domingo, 10 de novembro de 2013

Jimmy P. (2013)

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Jimmy P. de Arnaud Desplechin presente na Secção Oficial - Fora de Competição do Lisbon & Estoril Film Festival e um dos oito finalistas para o Prémio Louis Delluc de Melhor Filme Francês do Ano, encerrou no Centro de Congressos do Estoril o segundo dia do certame.
A história de Jimmy P., baseada no argumento escrito por Desplechin em colaboração com Kent Jones e Julie Peyr, apresenta-nos Jimmy Picard (Benicio del Toro), um índio Blackfoot que no pós-Segunda Guerra Mundial na qual havia combatido em França, é admitido num hospital militar no Kansas especializado em doenças cerebrais, depois de denotar sintomas como vertigens, cegueira ocasional e até mesmo a perda de audição que o deixam sem controlo sobre o seu corpo.
O primeiro registo que lhe é atribuído é que poderá sofrer de esquizofrenia sendo que, no entanto, os médicos que o examinam decidem consultar o antropólogo e psicanalista francês Georges Devereux (Mathieu Amalric), especialista em culturas ameríndias que irá analisar o presente, e sobretudo o passado, de Picard como forma de perceber qual o verdadeiro motivo que o impede de prosseguir normalmente com a sua vida.
Desplechin, Jones e Peyr apresentam-nos assim uma história sobre dois homens que a única coisa que possuíam em comum foi a sua passagem por França durante e pós-guerra e que, em circunstâncias normai, jamais se iriam aproximar um do outro. No entanto, a doença do primeiro e a curiosidade do segundo por uma cultura que o fascina, aproxima-os ao ponto de estabelecerem uma confiança extrema que ajudará um na investigação da sua vida e o outro no conhecimento e na resolução dos seus problemas reais que iam muito além de uma qualquer mazela ou consequência traumática da guerra.
Esta história verídica transporta-nos para a investigação da mente de um homem numa época em que o preconceito se instalava ferozmente contra um povo que tinha os seus direitos limitados e sobre o qual eram tecidas ideias chavão sobre o mesmo baseados em noções pré-fabricadas ao longo de décadas e que faziam supôr, aos menos conhecedores, um conjunto de conclusões que muito pouco tinham a ver com a real condição de, neste caso, Picard e que, ao mesmo tempo, estabeleciam também a improvável relação de amizade entre este e Devereux que, tal como ele, eram homens deslocados dos seus espaços naturais pela própria imposição do Homem.
Ainda que eta relação de amizade floresça com o tempo, não é menos verdade dizer que muito do seu passado fica oculto para o espectador. Percebemos que Devereux é um homem cujo passado provém de outro país que não França, mais concretamente a Roménia, e que mudou de nome por motivos que nunc são explicados mas que adivinham um passado turbulento (fugido da guerra e do extermínio muito provavelmente), e que poderiam contribuir para a dinâmica de inadaptado que se pretende ser partilhada com o Picard interpretado por Del Toro. E o pouco que é revelado desse passado denota uma elevada componente sexual tanto da parte de Picard através de encontros furtuitos, mais ou menos consentidos, que mantinha em adolescente ou até mesmo do que ia tomando conhecimento através de inúmeras situações, assim como do próprio Devereux é dada a conhecer a relação amorosa que manteve com "Madeleine" (Gina McKee) que, no entanto, nunca é aprofundada ou tão pouco revelado os como e porquês de ter começado ou terminado sendo desde o primeiro instante clara que a ruptura era iminente.
Ainda que Jimmy P. seja um filme interessante sobre a perspectiva da psicanálise, da relação de amizade que é estabelecida entre estes dois homens bem como a conclusão de a dor de alma ser por vezes bem mais fisicamente condicionante do que aquela que afecta o corpo, não é menos verdade que este filme nos mantém em suspenso com um conjunto de elementos técnicos que não o tornam pessoal, ou seja, impossibilitam o espectador de encontrar elementos com os quais se possa identificar, mantendo-se assim uma história que permanece interessante e bem dirigida mas ao mesmo tempo fria e pouco empática tornando-se essa a sua maior debilidade.
Del Toro consegue manter uma certa rigidez com a sua interpretação de Jimmy Picard sendo apenas já bem perto do final que a consegue quebrar demonstrando que existe o homem para além do trauma. No entanto Amalric mantém ao longo de todo o filme o mesmo registo "over the top", que não lhe é habitual, e que parece única e exclusivamente interessado em factores e elementos técnicos como se os mesmos funcionassem como uma qualquer excitação de momento.
Numa história que pretende centrar-se na salvaguarda da alma humana e no reencontrar de uma humanidade perdida, este filme mantém-se sempre muito técnico, frio e algo factual sem se preocupar muito com o aspecto das pessoas por detrás dos acontecimentos não conseguindo encontrar um único momento nas suas quase duas horas de duração que nos revele quem são (foram) Picard e Devereux para além das trivialidades que haveriam de juntá-los. Assim, e não sendo um filme fraco tem esta fragilidade que o impossibilita de se tornar num grande filme sobre a temática e que também não contribui para estas se tornarem nas grandes interpretações a que estes dois actores tão sistematicamente já nos habituaram.
Desplechin volta a filmar uma história grande mas que poderia ter sido magnanime se se tivesse ela própria rodeado de alguma humanidade que permitisse ao espectador sair consciente de que a recuperação da alma pode acontecer para além de uma qualquer vertente técnica que está aqui tão presente.
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7 / 10
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