.
Après l'Orage de Brice Veneziano (França) é mais uma das curtas-metragens presentes na competição oficial Internacional da décima-terceira edição do Festival Internacional de Cine de Piélagos a decorrer na Cantábria, em Espanha até ao próximo dia 20 de Maio.
Depois de mais uma discussão com o pai, Enzo (Raphaël Géron) sai de casa e vai passear com o amigo Arthur (Sidney Kheddam). É quando decidem atirar a bola de futebol aos carros que passam provocando um acidente que os passageiros do mesmo atacam violentamente Arthur enquanto Enzo escuta escondido e se prepara para o mais violento confronto de todos com Marco (Sagamore Stévenin), o seu pai.
A tensão entre "Enzo" e "Marco" surge desde cedo nesta narrativa para que o espectador a compreenda como o foco principal de tudo o que poderá estar por acontecer. Mais, os instantes iniciais denunciam de imediato a falta de qualquer amabilidade ou afecto entre pai e filho ao ponto de podermos até considerar que para lá de indiferença, existe sim um ódio quase inexplicável entre ambos. Mas, quando atentamos aos comportamentos e ao ambiente que existe por entre aquelas quatro paredes, não se torna muito complicado de identificar o que realmente está em falta naquele que outrora fora um lar. A ausência de uma mãe que o espectador identifica como recentemente falecida, foi o incontrolável elemento que abanou as estruturas daquela casa e, sobretudo, a tensa relação que agora se faz sentir entre um pai e um filho cada vez mais distantes. Se por um lado compreendemos que "Marco" é alguém mais rígido dentro daquela casa - eventualmente sempre o fora -, muito também graças à sua profissão enquanto agente da autoridade, não será também incorrecto afirmar que foi esse súbito desaparecimento da mulher que o levou a um consequente afastamento do filho que, em boa medida, representa o único elemento da sua presença ali. Então coloca-se a grande questão de... como agir agora perante alguém que o faz recordar o que já não tem?! Aliás, reveladora é a postura de "Marco" perante a revolta do pai de "Arthur" quando descobre que ambas as crianças estavam juntas quanto "Enzo" escapou â agressão dos automobilistas deixando o amigo para trás... "Marco" observa tudo à distância... a violência sobre o seu filho parece não o afectar... aliás, estará ele a permitir que o filho seja sancionado de uma forma que o próprio se sente incapaz de fazer?
Por sua vez "Enzo" entra numa espiral de perda. Uma criança que se viu sem o seu mais forte alicerce na figura da mãe, agora desaparecida e que o "deixou" com um pai relativamente ausente devido à sua profissão. "Enzo" perdeu, e perdeu-se, num rumo que não se consegue adivinhar qual o fim mas que se compreende pela mágoa e angústia de uma criança que não sabe como reagir a esta sua nova realidade. Incapaz de manifestar a sua solidão e tristeza junto de um pai que também não consegue demonstrar-lhe afecto ou amparo, o jovem vive nas suas pequenas fugas com o seu melhor amigo a única possibilidade que tem de encarar mais um dia onde já nada tem para perder a não ser, eventualmente, o que lhe resta da sua inocência. Os dois amigos, de forma inconsequente ou até impensada, limitam-se a deambular pela realidade de uma pequena vila do interior onde o mundo teima em não passar e o tempo abrandou sucessivas vezes deixando-as de braço dado com uma constante lembrança do que se perdeu.
É então que, neste ambiente de perda, distância e até mesmo alguma violência que começa por ser psicológica (em casa) e física (na sobrevivência sobre aquilo que está para lá das suas quatro paredes) que os dois protagonistas sobrevivem (ou tentam...), desconhecendo o dia de amanhã ou o que o futuro lhes poderá ainda reservar... um ainda mais distanciamento? Um ódio crescente? O encontrarem no "outro" o motivo da sua perda? Existirá alguma hipótese de redenção? Uma compreensão de que são, um para o outro, o único alento que agora têm?! Depois da trovoada, numa tradução literal mas que é principalmente figurativa do estado de espírito e de alma daquelas duas personagens, remete-nos sobretudo para a necessidade - ou tentativa... - de compreender que depois desta perda e da sua respectiva aceitação, existe algo mais. Algo mais que o espectador desconhece, nem tão pouco precisa de o saber, mas que os momentos finais entre os dois protagonistas poderá abrir caminho para esse rumo esperado entre ambos. Existirá algo melhor? Esperamos e desejamos que sim mas, no entanto, não nos compete saber e deixá-los sim no seu próprio espaço trabalhar essa redenção e esse aceitar de que agora só ali estão os dois... um para o outro... entregues a um destino desconhecido mas que é, até prova em contrário, o único que agora têm e que necessitam de lhe conferir estima, dedicação e afecto... tudo aquilo que até àquele exacto momento lhes tem faltado. O futuro poderá ser melhor... mas nós, espectadores, nunca o saberemos... apenas o podemos equacionar enquanto tal. E isso basta-nos.
Dotado de uma belíssima direcção de fotografia que com a sua oscilação e ausências de luzes e cores nos faz transportar para as diferentes dinâmicas psicológicas das duas personagens principais, são sobretudo as duas interpretações protagonistas de Géron e Stévenin que fazem criar luz nesta curta-metragem que para lá de uma história de redenção entre um pai e um filho que há muito que não se olhavam ou comunicavam está sim um conto sobre o crescimento forçado de duas figuras que, independentemente da sua idade, tinham deixado de avançar no tempo sem que, no entanto, este alguma vez tivesse parado.
.Depois de mais uma discussão com o pai, Enzo (Raphaël Géron) sai de casa e vai passear com o amigo Arthur (Sidney Kheddam). É quando decidem atirar a bola de futebol aos carros que passam provocando um acidente que os passageiros do mesmo atacam violentamente Arthur enquanto Enzo escuta escondido e se prepara para o mais violento confronto de todos com Marco (Sagamore Stévenin), o seu pai.
A tensão entre "Enzo" e "Marco" surge desde cedo nesta narrativa para que o espectador a compreenda como o foco principal de tudo o que poderá estar por acontecer. Mais, os instantes iniciais denunciam de imediato a falta de qualquer amabilidade ou afecto entre pai e filho ao ponto de podermos até considerar que para lá de indiferença, existe sim um ódio quase inexplicável entre ambos. Mas, quando atentamos aos comportamentos e ao ambiente que existe por entre aquelas quatro paredes, não se torna muito complicado de identificar o que realmente está em falta naquele que outrora fora um lar. A ausência de uma mãe que o espectador identifica como recentemente falecida, foi o incontrolável elemento que abanou as estruturas daquela casa e, sobretudo, a tensa relação que agora se faz sentir entre um pai e um filho cada vez mais distantes. Se por um lado compreendemos que "Marco" é alguém mais rígido dentro daquela casa - eventualmente sempre o fora -, muito também graças à sua profissão enquanto agente da autoridade, não será também incorrecto afirmar que foi esse súbito desaparecimento da mulher que o levou a um consequente afastamento do filho que, em boa medida, representa o único elemento da sua presença ali. Então coloca-se a grande questão de... como agir agora perante alguém que o faz recordar o que já não tem?! Aliás, reveladora é a postura de "Marco" perante a revolta do pai de "Arthur" quando descobre que ambas as crianças estavam juntas quanto "Enzo" escapou â agressão dos automobilistas deixando o amigo para trás... "Marco" observa tudo à distância... a violência sobre o seu filho parece não o afectar... aliás, estará ele a permitir que o filho seja sancionado de uma forma que o próprio se sente incapaz de fazer?
Por sua vez "Enzo" entra numa espiral de perda. Uma criança que se viu sem o seu mais forte alicerce na figura da mãe, agora desaparecida e que o "deixou" com um pai relativamente ausente devido à sua profissão. "Enzo" perdeu, e perdeu-se, num rumo que não se consegue adivinhar qual o fim mas que se compreende pela mágoa e angústia de uma criança que não sabe como reagir a esta sua nova realidade. Incapaz de manifestar a sua solidão e tristeza junto de um pai que também não consegue demonstrar-lhe afecto ou amparo, o jovem vive nas suas pequenas fugas com o seu melhor amigo a única possibilidade que tem de encarar mais um dia onde já nada tem para perder a não ser, eventualmente, o que lhe resta da sua inocência. Os dois amigos, de forma inconsequente ou até impensada, limitam-se a deambular pela realidade de uma pequena vila do interior onde o mundo teima em não passar e o tempo abrandou sucessivas vezes deixando-as de braço dado com uma constante lembrança do que se perdeu.
É então que, neste ambiente de perda, distância e até mesmo alguma violência que começa por ser psicológica (em casa) e física (na sobrevivência sobre aquilo que está para lá das suas quatro paredes) que os dois protagonistas sobrevivem (ou tentam...), desconhecendo o dia de amanhã ou o que o futuro lhes poderá ainda reservar... um ainda mais distanciamento? Um ódio crescente? O encontrarem no "outro" o motivo da sua perda? Existirá alguma hipótese de redenção? Uma compreensão de que são, um para o outro, o único alento que agora têm?! Depois da trovoada, numa tradução literal mas que é principalmente figurativa do estado de espírito e de alma daquelas duas personagens, remete-nos sobretudo para a necessidade - ou tentativa... - de compreender que depois desta perda e da sua respectiva aceitação, existe algo mais. Algo mais que o espectador desconhece, nem tão pouco precisa de o saber, mas que os momentos finais entre os dois protagonistas poderá abrir caminho para esse rumo esperado entre ambos. Existirá algo melhor? Esperamos e desejamos que sim mas, no entanto, não nos compete saber e deixá-los sim no seu próprio espaço trabalhar essa redenção e esse aceitar de que agora só ali estão os dois... um para o outro... entregues a um destino desconhecido mas que é, até prova em contrário, o único que agora têm e que necessitam de lhe conferir estima, dedicação e afecto... tudo aquilo que até àquele exacto momento lhes tem faltado. O futuro poderá ser melhor... mas nós, espectadores, nunca o saberemos... apenas o podemos equacionar enquanto tal. E isso basta-nos.
Dotado de uma belíssima direcção de fotografia que com a sua oscilação e ausências de luzes e cores nos faz transportar para as diferentes dinâmicas psicológicas das duas personagens principais, são sobretudo as duas interpretações protagonistas de Géron e Stévenin que fazem criar luz nesta curta-metragem que para lá de uma história de redenção entre um pai e um filho que há muito que não se olhavam ou comunicavam está sim um conto sobre o crescimento forçado de duas figuras que, independentemente da sua idade, tinham deixado de avançar no tempo sem que, no entanto, este alguma vez tivesse parado.
8 / 10
..
Sem comentários:
Enviar um comentário