segunda-feira, 27 de outubro de 2014

Fury (2014)

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Fúria de David Ayer é uma longa-metragem norte-americana e o mais recente filme de Brad Pitt a estrear nas salas nacionais.
Alemanha, Abril de 1945. O país e o continente estão completamente devastados. A companhia de "Wardaddy" Collier (Pitt) composta por "Bible" Swan (Shia LaBeouf), "Gordo" Garcia (Michael Peña) e "Coon-Ass" Travis (Jon Bernthal) percorrem os campos de batalha desolados antes de receberem Normal Ellison (Logan Lerman) que os irá acompanhar a partir de então. Enquanto os quatro homens co-habitam no mesmo tanque tendo já testemunhado todos os horrores da guerra, o jovem Norman passou os poucos dias do conflito numa secretária sendo agora obrigado a vê-la em primeira mão.
A tensão dos quatro homens em relação a Norman cresce quando este parece não querer compreender o lugar e a situação em que se encontra. No entanto, quando o conflito chega até junto dos cinco homens, todos terão de compreender aqueles que têm a seu lado se querem ultrapassar e sobreviver ao conflito e a toda a sua devastação.
Com um argumento também ele da autoria de David Ayer, Fury é desde o primeiro instante um intenso relato sobre os últimos dias de uma guerra devastadora (como todas) e sobre os seus efeitos transformadores na mente daqueles que por ela passaram. Com um enfoque direccionado para valores de honra e de irmandade cimentados dentro de um espaço ínfimo onde todos conhecem tudo sobre todos - o tanque - esta longa-metragem é desde cedo o registo de um esgotamento físico e mental de um grupo de homens que vê o seu espaço subitamente "invadido" por um jovem adulto que nada viu ou conhece dos horrores de um conflito que eles testemunharam em primeira mão.
Enquanto os quatro homens que travaram algumas das mais duras batalhas e situações dos finais da Segunda Guerra Mundial tinham uma cumplicidade fundamentada nessa experiência colectiva, o jovem "Norman" (Lerman) surge como um inesperado humanitário que se recusa a participar ou pactuar - seja de que forma fôr - com os horrores que ali vai lentamente testemunhando. O conflito existente para lá do tanque em que se encontram é, também ele, transportado para o seu interior exacerbando as tensões que existem entre estes homens que não conseguem reconhecer em "Norman" o homem jovem e relativamente inocente que, em tempos, também eles já foram. Incapazes de reconhecer outro lar ou outra forma de estar que não aquela que encontraram em Fury - o tanque - a sua nova casa e local que tal como eles tudo testemunhou, os quatro exercem uma certa pressão sobre a voluntária inocência de um jovem que, no entanto, reconhecem ser puro e um pouco daquilo que eles foram. Não o desprezando mas sim chorando um pouco por aquilo que reconhecem ter perdido, "Norman" é, portanto, o homem que todos eles foram mas que se perdeu nos campos de batalha de uma Europa em ruínas.
A loucura é, também ela, sentida um pouco por todo o filme. Desde os caminhos percorridos por deslocados e sobreviventes de uma guerra que não conferiu diferenças entre ninguém, expatriando todos de igual forma, aos relatos de um horror vivido pelo grupo de norte-americanos aquando do desembarque na Normandia sem esquecer as pequenas tentativas de uma "vida normal" junto de duas alemãs que tentam também elas sobreviver ao impensável, Fury tem sempre na esperada humanidade de "Norman" o reflexo de uma convicção não confirmada de que se consegue sobreviver a um conflito nem que esta seja uma sobrevivência psicológica. No entanto, e como se comprova ao longo desta longa-metragem é que a morte chega de diversas formas; para uns ela chega sob uma perspectiva física onde o corpo se extingue enquanto que para outros essa mesma morte chega pela degradação psicológica e pelos horrores que o cérebro regista onde ninguém independentemente do seu local ou estatuto consegue escapar a uma morte que pode chegar vinda de qualquer lugar. Desta forma, e para lá de qualquer expectativa sobre os destinos dos ocupantes daquele tanque, aquilo sobre o qual Fury tenta fazer uma reflexão é única e exclusivamente sobre as várias fases ou etapas de uma morte que pode começar psicológica pela abdicação de valores ou princípios sempre praticados e defendidos - em condições normais que não aquelas em que se encontram - e que finalmente esta morte pode tornar-se física extinguindo a existência de qualquer um.
Assim, Fury é essencialmente sobre uma dualidade moral verificada nas suas personagens... por um lado a companhia do Fury... homens habituados e experientes numa guerra que não tem perdão e por outro "Norman", um jovem idealista que tenta encontrar o lado bom num conflito e num local onde toda a humanidade desapareceu e que se vê também ele transformado naquilo que inicialmente abominara... ser um homem que vê na morte do "outro" um estado dito "normal" e único capaz de garantir a sua própria sobrevivência.
Com um elenco notável onde se destaca obviamente Brad Pitt como o respeitado sargento "Collier" é, no entanto, a presença de Logan Lerman como "Norman" que se destaca em Fury. Se Pitt encarna aquela geração que viveu a guerra desde o seu primeiro instante e que, como tal, atravessou todas as suas fases mais tenebrosas encontrando apenas no palco de guerra o único lugar em que se sente em casa, é em Lerman que se nota a maior transição - de pacifista a homem de e da guerra - e é através do seu cada vez menos inocente olhar que o espectador testemunha toda a transformação mental de uma guerra hedionda que não deixou inocentes mas sim vítimas. De The Patriot (2000) a Riding in Cars with Boys (2001) enquanto jovem mas carismático actor, Logan Lerman atingiu um estatuto enquanto jovem estrela de Hollywood com Percy Jackson & the Olympians: The Lightning Thief (2010) e a confirmação enquanto actor para o futuro com The Perks of Being a Wallflower (2012) que agora vê cimentado com Fury, colocando-se na galeria dos actores que fez uma saudável e bem sucedida transição enquanto "child actor".
Não sendo um clássico do género imortalizado pela época ou temática que aborda, Fury não deixa, no entanto, de ser um dos mais emblemáticos filmes de guerra dos últimos anos não só pela forma como filma a mesma mas principalmente pela forma como consegue de forma exímia filmar os diferentes estados psicológicos de um conjunto de homens que viveram e morreram no conflito. Homens esses que encontraram naqueles campos de batalha - e naquelas que lá travaram - o único possível "conforto" que as suas almas perdidas (talvez por ela...) alguma vez ambicionaram.
Marcado também pela excelência técnica Fury afirma-se sobretudo pela sua ode à sobrevivência... da alma, dos valores e talvez (quando possível) daquilo que aqueles que passaram por esta época, uma vez foram... e que possivelmente já não consigam voltar a ser.
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"Don "Wardaddy" Collier: Ideals are peaceful. History is violent."
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10 / 10
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