segunda-feira, 18 de maio de 2020

2º Dto. (2020)

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2º Dto. de Hernâni Duarte Maria e Pedro Noel da Luz (Portugal) é a única curta-metragem portuguesa presente nesta edição do Trapped Film Festival e que revela a história de Vera e o seu regresso à sua antiga casa onde para lá dos seus pesadelos também alguém a espera.
De imediato é compreendido pelo espectador que esta casa, aparentemente abandonada, é o refúgio de algo desconhecido. Observamos objectos dispersos e uma desarrumação que apenas uma casa com uma "alma" própria poderia revelar ou será que não estamos perante uma "casa" qualquer. À medida que conhecemos o espaço em que se encontram as nossas personagens, reparamos também em pequenos detalhes que a casa esconde. De sombras que ocultam parte do cenário a uma aparente ausência de reentrâncias que permitam a luz exterior e que, em boa medida, condicionam a compreensão do espaço num todo.
Lentamente encontramos brinquedos e breves espaços que parecem fazer despertar a memória de um passado mais ou menos presente. As sombras desvanecem e confirmam-se enquanto a viagem pela casa prossegue. Proferem-se nomes que o espectador apenas pode confirmar com as suas próprias suspeitas sobre quem serão não tendo, para além das mesmas, qualquer outro indício significativo que o possa esclarecer sobre estas identidades... quando ali terão estado ou, por outro lado, que papel terão desempenhado nas memórias daquelas que, agora, os chamam e recordam. Assim, e numa casa que parece enclausurar todas as memórias de um passado que aquelas almas insistem ou não podem reconhecer, persistem os ecos da memória e de um passado vivido e deixado numa distância que apenas faculta uma miragem e não uma confirmação. Os anos passam - passaram - e disso temos uma confirmação pelos parcos diálogos que nos chegam das intervenções das duas personagens e, com eles, todo um latente esquecimento que se compreendem por um comportamento que as leva a vaguear por aquele espaço que não só parece diminuto como, ao mesmo tempo, um próprio resquício de uma memória pouco clara que o tempo ainda não apagou.
Visualmente cativante através de uma direcção de fotografia de Pedro Noel da Luz que recupera o melhor de um terror retro que coloca os espectador nos meandros de corredores que dificilmente se compreendem como aqueles de uma casa ou de uma mente. Este 2º Dto. permite assim diversas leituras sobre os meandros deste "apartamento" que esconde mais do que revela e que oferece, dessa forma, a possibilidade do espectador olhar para o mesmo como uma história dita "real" onde acontece de facto esta realidade a estas personagens ainda existentes no universo dos vivos como, ao mesmo tempo, permite a leitura de estes mesmos já não pertencerem a "este reino", e que mais não são agora do que meros fantasmas em busca de um significado para o local em que se encontram e no mesmo reter um sentido para uma existência que está basicamente num limbo entre dois espaços.
Não conseguindo necessariamente criar terror através das interpretações - que não deixam de ser de qualidade -, mas sim pelos actos que o argumento assim lhe permite, 2º Dto., poderia abrir a porta - ironia à parte - para uma obra mais alongada e onde se explorem estas dúvidas existenciais - nossas face às personagens - transformando-se dessa forma num interessante conto que oscilaria entre o terror psicológico ou, talvez, aquele tido num mundo "mais além" e, possivelmente, criando mais questões do que aquelas que já agora nos deixou.

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7 / 10

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