quinta-feira, 19 de maio de 2016

A Caverna (2015)

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A Caverna de Edgar Pêra é uma curta-metragem portuguesa de ficção e um dos últimos trabalhos do realizador de A Janela (Maryalva Mix) (2001), Oito Oito (2002) e O Barão (2011).
O que acontece quando um grupo de espectadores se encontra fechado numa sala de cinema e se vê forçado a conviver entre si?
Desde o primeiro instante que o espectador mais atento reconhece a mão criadora de Edgar Pêra em A Caverna na medida em que apenas um realizador - e argumentista - com um dedo criativo com este realizador poderia criar - e filmar - uma história em que no centro da mesma se encontra a dinâmica espectador versus sala de cinema/filme e espectador versus espectador.
Se por um lado observamos uma inicial relação do espectador comum que parece viver naquela sala como se dela dependesse a sua própria existência tendo, ao mesmo tempo, uma experiência quase extra-sensorial ao observar as inúmeras imagens que lhe chegam da tela - e das quais apenas temos breves vislumbres e imagens reflectidas nas faces dos espectadores -, é também justo afirmar que A Caverna cedo se transforma numa obra onde a dinâmica principal passa para a relação entre espectadores e a comunhão de espaço que denotam entre si.
Se o espectador dorme na sala de cinema como que de uma "caverna" onde passam pelo seu estado de hibernação se tratasse, é também justo afirmar que os rituais estão de tal forma entranhados nos diversos indivíduos que todos agem a uma passada lenta e semelhante que os transforma não em vários mas sim num aparente único organismo que sobrevive dentro daquelas paredes. Desde o período de descanso às refeições sem esquecer a breve socialização que têm entre si, todos vivem para assistir ao próximo filme efectuando apenas breves pausas entre momentos que se repetem sucessivamente. Rapidamente esquecem - se é que alguma vez os tiveram - outros rituais ou uma vida para lá daquilo que ocorre naquela sala e a cumplicidade é de tal forma presente que a seu tempo as suas relações passam do individual a um colectivo ou, numa palavra que o poderá melhor caracterizar, a uma tribo cujos hábitos são socialmente coordenados.
Alheados de uma normal socialização para lá daquela sala, os comportamentos evoluem - ou melhor, transformam-se - denotando momentos mais intensos, apaixonados e até mesmo selvagens talvez naquilo que poderá ser uma réplica assumida como "normal", daquilo que assistem e que percebemos consideram como a sua vida "real".
A sala de cinema é portanto, a tal "caverna" onde a tribo - ou irmandade - vê crescer uma cumplicidade de momentos e de comportamentos que transformam o espectador de um simples assíduo em sala num cúmplice de situações que apenas os demais elementos da tribo pode aceitar ou compreender e onde apenas podem pertencer aqueles que, tal como os demais, comungam da mesma "ordem". Espaço este que apenas a direcção de fotografia de Luís Branquinho - um habitual cúmplice de Pêra - transforma de uma banal sala de cinema numa gruta ou caverna real com recantos desconhecidos e perigos que podem estar à espreita.
Qualquer obra de Edgar Pêra é - por estas bandas - um acontecimento que se espera e aguarda com ânsia e dedicação - enquanto espectador - e A Caverna levanta um pouco aquele sentimento de que por muito bom que seja... não chegou. Não chegou na medida temporal, ou seja, os breves vinte minutos desta curta-metragem funcionam para deixar o espectador com vontade de uma longa-metragem onde o "espectador" (personagem) tivesse oportunidade de ser levado - e levar - ao limite mostrando o seu universo próprio e quais são as regras do jogo.
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7 / 10
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