quinta-feira, 24 de março de 2016

10 Cloverfield Lane (2016)

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10 Cloverfield Lane de Dan Trachtenberg é uma longa-metragem norte-americana que passaria despercebida do grande público não fosse o seu elegantemente editado trailer que nada revela suscitando, no entanto, uma enorme curiosidade e o seu título que remete o mais atento dos espectadores para a obra Cloverfield (2008), de Matt Reeves.
Aqui encontramos Michelle (Mary Elizabeth Winstead) que se encontra numa encruzilhada... Partir ou ficar para uma eventual relação e casamento com os quais parece não se identificar?
Depois de partir sem olhar para trás, Michelle vê-se envolvida num acidente de automóvel apenas para acordar algum tempo depois dentro de uma cave isolada e sem saber o que lhe aconteceu. Com ele estão Howard (John Goodman) e Emmett (John Gallagher Jr.) que afirmam que naquelas instalações estão seguros de um mundo "lá fora" que sofre as consequências de um ataque químico.
Num ambiente que se vai deteriorando lentamente, Michelle tem de fazer uma escolha... ficar ou tentar partir!
10 Cloverfield Lane e o dúbio argumento da autoria de Josh Campbell, Matthew Stuecken e Damien Chazelle - este último realizador e argumentista de Whiplash - remetem o espectador para um cenário diferente daquele que se espera se cruzarmos o seu título com o já referido de 2008. No fundo, se inicialmente se espera uma sequela ou prequela dos acontecimentos de devastaram a cidade de Nova York, a realidade é que aqui o que nos é apresentado enquanto espectadores é sim uma história de cativeiro, demência e sugestão que conquistam pela incerteza e por um aparente estado de loucura e alucinação que aos poucos vai tomando conta das suas personagens.
Quase sempre fiel a um comportamento de liberdade - ou libertação - a "Michelle" de Winstead afirma-se como uma mulher livre e de ideias fixas que, no entant, vive num permanente  conflito emocional. Se nos primeiros instantes a temos como uma mulher decidida a seguir um rumo mas que não esquece que está a deixar para trás todo um passado em comum com um "Ben" (voz de Bradley Cooper) que na prática nunca conhecemos, é também real que este comportamento a persegue aquando do seu cativeiro naquele misterioso e claustrofóbico bunker no qual se vê detida contra sua vontade. Numa constante incerteza, "Michelle" parece habituar-se àquele espaço tal como se habituou a uma relação da qual - aparentemente - não tinha tanta certeza se iria resultar, deixando passar a ideia de que apenas por "ali" se mantém por constituir uma segurança máxima de algo que pode estar "lá fora". Incerta sobre o que realmente deseja, as suas fugas ocasionais denotam alguma verve que pretende manter acesa e uma desconfiança latente no espaço que a rodeia.
No entanto são os seus dois companheiros de bunker que mais denotam um comportamento sintomático do clima em que vivem. "Emmett" é um tipo do campo, sem grandes experiências de vida ou confiança em si próprio, deixa-se levar - pelo que nos é revelado pelo próprio - por histórias de uma ameaça química que destruir o ar e a possibilidade de sobrevivência no exterior. No entanto, é o seu convívio com "Michelle" e o efeito de novidade que esta transporta que o fazem despertar lentamente para uma eventual "outra realidade" que desconhece. Mas é em "Howard" que reside o maior conflito não só entre as personagens como também por parte do espectador que nutre por ele sentimentos ambíguos e incertos nos quais residem, eventualmente, um dos pontos fortes deste argumento. Se inicialmente o espectador desconfia de imediato deste homem, pois afinal ele levou "Michelle" para aquele espaço de uma forma arbitrária e sem pedir o seu consentimento, provocando assim uma imediata repulsa por um potencial raptor, é também certo que aos poucos - e por entre alguns espasmos de violência - que "Howard" se revela como um tipo potencialmente pacato mas... desde que as suas regras sejam respeitadas. Domínio forçado graças a um mundo caótico ou simplesmente um potencial paranóico que detém duas pessoas contra sua vontade?
É nesta constante dualidade e incerteza que o espectador "vive" tentando perceber quem e quando irá despoletar o primeiro grito de liberdade mesmo num suposto mundo desfeito por um qualquer extermínio colectivo, no seio de um conjunto de personagens que percebem não só ter de conviver entre si como aprender a sobreviver a si próprios... Afinal, qualquer passo em falso pode determinar o final daquilo que conhecem como o que resta da Humanidade. E com esse medo - já denotado em "Michelle" -, os comportamentos de todos parecem aos poucos cair numa aparente rotina e numa repetição de hábitos que, por conformidade, aceitam sem questionar... Executam pequenas tarefas de manutenção de um pequeno espaço partilhado, comem, jogam, vêem televisão e conversam sem pensar no mundo que deixaram para trás.
Num misto de raptor e raptado - "Howard" e "Michelle" - com a presença (in)voluntária de uma visita - "Emmett" - 10 Cloverfield Lane instala uma constante dúvida sobre o que se passa "lá fora" e que só nos é revelado já bem perto do final da sua narrativa. Existirá ainda um mundo? Existirão as pessoas que anteriormente conhecemos? De que forma passa o tempo que - ao espectador - nunca é revelado? E principalmente... existirá uma escapatória de um espaço que parece tornar-se cada vez mais pequeno?
Sem qualquer relação temporal ou geográfica com Cloverfield, a longa-metragem de Dan Trachtenberg não será uma prequela ou sequela mas sim uma potencial linha temporal idêntica com acontecimentos que se desencadeiam - percebemos - um pouco por todo o mundo (ou pelo menos pelos Estados Unidos), e que dão a conhecer ao espectador que o planeta vive um conjunto de sérias alterações populacionais sem, no entanto, serem explicadas as questões base... como e porquê!
Ainda que competente no que diz respeito à sua capacidade de criar suspense, 10 Cloverfield Lane consegue ser interessante durante praticamente todo o segmento em que se estabelece e afirma como um potencial relato de cativeiro onde vítima(s) e raptor convivem mais ou menos alegremente desconfiando, no entanto, sempre das intenções dos seus companheiros. Pelo final, e dando uma continuidade de incerteza ao desfecho da sua personagem principal, assume-se como uma eventual porta aberta para aquilo que este género de filmes de melhor tem... a capacidade de se propagar sem final à vista mantendo o espectador num fio suspenso sem saber quando e como irá surgir a próxima "entrega" Cloverfield que poderá - ou não - trazer consigo algumas respostas.
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7 / 10
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