segunda-feira, 8 de abril de 2013

Colegas (2012)

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Colegas de Marcelo Galvão foi uma das longas-metragens mais aguardadas desta quarta edição do FESTin a decorrer no Cinema São Jorge e uma das mais fortes em competição.
Stalone (Ariel Gondenberg), Aninha (Rita Pokk) e Marcio (Breno Viola) são três jovens amigos que vivem numa instituição para pessoas com Síndroma de Down. Os três adoram cinema e não poderiam trabalhar noutro local que não a videoteca da instituição onde passam horas sem fim a ver todos os filmes que por lá encontram.
Um dos seus filmes preferidos é o filme Thelma & Louise, e é com base neste road movie que tem como principal fonte de inspiração a mais profunda e sentida história de amizade que os três resolvem fugir da instituição no carro do jardineiro Arlindo (Lima Duarte) e concretizarem os seus sonhos na maior experiência de liberdade que alguma vez poderiam imaginar. Nesta invulgar viagem conhecem o mais variado conjunto de locais que culminará com a chegada a Buenos Aires na Argentina, tendo apenas como base a concretização dos seus mais importantes desejos... para Stalone será ver o mar, para Aninha será a concretização do seu casamento e para Marcio o desejo de poder voar.
O argumento de Marcelo Galvão era logo à partida arriscado para o mais incrédulo dos espectadores quando algum potencial preconceito faz questionar a decisão de ter nas interpretações principais três actores que são de facto portadores do Síndroma de Down, esquecendo que as emoções que se podem sentir num filme podem ser-nos transmitidas por um qualquer indivíduo desde que as represente com honestidade, entrega e paixão. É isso, e apenas isso, que aqui temos desde o início até ao fim. Como qualquer um de nós, estas três ricas e de certa forma excêntricas personagens, representam tudo aquilo que qualquer outra pessoa sente. Têm emoções, desejos, sentimentos e vontade de amar, de vida e de na sua própria inocência, sentir que estão vivos num mundo que em tempos preferiu deixá-los num local afastados de todos os demais.
Sem querer fazer um filme que se afirmasse pela diferença, mas sim um filme que mostrasse um conjunto de emoções que são comuns a todos, Marcelo Galvão conseguiu estabelecer (in)voluntariamente a diferença, e filmar uma sentida e emotiva história que consegue emocionar qualquer um dos seus espectadores através de um conjunto de momentos e situações que são comuns a todos nós. Afinal, quais são realmente as diferenças que nos separam? Todos sentimos, todos pensamos, todos amamos e todos temos aquela vontade de liberdade e de conhecer o mundo como inerente. Todos, sem excepção, a sentimos num dado momento das nossas vidas... ou durante toda a nossa vida. Conhecer pessoas que normalmente nunca iríamos conhecer, ver lugares que o mais certo será nunca vermos e ter no nosso íntimo a sensação de que com esses pequenos momentos conseguimos transformar todo o significado da nossa vida. É isso que estas três divertidas e cheias de vida personagens (almas) conseguem mostrar-nos durante a duração deste excelente filme. E a habilidade do argumento de Marcelo Galvão é conseguir abstrair-nos do facto dos seus actores terem Síndrome de Down e vêmo-los simplesmente como três actores que nos fazem vibrar, sorrir, emocionar e principalmente encantar com uma quase sempre constante inocência que os faz encarar o mundo à sua própria maneira... divertidos e sem maldade, independentemente do método por vezes utilizado poder assustar os demais que, com o preconceito da diferença os olha com alguma desconfiança.
Ariel Goldenberg, Rita Pokk e Breno Viola que dominam todo o filme, não poderiam ser mais enternecedores. A sua simplicidade e inocência, paixão e vivacidade são os elementos fundamentais para compôr toda uma história que poderia não ter mais nenhum elemento a acompanhá-los e seria suficiente para fazer desta obra um grande filme. No entanto, e felizmente, Colegas consegue ainda apresentar um conjunto de interpretações secundárias que, também elas, primam pela boa disposição e que passam pela prestação do "Agente Portuga" (Rui Unas) e do "Agente Sousa" (Deto Montenegro), os dois polícias que perseguem os três amigos, bem como por um variado conjunto de actores que se assumem quase como figurativos como o jardineiro "Arlindo" de Lima Duarte, mas que ainda assim se assumem como importantes personagens para o desenvolvimento da história.
E se de conteúdo este filme é uma aposta ganha, o mesmo se poderá dizer a nível técnico onde tem alguns elementos dignos de destaque nomeadamente a sua música original da autoria de Ed Côrtes, que oscila entre ritmos animados típicos de um road movie e musicalidades mais enternecedoras e comoventes pois não é possível ter todo o filme ao ritmo de uma gargalhada e é preciso contra-balançar com segmentos mais sentidos e melancólicos, mas não tristes, onde o poder dos sonhos concretizados ganha controlo sobre todas as imagens que vemos. E são estas mesmas imagens que pela mão de uma requintada fotografia da autoria de Rodrigo Tavares que consegue realmente colocar-nos dentro delas como se de um sonho se tratasse, e o momento que toma forma na praia é disso o exemplo mais perfeito de todo o filme.
Colegas é um filme que espero venha ainda a estrear comercialmente em Portugal (talvez o prémio de longa-metragem que certamente irá vencer para isso contribua), e que principalmente o público o abrace e receba sem qualquer tipo de preconceito para assim poder perceber que para além dos actores que lhe dão vida e que já por si são excelentes, está também uma história sobre liberdade e conquista pessoal que é comum a qualquer um de nós.
Parabéns Marcelo Galvão pela extraordinária, sensível, emotiva e bem-disposta história que nos entrega e especialmente pela forma humana com que a conseguiu filmar. Um dos filmes do ano...sem qualquer reserva.
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9 / 10
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