O Jardim dos Caminhos que se Bifurcam de João Cristóvão Leitão é uma curta-metragem portuguesa experimental e uma das que se encontram presentes na selecção oficial da edição deste ano dos Caminhos do Cinema Português a decorrer em Coimbra até ao próximo dia 3 de Dezembro.
Partindo do conto homónimo de Jorge Luís Borges, esta curta-metragem é uma história que se desenvolve em três momentos contribuindo, cada um deles, para o desenrolar de uma única história comum às suas duas personagens.
Com a noção de labirinto onde se perdem Minotauro (Miguel Nunes) e Ícaro (Filipa Matta) sempre presente, O Jardim dos Caminhos que se Bifurcam é assim uma reflexão o momento em que ambos cruzam diferentes níveis de um mesmo espaço podendo, num seu futuro, cruzarem os seus caminhos passando assim a evoluir com um intuito próximo... e potencialmente comum.
O "Minotauro" assume-se como o fruto de um amor ilegítimo e, como tal, um monstro por natureza expondo à realidade - dos demais - os seus defeitos e deformações não como uma condição mas sim como o seu estado de existência normalizado - para si - percorrendo o tal labirinto como um ser diferente. Por sua vez, "Ícaro" é filho da perfeição que paga a sua "dívida" não por um crime seu mas pelo de seu pai que se julgou um deus ofendendo o Olimpo... Pelo crime foi, tal como o "Minotauro" condenado a uma existência errante pelo labirinto onde todos se perdem e ninguém encontra a saída.
Esta existência errante é acompanhada pelo espectador à medida que ambos observam o seu ambiente não natural tentando dele escapar e poder viver para lá das muralhas que a deformação (por um lado) e o orgulho (pelo outro) os condenaram. A imagem, sempre dividida em três segmentos, é como uma divisão temporal - a eterna prisão - que os coloca ao mesmo tempo a viver espaços e locais distintos sem nunca cruzarem os seus caminhos. Se um poderá ser o escape do outro então este... nunca irá chegar. Assim, numa constante observação do espaço no qual o tempo passa de forma diferente do que fora do labirinto, os caminhos não percorridos - e que se assumem como personagens importantes mais invisíveis - espreitam e observam a sua prisão cada vez mais cerrada naquele espaço que tanto tem de idílico como de prisão aberta sem grades ou correntes. Imóveis, face ao tempo bem como face à sua incerteza, tanto "Ícaro" como "Minotauro" são eternos prisioneiros da sua própria inactividade.
Sempre com uma construção que obriga o espectador a aplicar a visão como o seu sentido primordial mas também a audição como um importante elemento da captação de alguns elementos fundamentais, O Jardim dos Caminhos que se Bifurcam transforma a escolha das suas personagens naquela que o espectador deve tomar. Ou seja, ao observar os dois momentos distintos em que circulam as personagens, o espectador é também obrigado a optar pelo espaço de uma delas seguindo-a e tentando compreender quais as suas opções - se é que algumas - e a potencialidade de um encontro entre ambos num espaço que sendo comum os impede de percorrerem o mesmo caminho.
Mais filosófico do que dramático e assumidamente existencialista, O Jardim dos Caminhos que se Bifurcam é uma interessante curta experimental que precisa mais do que um visionamento para que as suas escolhas - e das suas personagens - sejam compreendidas e para que todas as palavras proferidas enquanto prisioneiros da mais exuberante prisão sejam retidas e captadas enquanto rendição a um espaço que faz desesperar controladamente até à total perda de sentidos.
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6 / 10
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