segunda-feira, 2 de abril de 2012

E Amanhã... (2011)

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E Amanhã... de Bruno Cativo é a primeira longa-metragem deste realizador, e que também assina o argumento, que a efectuou sem qualquer apoio institucional e que teve a sua estreia no Cineclube de Telheiras.
Miguel (Pedro Barroso) é um jovem para quem os bens materiais pouco significado têm. Maria (Diana Nicolau) é a sua namorada e para quem estas mesmas posses e a vontade de alcançar fama e sucesso muito representam. Considerando os seus diferentes objectivos de vida e os desencontros que a sua relação acaba por ter, Miguel desaparece deixando tudo e todos para trás. Passam três anos em que não se sabe nada dele até ao dia em que resolve finalmente aparecer. Será o seu reencontro bem sucedido?
Confesso que inicialmente saí algo dividido da projecção deste filme. Foi só depois a pensar nele, e muito também à medida que me preparo para escrever este comentário que finalmente reflito sobre alguns aspectos que me levaram a essa divisão.
Primeiramente o facto de uma primeira metade do filme que se debruçava essencialmente sobre a personagem interpretada por Pedro Barroso e sobre a sua descida a um estado mental de total libertação do seu próprio espaço e dos seus bens ser excessivamente longa. No entanto, ao mesmo tempo que a considerei longa não pensei que era com base nesta sua personagem que todo o filme acabaria por se desenvolver. Sendo este "Miguel" a personagem central de toda a história e aquela que tem uma maior transformação quer em si quer em relação aos demais com quem interagia acaba por fazer todo o sentido o maior destaque que lhe é dado.
E bem. Pedro Barroso que estamos normalmente habituados a ver em produções televisivas e maioritariamente telenovelas, tem aqui uma sólida interpretação em cinema e num filme que é quase um "one-man show". É dele que escutamos as maiores reflexões sobre a vida, o amor e quem, quase sem diálogos durante todo o filme, consegue transmitir um profundo vazio de alma que o consome aos poucos. Primeiro pela falta de retribuição no amor de "Maria" que o leva a abandonar tudo e desaparecer, e finalmente quando entra literalmente numa espiral de decadência que o leva a uma vida de sem-abrigo.
Já para com Diana Nicolau tenho uma sensação ambivalente. Se inicialmente tem uma interpretação com quem não se consegue criar qualquer tipo de empatia, é também certo que já perto do final a sua veia mais cómica consegue consquistar qualquer um pelo uso de um diálogo sarcástico e irónico. Aqui, sem dúvida, vence.
Destaco ainda a participação especial de um João Perry que, quase irreconhecível, dá o ar de sua graça como o mendigo com quem "Miguel" consegue finalmente dialogar.
Se por um lado gostei da ideia de transformar o filme como se de um livro se tratasse, onde ouvimos uma narração à medida que as imagens percorrem o ecrã, muito como se fosse a nossa própria mente a ler o que os nossos olhos vêem, por um lado algo que me desconcertou um pouco a atenção foi a constante presença, em praticamente todos os momentos, da banda-sonora. Acabamos por, a certo ponto, não dar a devida importância aos sons que compõem a tela por já a termos relegado para um segundo plano quase "sem importância". Aspecto este que também se salva após a segunda metade do filme onde se torna quase impossível não a reconhecermos novamente devido à sua emotividade entrar num crescendo apenas comparável às vivências das próprias personagens.
Destaco ainda como um factor positivo a caracterização que tanto Pedro Barroso como João Perry têm nos momentos em que retratam dois sem-abrigo. No casso de Perry, como já referi, torna-o quase irreconhecível. Quanto a Pedro Barroso, e como o próprio admitiu numa breve conversa aos espectadores, o trabalho de investigação e preparação para o filme a isso o levou.
Finalmente um aspecto menos positivo, não pelo filme mas sim pelas condições em que a projecção foi feita, foi a impossibilidade de apreciar todo o trabalho de fotografia que, tal como podemos constatar no trailer que aqui também deixo, nos revela. Os tons ora esbatidos ora vivos fruto de uma memória agradável que "Miguel" tinha do seu passado, parecem-me ser elementos positivos, e muito bem conseguidos, neste filme.
Finalmente, e voltando a um aspecto que referi no início, considerando que esta é a primeira longa-metragem do realizador Bruno Cativo, onde consegue criar uma história inicialmente complexa mas que consegue levar a um bom porto, mostram a capacidade e qualidade do seu trabalho que, espero, possa vir a dar ainda maiores e melhores frutos no futuro. Bruno Cativo, tal como muitos dos realizadores de uma nova vaga que parece firmar-se no panorama cinematográfico português, mostra com esta sua longa-metragem ter ainda muito que contar. E assim o espero.
Espero também que esta sua longa-metragem possa vir a ter algum tipo de distribuição em Portugal e que não se limite apenas aos circuitos de festivais de cinema, ficando assim mais perto dos espectadores.
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7 / 10
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