O Cheiro das Velas de Adriana Martins da Silva é uma curta-metragem portuguesa de ficção que nos permite entrar na tensa e invulgar relação entre Sara (Joana Brandão) e Gabriela (Oceana Basílio), duas irmãs que se reúnem para o aniversário da sua mãe, anos após da sua própria relação se ter afastado e degradado ao ponto de pouco comunicarem ou até mesmo se conhecerem.
No entanto, Sara pouco conformada com este estranho distanciamento da sua irmã, aos pouco tenta perceber o que a levou a ignorá-la ao ponto de mal se falarem para aquela que seria uma invulgar descoberta da sua juventude e principalmente da mulher que ela própria é mas que, até então, recusou aceitar.
O argumento escrito por Pedro Martins e Adriana Martins da Silva consegue colocar-nos num ambiente tenso ao ponto de quase nos parecer carnal em diversos momentos, e capta a relação não necessariamente entre duas irmãs mas sim entre duas mulheres que conhecendo-se são essencialmente duas estranhas com curiosidade sobre quem será a "outra" com quem se deparam. Assim, de um início repleto de silêncios incomodativos e quase cortantes, passamos para uma auto e mútua descoberta sobre o passado desta duas irmãs próximas e amigas mas que são agora duas misteriosas e sedutoras mulheres que se desconhecem. Assim, se inicialmente a sua relação é tensa e impessoal, muito rapidamente temos entre ambas um clima sedutor quase carnal onde aparentemente se sentem incapazes de estar afastadas, tal a curiosidade.
Mas não é só o argumento que transmite uma força. A dupla de actrizes Oceana Basílio e Joana Brandão são por si só o seu veículo. Enquanto Brandão é um elemento silencioso mas curioso prestes a entrar numa viagem de auto-descoberta, Basílio é o motor que faz essa viagem ter o seu começo. Viagem essa para a qual coloca à disposição toda a sua natural sensualidade que consegue dominar o filme a todo o momento, e evidenciar a clara química que existe entre as duas actrizes que se entregam, com dedicação, às suas personagens que assim dominam o espaço e principalmente o tempo que passa sem que dele demos conta.
Tecnicamente há que referir a perfeita sintonia entre a direcção de arte de Sofia Nunes e a fotografia de Miguel Robalo que nos colocam num espaço que por momentos pensamos não existir na medida em que estamos perfeitamente concentrados na dinâmica criada entre "Sara" e "Gabriela" esquecendo que à nossa volta existe todo um mundo onde elas se encontram.
Gostei particularmente desta interessante curta-metragem pela possibilidade que ela nos dá de viajar para além daquele breve encontro entre as duas irmãs, ou seja, pelo facto de ter potencial para ser uma longa-metragem onde poderia ser explorada a dinâmica das duas enquanto crianças, bem como a relação com a mãe que, sendo fisicamente ausente nesta curta-metragem (ou presente por breves segundos), é uma presença quase sempre constante nas memórias das duas irmãs e que teria com certeza a sua própria história a contar sobre a relação que por um lado tem com as suas filhas como por outro, a relação que percebeu ter existido entre ambas.
Iremos assim ter a hipótese de poder ver mais?
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8 / 10
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