terça-feira, 9 de julho de 2013

A Corda (2013)

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A Corda de Luís Belo foi a curta-metragem que saiu grande vencedora do 48 Short Media que se realizou no final do mês passado em Viseu, ao conquistar os prémios para o Melhor Cartaz, Fotografia, Curta-Metragem e o Grande Prémio do certame.
Dois amigos de infância encontram-se no jardim da sua antiga escola agora abandonada, onde os únicos ruídos que permanecem são aqueles que as suas memórias permitem recordar, e onde tantas horas de animação passaram. Ele (L. Filipe dos Santos) encara aquele espaço como a sua mais preciosa memória da amizade que sente por Ela (Ana Seia), no entanto o sentimento não parecer ser mútuo.
Ela, por sua vez, recorda o pequeno recanto da floresta como o lugar especial onde tem as mais sentidas recordações da amizade que sente por Ele, e onde passaram longas tardes na sua juventude, sendo que para Ele este espaço pouco significado parece manter.
Estará esta amizade tão presente como nos momentos em que ambos eram crianças e se viam como as pessoas mais especiais do mundo, ou estaremos agora perante duas pessoas que em tempos foram bons e fiéis amigos?
Tendo como base o poema Autopsicografia de Fernando Pessoa, tal como as restantes curtas do 48 Short Media, o magnífico argumento de Ana Seia é um claro retrato do passar dos anos e da forma como encaramos pessoas ou lugares onde em tempos tivemos uma parte da nossa própria história. É, no entanto, no regresso a esses mesmos locais que finalmente percebemos o quão importantes eles ainda são não só para nós mas também para aqueles com quem os partilhámos. Assim, a grande questão aqui colocada é simples... serão esses espaços e pessoas que fizeram parte do nosso crescimento tão importantes hoje como foram na altura? Seremos capazes de o compreender, assimilar e assumir em nome dessa grande amizade que em tempo uniu duas ou mais pessoas, ou permaneceremos num qualquer silêncio protector fingindo que tudo teve o seu tempo, a sua marca e o seu próprio espaço mas que permanecem "hoje" como um símbolo do passado?
Mas Ana Seia consegue ir ainda mais longe quando nos obriga a pensar (tarefa árdua nos dias que hoje correm), não sobre os sentimentos mas sim sobre a incapacidade que existe em nos entregarmos ao "outro" quando por ele sentimos a mais forte empatia e ligação como se de uma alma gémea se tratasse. O receio do "não", do afastamento ou de uma incompatibilidade de sentimentos, de expôr o próprio "eu" e de evidenciar a vulnerabilidade impedem-nos, com o passar dos anos, de reconhecermos em nós a capacidade de nos entregarmos, de gostarmos, de sentirmos e de o fazermos notar como as crianças fazem inconscientemente tal como nos é retratado no final desta curta-metragem. A questão final que se coloca é, deixamos nós de sentir ou sentimos sem querer sentir e com o receio que o "outro" saiba?
Se este argumento já nos permite pensar o suficiente, não é menos verdade que as duas interpretações protagonistas a cargo de L. Filipe dos Santos e de Ana Seia, exalam uma química e empatia que está para além das palavras. Os contidos gestos que ambos reflectem nos seus espaços especiais, garantem-nos não só a cumplicidade não assumida que sentem um pelo outro mas também que existe mais para além da simples amizade que em tempos os uniu. Sentimento esse do qual se privam mutuamente mas que é tão claro como a vivacidade das suas memórias e o qual timidamente expressam quando revelam que "pouco tempo passam juntos".
"Dá-lhe corda", escutamos por duas vezes por alguém que poderemos associar não só à sua memória (José Cruz), como também o poderíamos pensar como o professor que tiveram e que testemunhou essa cumplicidade. "Dá-lhe corda", repete, como se soubesse que é dessa forma que podem aCORDAr os seus sentimentos e vivê-los sem receios, sem constrangimentos e com uma vontade plena de simplesmente senti-los.
Sem reservas vou eu expressar os meus sentimentos e assumir que o realizador Luís Belo dirige uma simples, brilhante, emotiva e sentida curta-metragem com a qual eu me identifico em diversos momentos, e honestamente sei que muitos também o sentirão... mesmo que não seja admitido (porque a mensagem não chegou lá)... E finalmente deixo ainda uma nota positiva à direcção de fotografia de Tiago Ribeiro que capta oscilações e variações da luz muito interessantes que nos posicionam quer no presente quer no campo da memória e do passado bem como não poderia esquecer o cartaz, também da autoria de L. Filipe dos Santos, que constitui o melhor que este ano cinematográfico assistiu até ao momento. Dá que pensar o que o futuro nos pode reservar às mãos de profissionais com este nível... e eu cá estarei para assistir aos próximos filmes.
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10 / 10
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