terça-feira, 15 de maio de 2018

Fuera de Juego (2017)

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Fuera de Juego de Richard Zubelzu (Espanha) é um documentário em formato de longa-metragem que aborda a temática da homossexualidade no futebol em Espanha e de todo o tabu que se gera em redor da mesma.
Partindo do pressuposto de que existe um estereótipo instaurado na sociedade nas mais diversas áreas, desporto incluído, e à qual todos "respondem" aceitando e não questionando, como reagir quando aqui a expressão da sexualidade individual difere desse ideal previamente estabelecido e dominante? A sexualidade, direito civil consagrado na lei, não colide com os interesses ditos "de grupo" quando expresso de acordo com a corrente da maioria mas, no entanto, existe uma (suposta?!) minoria silenciosa que lentamente começa a assumir-se como detentora de direitos igualitários.
Assim, e conhecendo o espectador que o meio desportivo e muito particularmente aquele ligado ao futebol, a grande questão ou pensamento que este documentário pretende levantar e deixar presente na mente do mesmo é a ideia de que todas as formas de descriminação começam na vontade de inferiorizar a diferença. Dito isto, num meio onde a suposta masculinidade prevalece em detrimento dessa diferença, ou da expressão de uma sexualidade não dominante - partimos desta premissa apenas pelo desconhecimento da sexualidade/estereótipo associada ao grupo -, e tendo como ponto de partida que aqueles aqui inseridos "correspondem" ao ideal de família previamente instaurado, Fuera de Juego lança uma última ideia ligada ao facto de que o suicídio é acto que está tantas vezes ligada a este "preconceito de balneário" que inibe os atletas primeiro de se assumirem tal como são e depois agentes que reagem à pressão de pares pela impossibilidade dessa mesma expressão sexual individual.
No entanto, Fuera de Juego revela que lentamente e através de pequenos actos, algumas associações espanholas ligadas ao futebol têm vindo a tentar a sensibilização do grande público nomeadamente através do uso de atacadores multicolores durante as partidas de futebol bem como através do movimento que defende que o insulto - aqui sexual - não é um direito mas sim um acto de violência e agressão psicológica para com os atletas que assumem a sua sexualidade... não dominante. Se na rua não se ofende e agride verbalmente ninguém, o objectivo é então que em campo este insulto também não pode ser permitido.
Se toda esta dinâmica é equacionada num desporto dito "masculino" e, como tal, a questão aqui imposta é a homossexualidade masculina, Fuera de Juego questiona ainda esta expressão de sexualidade no campo feminino ou, por outras palavras, este documentário levanta ainda a questão através da exibição de pequenos elementos ou pensamentos que demonstram que num desporto dito "para homens", a descriminação já se encontra presente quando disputado por mulheres e, sobretudo, se estas se assumirem também como homossexuais estando, dessa forma sujeitas a uma pressão e violência (pelo menos) verbal e psicológica dupla ao serem vistas como "invasoras" de um desporto masculino e ainda pela sua expressão sexual "não dominante".
Se Fuera de Juego revela que a realidade é ainda negra apesar dos enormes progressos que lentamente - muito lentamente - se têm vindo a registar na área desportiva, não deixa de ser uma realidade que o efeito tabu já foi levantado e que os assuntos começam a ser discutidos ainda que com a resistência de muitos dos ditos "poderes instalados". No entanto, tem sido através da constante acção de muitos atletas e de muitas organizações e associações que consciencializam para a aceitação dessa diferença que a temática da homossexualidade no desporto, ainda que não total e livremente debatida, seja já encarada como uma realidade e um elemento presente na vida de muitos.
Quanto a esta documentário enquanto uma peça cinematográfica, aquilo que lhe falta não é tanto a abordagem a esta temática, sempre importante e muito pertinente, mas sim o facto das entrevistas ou mesmo das abordagens à homossexualidade dos atletas não ser levada mais a fundo explanando - para o espectador - através de momentos e experiências de muitos que pudessem estar dispostos a falar na primeira pessoa. Porque um documentário não pode ser apenas a documentação dos factos mas sim os relatos que humanizam as histórias, as experiências, os traumas e a própria violência a que muitos foram sujeitos. Importante enquanto peça cinematográfica que aborde esta questão - talvez - pela primeira vez mas ainda assim apenas um projecto embrião para um assunto que terá certamente ainda muito por abordar e explorar... Talvez a partir daqui exista a vontade de muitos - ou de apenas alguns - em começar a encará-lo como algo realmente relevante (e não apenas "existente") e, como tal, necessário de ser discutido e debatido. Ao realizador Richard Zubelzu os parabéns pela iniciativa e pela coragem de finalmente trazer esta temática à atenção do público.
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5 / 10
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