O Fim da Inocência de Joaquim Leitão é a mais recente longa-metragem do realizador de Adão e Eva (1995), Tentação (1997), Até Amanhã, Camaradas (2013) e o mais recente Índice Médio de Felicidade (2017).
Inês (Oksana Tkach) é uma jovem adolescente de uma família de classe média alta que com o despertar da sua sexualidade se vê envolvida nos meandros das redes sociais levando-a a um encontro com um homem mais velho que a viola. Numa espiral de violência e auto-destruição, Inês tenta recuperar de um mundo no qual se vê cada vez mais embrenhada e as consequências que daí podem advir resultarão determinantes para a sua posição de limbo entre dois mundos nos quais parece não se sentir inserida.
O argumento de Roberto Pereira baseado no romance de Francisco Salgueiro - que tal como é anunciado logo no início de O Fim da Inocência cimenta-se em factos verídicos - em duas interessantes vertentes exploradas... A primeira directamente relacionada com o tal despertar para a sexualidade de uma jovem "Inês" protegida de um mundo exterior por uma família mais controladora e de posses. No entanto, pela inevitabilidade das hormonas em pleno funcionamento, que esta jovem desperta para essa sexualidade da pior forma... Da pressão de pares aos meandros das redes sociais, das más experiências que desencadeiam todo uma "primeira vez" que se recorda como o pior de toda uma jovem vida, "Inês" é o protótipo humano de que nada é tão romanceado e embelezado como os "outros" fazem crer ou pior... nada pior do que forçar uma situação para a qual pode ainda não ter chegado o seu momento. Assim, o sexo, a droga e os comportamentos de risco começam a fazer parte da sua vida e cada vez mais insuficientes para satisfazer uma constante necessidade e dependência que a transformam não só numa pessoa diferente daquela que fora em tempos como principalmente alguém incapaz de se sentir satisfeita pela inevitabilidade de uma relação - não assumida - que a complete esquecendo assim a jovem sonhadora que em tempos fora.
No entanto, se esta perspectiva até valida o conteúdo desta história, é a segunda vertente com que o espectador pode olha para esta longa-metragem que, por momentos, pode prejudicar o seu conteúdo, nomeadamente pela breve impressão que é lançada ao misturar dois aparentes e distintos mundos... de um lado o de "Inês" onde o luxo e as "boas maneiras" povoam os jovens "Bernardo's" e "Mafalda's" deste universo e aos quais tudo é facultado... e por outro o mundo de "Ângelo", um jovem lá do bairro que até pode gostar de "Inês" mas que por ter nascido no lado errado da cidade é aqui apenas apresentado como alguém que trafica, que se mete por caminhos menos legais e que pouca importância dá à jovem com quem está não sendo, no entanto, devidamente explorada a potencial relação que aqui se tenta definir. No fundo, aquilo que é explorado nesta dinâmica acaba por ser uma forma polida de mostrar que temos "sexo, drogas e rock'n roll no bairro" ou, por outro lado, quando "este (bairro) se encontra com o condomínio privado".
Independentemente da perspectiva pela qual queiramos analisar O Fim da Inocência, temos um cinema assumidamente comercial que apela directamente ao espectador para uma história fluída - mesmo com as suas falhas - que aborda uma certa preocupante actualidade onde a promiscuidade e o "querer viver" se confundem perdendo os seus intervenientes toda uma liberdade de o experimentarem a seu devido tempo, ao mesmo tempo que se tenta equilibrar com uma mensagem social sobre a facilidade de ter o que se quer sem grande custo ou esforço graças a uma rápida influência das redes sociais e das comunicações massificadas que, para lá de todos os seus benefícios, aproximam muito daquilo que se quer distante... a mentira.
No final O Fim da Inocência expõe isso mesmo... o fim de uma juventude que se perde pelos efeitos nocivos de uma pressão de pares, ou até mesmo bullying, que suscita nos mais frágeis a necessidade de se integrarem num mundo para o qual não estão preparados mas que (para eles) os poderá deixar bem "colocados" no mundo dos seus supostos amigos ao experimentarem tudo, e até mesmo todos, sendo levados para um conjunto de experiências alternativas que são transformadoras e não pelos melhores motivos.
O realizador Joaquim Leitão vai seguro com esta sua nova longa-metragem e, ainda que com alguns toques de condomínio privado versus bairro, distancia-se do trágico Sei Lá (2014) apresentando uma história que sim... até tem um conteúdo actual e pode ser o espelho de uma certa juventude irrequieta que pela vontade de viver a vida muito depressa pode, por sua vez, conseguir terminá-la da pior forma. O Fim da Inocência consegue ainda a proeza de reunir um conjunto de jovens actores portugueses saídos de uma geração "Morangos com Açúcar" - diga-se o que se disser, as portas que a referida série abriu para toda uma nova geração de actores que, tendo ou não passado pela mesma, reflectem as suas marcas foi positiva - entre os quais se destaca a jovem actriz ucraniana Oksana Tkach que com a sua "Inês" consegue uma primeira interpretação protagonista inspirada e bem construída sem esquecer, claro, a presença de uma Sofia Alves desaparecida do grande ecrã há mais de uma década.
O Fim da Inocência não será o filme maior de Joaquim Leitão... Por aqui esse ficará reservado para Até Amanhã, Camaradas ou mesmo Inferno (1999) mas, ainda assim, esta sua mais recente longa-metragem será certamente uma das mais interessantes dos últimos anos e um interessante exemplar de como o cinema nacional pode, também ele, perder a vergonha e assumir-se sem pudor como uma obra comercial e directamente direccionada para o grande público.
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"Inês: A única forma de realizar os sonhos é acordar."
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7 / 10
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