Transilvania de David Tordable é uma curta-metragem espanhola que através de alguma comédia toca em diversos pontos sensíveis das sociedades actuais.
Pedro (David Rubio) e Juan (Emilio Gonzalez) são dois amigos que depois de muitos anos sem um contacto presencial se reencontram com novidades para partilhar. Pedro vai casar e, em vez de encontrar nisso um motivo de satisfação, passa o pouco tempo que está com o amigo a encontrar argumentos para justificar e dar sentido a este mesmo casamento. Qual será o problema que realmente o atormenta?
O argumento de Pablo Gutiérrez é súbtil na reflexão cómica que efectua a respeito das sociedades modernas, conseguindo assim identificar alguns dos problemas da actualidade e apontar os medos irracionais que problemas como o desemprego e as dificuldades económicas fazem crescer junto da população.
"Pedro" vai casar. Conheceu a mulher da sua vida "mas"... ela é romena, da Transilvânia... terra dos monstros como mais tarde apontava "Juan". É a mulher que face às dificuldades de encontrar um trabalho dentro da sua área de formação, o ensino, continuou a procurar e encontrar trabalho como enfermeira. É bonita, ama-o e aceitou constituir família com ele. No entanto, algo atormenta "Pedro"... ela é romena mas "das normais"... não é "escura" e o nome dela até passa por espanhol... "Natália", podendo desta forma encontrar uma maior receptividade junto da sociedade de uma forma geral. Ou será que a aceitação que tarda em chegar é a de "Pedro", aquela que já deveria estar garantida desde o primeiro momento?
Aos poucos, e sempre através das maiores irracionalidades e preconceitos que aos poucos aumentam nas sociedades europeias como a xenofobia e o medo do "outro", provocados pela falta de oportunidades e o exponencial crescimento do desemprego, da insegurança e da incerteza do futuro, esta curta-metragem e a excelente direcção de David Tordable dão vida a um argumento que infelizmente não é apenas mais uma história mas sim a realidade de uma sociedade que aos poucos dá os seus sinais de ruptura. Como pode Espanha ser uma super-potência quando aparentemente tudo à sua volta parece aos poucos desmoronar e a sua população viver num constante clima de insegurança económica que rapidamente se traduz numa insegurança social?
Este argumento e respectivas premissas estão aqui adaptados a uma realidade espanhola mas, na prática, podem ser realidades de qualquer outra parte de um continente que aos poucos se ressente das suas más políticas (e políticos) que graças a medidas de corrosão social fazem aumentar não só essas referidas incertezas como principalmente a necessidade de encontrar os ditos bodes expiatórios que de alguma forma "justifiquem" os problemas que as populações e a sociedade enfrentam. Como posso ir "eu" a uma entrevista onde todos os outros indivíduos que lá estão são imigrantes? Imigrantes esses que, tal como "eu" podem ser atletas de alta competição, pioneiros na medicina, na cibernética, nas engenharia ou nas artes e letras mas que, face à incerteza de um futuro desconhecido, são para o nativo um impedimento para a prosperidade.
A curta-metragem de David Tordable reflecte assim sobre um importante e muito presente problema da nossa sociedade mas de uma forma ligeria e não tão "negra", facto que nos permite pensar mais seriamente sobre o mesmo não o encarando como uma fatalidade mas sim como um preconceito ou estigma que não deveremos ter na nossa vida nem na nossa mentalidade, deixando assim de encarar o "outro" como algo diferente do "eu". E acima de tudo, dá-nos também um pequeno olhar sobre como a forma de violência mais escondida e menos avaliada pode estar mesmo ao meu lado, junto daqueles que considero como sendo iguais a mim e que, por esse mesmo motivo, não o considero como uma real ameaça ou violência como é o caso da doméstica presente no segmento final desta excelente e muito bem elaborada curta-metragem.
Um filme imprescindível e um dos mais bem dirigidos que vi nos últimos tempos que poderia muito bem ser exemplo e motor de sensibilização pois são estas "pequenas" histórias que por vezes conseguem mais facilmente chegar às mentes menos receptivas.
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9 / 10
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