quinta-feira, 22 de setembro de 2016

Grandma (2015)

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Grandma de Paul Weitz é uma longa-metragem norte-americana que passou na secção Panorama desta vigésima edição do QueerLisboa - Festival Internacional de Cinema Queer que decorre no Cinema são Jorge, até ao próximo dia 24 de Setembro.
Depois de terminar o seu mais recente relacionamento, Elle (Lily Tomlin) recebe a visita de Sage (Julia Garner) a sua neta adolescente, que lhe revela precisar urgentemente de dinheiro.
A inesperada união destas duas mulheres leva-as a revisitar o passado de Elle enquanto, ao mesmo tempo, ambas estabelecem uma forte e cúmplice ligação fazendo-a abraçar um passado, até então, não lembrado.
A mais recente longa-metragem de Paul Weitz - na qual exerceu funções de produtor, realizador e argumentista - é o grande regresso em força de uma sempre espera Lily Tomlin (figura central de todo o filme), no papel de uma mulher de feitio algo complicado que se encontra num momento de viragem na sua vida. Viúva após a morte da sua companheira de toda uma vida, "Elle" (Tomlin) separa-se da sua mais recente relação com uma mulher mais nova que, segundo ela, não iria garantir-lhe mais do que uns breves momentos de prazer. Neste momento de viragem onde não mantém relações afectivas, de amizade ou mesmo familiares com uma filha que se mantém distante, "Elle" recebe uma jovem neta naquele que é - também ele - um momento da sua vida. Com poucas perspectivas de uma velhice mais descansada, "Elle" decide então encarregar-se da neta que acompanha e protege enquanto revisita todo o seu passado como esperança de poder saldar algumas dívidas... monetárias e sentimentais.
Dividido em seis breves capítulos, o argumento de Paul Weitz inicia a sua narrativa com a concretização de um final - 1."endings" - onde "Elle" encerra a mais recente etapa da sua vida que, por medo da entrega, da cumplicidade ou de voltar a perder o que mais estima, a levam a considerar que a (sua) solidão será mais reconfortante do que a imagem de um futuro incerto. A abrir com uma expressão reveladora de toda a dinâmica de Grandma, "Time passes. That's for sure", o espectador delicia-se com o comportamento irascível de uma mulher que se afirma pelo sua faceta dura e rude que oculta todos os sentimentos sentidos e ignorando a dor que acumula como uma penitência.
Com uma viagem pelo passado em busca do dinheiro perdido e esperado - 2."ink", 3."apes" e 4."The ogre" - são o tal caminho que será necessário percorrer pelos velhos amigos e espaços conhecidos que a poderão salvar de uma situação angustiante e necessariamente transformadora. De todos estes segmentos, e eventualmente de todo o filme, é "The Ogre" aquele que contém a maior carga dramática e emotiva, aquando da visita de "Elle" a "Karl" o seu ex-marido do qual fugiu durante uma noite quando compreendeu a sua verdadeira sexualidade. De uma recepção inicialmente amistosa ao remexer de um passado sofrido que o espectador compreende esconder mais do que um simples sorriso de um inesperado encontro, este segmento termina com o rancor de uma vida interrompida - literalmente - e com a mágoa que tornou duas pessoas aparentemente alegres em amargos e relativamente destruídos num íntimo desconhecido dos demais.
Do ressentimento de uma vida passada àquele tido para com uma filha ausente - 5."kids" -, Grandma revela a relação agreste de "Elle" com "Judy" (Marcia Gay Harden). Mãe e filha distantes pelo viver libertino de uma e o excesso de responsabilidade da outra, encontram agora a aproximação que lhes era necessitada graças a um evento da neta que recorre a uma avó que sente distante mas como o seu único recurso face a uma mãe austera. A morte separa... a morte une... é com base nesta premissa que se pode caracterizar a relação das duas mulheres... de mãe e de filha... e destas para com uma neta que, não sendo descurada é, no entanto, sentimentalmente negligenciada vivendo uma vida que é relativamente livre nos actos mas austera nas consequências encontrando, agora, na presença de uma avó que é assumidamente um poço de alguma sabedoria, irascível mas acolhedora, que as três mulheres acabam por encontrar todo o apoio - por confirmar - que necessitavam.
Finalmente o último segmento - 6."dragonflies" - de Grandma é como que uma reflexão da vida - passada e presente - onde "Elle" percebe finalmente que tem o seu lugar no mundo - e no mundo de alguém - estando, no entanto, solitária num percurso que fora, até então, percorrido a duas mãos e que agora terá de abraçar enquanto um caminho sim... mas o seu... livre e descomprometido, solitário mas com a certeza de que alguém a poderá e estará a esperar no seu final.
Eventualmente o filme mais quente e mais emotivo - à data - desta edição do QueerLisboa, Grandma é um triunfo não só para o realizador que aparentava não ter um filme do mesmo calibre desde o ido About a Boy (2003), mas também para Lily Tomlin que aqui encontra uma personagem à altura da sua qualidade interpretativa, entregando à sua "Elle" uma alma maior, uma personalidade única e um sentimento de um desespero controlado como manifestação face a um mundo que se transformou desde os tempos da sua juventude mais libertina - que nunca chegou a perder - e agora a encontra numa nova experiência mas, no entanto, com um olhar mais fechado e conservador que não faz jus à sua enorme vontade de viver nem tão pouco à sua (des)esperança sentida no(s) - e para com - demais.
Emotivo, divertido, sentido, reflexivo e com uma alma intensamente grande como a de Lily Tomlin, Grandma é aquele pequeno - em duração - grande filme que contém tudo aquilo que o espectador necessita para sair de uma sala de cinema com a percepção de que no final de um caminho tudo parece - estranhamente - terminar tal como devia garantindo a confirmação de uma vida bem vivida... independentemente dos seus percalços.
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"Elle Reid: You need to be able to say 'screw you' sometimes."
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8 / 10
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