segunda-feira, 1 de dezembro de 2014

Animal (2005)

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Animal de Roselyne Bosch é uma longa-metragem de co-produção luso-franco-britânica e vencedora de dois troféus no Fantasporto - Festival Internacional de Cinema Fantástico do Porto em 2006 que remete o espectador para um local indeterminado - Lisboa - na Europa do futuro onde Thomas (Andreas Wilson) se dedica ao estudo da violência e tenta criar uma fórmula que a elimine do comportamento humano.
Contra todos os riscos decide validar a sua tese testando a sua fórmula numa cobaia humana... Vincent Iparrak (Diogo Infante) um assassino em série é o alvo escolhido e Thomas espera comprovar que modificando os genes... se modificam os comportamentos humanos.
Com um argumento da realizadora Roselyne Bosch - um dos troféus do Fantasporto - Animal elabora a interessante premissa de que a violência pode ser irradicada tal como qualquer doença a que o Homem esteja sujeito. No entanto, será o tal gene que a fomenta capaz de ser desenvolvido noutro Homem? Numa Lisboa - não identificada - futurista, o espectador revisita locais que lhe são familiares como o Parque das Nações, o Oceanário, Gare do Oriente e a Ponte Vasco da Gama que denotam esse ambiente futurista sem que, no entanto, se retire a ligação que se tem com os mesmos e vagueia por uma história que se quer "possível" nesse mesmo futuro.
O protagonista interpretado por Andreas Wilson é um homem marcado por uma tragédia pessoal relacionada com a sua irmã e pela imagem de um criminoso que a molestou - o "Vincent" de Diogo Infante - pretendendo portanto pôr em prática a teoria de que o comportamento humano pode ser moldado e alterado criando uma potencial sociedade perfeita onde o crime seja irradicado. Se a problemática da alteração genética e, como tal, comportamental são por si temáticas complexas e fracturantes, Animal expõe aqui a hipótese destes testes serem efectuados em cidadãos no corredor da morte - uma Europa futurista o suficiente para que a pena de morte esteja de novo "no activo" - como que de uma sociedade já marcada por diversas transformações onde foi necessária a imposição de uma pena pesada para quebrar uma qualquer violência extrema ocorrida no passado. Se inicialmente pensamos que a atmosfera geográfica e física desta nova Europa não é assim tão distante daquela que temos, pequenos grandes factores vão sendo apresentados que nos comprovam exactamente o contrário.
A dinâmica entre o "Thomas" de Wilson e o "Vincent" de Infante são possivelmente dos elementos mais enigmáticos e interessantes de Animal. Existe uma química que transcende os breves momentos em que se cruzam (ou pelo menos aqueles a que o espectador teve acesso), fazendo perceber que os dois homens desejam aquilo que o outro é. Se "Thomas" pretende ser alguém mais viril, respeitado (temido?) e capaz de fazer o impossível, "Vincent" parece seduzido com a capacidade de não fazer mal uma vez exposto à "cura" milagrosa proposta e provada pelo cientista comprovando que provavelmente... esta alteração genética e, como tal, comportamental afinal conseguiu comprovar os seus propósitos. A química entre os dois assume-se quase como que familiar... uma relação imposta pela simples existência e não algo que tenha sido fomentado pela mútua dependência que os levou a achar conveniente e proveitoso estarem próximos. Se Andreas Wilson tem uma interpretação que vai seduzindo com o crescendo e modificação a que o próprio se sujeita passando de um tipo apático e demasiadamente concentrado nos seus estudos e experiências a alguém indiferente e convencido de que se impõe pela força é, no entanto, Diogo Infante que tem a personagem mais cativante de Animal ao encarnar o tal psicopata violento e assassino que um dia o obrigam a descobrir a "luz" e uma certa pureza até então desconhecidas.
Se estas duas interpretações juntamente com a premissa do seu argumento são os elementos mais fortes de Animal, seria injusto não referir a direcção de fotografia de Tetsuo Nagata que transforma todos os elementos reconhecíveis da cidade de Lisboa em componentes modernas de uma cidade desconhecida e desse tal futuro incerto e conferem a esta longa-metragem uma certa dinâmica fria e distante onde os cidadãos existem mas como meros acessórios de uma sociedade que não se consegue definir na totalidade. Lisboa está presente e conseguimos percebê-lo mas, ao mesmo tempo, é uma cidade que desconhecemos na sua totalidade graças a este esvaziamento de alma que tanto a caracteriza.
No entanto, se Animal consegue atingir a excelência nestes aspectos já mencionados - premissa, interpretações e fotografia -, como um todo a Roselyne Bosch deixou esta longa-metragem perder alguma da sua dinâmica graças à história sentimental que tenta fazer recriar - sem grande êxito a meu ver - esquecendo a relação que de facto funcionava - a de "Thomas" com "Vincent" - ou até mesmo dar corpo ao elemento primordial que ligava tanto médico como assassino, distante de qualquer relação cientista versus cobaia mas sim uma em que o primeiro foi uma das vítimas (por associação) dos traços psicopatas que agora tanto tenta eliminar no seu "paciente".
De interessante e inovador - principalmente se equacionarmos que não é um estilo de cinema muito comum na cinematografia portuguesa - a uma obra que se deixou levar pelas suas pretensas aspirações, Animal é tecnicamente competente mas o seu argumento e respectivas ambições, deixaram-se levar por caminhos dos quais dificilmente se conseguiria sair sem cair no banal ou já (re)conhecido, descaracterizando o essencial e perdendo um pouco da tal "alma" que lhe poderia ter conferido sendo, ainda assim, um filme que vale a pena ser visto pela tal inovação que inicialmente defende.
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5 / 10
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