Res Pública de Manuel Valls é uma curta-metragem de ficção espanhola que leva ao espectador ao interior de uma intriga política e à revelação de um passado que se pode demonstrar não tão claro e moralista como aparenta ser.
Pablo (Manuel Valls) é o representante de um partido acostumado ao poder. Acostumado de tal forma que julga que as suas acções não lhe trarão qualquer consequência. Ele é intocável.
No entanto, é quando Ana (Lucrecia Cervelló) demonstra querer ascender rapidamente na sua carreira que os erros passados de Pablo parecer querer ressurgir. Irá ele pagar o seu preço?
Com um argumento escrito também por Valls, Res Pública não poderia ser um filme mais actual não só pela sua perspectiva da vida política tão escondida dos olhos públicos mas que "responde" a tantas questões colocadas pelo eleitorado e pela sociedade em geral, mas também pela forma como mais ou menos subtilmente expõe os podres daqueles que se deixam corromper pelo poder bem como aqueles tidos por quem chega com grandes ilusões e se deixa levar pela mesma trama de intrigas que começou por condenar.
Num mundo que não permite qualquer tipo de jogo fraco, Res Pública tece assim uma questão essencial... Até onde cada um está disposto a ir para se fazer valer num mundo impiedoso?
E para responder a esta questão temos por um lado "Pablo" e por outro "Ana". Se o primeiro tem uma vida estabilizada e é, de uma ou outra forma, uma figura respeitada em sociedade, não é menos verdade que o seu passado esconde algo do qual ele não se orgulha e tem um confesso receio que se torne público e que pode abalar toda a sua "saudável" estabilidade caso seja descoberto. E quando julgamos que "Ana" chega para desmascarar este passado exigindo assim um nível de transparência que faltou até então, percebemos que esta está disposta a continuar a esconder esse passado se lhe fôr garantida uma ascenção profissional que de outra forma lhe seria impossível de alcançar. Desta forma, e tendo em conta a ideia de que uma mão lava a outra, ambos se comprometem e condicionam a sua já pouca falta de integridade selando um "contrato" que irá a partir desse momento vinculá-los a um jogo de silenciosa estratégia.
Mas Res Pública não é apenas uma meditação política mas também social na medida em que durante a tensa mas pacífica negociação entre "Pablo" e "Ana" revelam aquilo que todos nós preferimos não "saber", ou seja, o quão fácil é controlar os demais. É quando ambos revelam que temem que se descubra o passado e a actual negociata que verbalizam sobre como controlar o público uma vez que a imprensa já está nas suas mãos. O espectador - também de forma serena - questiona-se então sobre a imparcialidade e isenção de uma comunicação social que pode estar controlada e, como sua consequência directa, como estar toda uma população informada e actualizada se a dita imprensa está comprometida. Num jogo de acção e reacção só nos resta uma certeza... (in)voluntariamente estamos todos comprometidos.
No final, e quase imperceptível e silencioso, fica o drama daqueles que sofreram. As vítimas que escondem também em silêncio a sua mágoa e vergonha anulando a sua presença num mundo que não só os esqueceu como torturou e deitou fora. Os seus corpos enfraquecidos lentamente apagam-se enquanto floresce a mentira e a violência de outros que chegaram ao poder, que mandam, que mentem, corrompem e eliminam... com a facilidade de quem pode, quer e faz e as interpretações de Valls e Cervelló são astutas e poderosas para nos demonstrar que ou se tem poder... ou se é eliminado. Não existe meio termo.
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8 / 10
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