O Cosmonauta de Nicolás Alcalá é uma longa-metragem espanhola-rusa independente e que graças a uma muito bem elaborada campanha publicitária de crowdfunding conseguiu garantir a sua conclusão.
A história deste filme começa na década de 50 do século XX quando o espaço era uma incógnita ainda por explorar, e nos são relatados os sonhos de um homem que em criança desejou e imaginou o que estava para lá do seu planeta.
Depois deste pequeno relato introdutório somos transportados para 1975 quando Stas (Leon Ockenden), um cosmonauta russo que no final da sua missão no espaço se vê impossibilitado de regressar a casa ficando perdido no espaço.
No entanto, num misto de memórias e de recordações de um passado que vivera, Stas recorda a sua vida na Terra, a sua amizade e cumplicidade com Andrei (Max Wrottesley) e Yulia (Katrine De Candole), e do amor que secretamente nutria por esta última, ao mesmo tempo que nos deparamo com uma nova e estranha realidade que se prende com o facto de Stas estar subitamente de regresso ao planeta que, no entanto, encontra vazio e solitário, desprovido de qualquer tipo de vida para além da natural que parece conquistar lentamente terreno, e tendo nas infraestruturas que resistem a marca de que alguma vez o Homem passou pela Terra, sendo que é através das mensagens que envia via rádio que Stas vai, aos poucos, destruindo a realidade daqueles que ficaram para trás, e atormentando as suas próprias realidades.
O curioso argumento de Nicolás Alcalá retém uma interessante premissa sobre a solidão ao transportá-la para um cenário pouco habitual como é a órbita terrestre, onde independentemente de toda a comunicação que se pode estabelecer com quem ficou no planeta, a realidade é que naquele pequeno aparelho no espaço a solidão sente-se de uma forma muito particular. Longe de tudo e de todos tendo apenas um rádio para poder comunicar, o que aconteceria se, de repente, um indivíduo se deparasse com a impossibilidade de regressar para as pessoas e lugares que sempre conheceu? Até que ponto este seria psicologicamente afectado por um fim que, não sendo anunciado, estaria longe e imperceptível, ficando apenas confirmada uma cada vez maior solidão e um vazio evidente?
O único escape que assim teria "Stas", personagem não necessariamente principal mas aquela sobre a qual todo o enredo se desenvolve, é dar continuidade a uma imaginação sobre essas mesmas experiências que em tempos tivera e que estão agora para sempre impossibilitadas por não poder regressar ao seu espaço. Apenas na sua memória regressa, e é nela que a Terra já não tem uma população nem qualquer sinal de vida, pois por não poder testemunhá-la não sabe como se transforma, como se condiciona ou desenvolve, nem tão pouco as marcas que esta deixa naqueles que a habitam. Assim, a única coisa que persiste é a sua memória e as imagens que teve do seu passado e, como tal, no seu suposto regresso nada mais existe... nem pessoas nem animais que, em circunstâncias ditas normais, teriam já as marcas do tempo decorrido. Tudo o que então temos nada mais são do que as vãs memórias do passado e dos espaços.
Enquanto "Stas" divaga sobre uma Terra vazia, os seus amigos e o seu passado extinguem-se lentamente pelas imagens que as suas divagações lhes transmitem e que denotam uma mente outrora brilhante que agora se apaga lentamente numa imensidão de vazio que ninguém, a não ser o próprio, pode imaginar.
É esta mesma solidão e constante memória que, na prática, têm o lugar mais importante de toda esta história. Através da fotografia de Luis Enrique Carrión onde predominam os tons esbatidos e por vezes vagos e pouco claros que somos apresentados a todo um espaço em que as memórias são a vivência presente. É a partir delas que todo o filme ganha forma e que percebemos que enquanto espectadores já abandonámos também nós um qualquer domínio onde a realidade predomine. Nós vivemos e estamos a experimentar aquilo que sobra de uma memória e das recordações de "Stas". Este filme alcança assim uma componente quase mística como se de um relato do passado com imagens em movimento se tratasse.
Visualmente bastante apelativo e com algumas imagens e planos de extrema beleza poética que transformam o planeta como se de um paraíso se tratasse mas que, no entanto, apresentam alguns momentos em que falta uma conexão real com a história em si. No entanto, se pensarmos nelas como resquícios de uma memória... quantos de nós podem dizer que a têm com uma ligação coerente e cronológica acertada?
Ainda com uma música original de Joan Valent que faz denotar as qualidades etéreas desta história, este filme vive muito do potencial de o identificarmos e qualificarmos como um retrato de um memória e dos referidos aspectos técnicos que contribuem para que esse factor seja privilegiado em detrimento dos demais, não apresentando nenhuma interpretação que se evidencie das demais ou tão pouco um argumento que explore certas pontas soltas como a relação entre "Stas" e "Yulia" para o desconhecimento de "Andrei".
Vale com toda a certeza pelo potencial artístico que apresenta e que faz dele um interessante filme poético e visual, mas no que diz respeito ao argumento tem potencial que o faz poder ir bem mais longe mas que logo de antemão percebemos não ter sido conseguido graças às limitações orçamentais que teve. Em abono da verdade, há ainda que referir que este projecto foi concluído graças ao investimento e apoio daqueles que nele acreditaram e que, para além disso, teve a vantagem de estrear não só em sala como também via net quase em simultâneo.
Diferente e interessante, com leves toques de Mallick, este O Cosmonauta não é um filme que irá conseguir uma enorme legião de fãs mas que para aqueles que apresentem um espírito mais aberto e receptivo irão com toda a certeza dele retirar alguns aspectos e premissas francamente interessantes e promissoras.
.A história deste filme começa na década de 50 do século XX quando o espaço era uma incógnita ainda por explorar, e nos são relatados os sonhos de um homem que em criança desejou e imaginou o que estava para lá do seu planeta.
Depois deste pequeno relato introdutório somos transportados para 1975 quando Stas (Leon Ockenden), um cosmonauta russo que no final da sua missão no espaço se vê impossibilitado de regressar a casa ficando perdido no espaço.
No entanto, num misto de memórias e de recordações de um passado que vivera, Stas recorda a sua vida na Terra, a sua amizade e cumplicidade com Andrei (Max Wrottesley) e Yulia (Katrine De Candole), e do amor que secretamente nutria por esta última, ao mesmo tempo que nos deparamo com uma nova e estranha realidade que se prende com o facto de Stas estar subitamente de regresso ao planeta que, no entanto, encontra vazio e solitário, desprovido de qualquer tipo de vida para além da natural que parece conquistar lentamente terreno, e tendo nas infraestruturas que resistem a marca de que alguma vez o Homem passou pela Terra, sendo que é através das mensagens que envia via rádio que Stas vai, aos poucos, destruindo a realidade daqueles que ficaram para trás, e atormentando as suas próprias realidades.
O curioso argumento de Nicolás Alcalá retém uma interessante premissa sobre a solidão ao transportá-la para um cenário pouco habitual como é a órbita terrestre, onde independentemente de toda a comunicação que se pode estabelecer com quem ficou no planeta, a realidade é que naquele pequeno aparelho no espaço a solidão sente-se de uma forma muito particular. Longe de tudo e de todos tendo apenas um rádio para poder comunicar, o que aconteceria se, de repente, um indivíduo se deparasse com a impossibilidade de regressar para as pessoas e lugares que sempre conheceu? Até que ponto este seria psicologicamente afectado por um fim que, não sendo anunciado, estaria longe e imperceptível, ficando apenas confirmada uma cada vez maior solidão e um vazio evidente?
O único escape que assim teria "Stas", personagem não necessariamente principal mas aquela sobre a qual todo o enredo se desenvolve, é dar continuidade a uma imaginação sobre essas mesmas experiências que em tempos tivera e que estão agora para sempre impossibilitadas por não poder regressar ao seu espaço. Apenas na sua memória regressa, e é nela que a Terra já não tem uma população nem qualquer sinal de vida, pois por não poder testemunhá-la não sabe como se transforma, como se condiciona ou desenvolve, nem tão pouco as marcas que esta deixa naqueles que a habitam. Assim, a única coisa que persiste é a sua memória e as imagens que teve do seu passado e, como tal, no seu suposto regresso nada mais existe... nem pessoas nem animais que, em circunstâncias ditas normais, teriam já as marcas do tempo decorrido. Tudo o que então temos nada mais são do que as vãs memórias do passado e dos espaços.
Enquanto "Stas" divaga sobre uma Terra vazia, os seus amigos e o seu passado extinguem-se lentamente pelas imagens que as suas divagações lhes transmitem e que denotam uma mente outrora brilhante que agora se apaga lentamente numa imensidão de vazio que ninguém, a não ser o próprio, pode imaginar.
É esta mesma solidão e constante memória que, na prática, têm o lugar mais importante de toda esta história. Através da fotografia de Luis Enrique Carrión onde predominam os tons esbatidos e por vezes vagos e pouco claros que somos apresentados a todo um espaço em que as memórias são a vivência presente. É a partir delas que todo o filme ganha forma e que percebemos que enquanto espectadores já abandonámos também nós um qualquer domínio onde a realidade predomine. Nós vivemos e estamos a experimentar aquilo que sobra de uma memória e das recordações de "Stas". Este filme alcança assim uma componente quase mística como se de um relato do passado com imagens em movimento se tratasse.
Visualmente bastante apelativo e com algumas imagens e planos de extrema beleza poética que transformam o planeta como se de um paraíso se tratasse mas que, no entanto, apresentam alguns momentos em que falta uma conexão real com a história em si. No entanto, se pensarmos nelas como resquícios de uma memória... quantos de nós podem dizer que a têm com uma ligação coerente e cronológica acertada?
Ainda com uma música original de Joan Valent que faz denotar as qualidades etéreas desta história, este filme vive muito do potencial de o identificarmos e qualificarmos como um retrato de um memória e dos referidos aspectos técnicos que contribuem para que esse factor seja privilegiado em detrimento dos demais, não apresentando nenhuma interpretação que se evidencie das demais ou tão pouco um argumento que explore certas pontas soltas como a relação entre "Stas" e "Yulia" para o desconhecimento de "Andrei".
Vale com toda a certeza pelo potencial artístico que apresenta e que faz dele um interessante filme poético e visual, mas no que diz respeito ao argumento tem potencial que o faz poder ir bem mais longe mas que logo de antemão percebemos não ter sido conseguido graças às limitações orçamentais que teve. Em abono da verdade, há ainda que referir que este projecto foi concluído graças ao investimento e apoio daqueles que nele acreditaram e que, para além disso, teve a vantagem de estrear não só em sala como também via net quase em simultâneo.
Diferente e interessante, com leves toques de Mallick, este O Cosmonauta não é um filme que irá conseguir uma enorme legião de fãs mas que para aqueles que apresentem um espírito mais aberto e receptivo irão com toda a certeza dele retirar alguns aspectos e premissas francamente interessantes e promissoras.
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