Lado Nenhum de Rui António é uma curta-metragem portuguesa de ficção que esteve em competição no Shortcutz Xpress Viseu e que nos conta uma história que podemos considerar actual.
Mãe (Mariema) e filho (Pedro Barbeitos) vagueiam pelas ruas de Lisboa. Aos poucos percebemos que não têm que comer ou lugar para viver transportando as suas poucas posses à medida que caminham.
Num mundo em transformação que surpreende nem sempre pelos melhores motivos, conseguirá esta família sobreviver a todos os desafios com que são confrontados?
O argumento de Rui António e Afonso Cruz apresenta-nos a difícil e quase sempre escondida realidade de uma sociedade moderna, falida e em declínio onde tudo o que interessa é parecer "normal" aos olhos daqueles que (nos) observam. As aparências de uma vida plena e de sucesso onde as posses monetárias definem aquilo que cada um é fazem de Lado Nenhum um triste mas real retrato de um Portugal - aplicável a qualquer outro espaço - actual. Triste e pesaroso que se sustenta com a imagem de um período mais farto mas igualmente imaginado, seguimos então a vida destas duas pessoas que recordam agora os seus bons momentos onde pouco (ou nada) possuem passando pela vida, pelas ruas, pelas memórias apenas com o intuito de sobreviver e manter uma dignidade (ou aparência) que também faz parte desse conjunto de memórias.
No entanto é também este argumento que faz um interessante reparo sobre as pessoas que, tendo ou não algum objectivo aparente, parecem vaguear pelas ruas, pelos espaços e pelos seus afazeres como autómatos habituados a uma rotina que pouco lhes irá proporcionar para além da ilusão de ter "algo". O hábito, esse malfadado estado que condiciona tudo e todos àquilo que lhes é apresentado. Se é bom a isso se habituam... se é mau, o destino será o mesmo. Habituamo-nos facilmente ao que nos é colocado no caminho, por vezes sem tentar contrariar, pois temos como garantido que aquele é o nosso destino... o nosso fado; o fim de um percurso que poderá - ou não - mudar mas que naquele dado momento é a certeza inabalável. Comer lixo ou roubar, mendigar e enganar... a tudo se habituam sem questionar.
No final, a última e talvez mais importante mensagem de Lado Nenhum - que se insere na já referida corrente cinematográfica que tem como base a actual crise financeira/social - é a forte necessidade que tem em demonstrar que o importante é sobreviver mesmo que, para tal, seja necessário recorrer a todos as fórmulas - mais ou menos prestigiantes - para o conseguir.
Interessante é a química entre Pedro Barbeitos e Mariema enquanto mãe e filho abandonados à sua própria sorte numa idade em que esta já não se irá fazer notar, e principalmente a fria e algo calculista interpretação desta veterana actriz que - felizmente - não está esquecida com uma interpretação enquanto uma mulher disposta a tudo (mesmo tudo) para poder vencer numa vida que faz questão de lhe mostrar que se esqueceu dela retirando-lhe todos os confortos que durante anos lhe conferiu.
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"Filho: As pessoas são como os planetas... parece que vão a algum lado mas só andam às voltas."
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8 / 10
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