sábado, 7 de fevereiro de 2015

Surveillance (2008)

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Vigilância de Jennifer Lynch é uma longa-metragem norte-americana e a segunda da realizador desde Boxing Helena (1993).
Depois de alguns bizarros assassinatos ocorrerem numa pequena cidade do interior dos Estados Unidos, os agente do FBI Elizabeth Anderson (Julia Ormond) e Sam Hallaway (Bill Pullman) instalam-se na mesma para averiguar a ocorrência e interrogar os sobreviventes. À medida que algumas respostas vão sendo respondidas e que todos revelam ter algo por esconder, a grande questão coloca-se... conseguirão alguma vez encontrar os assassinos?
Aquilo que se destaca de no argumento de Kent Harper e Jennifer Lynch é a capacidade de colocar o espectador num estado de antipatia imediata com todas estas personagens que parecem ter sido retiradas de um espaço alternativo e com mentes muito próprias sobre aquilo que é "correcto" em sociedade e na comunidade. De dois drogados com vontade de negócio fácil e rápido (Pell James e Mac Miller), a um par de polícias pouco respeitador da lei (French Stewart e Kent Harper) e sem esquecer a jovem Stephanie (Ryan Simpkins), todos são, pelo interrogatório ou pelas imagens em flashback que o espectador recebe como pistas sobre o sucedido, suspeitos de algo inconclusivo.
Sendo a única certeza do espectador a ocorrência das mortes e a fuga de dois perigosos assassinos, cabe-nos confiar nos representantes da lei que ali chegam para (nos) desvendar quem são, afinal, todas estas pessoas que conseguiram sobreviver a um conjunto de crimes hediondos e que serão agora testados pelos seus actos... ou falta deles. A moral, ausente tanto nos sobreviventes (ou suspeitos?) como nos agentes da autoridade e até mesmo, de certa forma, nos agentes do FBI que ali chegam e parecem ter, eles próprios, a sua história por contar, leva o espectador a suspeitar estar perante um universo alternativo, distante da lei, do seu cumprimento ou até mesmo de uma noção sobre a dita que leva estas diferentes personagens a caminhar num limbo, sendo questionados - pelo espectador - sobre os seus verdadeiros motivos existenciais ou, por outras palavras, sobre o que os move e aparenta levar a um espaço de indiferença apática desadequada aos acontecimentos que testemunharam.
Alguns indiferentes à morte - afinal abandonaram ao acaso aqueles que precisavam - à lei - que juraram cumprir - à necessária atenção aos seus - afinal... uma música de outros tempos deixa sempre mais adrenalina - ou até mesmo a uma noção de alerta quando em perigo - quando parecem não (nos) escutar... para quê preocupar?! - todos eles são supostas vítimas de um conjunto de acontecimentos que, no final, se revelam eles próprios detentores de uma qualquer razão mais ou menos oculta que os levou a distanciarem-se do correcto... daquilo que tem de ser feito ou, como quem diz, da tal já referida moral que (em princípio) povoa o imaginário de todas as pessoas.
A corrupção instalada na lei, na ordem, nos costumes, nos valores e até mesmo no dia-a-dia daqueles que aparentam (ao exterior) ser simples e pacatos cidadãos revela-se para lá de institucional... pessoal. O argumento de Surveillance não questiona tanto se a autoridade é corrupta - potencialmente ou de facto - mas sim se o indivíduo por detrás do aparentemente mais inocente rosto corresponde com uma noção de justiça igualitária ou se, por sua vez, usa esse mesmo aspecto para manobrar em proveito próprio... independentemente de se se é um polícia, um drogado desrespeitador da lei ou uma criança inocente.
No fundo a grande questão que Surveillance levanta é... até que ponto é cada um de nós verdadeiramente inocente... Mais, até onde vai a inocência de um indivíduo ou, por outras palavras, o que distancia estes sobreviventes de um massacre em pessoas moralmente de bem... em verdadeiras vítimas ou não serão eles mais do que não tão simples colaboradores do mesmo que se refugiam no seu proveito próprio e condição do momento para escaparem a um desejo reprimido e oculto que, na sua perspectiva, os irá beneficiar a longo prazo. Perto do final questiona-se o espectador sobre quem serão os verdadeiros assassinos... as reais vítimas e até mesmo se deve ter simpatia para com o mais inocente dos rostos...
Sendo o ponto mais forte de Surveillance a recriação de um universo muito próprio no meio de "nenhures" e as duas interpretações disfuncionais de Julia Ormond e Bill Pullman que são aliás das melhores que ambos oferecem em muito tempo, ficou em falta, no entanto, o clima claustrofóbico que poderia ter sido criado em torno daquela esquadra de polícia perdida no meio do deserto e até alguma psicopatia dos agressores (quais deles?!) que poderia ter sido mais explorada e deixado o espectador criar uma empatia com algumas destas personagens... por muito que a mesma possa parecer "perigosa".
Num ritmo muito próprio e com a sua marca Lynch bem denotada - mas não tão vincada como a de David Lynch - a realizadora Jennifer Lynch revela-se capaz de contar histórias enigmáticas, recheadas de inuendos e caminhos dúbios que primeiro são firmados pela incerteza mas esclarecedores pelos pequenos detalhes e pistas que são lançados e que o espectador teima em ver mas não em perceber pela improbabilidade da sua confirmação. E Surveillance - a nossa vigilância - não sendo uma obra-prima no género nem aquele filme que iremos recordar mais tarde consegue, no entanto, construir um conjunto de interessantes e carismáticas personagens que mereciam - todas elas - ter as suas histórias paralelas contadas e filmadas revelando assim a sua perspectiva sobre este mundo "distante" onde parecem residir.
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6 / 10
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