. Mas, no entanto, quando se abre a porta ao primeiro homem que lhe aparece, permanece a dúvida sobre até que ponto aquilo que se conhece é a fase de encantamento e sedução... que nem sempre permanecem... e o que sobra não será apenas um vislumbre de algo que eventualmente se teve mas que já não se deseja. Assim, se a relação sentimental, afectiva e cúmplice entre os dois jovens parece frágil pela possibilidade de se concretizar, não deixa de ser uma realidade que aquela tida pelos adultos não é mais estável e segura... bem pelo contrário!
A tensão sentida pelos jovens - que apenas se vem agudizar com a presença de "Sarah" que acaba por se transformar no elo de normalidade que, a certa altura ambos sentem mas que se torna mais vincada para "Mark" - transforma-se numa revolta interior quando "Jack" se sente traído nos seus sentimentos, nos seus actos e até no afecto que até então não havia sentido por ninguém. Da química à revolta, da cumplicidade ao ciúme, "Jack" e "Mark" vivem os momentos que poderão ser transformadores nas suas vidas.
No final, como resultado directo daquilo que havíamos escutado no início, assistimos a uma fuga... a um pedido de ajuda. Ficamos com a confirmação de que independentemente de um assassinato ou de um suicídio, a vida daqueles dois jovens ficou irremediavelmente perdida. Perdida graças à morte, ao sofrimento e principalmente graças à incapacidade de aceitação por parte de uma sociedade que prefere aceitar padrões de uma normalidade auto-imposta do que compreender e respeitar o mais profundo dos sentimentos de amor e de amizade. Tudo o que é dito "desviante" acaba por ser tornar inaceitável e, como tal, a ser repudiado. Os traumas daqui resultantes e nunca aceites como tal são transformadores. Podem até ser fatais como aqui confirmamos. Mas em nome de uma masculinidade e da manutenção de padrões de sexualidade, perpetuam-se as injustiças e marginalizam-se os sentimentos e os afectos... ainda que puros, sentidos e honestos.
Com brilhantes interpretações de Owen Campbell como "Jack", o jovem anti-social que consegue pela primeira vez estabelecer uma cúmplice amizade e aquele que, no fundo, mais se desenvolve no campo da afectividade, e Charlie Heaton como "Mark", o adolescente ultra-confiante que receia um amor sentido e puro, As You Are revela ainda uma reaproximação de Mary Stuart Masterson ao grande ecrã - tão desaparecida tem estado - com uma interpretação confiante e, também ela, desesperadamente à procura de um amor que tarda em chegar, e é abrilhantado com uma exímia direcção de fotografia de Caleb Heymann que capta a energia da proximidade de um Verão escaldante e uma atmosfera muito anos '90 onde ainda conseguia reinar uma certa inocência e puerilidade teen que dão um intenso charme à câmara de Joris-Peyrafitte revelando-o como um dos novos e emergentes realizadores para quem o espectador terá - e irá - ficar atento confirmando assim que a competição de longas-metragens do QueerLisboa este ano está forte e bem renhida.
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8 / 10
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sábado, 16 de setembro de 2017

Beach Rats (2017)

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Beach Rats de Eliza Hittman é uma longa-metragem norte-americana presente na Competição Oficial da vigésima-primeira edição do QueerLisboa - Festival Internacional de Cinema Queer que decorre no Cinema São Jorge, em Lisboa até ao próximo dia 23 de Setembro.
Frankie (Harris Dickinson)  é um adolescente à deriva que tenta descobrir a sua identidade sexual ao mesmo tempo que vive um drama familiar devido à débil condição de saúde do seu pai. Numa rotina que gira em torno das saídas com os seus amigos de Brooklyn, uma potencial nova namorada e os encontros com homens mais velhos que marca online, Frankie tenta desesperadamente encontrar um lugar... que pode não chegar.
Também com um argumento da autoria de Eliza Hittman, Beach Rats foi o vencedor do prémio de realização da última edição do Festival de Sundance, girando em torno da história de um jovem que tenta desesperadamente encontrar o seu verdadeiro "eu" conseguindo, dessa forma, sobreviver àquela idade de uma incerteza que é não só enquanto o indivíduo que é mas também a propósito da sua sexualidade e necessidades afectivas. A existência de "Frankie" resume-se a uma aparente despreocupação enquanto passeia por Brooklyn com os amigos - todos potenciais marginais - e consome qualquer tipo de droga que consegue roubada dos medicamentos do pai. A pressão dos pares e uma irmã para quem a expressão da sua vida sentimental e, de certa forma, sexual parece ser tão simples, fazem de "Frankie" um jovem adulto cuja existência se limita à omissão, à mentira, à repressão e, essencialmente, a uma involuntária regressão de personalidade que lentamente o confinam a uma auto-violência emocional.
No entanto, "Frankie" encontra uma escapatória para este seu drama quando começa a seduzir homens mais velhos - aqueles que, segundo ele, não conhecem ninguém do seu círculo de amigos - e com quem pode livremente expressar a sua sexualidade. Mas, aquilo que aparentava ser o escape perfeito para a sua sexualidade cedo se transforma numa prisão na medida em que tem de continuar a esconder-se do mundo e viver uma fachada... enquanto a luz do sol brilha. Os encontros são sempre anónimos, em locais desertificados e inicialmente a troca de alguma droga que consome como que utilizando uma desculpa para poder manifestar os seus desejos e expressar os tais sentimentos que o "mundo" desconhece. No entanto, e à medida que o cerco social - mãe, namorada e amigos - aperta, impossibilitando-o de continuar a viver esta existência dupla, "Frankie" terá de perceber que para lá das condicionantes que o rodeiam, aquilo que o define não é a imagem que os outros têm de si mas aquela que ele é capaz de suportar cada vez que olha para o espelho.
Da pressão de pares exercida por aqueles com quem convive mais tempo mas que não passa de uma amizade por conveniência - drogas e mulheres que se tentam encontrar diariamente - à pressão efectuada (de certa forma...) pela imagem que lhe foi incutida de normalidade - homem encontra mulher - "Frankie" desespera silenciosamente como que de uma luta pela sua própria sobrevivência se tratasse. Conseguirá ele alguma vez fazer co-existir estes dois traços da sua personalidade e sexualidade ou, por sua vez, terá ele de (se) assumir ao mundo quem realmente é? Os breves instantes em que ele observa a sua irmã mais jovem nos primeiros actos de uma paixoneta e sente que tudo é tão fácil para ela enquanto que o próprio percebe que tem primeiro de respeitar a imagem social que dele foi criada e só na sombra poder ser livre e quem realmente é, transformam-no em alguém que se auto-mutila psicologicamente apenas para manter aquilo que as aparências (pensa) pedem.
Harris Dickinson - o jovem "Frankie" - dá corpo a toda esta dualidade (e duplicidade) de momentos, sentimentos, expressões e manifestações de uma juventude que tem não só de sobreviver enquanto indivíduo mas também perante os seus pares sociais e grupos primários exaltando com a sua personagem uma intensidade dramática e individual dignas de registo para quem tem (ainda!) um tão jovem percurso enquanto intérprete deixando adivinhar aquilo que de bom ainda o espera. Aqui, o espectador vibra não só com o seu drama silenciado de jovem incapaz de fazer seguir a sua vida em total liberdade, como também pela incapacidade que sente - ou reprime?! - ao perceber que tudo é (para os demais) bem mais simples, menos questionado e igualmente pouco esperado. Tudo é "normal" para os demais... porque não poderá ser para ele? Ainda que pouco explorado em Beach Rats, existe todo um drama familiar que ficou por abordar sendo que, no entanto, percebemos aquando do início da sua breve relação com "Simone" (Madeline Weinstein) que dele se espera que a relação seja tão parecido com aquela que os seus pais tiveram... A pressão, ainda que pouco dinamizada neste guião, sente-se e Dickinson consegue recriá-la por breves mas intensos apontamentos que o seu olhar deixa escapar durante os mesmos.
Finalmente, e também como um apontamento breve de Beach Rats, Hittman deixa passar a ideia de que é nesta era global e informatizada onde tudo está ao alcance de um simples click num computador, que as relações humanas se tornam mais complexas, menos vividas e sentidas e assumidamente mais impessoais. As pessoas encontram-se pelo único instante de prazer imediato que sabem que esse encontro irá proporcionar, e muito pouco preocupadas com aquilo que a longo prazo dali podem retirar - que será nada graças ao seu imediatismo -, desumanizando o contacto, tornando-o semi-animalesco e impessoal... mas sobretudo anónimo... os nomes tornam-se secundários e o indivíduo irrelevante... hoje um... amanhã outro. Num mundo onde tudo se pode ter e conhecer... permanece a questão sobre se realmente se tem e conhecer algo ou alguém?!
Numa atmosfera muito século XXI e na intensidade de um qualquer Verão que parece ser o marco de um fim e de um (talvez não) tão novo início, Beach Rats tem ainda uma magnífica direcção de fotografia de Hélène Louvart que parece desumanizar os intérpretes e os espaços conferindo-lhes uma dinâmica de um constante anonimato nem sempre involuntário e uma música de Nicholas Leone que - essa sim - consegue criar a tal atmosfera destes anos dois mil que, por instantes, parece que o espectador desconhece.
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8 / 10
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Arroios Film Festival 2017: os vencedores

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Terminou hoje a segunda edição do Arroios Film Festival, em Lisboa, cujo principal tema foi o da inclusão. Com quase quarenta filmes curtos em competição, o AFF premeia a melhor curta-metragem nas áreas de Ficção, Documentário e Animação e ainda o melhor trabalho transversal a toda a competição.
Foram os vencedores:
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Grande Prémio - Prémio Libertas: Watu Wote, de Katja Benrath (Alemanha)
Ficção: New Neighbors, de E. G. Bailey (EUA)
Documentário: Luíza, de Caio Baú (Brasil)
Animação: Dent de Lléo, de Jorge Bellver (Espanha)
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sexta-feira, 15 de setembro de 2017

Harry Dean Stanton

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1926 - 2017
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European Achievement in World Cinema goes to...

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A Academia Europeia de Cinema anunciou hoje o nome da galardoada com o EFA - European Achievement in World Cinema. Com uma carreira que se estende tanto à frente como por detrás da câmara, da interpretação à realização sem esquecer o argumento, a actriz francesa Julie Delpy é portadora de uma carreira que se iniciou em 1978 com a longa-metragem Guerres Civiles en France, de François Barat, Jöel Farges e Vincent Nordon e "um exemplo de dedicação à arte cinematográfica".
Foi, no entanto, com Mauvais Sang (1986), de Leos Carax que Delpy alcançou o seu primeiro grande sucesso incluindo uma nomeação ao César da Academia Francesa de Cinema na categoria de Melhor Actriz Revelação.
Com uma carreira que ultrapassava as fronteiras do seu país natal, Delpy trabalhou com inúmeros realizadores tanto na Europa como nos Estados Unidos onde finalmente alcança o estatuto de estrela internacional ao interpretar Before Sunrise (1995), de Richard Linklater ao qual se seguiram Before Sunset (2004) e finalmente Before Midnight (2013) trilogia pela qual recebeu duas nomeações ao Oscar de Melhor Argumento Adaptado em 2005 e 2014.
No seu curriculum, Julie Delpy inclui ainda as longas-metragens Déctetive (1985), de Jean-Luc Godard, La Passion de Béatrice (1987), de Bertrand Tavernier, La Noche Oscura (1989), de Carlos Saura, Europa Europa (1990), de Agnieszka Holland, Homo Faber (1991), de Volker Schlöndorff, Warszawa. Année 5703 (1992), de Janusz Kijowski, na trilogia Trois Couleurs: Bleu (1993), Blanc (1994) e Rouge (1994), de Kzrysztof Kieslowski, Killing Zoe (1993) de Roger Avary, The Three Musketeers (1993), de Stephen Herek, Tykho Moon (1996), de Enki Bilal, An American Werewolf in Paris (1997), de Anthony Waller, Waking Life (2001), de Richard Linklater, Broken Flowers (2005), de Jim Jarmusch, The Hoax (2006), de Lasse Hallström, Avengers: Age of Ulton (2015), de Joss Whedon, Wiener-Dog (206), de Todd Solondz tendo ainda protagonizado obras que realizou como 2 Days in Paris (2007), The Countess (2009), Lolo (2015) ou o ainda por estrear My Zoe (2018) numa carreira onde contracenou com actores como Jean-Pierre Léaud, Juliette Binoche, Greta Gerwig, Tchéky Karyo, Michel Piccoli, Denis Lavant, Tom Everett Scott, Woody Allen, Ethan Hawke, Manuel de Blas, Michelle Williams, Michael Vartan, Marco Hofschneider, Sam Shepard, Barbara Sukowa, Lambert Wilson, Hanna Schygulla, Dermot Mulroney, Brendan Fraser, Donald Sutherland, Lolita Davidovich, Emmanuelle Riva, Eric Stoltz, Kiefer Sutherland, Charlie Sheen, Chris O'Donnell, Tim Curry, Irène Jacob, Rebecca De Mornay, Jean-Louis Trintignant, Billy Wirth, Martin Short, Alan Cumming, Bill Murray, Tilda Swinton, Sharon Stone, Jessica Lange, Richard Gere, Alfred Molina, Kathy Bates, Gerard Butler, Adam Goldberg, Daniel Bruühl, Andy Garcia, Sarah Michelle Gellar, William Hurt, Anamaria Marinca, Eric Elmosnino, Chris Rock, Robert Downey Jr., Chris Evan, Mark Ruffalo, Scarlett Johansson, Samuel L. Jackson, Don Cheadle, Chris Hemsworth ou Gemma Arterton.
Entre os prémios e nomeações já alcançados destacam-se ainda duas nomeações aos European Film Awards enquanto Melhor Actriz e Melhor Filme, uma nomeação como Melhor Actriz em Comédia/Musical nos Globos de Ouro da HFPA e ainda diversas indicações na crítica especializada norte-americana.
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A trigésima cerimónia dos European Film Awards irá realizar-se no próximo dia 9 de Dezembro em Berlim, na Alemanha.
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quinta-feira, 14 de setembro de 2017

Escape from Isis (2015)

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Escape from Isis de Edward Watts é um documentário britânico recentemente exibido em Portugal que revela o brutal regime em que milhões de mulheres vivem sob o controle do Daesh e o grupo de homens que se dedica a resgatá-las ao mesmo possibilitando-lhes uma vida em liberdade.
Executado ao estilo de uma reportagem em que os intervenientes são apresentados enquanto personagens activas, este documentário permite ao espectador uma abordagem inicial que enquadra Histórica e politicamente os Estados que vivem com uma crescente ocupação do Daesh e a sua directa influência sobre aqueles que vivem nestes territórios. Ao mesmo tempo, o espectador compreende ainda que esta crescente influência do grupo terrorista no interior de alguns países como, por exemplo, o Iraque se reflecte como uma consequência da instabilidade política do país que, tal como na Síria actual, permitiu aos mesmos ganhar e aumentar a sua esfera de influência.
Dos territórios desolados por anos de guerras civis que desordenaram uma ordem - ainda que totalitária - às populações amedrontados que vivem sob um jugo de poder desumano e desumanizador, Escape from Isis aborda essencialmente as vidas daqueles que ficaram sobre o mando do grupo terrorista e, claro, aqueles que se tornam imediatamente como os mais vulneráveis entre todos... as mulheres. Num regime que pretende instaurar uma ditadura fundamentalista religiosa onde a mulher ocupa o lugar mais baixo de uma hierarquia desumanizadora, este documentário aborda, através de relatos tidos na primeira pessoa, a transformação na vida diária daquelas que se viram de um momento para o outro a viver num território ocupado e levadas a uma condição desumana que as transforma não em pessoas, nem tão pouco cidadãs mas sim objectos que podem ser usados e facilmente descartados quando a sua desobediência - afirmação enquanto ser humano - fala mais alto.
Por medo, revolta ou claro necessidade inata estas mulheres - e por mulher entenda-se qualquer criança com idade igual ou superior a 12 anos -, transformam-se em prisioneiras num regime onde ninguém depõe a seu favor. Da simples negação ao "outro" como sua auto-afirmação ao adultério, o regime do Daesh transforma estas mulheres em banais criminosas que são uma afronta à sua dita "lei" religiosa passíveis de serem punidas primeiro com a ostracização social que as afasta inclusive da sua própria família e, finalmente, com a sua morte por apedrejamento - da própria família à comunidade de homens que a condena sem qualquer julgamento que a possa ilibar do "crime".
Do outro lado da fronteira, principalmente na Turquia, o espectador acompanha ainda a acção de um grupo de homens que se dedica ao seu resgate e salvamento. Quer seja através do "rapto" - leia-se resgate - ou mesmo através do pagamento de avultadas verbas que têm como fim último a continuidade do regime através da compra de armamento -, estes homens descobrem em que localidades estas mulheres se encontram, tentam estabelecer contactos e ligações com os seus captores que as mantêm isoladas num cativeiro onde mais não são do que os referidos "instrumentos" e "objectos" e, finalmente, tentam retirados desses mesmos locais garantindo-lhes uma vida de liberdade nos territórios ou países em que o Daesh não exerce qualquer influência.
Ignorando os processos que este grupo de homens exerce - até para sua própria segurança - Escape from Isis leva o espectador a uma viagem que oscila entre a beleza natural do território e a barbárie dos crimes que são cometidos no mesmo. No final apenas acompanhamos a chegada a uma terra de ninguém onde a liberdade é finalmente uma luz ao fundo do túnel - nunca é garantida enquanto uma fronteira não é ultrapassada -, a chegada destas mulheres aos inúmeros campos de refugiados que se encontram dispersos pelos mais variados países e, finalmente, a contínua acção daquele grupo de homens que não só arrisca a sua condição social como principalmente a sua segurança garantindo a estas mulheres a sua liberdade e aos terroristas do Daesh cada vez menos "mercadoria" - como são consideradas as mulheres - que tenham para negociar e perpetuar a sua acção macabra através do dinheiro que tentam receber.
Poucas vezes um documentário consegue arrancar calafrios do espectador como este Escape from Isis. Não só toda a sua acção é de cortar a respiração desde que começa como o espectador compreende que não está a assistir a uma qualquer situação encenada que aconteceu há inúmeros anos. Pelo contrário, tudo o que este documentário proporciona é um conjunto de situações - não exploradas até à exaustão - que acontece in loco. Um passo em falso pode representar a morte de uma ou várias mulheres. Um pagamento não feito descoberto pode representar a sua própria morte ou pelo menos a desconfiança que encerra uma canal de libertação das mesmas. A identidade nem sempre preservada daqueles que negoceiam pode, por vezes, representar um conjunto de ameaças e represálias que, normalmente, pode resultar na morte. A segurança é inexistente e o espectador sente que caminha numa linha muito ténue que separa essa esperada segurança de uma morte que se percebe quase sempre como uma certeza.
Intenso, dramático, emotivo e sempre revoltante pela desumanização a que um grupo pode remeter toda uma sociedade, Escape from Isis é um documentário contemporâneo, importante, pertinente e sobretudo um mordaz relato de uma realidade que necessita ser denunciada e que se constitua como um registo importante da nossa História - ainda a decorrer. Registo esse que, como referi, denuncie a brutalidade de um regime totalitário e fundamentalista enquanto, ao mesmo tempo, tente sensibilizar as opiniões daqueles que (nas nossas sociedades) encarem o outro, que é, também ele uma vítima, como um perigo tão grave como um agressor em plena actividade.
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8 / 10
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Fernanda Borsatti

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1931 - 2017
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quarta-feira, 13 de setembro de 2017

Frank Vincent

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1939 - 2017
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Meia Noite (2017)

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Meia Noite de Bruno Carnide é uma curta-metragem portuguesa de ficção e o mais recente trabalho do realizador de Em Terra Frágil (2011), Calou-se. Saiu. Saltei. (2014) e Manuel (2015).
De noite. O telefone toca. Um vulto. Uma mensagem que fica por gravar.
Com um argumento da autoria do realizador, Meia Noite aparenta ser a viagem de um vulto pela noite de uma cidade onde todos já se apagarem por entre as paredes das suas casas. Em dois breves minutos o espectador percorre os silêncios e as sombras de uma cidade que dorme. A tranquilidade e os vultos que insistem em percorrer a cidade numa viagem que opõe o "ser" ao "espaço" como que um habitante já ido que revisita os lugares onde (con)viveu e que conheceu. Agora, num silêncio profundo apenas perturbado pela insistência de uma mensagem que não é gravada, Meia Noite e o seu vulto visitante anónimo é apenas confirmado pelas sombras e pelas luzes que se extinguem à medida que passa.
Da desertificação do espaço - pela ausência de e do ser - à homenagem às sombras da cidade - num registo de direcção de fotografia também da autoria do realizador - Meia Noite tanto pode uma homenagem do Homem/Mulher ao espaço através da presença do vulto que por ela vagueia, como a sua despedida a um espaço onde agora já não habita fisicamente mas que identifica como uma parte do seu ex-ser destacando essa direcção de fotografia que transforma a noite de uma cidade num espaço fantasmagórico onde a presença humana parece ter sido "agora" abandonada.
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6 / 10
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Woodgreen (2017)

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Woodgreen de Welket Bungué é uma curta-metragem de ficção de co-produção brasileira e britânica que relata a viagem de Soho N'a (Bungué), um emigrante guineense residente em Londres que embarca numa viagem para o Brasil aquando de uma crise matrimonial. Chegado a terras de Vera Cruz, fica perdido numa ilha durante dez dias e ao regressar, decide gravar a sua viagem de volta a Londres com a câmara do telemóvel apenas para perceber que o espaço tal como o conhecia... já não parece ser o mesmo.
Com argumento também da autoria de Welket Bungué, Woodgreen regista três momentos distintos... Do primeiro em que atravessa os locais de uma folia carnavalesca num Brasil distante a um segundo que capta uma Londres intensa mas indiferenciada onde todos caminham sem ninguém se olhar numa clara dicotomia calor versus frio que opõem as sociedades Sul-Americanas e Europeias. Numa espera-o uma vida de indiferença e distanciamento que lhe recordam tudo o que perdeu... casa, mulher e cão. Na outra a ideia de uma vida diferente, talvez melhor, onde a mudança lhe confere uma réstia de oportunidade.
Do desespero de um homem à sua viagem pela busca de uma nova oportunidade, Woodgreen reflecte sobre as oportunidades e escolhas - quando as pode fazer - de um homem deslocado da sua terra que tenta encontrar um espaço - novo e seu - ultrapassando barreiras e obstáculos que surgem pela confiança e inexperiência que tudo o que se apresenta como "novo" lhe colocam.
Num registo semi-documental onde este e a ficção se confundem, esta curta-metragem filmada na primeira pessoa como que de um registo de viagem se tratasse explora a solidão do Homem em breves minutos que deixam no espectador a vontade de conhecer um pouco mais - dele e da sua viagem - para lá dos breves apontamentos situacionais que nos são fornecidos em legendas. Interessante pela ideia de exploração do desconhecido como caminho possível para essa tal nova oportunidade, Woodgreen apenas "falha" pela sua (infelizmente) curta duração.
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6 / 10
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Shortcutz Viseu 2017: os vencedores

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O Shortcutz Viseu anunciou hoje os seus vencedores. Contrariamente ao que sucedeu nos últimos anos, o quarto aniversário do evento na cidade não ocorreu sob uma forma física mas, ainda assim, o Shrotcutz Viseu não deixou de celebrar o melhor do cinema curto que passou pela cidade no último ano anunciando A Instalação do Medo, de Ricardo Leite como a Melhor Curta do Ano que arrecadou ainda o prémio de melhor argumento.
São os vencedores:
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Curta-Metragem: A Instalação do Medo, de Ricardo Leite
Realização: Belmiro Ribeiro, Post-Mortem
Actor: Welket Bungué, Bastien
Actriz: Helena Canhoto, Vícios para uma Família Feliz
Argumento: Ricardo Leite, A Instalação do Medo
Montagem: Joana Maria Sousa, Cavallo
Fotografia: Pedro Azevedo, Jigging
Som: Jérémy Pouivet, Post-Mortem
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Revenge Porn (2017)

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Revenge Porn de Guilherme Trindade é uma curta-metragem portuguesa de ficção que marcou presença em competição na última edição do MOTELx - Festival Internacional de Cinema de Terror de Lisboa - que terminou no passado Domingo - ao prémio MOTELx de Melhor Curta Portuguesa de Terror.
Um encontro de Wayne (João Harrington Sena) com Sandy. Enquanto ela espera pela última esperança de um encontro normal, ele exibe-se como o machismo convencido de quem ela já suspeita. Terá ele outros planos para uma noite que ainda não terminou?!
Depois do maravilhoso Offline onde a temática do "amor" pairava por todas as esquinas, Guilherme Trindade assina o argumento deste Revenge Porn que leva o terror a toda uma nova dinâmica de sobrenatural meets online cam sex.
"Wayne" é um tipo desligado, assumidamente grosseiro e para quem as mulheres são apenas um objecto do qual se serve - e que o serve - para os instantes de prazer que os caprichos do seu pénis (estamos num blog familiar vamos manter a linguagem assim lol) exigem. Nada parece ser um obstáculo para os referidos caprichos... nem os sentimentos, nem a pessoa, nem tão pouco o sexo daqueles com quem potencialmente se encontra para os satisfazer - qual macho latino... ou talvez não!. Para "Wayne"... vale tudo.
De sexo virtual no seu telemóvel a inúmeros momentos frente ao seu computador pelas mais variadas salas de chat-cam, o que importa é a satisfação momentânea facultada... por quem quer que seja. De virtual anónimo a potencialmente revelador da sua identidade - e talvez daquela de quem está do outro lado - a satisfação máxima e o clímax são os únicos objectivos a ter em conta. Até que o encontra...
Os instantes em que "Wayne" satisfaz as suas necessidades carnais e em que conversa... com o seu "companheiro" oscilam entre o hilariante, entre a comédia que se adivinha gore e um terror sobrenatural que apenas a existência das redes virtuais que do distante fazem próximo, confirmam ao espectador que afinal estamos todos num espaço terreno... mas com forças existenciais que se propagam... online.
Dos malefícios da rede ao facilitismo do "online" - curiosa contraposição à longa-metragem anteriormente referido onde o off representa uma maior proximidade ao amor e não à desconexão do sexo anónimo - passando pelo humor gore onde a masturbação frenética faz atinge um banho de sangue e não a ejaculação do protagonista, Revenge Porn é uma original e bem sangrenta forma de se fazer humor sério onde para lá da pouca simpatia que o protagonista nos deixa - um bravo a Harrington Sena - e da indiferença que nos suscita o seu "castigo", o espectador reflecte ainda sobre os perigos do "online" - ocultismo à parte - onde tudo se vê, tudo se sente e tudo se vinga.
Com uma obra onde as novas tecnologias são assumidamente um elemento a destacar - Offline (2016) e agora este Revenge Porn -, Guilherme Trindade comprova com esta sua curta-metragem que o estilo gore teria umas interessantes "pernas" para andar possibilitando uma revitalização (ou surgimento) do cinema do género pelas terras lusitanas. Destaque ainda para a música original de Ricardo Remédio e para a direcção de fotografia pela mão do próprio realizador que dão a Revenge Porn uma atmosfera muito al'Argento, transformando-se em elementos fundamentais para a dinamização do ambiente e da atmosfera que se pretende fazer sentir.
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7 / 10
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segunda-feira, 11 de setembro de 2017

Tiago Ortis

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1978 - 2017
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Mark La Mura

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1948 - 2017
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Academia Portuguesa de Cinema selecciona...

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A Academia Portuguesa de Cinema seleccionou a longa-metragem São Jorge, de Marco Martins como o candidato nacional para representar Portugal aos Oscars na categoria de Melhor Filme Estrangeiro e aos Goya da Academia Espanhola de Cinema na categoria de Melhor Filme Ibero-Americano.
Depois de Alice em 2006, São Jorge é a segunda vez que uma obra do realizador Marco Martins é seleccionada para o chamado "prémio máximo do cinema mundial" sucedendo a Cartas da Guerra, de Ivo M. Ferreira em 2017.
São Jorge conta a história de Jorge, um boxeur desempregado que tenta sustentar toda a sua família numa época em que a crise e a troika invadiram Portugal, vendo-se obrigado a recorrer a um trabalho numa empresa de cobranças coercivas para sobreviver estando as interpretações a cargo de Nuno Lopes - vencedor do prémio Orizzonti de Melhor Actor em Veneza em 2016 - Gonçalo Waddington, Mariana Nunes, David Semedo, José Raposo, Jean-Pierre Martins e Beatriz Batarda.
A 32ª edição dos prémios Goya será realizada em Madrid no próximo dia 3 de Fevereiro enquanto que a 90ª edição dos Oscars está marcada para 4 de Março seguinte, em Los Angeles.
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It (2017)

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It de Andy Muschietti é uma longa-metragem norte-americana, a mais recente adaptação de uma obra de Stephen King e o remake da mini-série de dois episódios com o mesmo nome de 1990, realizada por Tommy Lee Wallace.
Um ano depois do desaparecimento do irmão, Bill (Jaeden Lieberher) e um grupo de crianças inadaptadas e perseguidas pelos malfeitores mais velhos da cidade, vêem-se ameaçados pelo bizarro e maléfico demónio sob a forma de um palhaço Pennywise (Bill Skarsgard).
Atormentados por vidas não tão perfeitas, pela pré-adolescência e por um demónio que os persegue através dos seus mais vividos pesadelos, estas crianças têm de conseguir sobreviver às suas vidas para finalmente as poderem defender do seu próprio fim.
Adaptado de uma obra de Stephen King por Cary Fukunaga, Chase Palmer e Gary Dauberman tendo ainda como ponto de referência a já referida obra do início da década de 90, este It de Muschietti é - era - um dos filmes mais aguardados do ano primeiro por aqueles que experimentaram o terror do "Pennywise" de Tim Curry e finalmente por toda uma nova geração de fãs de terror desejosos de ver a mais recente adaptação da obra do mestre - leia-se King - que foi exponenciado por um trailer extremamente interessante partilhado por todas as redes sociais o que fez antecipar "o tal" filme de terror que tantos de nós esperávamos há anos.
Aquilo que It nos revela já era conhecido - pelo menos, e repito, para aqueles que vibraram com a mini-série da década de 90 -, começando pelas vidas atormentados de um conjunto de jovens no final dos idos anos 80 - acção deslocada da década de 60 na obra original -, onde numa localidade perdida do meio do mundo que se transforma, um inúmero conjunto de crianças desaparece sem que ninguém lhes consiga encontrar o rasto. De "Bill" (Lieberher), a "Beverly" (Sophia Lillis) cujo pai se insinua a uma jovem à beira da puberdade que se masculiniza para deixar de ser vista como uma presa, passando por "Ben" (Jeremy Ray Taylor) o miúdo novo e com algum peso a mais perseguido pelos mais velhos, sem esquecer "Mike" (Chosen Jacobs) atormentado com a morte dos pais, "Eddie" (Jack Dylan Grazer) cuja mãe havia transformado num hipocondríaco ou "Stanley" (Wyatt Oleff) e o seu medo a palhaços ou mesmo "Richie" (Finn Wolfhard) com o seu medo do escuro, todos eles encontram-se naquele momento das suas vidas em que o racional se confunde com o irracional e, típico de um momento de transformação, ressurgem todos os medos de, aquando crianças, os limitavam na sua vontade de explorar e de viver.
Desta forma "Pennywise" é, para lá do demónio que o espectador reconhece, a junção de todos os medos que condicionam a vontade humana de avançar, de arriscar, de conhecer e de essencialmente viver numa plena liberdade e felicidade. "Pennywise" explora e joga com os medos de cada um enquanto crianças que são... seja o medo do escuro, da perda, do abuso, da falta de segurança, da violência ou até mesmo da morte, todos eles são condicionados por medos (ir)racionais que os fazem permanecer nessa idade infantil onde estão e são mais vulneráveis. No fundo, "Pennywise" acaba por ser o tal monstro (ou demónio) que explora essa vulnerabilidade aproveitando-se, de seguida, do isolamento a que cada um se remete onde pode, então, atacar e sair vencedor.
Os jovens, cada um à sua maneira, encontram-se naquela idade onde tudo o que fazem ou dizem os condiciona na sua pertença a um grupo - ou clã - e, como tal, vulneráveis ao sentimento desse isolamento. Gostar de uma banda "proibida" pelos parceiros, de uma rapariga (ou rapaz) que não é aprovado pelo mesmo ou de quem alguém já gosta, a vontade de uma independência e desafio à autoridade parental que surge com o despertar da adolescência ou até nutrir sentimentos que sentem não poderem ser confessados a todos condiciona nos seus movimentos mantendo como único alternativa permanecer perto daqueles que como eles, de uma ou outra forma, partilham essa mesma identidade marginal e transformadora... tão complicada é essa adolescência!!!
Com um espírito muito ao estilo dos idos anos 80, It recorre àquilo que de melhor nos trazem as tecnologias dos anos '10 deste século XXI. Para todos os que viram a mini-série de Tommy Lee Wallace, recordam que não tínhamos ali grandes elementos construídos através do que o avanço tecnológico permite levando a que o espectador se perca - ou pelo menos disperse - por tudo aquilo que de forma aleatória compõe o cenário desta longa-metragem, sendo assim obrigado a concentrar-se nos pequenos detalhes e num não tão simpático "Pennywise" de Tim Curry que aparecia de surpresa para tentar levar a sua próxima vítima. Aqui o espectador tende a dispersar pela criação de efeitos especiais que tornam todo o espaço e ambiente mais negro e num "Pennywise" brilhantemente caracterizado ao qual Bill Skarsgard dá vida e muita alma, mas cuja energia se concentram num assumidamente maléfico sorriso e num quase histerismo com que resolve atacar/surpreender as suas vítimas. Se o "Pennywise" de Skarsgard vence pelo referido sorriso que amedronta sem que ele se movimente... era aquele composto por Tim Curry o que realmente meteu medo a toda uma geração nascida nos anos 80. Skarsgard - que repito tem uma brilhante composição - amedronta pelo sorriso do mal... Curry amedrontava porque o seu palhaço nem sempre bem caracterizado, com as suas referidas falhas e um sorriso inicialmente convidativo dava lugar a um monstro que o espectador reconhecia ser capaz de recear. Se um é o sorriso do mal... o outro é o sorriso de um mal escondido, oportunista, meticuloso e até mesmo estratega que primeiro alicia e só depois é capaz de se revelar... eis o verdadeiro mal!
Dos traumas de uma adolescência que se avizinha no meio local onde todos aparentam pertencer a um planeta distante - afinal, em It não encontramos um único adulto que aparente ser normal ou pelo menos que não tenha preocupantes desvios psicológicos -, esta longa-metragem assume-se sim como uma interessante e estimulante reconstrução de época (cronológica e estival) e numa união - ainda que extremamente rápida - destes jovens que procuram não só um grupo de amigos como também aqueles com quem se possam identificar e escapar das pressões sociais externas que sentem serem cada vez mais uma constante... afinal, enquanto crianças ninguém espera nada deles... mas há medida que se tornam jovens adultos as responsabilidades começam a surgir quase que como uma obrigação que os persegue. Poderá "Pennywise" ser esse aproximar da idade adulta onde tudo perde o seu encanto e magia? Da direcção de fotografia de Chung-hoon Chung que capta a luz daqueles que deveriam ser os dias despreocupados de um conjunto de jovens ao lado negro (da força?!) onde todos os pesadelos ganham vida à caracterização e direcção artística que contribui de forma decisiva para a atmosfera negra que se pretende sentir, It destaca-se pela inevitável prestação de Skarsgard enquanto o demónio "Pennywise" - que percebemos ser uma constante ao longo da História bastando para isso procurar os detalhes - e pela premissa de que a história não fica assim... afinal nenhum mal morre de forma eterna... nenhum amor se deixa por cumprir... todos eles chegam à idade adulta e claro... todos terão de se reencontrar... mais não fosse pela óbvia pista lançada no final de It.
Dinâmico, com alguns momentos capazes de provocar os seus sustos e negro quanto baste, It não consegue superar a obra original de 1990 que cultivou e explorou o medo de cada um e fez o espectador pensar naqueles tempos de criança onde todo o mundo à sua volta apresentava perigos que foram (ou não) ultrapassados. Aqui, resta a expectativa da sequela... e a forma como este conseguirá (ou não) manter-se fresco junto do espectador que esperava um devido desfecho para "Pennywise" que não dure mais de um ano. Assim... It é competente... mas deixa a vontade de poder ter mais.
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7 / 10
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