Uma Senhora Herança de Israel Horovitz é uma longa-metragem estreada logo no início deste recente ano que tem nos seus três protagonistas um aliciante imediato, ou seja, Maggie Smith, Kristin Scott-Thomas e Kevon Kline numa história que decorre na cidade de Paris.
Mathias Gold (Kline) chega a Paris sabendo que herdou um apartamento do seu recentemente falecido pai. Quando chega ao espaço percebe que detém uma pequena fortuna no centro da cidade e é recebido por Mathilde Girard (Smith) que lhe explica que a sua herança não é assim tão grande quanto pensa tendo, aliás, de a sustentar enquanto fôr viva.
Quando tudo parece estar finalmente no fundo, Mathias conhece Chloé (Scott-Thomas), a rude filha de Mathilde ao mesmo tempo que descobre todas as justificações do seu triste e cruel passado.
As expectativas para este filme de Horovitz eram, assumidamente, grandes. Não só pelo seu insuspeito elenco como também pela história de redenção e de "novo início" que aparentava ter para pelo menos uma das suas personagens. Se a isto juntarmos uma história que tem a cidade de Paris como pano de fundo - onde mesmo não sendo um dos elementos fundamentais desta história que poderia decorrer em qualquer outra cidade do mundo - só poderia esperar um daqueles filmes que iriam certamente ficar na memória durante muito tempo.
Se tudo isto tem, no fundo, um pouco de verdade, não é menos certeiro que My Old Lady prima por um conjunto de momentos que tendo a sua interligação deixam, no entanto, sempre uma sabor a pouco, isto é, conhecendo as "misérias" das personagens em questão sente-se que todo o reconhecido potencial dramática das mesmas e dos actores que lhes dão corpo não está presente na sua totalidade e basta para tal lembrarmo-nos de outros desempenhos dos mesmos.
Não seria difícil estabelecer uma imediata empatia com "Mathias Gold", personagem interpretada por Kline, não só pelo seu aparentemente trágico passado que aos poucos vamos conhecendo, mas também pela expressividade de desgaste e de busca incessante por um dia melhor que Kline transparece com cada olhar. O mesmo olhar que nos revela que aos poucos se sente a voltar ao mesmo abismo de onde recentemente saíra e que agora lhe "sorri" como quem diz que de lá nunca havia saído. "Mathias" é um alcoólico recuperado, fruto de um distanciamento do pai e de uma mãe que se suicidara nos seus braços. A sua história de fracos e escassos elos de ligação com outro ser humano são assombrados com as descobertas parisienses da vida extra-matrimonial do seu pai que, ao mesmo tempo, explicam todo o passado solitário que viveu. E a emoção contida no seu olhar rapidamente iria explodir em todos os desabafos que o retorno ao alcoól poderiam potenciar. Kline, numa única palavra, é sublime.
Sublime é também a aspereza de Scott-Thomas como uma mulher desligada de relacionamentos - menos os extra-matrimoniais - que comprovam que está preparada para tudo mas sem qualquer tipo de compromisso ficando esses para os outros e mantendo-se ela como o "terceiro elemento". Aos poucos o espectador percebe também que a sua animosidade para relacionamentos sérios mais não são o do que o fruto daquilo que testemunhara toda a sua vida dentro da sua própria casa pelas mãos de "Mathilde", a sua mãe. Maggie Smith, de quem é dispensável fazer qualquer tipo de apresentação é, no entanto, a intérprete de quem se esperava um fundo maior, uma justificação silenciosa para a sua personagem, para o seu amor e para a vida que teve sendo que, no entanto, sente-se um distanciamento não só da sua personagem como principalmente desse mesmo amor que condicionou o saudável desenvolvimento de duas famílias... a sua e a de "Mathias".
No final acaba por ser este mesmo distanciamento da personagem de Smith para com os demais, mantendo-se quase exclusivamente como alguém que assiste aos desabafos e tristezas alheios, que falha na interligação das personagens, justificando apenas as suas acções com a sua própria falta - voluntária ou não - de conhecimento daquilo que os atormenta bem como sobre os seus difíceis crescimentos enquanto indivíduos. Se o ambiente pessoal e geográfico são magníficos para uma história que se quer tensa e com ligeiros apontamentos de comédia, não é menos verdade que o espectador se mantém num constante limbo que é apimentado com rudimentares elementos que rapidamente se desvanecem.
My Old Lady é assim um filme com um potencial não totalmente explorado mas, ao mesmo tempo, interessante pela tripla de actores - sem esquecer os apontamentos secundaríssimos de Noémie Lvovsky e Dominique Pinon que constituem ao mesmo tempo uma debilidade do filme - bem como pela ideia de uma potencial redenção que, não chegando às mãos das suas personagens dá, no entanto, lugar à descoberta de que o reconhecimento e a aceitação do trauma de infância são os únicos passos possíveis para alguém que pretende apenas seguir em frente com aquilo que resta da sua vida. Nas palavras de "Mathilde"... "precision is the key to a long life"... exactamente aquilo que aqui faltou... não aquela dos sentimentos das personagens mas sim a que poderia ter unido a dor de cada uma delas.
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"Mathias Gold: A perfect flower is nearly old."
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6 / 10
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