quinta-feira, 15 de agosto de 2013

É o Amor (2013)

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É o Amor de João Canijo é a mais recente longa-metragem do realizador de Noite Escura (2004), Mal Nascida (2007) ou Sangue do Meu Sangue (2011) e protagonizado por Anabela Moreira - como ela própria - num registo cinematográfico que cruza a ficção e o documentário centrado na vida de uma comunidade piscatória de Caxinas, em Vila do Conde.
A actriz em campo para um trabalho de auto-investigação e preparação para um eventual trabalho enquanto profissional de artes interpretativas. Da sua chegada ao "campo de trabalho" à sua convivência e criação de empatia sem esquecer a própria amizade formada com algumas das peixeiras com quem acabou por conviver, é a relação entre a actriz com a determinada Sónia Nunes que acaba por se destacar desde o primeiro instante. Num misto de aprendizagem - da profissão e do espaço - e experiência documental que a actriz efectua junto da comunidade, É o Amor é - possivelmente - a primeira obra cinematográfica de Canijo com a qual eu (enquanto espectador) não consegui encontrar grandes pontos de empatia não deixando de, no entanto, lhe reconhecer mérito enquanto um trabalho cinematográfico no qual se reconheça o dedo do realizador.
Com um argumento construído pelo realizador e pela própria actriz, o espectador encontra-se portanto num meio diferente do habitual das obras de Canijo onde se abrem as portas a uma qualquer comunidade marginal onde todos acabam por ser meros "turistas" cinematográficos daquele ambiente específico lançando-se em É o Amor para um registo semi-documental onde se conhece essa comunidade (não marginal), mas como se nela residisse toda uma entrega, dedicação, felicidade e capacidade de "amar" diferente de todas as demais onde, ocasionalmente, todos nós vivemos e deixando, dessa forma, toda uma virtuosidade desta comunidade na pessoa de Sónia Nunes como algo que deveríamos esperar e ambicionar alcançar. Que o documentário tenha de encontrar o lado humano para tentar transmitir uma mensagem que crie empatia no espectador, estou totalmente de acordo, que se transforme o modo ou estilo de vida do "documentado" como o exemplo correcto a seguir ultrapassa o limite de obra documental para uma ficção moralista que nem sempre - se é que alguma vez - acaba por ser desejado.
Assim... o que encontra aqui o espectador? Inicialmente o choque cultural que encontra (através de Anabela Moreira), colocando o seu meio (potencialmente diferente) em directo "confronto" com a vida nas Caxinas, das peixeiras e da comunidade piscatória no seu todo. Começamos por perceber um pouco da vida da comunidade - chamemos-lhe assim uma vez que todos aqueles com quem nos cruzamos no ecrã acabam por revelar todo um um conhecimento e respeito comum - para de seguida nos centrarmos na experiência de Anabela Moreira enquanto membro "estrangeiro" que chega ali para adquirir conhecimento in loco dessa mesma vida. Se inicialmente acompanhamos a actriz nos seus pequenos fait divers ou falta de experiência em todo o trabalho a que se propõe, cedo compreendemos que toda a sua vontade em se sentir "pertença de" acaba não só por soar forçado como uma forma desesperada de ser parte de um grupo que, na realidade, não será o seu. E nunca será não por vontade dos demais mas sim por ter sido claro para o espectador desde o primeiro instante que este é um trabalho de investigação que lhe permitirá ganhar experiência no espaço e no meio e não toda uma mudança radical de vida que irá encetar num futuro próximo. Mais, enquanto actriz Anabela Moreira é um dos nomes fortes do actual cinema português - inegável facto -, o que lança dúvidas no espectador sobre toda uma dramatização de "confessionário" no qual expõe (para o espectador) as suas dúvidas quanto à sua coerência ou talento, sobre o seu percurso ou futuro que, na realidade, nenhum de nós deste lado questiona.
Dito isto, e para lá da exposição excessiva dessa busca da felicidade onde a "do outro" é sempre maior e melhor do que "a minha" que na realidade se torna mais plástica do que propriamente credível ou genuína, É o Amor fragiliza-se pelos lugares comuns de embelezar ou divinizar a vida alheia como um modelo a seguir mas que nunca se conseguirá alcançar e por algumas verdades comuns sobre o amor, a felicidade e o sacrifício que todos nós conhecemos e nunca poderão ser equiparadas às dos demais... afinal, quantos de nós não passam por sacrifícios ou riscos não deixando de ser mais ou menos importantes do que aqueles tidos por outros em situações diferentes. Sem filosofias baratas... não viveremos nós todos uma existência repleta de riscos... dúvidas... incertezas... ou buscas incessantes por "algo" que esperamos alcançar para completar essa felicidade?
Documentário - ficcionado ou não -, É o Amor é possivelmente a obra cinematográfica de João Canijo que menos me impressionou até à data bem como aquela que menos deixou Anabela Moreira brilhar na qualidade de magnífica actriz que é, capaz de provocar todo um misto de emoções genuínas, cruas, existenciais e mesmo dóceis como aquelas que encontramos nos já referidos Mal Nascida ou Sangue do Meu Sangue, expondo-se aqui como alguém incerto e inseguro como se todo um percurso cinematográfico exibido até ao momento mais não fosse como o resultado de um acaso e não o fruto de todo um intenso (não duvido) trabalho.
Excessivamente extenso e por diversos momentos desnecessariamente pseudo-moralizador, É o Amor pode ser uma tentativa de o revelar (ao amor) nas suas manifestações junto das existências mais comuns mas, mesmo assim, está longe de se revelar como uma obra de referência no percurso do realizador (e da actriz) sendo, no entanto, uma interessante obra com alguns momentos interessantes nas vidas daqueles que são representados ou, por outras palavras, nas vidas que se encontram do outro lado da objectiva.
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5 / 10
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