domingo, 3 de junho de 2012

Legally Blonde (2001)


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Legalmente Loura de Robert Luketic é possivelmente o filme que lançou definitivamente para o estrelato essa grande actriz que é Reese Witherspoon, que aqui encarna Elle, uma loira com muito pouco na cabeça além de concluir o secundário, casar e viver num mundo ilusório onde nada de mal acontece... se se fôr louro e se conseguir encarar esse mesmo mundo com tanta personalidade quanto aquela que a cor do cabelo impõe.
Elle Woods (Witherspoon) vive para o liceu, respira o liceu, a sua residência e as suas tão ou mais desmioladas amigas que com ela compõem um trio bastante dinâmico em road-trips, ocasionais insinuações sexuais e estereótipos que fazem da mulher alguém dependente de um homem para poderem ser alguém na vida.
A vida de Elle é perfeita. Vive num mundo à margem da realidade, tem as suas amigas, Warner (Matthew Davis), o namorado perfeito e Bruiser o seu chihuahua que transporta para todo o lado como se de uma mala de mão, ou qualquer outro acessório, se tratasse. Tudo perfeito até ao dia em que Warner lhe diz que a vai deixar pois não é a namorada ideal para um futuro advogado de Harvard.
A perfeita vida de Elle é destruída até que esta loira literalmente burra (será?), resolve que o seu próximo desafio é estudar em Harvard e reconquistar o amor da sua vida. Aquilo que ela não esperava é que fosse a sua própria vida a mudar e ganhar todo um novo interessante e desafiante rumo que ninguém, muito menos ela, esperava poder vir a percorrer.
Hoje talvez não, mas na altura este filme assumia-se como a grande comédia do ano. Primeiro porque tinha como principal intérprete uma actriz que era (e é) muito apreciada no meio, e depois porque apesar de ser uma comédia liceal conseguia radicalmente afastar-se das tradicionais comédias do género onde a promiscuidade sexual e as piadas "broncas" assumem todo o controle e comando do filme em questão. Aqui as piadas existem sim, mas mais graças à ingenuidade da protagonista que, sem o prever, consegue dar a volta à vida de todos aqueles que a rodeiam e que têm a pior das imagens a seu respeito. Afinal o preconceito existe por todo o lado mesmo naqueles que naturalmente se assumem como mais inteligentes e iluminados e que, mais não fosse por isso, deveriam eles próprios encarar o mundo, e principalmente as pessoas, com uma mente mais aberta e disponível para aceitar a diferença mesmo que ela lhes pareça, inicialmente, "inferior".
Reese Witherspoon, que sempre tomou de pulso todos os filmes em que participou, tem de facto neste primeiro de dois em que interpretou esta personagem, esqueçam todos os outros que se aproveitaram do sucesso e soltaram (mal) para a ribalta (na prática nunca lá chegaram como este), o filme que a lançou definitivamente para as interpretações principais de Hollywood. O misto de inocência e uma pitada de malícia que a sua "Elle" transporta para o grande ecrã são não só o elemento de força do filme como aquele que faz qualquer um de nós gostar de o ver. E sim toda a gente gosta... Já vi muito boas pessoas a desdenhar o género mas com este ficaram rendidos mesmo que em "público" não o confessem.... Mas voltando a Witherspoon e à sua Elle Woods... A personagem criada consegue ser aquela amiga que todas as pessoas querem ter. Encara o mundo com um sorriso e por muitas desagradáveis situações por que possa passar, nada é motivo para desânimo... Por vezes alguns retrocessos mas nunca suficientemente fortes para a fazer retroceder. Ela é divertida e conquista-nos com o seu sorriso... com as suas deduções (i)lógicas mas principalmente com o seu carácter francamente humano que nos momentos mais delicados sabe dosear na quantidade certa para nos fazer sorrir e pensar "isto vai acabar bem".
A interpretação que lhe valeu uma nomeação ao Globo de Ouro de Melhor Actriz em Comédia e a colocou na lista como uma das preferidas para ser nomeada a Oscar de Melhor Actriz, foi aquela que marcou um ponto de viragem na sua carreira que até então era "divertida" mas que a partir deste momento a colocou também na lista de actrizes a ser consideradas para interpretações ditas "mais sérias".
E não esquecer todos os outros actores que em interpretações mais ou menos secundárias ficaram também inevitavelmente ligados e marcados a este filme... Jennifer Coolidge que se torna na improvável amiga de "Elle" que a ela recorre sempre que pretende tratar das unhas e do cabelo... Selma Blair como a rival pelo amor de "Warner"... Luke Wilson que interpreta o professor assistente que se rende a "Elle" no primeiro instante que a vê... a interpretação convidada de Raquel Welch que apesar de morena... é tão loura como "Elle"... ou Ali Larter, uma loura assumidamente mais inteligente e a quem "elle" vai salvar de uma longa estadia na prisão. Todos giram, essencialmente, em torno de Witherspoon mas também todos têm o seu lugar cativo no filme.
Aquilo que para mim faz desta comédia um filme vencedor não se prende com o facto de simpatizar com a actriz principal. Sim, é verdade que Witherspoon tem uma certa graça que nos faz gostar dela. Disso não haja dúvida. Aquilo que me faz simpatizar com o filme são as pequenas mensagens que para muitos poderão passar entre-linhas, mas que na verdade são o fio condutor de todo o filme.
Esqueçamos a actriz... esqueçamos o meio de onde ela provém e quem a rodeia. Concentremo-nos apenas nos factos... Temos uma jovem por quem ninguém dá nada e todos consideram como sendo apenas mais uma "burrinha" lá do burgo que tem tudo e não lhe dá nenhuma aplicação prática (o que de facto é a verdade). Mas é esta mesma pessoa que tem tudo para ser alguém e que nada usa que todos surpreende, primeiro pelo impossível e depois pelo concretizável. Estuda e consegue entrar numa das universidades mais prestigiadas do mundo. É certo que inicialmente pelos motivos errados, mas é depois de lá estar que realmente percebe que ela própria pode ser algo mais do que aquilo que ela própria projecta. Estuda, trabalha, luta por aquilo em que acredita e ainda tem tempo para poder ajudar uma inesperada amizade que lhe surge pelo caminho. Dedica-se àqueles que a respeitam e entrega-lhes sem reservas o seu tempo, a sua amizade e a sua atenção. Defende em quem acredita, mesmo que para todos os outros os motivos pareçam os mais errados ou improváveis, e sabe que por detrás de uma qualquer imagem há muito mais do que aquilo que os olhos vêem.
É certo que é tudo ilusório, afinal estamos a falar de um filme de comédia que à partida poderia não ter qualquer objectivo além de nos fazer divertir, mas não deixa também de ser verdade que para lá da imagem "cor-de-rosa", este filme tem muito mais escondido nas piadolas habituais de um filme de comédia. Ao contrário do que é costume no género... este filme tem coração. Tem uma mensagem que talvez muitos se esqueçam porque estão apenas divertidos a olhar para a comédia sem olhar o que ela esconde... o lado humano.
É isto que a interpretação de Witherspoon tem... um lado humano que a comédia "liceal" muitas vezes esquece, remetendo-se apenas para as brejeirices sexuais e o rebentar das hormonas que fazem destes filmes "bombas de bilheteira". E é este lado humano que torna uma personagem "impossível" em alguém real...alguém que nos esperamos que consiga triunfar no final mesmo que seja através das mais absurdas situações e momentos que seriam para qualquer um de nós, no mínimo, embaraçosos. É este lado humano que muitos ignoram e que faz com que muitas pessoas vivam num mundo à margem... um mundo paralelo e que não respeita as normas e as regras pelos quais a maioria se rege... e é a este tipo de "personagem" que representam de uma ou de outra forma muitas pessoas que eu enquanto espectador respeito. A capacidade de ser diferente mesmo quando todo o mundo diz para seguir a mesma linha. E é aqui que a Elle Woods de Witherspoon consegue ser uma vencedora intemporal e personagem pela qual será durante muitos e muitos anos recordada (mesmo que o Oscar lhe tenha chegado à mão através de outro filme).
No final, temos uma comédia forte, bem disposta e com uma enorme mensagem humana que se pretende passar (mesmo que alguns a prefiram nem sequer ver), e que se torna por muitos e longos anos um daqueles filmes que ao ver nos deixa incondicionalmente bem dispostos. Se todos os actores têm um desempenho que os marque... este será o de Reese Witherspoon.
Escusado (espero) será dizer que esta comédia deve ser vista e apreciada para além daquilo que inicialmente possamos achar dela... Caso não se veja para além do que as imagens mostram temos apenas uma comédia que esquecemos no instante imediato... No entanto se procurarmos um pouco mais para além das inocentes graçolas que percorrem o ecrã, teremos uma comédia que não esqueceremos tão depressa. Long live Elle.
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"Elle: No more boring suits or pantyhose, I'm trying to be somebody I'm not."
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10 / 10
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2 comentários:

  1. Tudo verdade! Grande review!
    Lá porque é uma comédia (romântica), isso não significa que seja um filme menor. Normalmente os criticos tendem a olhar com vista grossa a estes filmes. Que é bem melhor do que parece, tal como bem o refere no texto.
    É sim senhor um grande filme... mas mesmo não lhe atribuindo a nota máxima 10/10, classifico-o bem com: 7/10 (BOM).

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  2. Finalmente alguém que percebe o meu ponto de vista. É um facto que muitas comédias por vezes se limitam a ser "brejeiras". É também verdade que muitos críticos e comentadores tendem a olhar este género como algo "menor" e "sem interesse". No entanto, se bem olharmos para este filme, facilmente percebemos que a sua história tem muito mais para contar do que uma simples historieta adolescente de "liceu" .

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