Almas Censuradas de Bruno Ganhão é um documentário em formato de curta-metragem português que centra a sua dinâmica nos últimos anos e características da ditadura salazarista bem como na transição democrática portuguesa culminando com os dias que vivemos.
Este documentário que tece na sua primeira metade de duração um breve registo da tradição e dos "bons costumes" ao som de uma narração que é brevemente intercalada com segmentos dos discursos de Marcello Caetano, não esquece uma distinta ligação entre a procissão a Fátima e a penitência do dito pagamento de promessas com o silencioso sofrimento de um povo que teima em não evoluir nos tabus da sociedade enclausurada em si mesma.
Uma sociedade que vive assim presa aos antigos costumes e que aceita aquilo que alguém - ? - lhe dá a conhecer sem o questionar, aprisiona-se às premissas de uma informação desactualizada, demagoga e ultrapassada que perpetua - sem qualquer reserva - a estagnação e a ignorância. É nesta observação constante do Portugal que tivemos e temos - teremos? - que o espectador presencia uma vontade inerente e sempre presente de mudança que, no entanto, é abafada pelos ventos passados de que temos um povo sereno - apenas um mito - que se revela consciente e com medo de avançar. O tal medo que os costumes e boas maneiras impedem de evoluir e se extravasar além barreiras pessoais e individuais. Quando a multidão se teme... está para sempre sobre si fechada.
Os ventos de mudança trazidos com o 25 de Abril de 1974 foram, segundo o primeiro-ministro de então Vasco Gonçalves, uma época única na História de Portugal e que apenas com uma lucidez extrema poderiam ser aproveitados para a evolução económica e social que nos faria descolar definitivamente daquilo que havia sido deixado para trás, e citando-o era seu desejo que "não se perdesse o nosso futuro" - agora aparentemente perdido.
De momento curioso a momento ímpar, Almas Censuradas reflecte assim sobre o aprisionamento do espírito de liberdade que o povo português tem vivido ao longo dos séculos e, se por um lado mostra uma sede de mudança que parece por breves momentos ser impossível de quebrar, não é menos verdade que pela tal censura do espírito fruto de anos e anos de regimes totalitários, o povo aprendeu a reprimir os seus desejos, as suas vontades e principalmente as suas liberdades... No fundo, o povo reprimiu o desejo de ter desejo mantendo-se, portanto, num limbo entre liberdade e medo que o impede de progredir. A ter um obstáculo o povo só o encontrará no seu próprio seio.
Mordaz e de mensagem afiada, Almas Censuradas capta de forma breve mas certeira a alma - censurada e aprisionada - do povo português.
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"Vasco Gonçalves: Vivemos um momento como não viveram os nossos pais e não sabemos se viverão os nossos filhos."
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8 / 10
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