domingo, 24 de agosto de 2014

A Última Famel (2010)

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A Última Famel de Jorge Monte Real é uma longa-metragem portuguesa e a primeira dirigida pela antiga celebridade (?) de reality show que reúne nomes mais ou menos sonantes do mesmo meio.
Tinoco (José Carlos Pereira) descobre num barracão perdido no meio de uma qualquer mata aquele que julga ser o último exemplar de uma Famel XL17 pensando ter o seu golpe de sorte.
A moto, tida como uma relíquia para um extenso conjunto de personagens, é então tida como uma objecto de culto que todos querem ter na sua posse dando origem a um sem número de situações e a uma caça imparável pela mesma.
Jorge Monte Real que além de dirigir este filme escreveu também o seu argumento, entrega ao espectador uma história que no mais simpático momento se pode dizer que mais parece uma feira de bizarrias sendo, muitas das quais, momentos perfeitamente ofensivos não só para os intervenientes como para aqueles que tentam ou pretendem retratar e ainda para o público que se dá ao trabalho de perder pouco mais de uma hora a assistir a isto - e com "isto" quero dizer literalmente que me refiro a algo do mais inqualificável a que assisti nos últimos tempos.
As personagens aqui representadas conseguem ser mais grosseiras do que os piores dias d'Os Malucos do Riso, e enquadrarem-se num conjunto de lugares comuns e estereótipos negativos e depreciativos que levam o espectador a questionar-se sobre o objectivo de retratar cidadãos do norte como sendo - e vou dizê-lo de forma simpática - perfeitos labregos?! Não existe neste filme ninguém que não use e abuse de um sotaque de forma injuriosa e negativa ou que não use a ideia de pessoa do norte como alguém que ainda não sabe utilizar convenientemente uma casa-de-banho. A cidade de Águeda, onde decorreram as filmagens de A Última Famel, parece retirada de um universo paralelo onde apenas com muita sorte se percebe que já sabem utilizar a dita, comer com talheres ou pelo menos tentar não gaseificar qualquer conjunto de palavras proferidas as quais - muito dificilmente - conseguem identificar com pertencendo a uma frase.
Percebo a vontade de fazer uma comédia especialmente nestes tempos tão negros que a nossa sociedade atravessa e com ela tentar provocar alguns momentos mais agradáveis e de boa disposição, mas ultrapassa-me esta incansável necessidade de transformar toda uma população em labregos pouco desenvolvidos para quem uma cerveja é mais perceptível do que uma letra do abecedário, e com isto denegrir violentamente a noção de simplicidade/humildade que pode facilmente caracterizar muitos daqueles que se pretender retratar. Longe da noção de "povo simples" está aquela que o reduz a animais selvagens e sem maneiras que vagueiam perigosamente pelas mesmas ruas que outros... mais "instruídos".
Mais confusão ainda me faz a constante referência a momentos escatológicos e grosseiros para provocar a comédia estando os elementos referidos no anterior parágrafo sempre na dianteira daqueles que os provocam... Quer saia por cima, quer saia por baixo... parece que todo o conjunto de lixo corporal mais ou menos bio-degradável consegue (será?) provocar alguns momentos de boa disposição. Tremo - literalmente - pela sanidade da mente que teve e elaborou estas ideias pois parece-me no mínimo preocupante o ritmo frenético com que as mesmas aqui são "vomitadas".
Mas se tudo isto é mau, patéticos são os segmentos em que após perseguições absurdas pelas estradas do interior norte de Portugal, se entra pela rumo da ode poética em que Homem reencontra Natureza apenas para se reencontrar novamente com o Homem - neste caso Mulher - e com ela viver um lindo e terno romance... até perceber que ela é casada e que o usa como um boneco sexual... Ou até mesmo as luta com espadas - todos nós andamos com uma dentro do bolso - onde depois de utilizada como arma mortal fica espetada no peito e costas da vítima com cada ponta numa direcção distinta como se no momento de ser cravada conseguisse desafiar as leis da gravidade - qual Matrix - e ganhar vida própria.
Esqueçamos por momentos breves a péssima direcção de fotografia ou captação de som. Esqueçamos ainda as trágicas, desesperantes e desesperadas interpretações - Ana Brito e Cunha e José Carlos Pereira o que andam a fazer nisto - de actores e não actores nesta "peça" sem comédia, e concentremo-nos apenas no essencial... Será necessário recorrer ao grotesco, ao visceralmente grotesco acrescento, e ao escatológico para fazer os portugueses rir? Será o povo assim tão básico e mentalmente acéfalo para conseguir encontrar nisto algum tipo de humor?!
No fundo, aquilo que este género de filmes que A Última Famel aqui "tão bem" representam consegue é provocar um sentido medo de visitar o Portugal profundo... que ao que parece está repleto de animais selvagens de duas patas capazes de devorar o mais desprevenido "bom cidadão" e lançá-lo na sua perdição ou, pior ainda, num ritual idêntico de alarvidade humana.
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