Trindade de Diogo Simão é uma curta-metragem portuguesa de ficção que apresenta ao espectador três misteriosas personagens sentadas numa sala a confraternizar e falar sobre o mundo tal como o conhece(ra)m.
Pedro (André Canário), Valentina (Tânia Silva) e Jesus (Pedro Monteiro) conversam - sob o olhar atento de um barman (Diogo Simão) sobre a Humanidade. O passar dos anos e as suas atitudes perante uma Humanidade cada vez mais decadente ganham proporções que o espectador cedo irá descobrir.
Adriano Ferreira, Diogo Simão e Mariana Ramos criaram uma história onde três centenários vampiros conversam sobre o mundo e o Homem como instrumentos que, ao longo da sua existência, manobraram e utilizaram para o seu próprio prazer ou conveniência. Aos poucos torna-se perceptível para o espectador que os três mais não são do que vampiros que cruzaram os séculos tentando um conjunto de acções que primeiramente os aproximava desta Humanidade decadente mas que, aos poucos, os distanciou da mesma pela perversão dos actos e das mentalidades que lentamente se auto-destruíam. A Humanidade - dizem - está longe de merecer qualquer oportunidade de sobrevivência e, como tal, quem são eles para a lamentar ou celebrar..
No entanto, a postura dos três vampiros difere entre si. Enquanto "Valentina" se mostra uma oportuna ninfomaníaca que, juntamente com "Pedro", morde e transforma aqueles com quem se cruza pela sua própria conveniência surge, no entanto, um "Jesus" - não é coincidência - que se manifesta sempre do lado dessa mesma Humanidade que, segundo ele, merece sempre a oportunidade da redenção e da plena glorificação na Terra conferido pelo "pai ancestral". Se os dois primeiros desprezam o Bem e quem o pratica é este último que o tenta instalar e propagar sendo, no entanto, também ele um membro do sistema que ora se combate... ora se defende.
É então nos pequenos detalhes que Trindade cria pequenos apontamentos críticos - e de comédia - a esta "ordem" imposta pelo dito sobrenatural, ou seja, se a Santíssima Trindade - vampírica - age assim como o "Pai, Filho e Espírito Santo" que todos comanda e que a todos pretende difundir uma lógica de lei e moral não respeitada, é também o Trindade - hotel em que se reúnem - que se transforma no epicentro de uma conspiração que transcende o Homem e a Humanidade no seu todo. Enquanto uns tentam impôr essa ordem - por conveniência, convicção ou desdém - outro(s) esperam que, na realidade, toda a Humanidade se perca de vez e confirme as suas suspeitas de que a espécie dita humana comprove finalmente a sua génese e desmistifique toda a glória nela imposta por esse já referido "pai ancestral".
Com um argumento original e uma interessante abordagem ao tema das "origens" da Humanidade, do seu comportamento, poder de decisão e do seu potencial fim, Trindade cria um conjunto de interessantes personagens que reflectem assim não só um pouco dessa (des)Humanidade e, como tal, exibindo muito do "mal-estar" sentido no mundo como também deixa em aberto a presença de um silenciosamente curioso "Barman", atento aos comportamentos e intenções dos seus clientes... poderá ele ser o tal "Deus" disfarçado e resistente à intromissão no livre arbítrio dos seus "filhos"?!
Sendo um filme curto com uma abordagem bem delineada e original, Trindade deixa, no entanto, uma certa e séria curiosidade para um maior aprofundamento das intenções, e até destinos, da tríplice aliança, detentora de um poder não controlado e, dessa forma, influenciadores directos dos destinos do Homem... fica a vontade e gosto por um pouco mais desta não tão silenciosa trindade que espelha, no fundo, um pouco desta tão desgarrada Humanidade.
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6 / 10
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