Lucy de Luc Besson é não só a sua mais recente longa-metragem como tem como sua protagonista a actriz Scarlett Johansson. Se estes dois elementos não fossem suficientes para que este filme se tornasse numa promessa, basta juntar-se-lhe a participação de Morgan Freeman para então qualquer um poder esperar o filme do ano.
Lucy (Johansson) ia apenas cumprir um favor forçado a um amigo quando se vê envolvida num negócio de tráfico de droga. Retida contra a sua vontade, a droga que transporta espalha-se no seu organismo fazendo-a atravessar por rápidas mutações que a transformam no único ser no mundo capaz de utilizar uma cada vez maior percentagem do seu cérebro e, como tal, controlar tudo o que a rodeia.
Capaz de uma constante mutação, Lucy pretende agora vingar-se daqueles que a mantiveram cativa ao mesmo tempo que com a ajuda do Prof. Norman (Freeman) partilha os seus conhecimentos para o bem da ciência e supostamente da Humanidade.
Com um trailer promissor e com um conjunto de profissionais como o são Besson, Johansson e Freeman, Lucy apenas poderia ser aquele filme que qualquer cinéfilo deseja ansiosamente ver. Com uma apresentação repleta de elementos que nos transportam de imediato para os três sucessos maiores de Besson, respectivamente La Femme Nikita, Léon e The Fifth Element, como não esperar apenas o melhor e um filme não só repleto de acção como um espectáculo visual capaz de nos dominar na sua hora e meia de duração.
Lucy tem, à semelhança dos referidos filmes, mais uma personagem feminina dominante. Depois de Anne Parillaud, Natalie Portman e Milla Jovovich, chegou a vez de Scarlett Johansson funcionar como a musa de Besson que evidencia uma fragilidade cativante que rapidamente se transforma na sua maior arma e, como consequência, contribui para o próprio fortalecimento do carácter da sua personagem. É devido a essa referida inocência que "Lucy" se vê envolvida num negócio muito acima das suas próprias defesas e que irá condicionar todo o seu destino.
Até aqui La Femme Nikita, Léon e The Fifth Element partilham de um fundo comum com Lucy. Mas é só mesmo até aqui. Enquanto os três primeiros filmes são uma junção perfeita de acção e história dramática, Lucy apresenta-se como um filme que nos fascina pela sua realização mas que se perde numa tentativa de explicação de factos que apenas só pode ser comparado com a própria tentativa de transformar Johansson numa estrela de acção que simplesmente não resulta. Se por um lado a premissa de um ser avançado (ou mentalmente mais desenvolvido) parece poder ser perfeito para a actriz escolhida, não é menos verdade que todo o seu desenvolvimento é atirado à parede numa esperança de que cole e se torne num qualquer objecto de culto... mas sem "sumo".
A certa altura o espectador deseja, a todo o custo, que este filme dê uma volta e que seja cativante, afinal todas as premissas estão lá, mas na prática é sentido que por muito que se tente a sua elevação ao tal estatuto de culto, Lucy nunca cumpre. A constante necessidade em mostrar a mutação de "Lucy" e as capacidades e poderes que esta desenvolve no controlo de tudo o que a rodeia fazem de uma quase perfeita Johansson um mero andróide, sem reacção, emoções ou empatia apenas comparável com a necessidade demonstrado por esta na possibilidade em controlar o seu presente e voltar ao passado conhecendo assim as suas (nossas) origens.
"A Vida foi-nos dada há biliões de anos... O que fizemos com ela?"... A resposta a esta questão colocada logo no início de Lucy pode estranhamente ser a pergunta de resposta simples feita para todo este filme: nada. Lucy não convence primeiro pela apatia crescente com que Johansson é filmada deixando esta magnífica actriz num estado quase mecânico quando todo o fundamento da sua personagem poderia ser o descobrir o passado e a forma como este influenciou o presente (e de certa forma o futuro), criando assim uma potencial nova via para a Humanidade. Logo a pergunta que eu me coloco é simples... como pode uma pessoa supostamente tão preocupada com os destinos da referida Humanidade tornar-se em algo muito semelhante a um autómato?! Desprovida de emoções e de sensações... de dor até... qual o fundamento de descobrir algo que se diz condenado quando a própria se condena a um fim tão... "indiferente"?! "I feel everything" diz a nossa "Lucy" a dado momento... pois todos os seus actos demonstram o contrário evidenciando definitivamente a sua apatia.
Pelo meio temos Morgan Freeman. Escusado será de referir o potencial que encontro (todos nós encontramos) nos dotes artísticos deste senhor que nos presenteia com personagens quer dramáticas quer cómicas que enchem as medidas a qualquer cinéfilo. Até nas suas interpretações mais breves ou ditas secundárias podemos encontraá-lo em todo o seu esplendor. Aqui Freeman, enquanto o professor que estuda as capacidades da mente humana, encontra-se numa posição quase de "que estarei eu a fazer aqui?". A incredulidade que lhe vemos estampada no rosto é, de início ao fim, notória sendo o segmento final a coroação de tal pensamento. Freeman que está brilhante em todos os seus registos, encontra-se em Lucy como um mero apêndice. Alguém encontrado para tornar um argumento frágil em algo credível... Afinal, não nos recordamos dele como Deus?!
É é com Deus, ou pelo menos uma tentativa frustrada de o trazer a este filme, que Lucy termina. Sem revelar nada de extraordinário do final deste filme, "Lucy" termina com uma óbvia referência quase bíblica quando responde que está "por todo o lado" ao tornar-se num ser humano (?) evoluído ao ponto da sua presença física ser perfeitamente dispensável.
Quase prepotente, arrisco dizer, Lucy consegue ser o filme mais frágil de Besson de quem não conseguimos esquecer aqueles que foram os seus grandes sucessos não só junto da crítica como do público. Aqui, e com as devidas positivas referências a uma perspicaz direcção de fotografia de Thierry Arbogast que por momentos nos consegue remeter para um ambiente futurista (sem o ser) e a clara qualidade dos efeitos visuais e coreografias nos momentos de luta, Lucy é um daqueles filmes que nos passa ao lado. Sem ser de esquecer não é memorável, não suporta nada de novo nem sequer se preocupa em bem justificar os seus argumentos sobre a Humanidade (ou falta dela) e aquele que poderia ser o próximo passo da evolução humana.
No final, Lucy pretendeu ser a união entre dois pesos pesados de Hollywood com um visionário e inovador criador francês que, no entanto, ficou perdido pelas pretensões do que poderia ter sido mas do qual teve medo de ver concretizado. Não é mau... não conseguiu ser bom... limitou-se a ser assim assim...
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"Professor Norman:
We humans are more concerned with having than with being."
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5 / 10
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