domingo, 30 de junho de 2013

4M (2011)

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4M de Nelson de Castro e Wilson Pereira é uma curta-metragem portuguesa de ficção que nos conta a história de Diogo (Hugo Costa Ramos) e Estela (Sara Gonçalves), dois activistas que vivenciam uma penitência numa altura social, económica e moralmente conturbada.
Quando Diogo é capturado e aplicada sobre ele a nova lei 4M, a pergunta que se impõe prende-se com a impossibilidade das relações humanas e o futuro dos cidadãos que estão assim impedidos de manifestar as opiniões divergentes das impostas pelo governo.
O argumento de João Farinha, Nelson de Castro e Wilson Pereira não poderia ser mais ironicamente actual quando nos deparamos com uma vontade secreta de banalizar a manifestação e o direito à mesma onde numa sociedade que se assume cada vez mais individualista e desinteressada para com os reais problemas que a afectam se conforma lentamente com a "inevitabilidade" daquilo que lhe é imposto.
Numa época, independentemente dela qual fôr, em que alguns dos mais importantes direitos pelos quais toda a nossa sociedade se rege, devemos questionar-nos sobre a relevância dos mesmos não só para a mesma como principalmente para a consciencialização de classe e do próprio ser Humano e, como consequência directa, até que ponto abdicar hoje de um direito abre um precedente para outros serem questionados.
Esta curta-metragem que me chegou às mãos muito recentemente, deixa-me assim pensar sobre a sociedade em que vivemos e os perigos que afectam diariamente a nossa forma de vida onde se incute constantemente uma certa ideia de que manifestar é perigoso, que as manifestações e greves não trazem benefícios (antes pelo contrário), e especialmente que se o fizermos poderemos colocar em causa certas seguranças e garantias que até à data nos têm sido "dadas", quando na prática todas elas foram conquistadas no passado através da luta de muitos.
As inspiradas e cúmplices interpretações de Hugo Costa Ramos e de Sara Gonçalves encarnam assim na perfeição este sentimento de estarem por um lado marcados pelo afastamento que lhes é imposto e assim impedidos de socializar a uma distância que lhes permita solidificar a sua própria relação, e por outro sentimos também que o clima da sociedade em que vivem é fortemente austero e pouco livre, fazendo com que todos sintam o receio de viver tranquilamente as suas opiniões e posições sociais e políticas.
Destaque ainda para a direcção de fotografia de Nelson de Castro que consegue conferir a esta curta-metragem uma interessante atmosfera ao tempo e ao espaço em que se vive, como se nos encontrássemos numa época diferente, mas não tão distante quanto isso.
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8 / 10
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xXx (2013)

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xXx de João Alves foi a curta-metragem de animação vencedora do concurso Done in Sixty Seconds da Jameson/Empire e que esteve em competição em Londres, naquela que é uma excitante transformação do filme homónimo com Vin Diesel e Samuel L. Jackson deste realizador que tem elevado a animação nacional a um patamar bem alto.
A história original de xXx já todos conhecemos e, como tal, não vale a pena falar da mesma. No entanto, há sim que destacar a excelência desta animação que recupera em sessenta segundos todo um filme de acção e intriga através dos seus momentos mais emocionantes e marcantes conseguindo, através dos mesmos, ficar um magnífico filme do género bem como nos deixa pensar sobre todo o potencial que tem (ou teria) se fosse uma longa-metragem de animação com o ritmo que aqui apresenta.
Em duas pequenas grandes palavras... intenso e delirante.
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8 / 10
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Shame (2013)

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Shame de Leone Niel foi uma das três curtas-metragens finalistas ao concurso Done in Sixty Seconds promovido pela Jameson/Empire onde durante e referida duração se recria toda a dramatização de um filme.
Assim, numa recriação alternativa do filme Shame (Vergonha no título português), David Picco encarna a personagem a que Michael Fassbender deu vida e muita alma, e aqui com a excelência de o fazer de uma forma bem original e cómica da qual nada vou revelar pois precisa de ser visto pelo seu conteúdo que a todos fará lembrar o filme de Steve McQueen mas elevá-lo a um outro domínio.
Excelente e original este Shame português bem merecia mais do que um simples minuto.
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9 / 10
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sábado, 29 de junho de 2013

A Vida de Rafi (2013)

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A Vida de Rafi de Daniela Leitão é um documentário português sobre a conta-cultura do graffiti gravado na íntegra com um smartphone e que, tal como é anunciado, é assim o primeiro a seguir este registo.
Nesta curta-metragem documental acompanhados Rafi, uma rapper, graffiter e empresária que não só se dedica às suas actividades profissionais como também a auxiliar um sem número de animais que vai recolhendo.
Com a casa repleta de animais que vivem em harmonia, sobra-lhe tempo para as suas actividades profissionais onde se destaca com excelência e onde marca também pela diferença e pela feminilidade que, pelo que repara, faz excepção no seu meio.
O graffiti, enquanto contra-cultura e seu modo de se afirmar na sociedade, tal como a própria premissa e significado desta forma de arte explicita, é a marca do "eu" (social) "existo", que teve a sua origem em Carcavelos e que facilmente se difundiu por todo o país, através de uma personalização do espaço público urbano.
Além do tema ser ainda muito pouco explorado no universo cinematográfico nacional, algo curioso considerando que temos alguns dos melhores artistas do género a nível Europeu, este documentário preza ainda pela originalidade da forma como foi filmado sendo que, no entanto, perde um pouco por não ter uma maior duração e exploração da contra-cultura per si. Concordemos ou não com esta forma de arte, o que é facto é que todos nós não deixamos de ter uma vincada opinião sobre a mesma o que dá margem de liberdade ao tema para ser mais explorado em futuras produções do género.
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6 / 10
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O Ciclo do Amor (2013)

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O Ciclo do Amor de Tiago Vitorino, que assume igualmente os créditos de argumentista, é uma curta-metragem portuguesa de ficção que através de algum "humor adolescente" tenta caracterizar muitas das jovens relações da actualidade.
Quando um jovem se vê repentinamente solteiro depois da sua namorada o apanhar a olhar para outra, este atravessa as várias etapas da sua nova vida conjugal. Primeiro delira com a ideia das oportunidades que pode vir a ter para de seguida se amargurar por ter perdido aquilo que tinha dado como "seguro". Da excitação à depressão passando pelo rebate de consciência, este jovem aproxima-se repentinamente do fim da sua vida mesmo que, para tal, precise da ajuda do seu melhor amigo.
Vários são os momentos e situações desta curta-metragem que oscilam entre a tentativa de ter alguma comédia com o perfeito desastre que nos remetem para aquela lugar em que pensamos "mas que raio é isto?", que é como quem diz, o pior que pode acontecer a alguém que vê um filme. Não só as situações são francamente desastrosas e sem sentido, não pelo humor que poderiam ter mas pela falta dele, como também desejamos a certo ponto que alguns destes factos estejam realmente a acontecer e que o sofrimento (do espectador) termine rapidamente.
Quando o nosso jovem protagonista tenta suicidar-se cortando os pulsos, encontramos uma situação que mais parece uma carnificina da Humanidade pois com a quantidade de sangue derramada não percebemos bem se ele cortou os pulsos, a jugular ou se está realmente a esquartejar meio planeta. E quando pensamos que este momento terminou, recebemos ainda pior quando o seu melhor amigo o tenta salvar mas mais se aproxima de o eliminar... com amigos destes, quem precisa dos inimigos?!
A estes pequenos grandes erros que tentam suavizar a história dando-lhe alguns apontamentos de comédia, não ajuda o facto deste argumento conter um sem fim de clichés que estão completamente repetidos em dezenas de outros filmes do género e que são apenas tolerados nos mesmos por serem bem executados, bem como enterram ainda mais a curta-metragem quando vemos os evidentes erros de filmagem habituais no género que vão desde as oscilações de câmara nos exteriores, passando pelas dificuldades de som, a necessidade de transmitir ideias verbalizando todos os momentos que a câmara nos mostra e, claro está, o reflexo de quem filma como podemos constar perto do final junto ao carro ou, mais óbvio ainda, após o primeiro encontro com as novas namoradas... passa um mês e a fatiota dos intervenientes é exactamente a mesma (espero que tenham tomado pelo menos um duche pelo caminho...).
Para além de uma curta-metragem dita amadora à qual podemos dar o devido desconto se pensarmos que os envolvidos não têm experiência no meio, não deixa de ser menos verdade que a repetição não bem sucedida do género não faz com que este filme obtenha algum mérito para além da boa vontade de quem a faz poder iniciar-se num caminho cinematográfico. Assim, se a encararmos como um ensaio ou um trabalho experimental, tem o seu devido desconto e enquanto espectador posso "olhar para o lado"... No entanto, é bom que quem a fez perceba das suas limitações e tentar contar histórias mais simples e apropriadas aos recursos disponíveis onde, pelo caminho, possa inicialmente eliminar as pequenas falhas técnicas que comete e assim, com o tempo, poder apresentar histórias não só mais credíveis como também com mais graça e vigor... mesmo que este seja sem sentido e disparatado, porque de momento a única palavra que me ocorre com frequência é... desastre.
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1 / 10
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sexta-feira, 28 de junho de 2013

The Dark Half (1993)

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A Face Oculta de George A. Romero que também escreveu o argumento com base na obra homónima de Stephen King, apresenta-nos ao jovem Thad Beaumont, uma criança dotada para a escrita a quem é descoberto um tumor no cabeça que precisa remover. É no meio da operação que a surpresa surge e que os médicos descobrem que muito para além de um suposto tumor, o que Thad tinha instalado no seu cérebro, este inchaço era sim o seu irmão gémeo que nunca chegara a desenvolver.
Anos mais tarde já casado e pai, Thad (Timothy Hutton) é um escritor de sucesso que tem uma promissora carreira enquanto autor sério, e uma outra bem lucrativa onde desenvolve os mais variados contos que têm uma extensa legião de fãs, e em que assina como "George Stark".
Quando um fã descobre que Thad é afinal "Stark" e o chantageia em troca de não divulgar a sua identidade, este resolve terminar definitivamente com o seu pseudónimo e manter apenas a sua vertente mais séria. No entanto, é a partir deste momento que Thad começa a ser suspeito de cometer um conjunto de crimes violentos dos quais todas as provas o dão como culpado.
Estará Thad realmente implicado neles ou será que mais alguém a quem está intimamente ligado quer denegrir definitivamente a sua imagem?
Um filme realizado e cujo argumento foi escrito por Romero com base num conto de Stephen King, apenas pode resultar num filme de suspense e terror intenso que nos surpreende do primeiro ao último minuto. Aqui, temos toda uma atmosfera de um filme do género que consegue fazer aproximar o espectador de uma família que tem tudo para viver feliz e com a qual nos identificamos de certa forma mas, ao mesmo tempo, sentimos a constante presença de algo obscuro que pode revelar-se a qualquer momento, e que está invariavelmente relacionado com a estranha e invulgar juventude de "Thad".
No entanto, e apesar desta atmosfera ser uma constante durante todo o filme, não é menos verdade que poucos são os momentos que são verdadeiramente assustadores e dignos de transformar este filme numa referência do género ou naquela grande obra dos dois mestres do terror, e que apenas quando o verdadeiro "George Stark" aparece é que podemos realmente afirmar que a tensão está no ar, dando vida a alguns segmentos repletos de emoção e alguma violência física capazes de impressionar.
Para o bom funcionamento destes segmentos está a competente interpretação de Timothy Hutton que tem tanto de inocente e de alma perturbada como, por outro lado, é capaz de encarnar as verdadeiras trevas e o mal quando incorpora o seu "George Stark", naquela que é possivelmente a interpretação mais forte do filme e também da sua carreira desde então, eclipsando inclusivé a prestação que entrega enquanto "Thad". Se o mal tem realmente mil rostos, "Stark" é seguramente um deles.
As restantes interpretações são contidas e meramente decorativas mas, no entanto, destaco ainda a presença de uma Amy Madigan que interpreta a angustiada mulher de "Thad" que tudo faz para o confortar percebendo que está, no entanto, perante uma situação que ela própria não consegue controlar ou sequer pode antever as suas reais consequências.
Não sendo um dos filmes mais intensos de Romero, ou tão pouco das melhores adaptações de Stephen King ao grande ecrã, este The Dark Half consegue conter uma mística interessante e um clima tenso graças a "Stark" que mantém este filme vivo e num certo limbo que nos cativa sem conseguir, no final, cumprir todos os pressupostos da intensidade e do terror que dele nos faz esperar. Ele prende-nos e promete algo macabro por descobrir mas, na prática, ronda sem nunca cumprir ou efectivar todo o potencial que tem.
Interessante como filme de "sexta à noite" mas na prática é um filme que não nos transmite nada de novo, não pela falta do tal potencial mas sim porque nunca se determina a fazê-lo cumprir sendo que assim não o iremos recordar para tempos futuros ou que se torne sequer numa referência, e tendo apenas como seu lado francamente positivo a interpretação que Hutton encarna desde o início, para o bem e para o mal, e mesmo esta só consegue ganhar o fôlego necessário com o seu lado macabro e violento em momentos muito pontuais da trama, ficando assim a valer apenas para os apreciadores e fãs do género e não no seu todo enquanto obra de terror ou suspense.
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6 / 10
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48 ShortMedia

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de 28 a 30 de Junho em Viseu
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quarta-feira, 26 de junho de 2013

Branco (2013)

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Branco de Luís Alves é uma curta-metragem portuguesa de ficção que teve a sua muito aguardada estreia ontem no Shortcutz Lisboa e que é, de longe, um dos grandes filmes do ano, sendo isto desde já muito pouco para descrever aquilo que ele representa.
Portugal 2013. Branco (Nuno Melo), é um homem comum como tantos outros que, no entanto, atingiu o seu ponto de ruptura. Em dia de eleições, ele parece determinado em fazer a diferença e, para o bem ou para o mal, percebemos que ela está iminente.
Depois de uma breve passagem pelo café do bairro onde ouve os constantes desabafos de Isaías (Joaquim Nicolau) e Duques (Fernando Ferrão), chega finalmente a altura de se dirigir para o local de voto onde parece ter finalmente atingido o limite entre a realidade e um desespero selvagem de proporções que desconhecemos.
Não quero, e não vou, revelar mais sobre o conteúdo deste filme pois ele está repleto de mensagens, ideias, pensamentos e imagens que são demasiado importantes para as revelar sem que o público de uma forma geral os veja. No entanto, é também impossível não deixar a devida referência a algumas delas e enaltecer a qualidade do argumento de Luís Alves que desenha um desencantado retrato do Portugal e dos portugueses da actualidade.
Logo de imediato encontramos "Branco" que, como referi logo de início, é um homem como tantos outros mas que ao mesmo tempo mostra um completo desconforto e alienação da realidade. Aquele homem não está bem. Pelo contrário, está completamente desenquadrado da realidade que o rodeia. Atingiu o seu ponto de saturação e, apesar de não sabermos o quê, sabemos que algo irá correr mal e que o seu aparente esgotamento não é mais do que o reflexo de uma realidade (a sua), vivida com os problemas que o dito português comum tem. O que serviu como gatilho? Possivelmente um num lote variado de problemas... a ineficácia dos políticos? O desemprego? A perda da casa? A saturação com as inúmeras notícias de esquemas e favores que um grupo de privilegiados perpetua entre o seu seio de amigos?
Na prática o motor desta saturação é indiferente pois a resposta pode enquadrar-se a qualquer uma desta perguntas ou até mesmo ser a junção de todas elas. O que sabemos é que aquele homem percebeu que o país (leia-se, quem governa) está a ruir lentamente e a arrastar-nos a todos com ele.
No entanto, Branco (o filme) não "vive" só de críticas à classe dirigente mas também à enorme massa populacional que constitui este Portugal de 2013. Bem pelo contrário, a crítica vai mais além e aponta o dedo ao povo em si da mais brilhante e sarcástica forma possível. O dedo está apontado àqueles que sendo opositores da sua própria ruína assistem a ela impávidos e serenos como se nada fosse e que fazem do diário encontro no café o ponto mais alto da sua crítica e da sua "luta" que, invariavelmente nunca o chega a ser. Não basta falar do que está mal, é preciso e principalmente é urgente perguntar o que se passa, o porquê de estarmos numa aparente situação onde a única coisa que vislumbramos é o fundo de um poço que parece nunca mais chegar, mostrando-nos assim que por muito mal que o país e o seu povo estejam, é sempre possível continuar a cair rumo a um eterno e desconhecimento fundo. Não chega demonstrarmos o nosso descontentamento ao longo de quatro anos em que supostamente "legitimámos" uma Assembleia da República e, no final desse período, voltarmos às urnas para colocar a cruz nos mesmos eternos ditos "partidos do arco governativo", sem perceber que esse mesmo arco governativo é constituído por muitos mais partidos que encontramos no boletim de voto, e que expressões como estas mais não são do que desabafos dos "homens do sistema" que diariamente invadem os nossos serviços noticiosos.
Mas Branco vai ainda mais longe ao estender a sua crítica ao povo não só pela sua demissão enquanto líder do seu destino, mas sim pelo facto deste ser mordaz ao criticar também aqueles que optam por fazer uma diferença. Quando o "Branco" de Nuno Melo tenta demonstrar a sua revolta e indignação nos seus breves desabafos, cedo percebemos que ele acaba por ser não mais do que o alvo dos insultos daqueles que o conhecem, dos que com ele privam o habitual café e de um grupo de jovens que se demitiu bem cedo de todas as responsabilidades políticas e sociais que os deveriam mover. Assim, não só demonstra que as bases, a população em si, se afastou das decisões políticas dando uma carta branca à classe dirigente para decidir sobre os seus destinos sem qualquer tipo de responsabilização, como também percebemos que esse mesmo povo repudia aqueles que, tendo noção da realidade que o rodeia, a tenta modificar.
O argumento de Luís Alves expressa assim a ideia principal de todo este filme ao demonstrar que é fundamental e necessário perceber que naqueles breves instantes em que nos encontramos na urna de voto, podemos fazer a diferença e optar por outro partido, outro grupo de pessoas e outras ideias que talvez (tão simples quanto isso), nos possam mostrar outros rumos e outros caminhos a seguir pela dignidade de um povo que parece tê-la perdido e não a anseia recuperar, mas que tal como "Branco" (o homem), prefere deixar o boletim por preencher entregando nas mãos dos habituais "homens do regime" a perpetuação do sistema tal como ele está.
Branco é assim a perfeita analogia entre o homem e do povo que se abstém de tomar decisões, de questionar, de perceber, de problematizar e do voto que é (ou pode ser) uma perigosa arma de revolta de um povo, e a meu a ver enquanto cientista político de formação a mais eficaz mas muito mal utilizada quando esse mesmo povo prefere desistir de um seu direito, e que caracteriza assim um dos (senão o) grande mal deste país e povo que desiste de tomar as rédeas do seu próprio destino deixando-o em branco.
Ainda que repleto de alguns momentos mais cómicos e bem dispostos, a realidade vai muito para além dos mesmos e, quando digeridos, percebemos que nos estamos a rir da nossa própria ineficácia e desistência enquanto sociedade. Rimo-nos por assistir ao fim ou por dele continuarmos à espera sem saber quando irá chegar? Rimo-nos por saber que somos realmente o "soldado do nosso destino" ou por perceber que isso tem responsabilidades que não queremos assumir? A tragédia do povo que, tal como o país, ainda está por cumprir...
Com um Fernando Ferrão e um Joaquim Nicolau mordazes e corrosivos que são no fundo o espelho de todos os portugueses que, entre amigos, comentam o mal que vai o país sem que contra ele algo façam, não é menos verdade que Nuno Melo é, uma vez mais, a alma do filme. Através do seu delírio constante, fruto do esgotamento que o apanhou mais ou menos desprevenido, temos os mais certeiros rasgos de lucidez que, sendo dramatizados, mais não são do que a realidade de tantos e qualquer um de nós. A sua revolta e angústia são cortantes e percebemos que é nesta sua interpretação que está realmente a alma reprimida de um povo que por dentro se consome aos poucos mas que diariamente insiste em continuar sem grandes alaridos... até um dia.
Se o argumento é brilhante, a sua execução enquanto filme não poderia ser melhor. Ao longo da sua acção recebemos um conjunto de imagens que são, por um lado, a realidade a que "o outro" assiste de uma dada personagem mas, ao mesmo tempo, recebemos também um conjunto de breves momentos que refletem na perfeição aquilo que ele pensa a um dado momento e que mais não é do que uma caracterização do seu "eu" real, aquele que é possível esconder dos outros mas não de si próprio, ou seja, no fundo é como uma consciência que se encontra sempre pronta a caracterizar cada um de nós, e isto reflecte-se também graças à exímia fotografia de Ruben Esteves e João Carlos Rodrigues que consegue retirar um certo "brilho" às expressões dos actores nesses exactos momentos, capturando assim a sua verdadeira essência.
Com um desejo final de que este filme seja uma realidade por todo o país, muito brevemente e com urgência, só me resta dizer que Branco não é apenas um filme. Branco é uma lição política, de cidadania e sobre a sociedade que deveria ser estudada, e que Luís Alves é, felizmente, o seu professor. Quando a ele assistirem tenham em consideração que estamos perante o filme do ano.
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"Duques: Foram-se as vacas... ficaram os boys."
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10 / 10
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L'Amore Incompreso (2013)

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L'Amore Incompreso de Riccardo di Gerlando é a mais recente curta-metragem de ficção italiana deste realizador que venceu o CinEuphoria de Melhor Curta-Metragem na Competição Internacional este ano com a curta 33 Giri. Aqui, uma vez mais, Riccardo di Gerlando volta a surpreender pela sua extrema capacidade de contar uma história que acima da sua notória sensibilidade consegue também diluir-se no mundo da imaginação e dos sentimentos mostrando que o amor e o belo estão realmente nos olhos de cada um.
Acompanhamos a admiração de um homem por uma misteriosa e sedutora mulher que vê à distância. Não existe qualquer contacto entre eles mas cedo percebemos que a cumplicidade irá certamente existir. Aos poucos a atracção torna-se mútua e espontânea não conseguindo nenhum deles ficar-lhe indiferente. Estranhamente, até ao momento, percebe-se que eles se completam e que os seus destinos se cruzam numa história que estamos certos ir terminar bem.
O argumento de Riccardo di Gerlando tem a franca habilidade de nos mostrar como a felicidade e os elementos positivos estão constantemente à nossa volta, sendo que está assim ao nosso alcance a capacidade de a recriarmos e imaginarmos segundo os modelos que nos possam transmitir força, confiança e segurança.
A dar vida a este homem temos dois actores que o encarnam com muita alma. Por um lado temos Marco Pingiotti que interpreta o "verdadeiro" apaixonado e que, através dos tais referidos modelos que toma como exemplo para exteriorizar a sua confiança e assim se revê na imagem de Andrea Bonella, que mais tarde percebemos de onde provém, que assume assim a interpretação principal de toda a curta-metragem e que através de uma força contida num misto de segurança e incerteza nos faz chegar toda a sua sensibilidade e que, em diversos momentos encarna o carisma de actores como Pierfrancesco Favino ou Filippo Timi, dominando, sem qualquer reserva, toda a dramatização.
E o mesmo se pode dizer das actrizes Sandra Colombi e Jessica Zambellini que conseguem ser aquele elemento de beleza e da contemplação que são admirados pelos dois protagonistas e que, como tal, funcionam como os dois motores pelos quais as acções deles se regem.
Tecnicamente esta curta-metragem é também uma clara vencedora em aspectos como a sua fotografia, da autoria de Simone Caridi, que faz realçar os principais elementos do ambiente envolvente dando-lhes assim o devido protagonismo ao funcionarem como os ideais de beleza imaginados pelo protagonista e assim permanecendo na sua memória (e na nossa), preenchendo todo o espaço que o rodeia dando-lhes vida e também a sua própria alma.
Como nota final destaco a capacidade que um filme tem, como este presente caso, em conseguir transmitir toda uma elevada componente sentimental sem, ao longo da sua acção, ser necessário o uso da palavra. Sem ela estar presente Riccardo di Gerlando consegue reter toda a vontade do protagonista em conhecer e estar próximo da sua amada, de com ela partilhar espaços, momentos, o tempo e principalmente a sua dedicação, amizade e amor.
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8 / 10
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terça-feira, 25 de junho de 2013

Man of Steel (2013)

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Homem de Aço de Zack Snyder é possivelmente o grande e desejado blockbuster deste Verão que recupera com grande expectativa a saga do Super-Homem ao grande ecrã.
A história acompanha o jovem Clark Kent que aos poucos descobre não ser da Terra e que tem poderes maiores que não controla e, como tal, que se evidencia em relação aos demais atraindo atenções que nem sempre são desejadas. Descobre também que aqueles que pensava serem os seus pais (Kevin Costner e Diane Lane), não o são e que, como tal, se sente um inadaptado à procura do seu lugar.
À medida que os anos passam e o miúdo dá lugar ao adulto Clark Kent (Henry Cavill), numa altura em que já se encontra sem o pai que não conseguira salvar para assim não se apresentar ao mundo antes do tempo devido, encontramo-lo numa viagem à procura do seu próprio "eu", do seu espaço e de qual poderá ser a sua real missão.
É quando encontra Lois Lane (Amy Adams) e os sobreviventes do planeta de onde veio e que nunca conheceu chegam finalmente à Terra para a conquistar e aniquilar que, Clark Kent tem finalmente de aceitar os seus poderes e emergir enquanto o homem que iria ser o seu guardião e transformar-se no símbolo de esperança para a Humanidade, e que ficaria conhecido como Super-Homem.
Por detrás desta nova incursão no universo do Super-Homem e da sua relação com Lois Lane, ainda pouco explorada mas aguardemos, bem como com a sua revelação aos terrestres, está David S. Goyer e Christopher Nolan que cada vez fica ligado não só ao universo dos super-heróis como também ao cinema fantástico dos últimos anos. Pessoalmente, depois de ver o quão dignificado ficou o mundo Batman depois da sua trilogia, não posso esperar menos com este filme se bem que, é assumido, estava com as minhas sérias reservas quanto ao mesmo. Não só pelo facto de considerar que à excepção do primeiro título que estreou no finais dos anos 70 do século passado ter sido o único decente, como também por não ter sido um grande apreciador da saga de uma forma geral. O porquê é simples... Considero que um super-herói, independentemente dele qual seja, que não tem um passado obscuro ou conflituoso com a sua própria identidade é algo incoerente com a premissa de ser um assumido defensor da Humanidade, ela própria com todos os seus pequenos grandes problemas que, de uma ou outra forma, a definem com as suas qualidades e principalmente com todos os seus problemas e defeitos.
Aqui, felizmente para a história, para o filme e como consequência para os espectadores, este lado de indecisão e incerteza sobre o seu próprio futuro, juntamente com a componente de auto-descoberta que é inserida em boa parte do mesmo, dão a este Clark Kent não humano, aquela estranha mas fantástica capacidade de o transformar num e que, como qualquer outro, apenas procura o seu lugar no mundo, de se inserir e misturar em toda a massa humana anónima com quem quer encontrar semelhanças através da sua sensibilidade, vulnerabilidade e força, pontos de referência e claro está, deixar um dia mais tarde a marca que o possa identificar como alguém que por cá esteve durante um certo período.
Assim, ao mesmo tempo que é aberta a porta e apresentado o novo super-herói que irá certamente presentear os nossos ecrãs nos próximos anos e que nos permite esperar pelo novo conjunto de aventuras e de vilões que irão querer exterminar toda a raça humana, não é menos verdade que espero não assistir às mesmas etapas pelas quais passou Batman, isto é, a descoberta do herói dentro do homem seguido pela tentativa de afirmação da sua identidade escondida e repúdio da Humanidade, e finalmente a sua consagração como o verdadeiro defensor da mesma e adorado por milhões. Algo nesta saga tem de inovar e distanciar-se daquela do "homem-morcego", senão corre o sério risco de esgotar a fórmula e tornar-se, também esta, uma incursão falhada ao homem de Krypton.
A dar vida a este Homem de Aço temos um cada vez mais requisitado Henry Cavill que tem aqui a sua grande oportunidade na Sétima Arte. Com alguns créditos já firmados em filmes como Stardust ou Immortals que o catapultaram para a fama, não é menos verdade que para além deste género de filme com uma componente do fantástico está sempre presente nos seus desempenhos. No entanto, aquilo que para um actor poderia ser o risco de o tipificar com o género, não é menos verdade que aqui a personagem parece ter sido desenhada em especial para ele. Desde as suas fraquezas até à sua viagem de auto-descoberta, tudo parece ter sido feito à medida e nós enquanto espectadores acompanhamos todo o crescimento da sua personagem através das várias etapas que percorre sendo que, ao mesmo tempo, espero que não permaneça no género e se aventure por outras águas pois todas as sagas terminam um dia.
De todo um extenso elenco secundário onde se destacam Kevin Costner como o pai "terrestre" de Kal-El, e a mãe Diane Lane com o toque de sensibilidade que o seu coração pode dar, temos ainda um Russel Crowe e Ayelet Zurer com os verdadeiros pais de Kal-El, Amy Adams como uma "Lois Lane", simpática mas um pouco perdida, sempre pronta a descobrir a verdade para além dos factos, Laurence Fishburne como editor do Daily Planet ou Christopher Meloni como um dos principais militares dispostos a sacrificar-se pelo planeta Terra, bem como aquele que juntamente a Henry Cavill se destaca pela excelência, ou seja, um maior que o mal Michael Shannon que se assume sem grandes problemas como o vilão de serviço de quem temos realmente medo e sabemos que dele só poderemos vir a esperar o pior.
Tecnicamente o filme supera qualquer expectativa que possamos ter e desde a equipa de efeitos especiais visuais ou sonoros que faz dele um forte candidato aos Oscars do próximo ano, temos ainda a emocionante música original pelas mãos de Hans Zimmer digna de um épico do género fantástico, e uma envolvente fotografia de Amir Mokri que capta a essência de um planeta rico e diverso em vida, não me referindo apenas à Terra mas também ao imaginado Krypton. Destaque ainda para o guarda-roupa extra-planetário de Krypton bem como para o terrestre que parece inserir-nos numa época imaginada com contornos da actualidade criado pelo já oscarizado James Acheson e Michael Wilkinson.
Confesso que este Homem de Aço desperta, ao contrário do que esperava, a vontade e a curiosidade em ver as próximas entregas desta saga. Como tal, quem ainda não viu, seja ou não fã da mesma, pode estar certo que este é um intenso e extraordinário filme de acção e aventura com as doses certas de drama que não só é fiel à ideia deste super-herói como principalmente não nos irá desiludir mesmo que só o encaremos como um filme de género e de entretenimento. E isto já para não referir todas as suas personagens que estão ainda no início do seu próprio desenvolvimento e que têm assim ainda muito potencial para poder explorar.
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"Clark Kent: The world's too big, Mom.

Martha Kent: Then make it small. Focus on my voice. Pretend it's an island out in the ocean."
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"Jor-El: What if a child dreamed of becoming something other than what society had intended? What if a child aspired to something greater?"
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8 / 10
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Festival de Cine Lima Independiente 2013: os vencedores

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COMPETIÇÃO INTERNACIONAL
Melhor Filme: P3ND3JO5, de Raúl Perrone
Menção Especial do Júri: LUKAS THE STRANGE, de John Torres (Filipinas) e EL ESPACIO ENTRE LAS COSAS, de Raúl del Busto (Perú)
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COMPETIÇÃO NACIONAL
Melhor Filme Peruano: LA MAR BRAVA, de Bryan Rodríguez
Menção Especial do Júri: CRONOLOGÍA DEL OLVIDO, de Renzo Alva
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Prémio de Melhor Primeira Obra: AVANTI POPOLO, de Michael Wahrmann (Brasil) e BIG BOY, de Shireen Seno (Filipinas)
Prémio da Crítica Internacional: VIKINGLAND, de Xurxo Chirro (Espanha)
Prémio Activismo e Dereitos Humanos: PUBLIC HEARING, de James N. Kienitz (Estados Unidos)
Prémio APRECI ao Melhor Filme Peruano: CABLE A TIERRA, de Karina Cáceres
Prémio Cine de Guerrilla: PEOPLE´S PARK, de J.P. Sniadecki e Libbie D. Cohn (Estados Unidos) e UN MITO ANTROPOLOGICO TELEVISIVO, de Maria Helene Bertino, Dario Castelli y Alessandro Gagliardo (Itália)

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segunda-feira, 24 de junho de 2013

The Place Beyond the Pines (2012)

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Como Um Trovão de Derek Cianfrance marca a segunda colaboração do realizador com Ryan Gosling que aqui interpreta Luke, um enigmático motociclista de uma feira em Schenectady, onde pratica inúmeras habilidades para o entretenimento dos transeuntes. Um dia é revisitado por Romina (Eva Mendes), a sua antiga paixão e que desperta novamente a vontade de reatar a ligação que parecia perdida.
É numa das visitas à sua casa que Luke descobre ser pai de um recém nascido bebé que Romina tivera sem lhe dar conhecimento. Determinado em cuidar do seu filho e da mulher que ama, mesmo estando esta com outro homem, Luke não só abandona a vida das feiras ambulantes como também tenta um emprego sério numa oficina. Quando a realidade é dura demais e o dinheiro não chega, Luke e o seu patrão Robin (Ben Mendelsohn) iniciam uma série de assaltos a bancos e assim garantirem um nível de vida superior àquele que alguma vez poderiam esperar.
No entanto, é quando a ambição fala mais alto e Luke se envolve num último desastrado assalto que depara com Avery Cross (Bradley Cooper), um polícia novato e sedento de se afirmar numa carreira repleta de corrupção e crime organizado, e que as suas vidas iriam assim ganhar um contorno radicalmente diferente do esperado, marcando para sempre os seus próprios destinos.
Quinze anos depois quando se julga que todos os crimes estão expiados, os velhos fantasmas e tormentos voltam a surgir quando os descendentes de Luke e de Avery se cruzam, despertando todos os mistérios que estavam por resolver ao mesmo tempo que lhes conferem uma redenção que desconheciam esperar, num lugar para além dos pinheiros.
Dividido em dois distintos segmentos, este filme cujo argumento é escrito a três mãos por Derek Cianfrance, Ben Coccio e Darius Marder cria duas controversas personagens que nos conquistam desde o primeiro instante em que os nossos olhos os vêem. Por um lado "Luke", um homem despreocupado e que em qualquer circunstância normal nos faria mudar de passeio... Camisa vestida ao contrário, todas as partes visíveis do corpo tatuadas e com um distante olhar que parece fitar-nos com uma desconfiança proporcional àquela que nele depositamos inicialmente. No entanto, à medida que o conhecemos vamos ficando seduzidos não só com a sua simplicidade mas principalmente pelo facto de se mostrar aquele tipo que possivelmente todos gostamos de ter como amigo, com valores e princípios de família, lealdade, amizade e dedicação que são difíceis de encontrar, principalmente porque descobre que tem um legado que deve preservar... um jovem filho.
No seu oposto, e apesar de algumas evidentes semelhanças, temos "Avery", um homem de família a quem se dedica mas que, ao mesmo tempo, coloca em segundo plano pelo bom nome da sua carreira e da ascenção profissional que procura desesperadamente. Tem valores pelos quais se tenta guiar mas ao mesmo tempo esquece aqueles que deveriam ser a sua prioridade... a família, naquele que é um claro paradigma com o que lhe aconteceu. Filho de um pai exemplar e com uma reputada carreira, "Avery" pretende inconscientemente seguir o mesmo exemplo, mesmo que afirme convictamente que não pretende ser o pai como o seu foi.
Se "Luke" a seu tempo acabará por violar a lei como forma de garantir a sua sobrevivência, não é menos verdade que o próprio "Avery", que jurou defendê-la, também a irá violar como forma de ascender profissionalmente e, ironicamente, fazer respeitar a lei que ele próprio violou para lá chegar. É aqui que estes dois homens se cruzam... ambos têm uma conduta moral, valores, regras e princípios que sabem ser invioláveis e correctos mas até que ponto os irão cumprir sabendo que se o fizerem não chegam a viver com a dignidade que esperam ter mas que, no entanto, se os violam qual será essa mesma dignidade e conduta moral? Até que ponto estará ela própria corrompida e em que medida poderiam estes dois homens, que se encontram em lados opostos da lei (na prática quão opostos?), ter sido amigos e partilhar os mesmos círculos, conhecimentos e amizades?
Apesar de não constituir uma interpretação principal, não deixa de ser "Romina" que determina (in)conscientemente os destinos destes dois homens. O seu desaparecimento e mais tarde revelação enquanto mãe de uma jovem criança, serve de motor principal a toda uma série de acontecimentos que, noutras circunstâncias, poderiam nunca ocorrer, e mesmo num futuro ainda por determinar, é ela que faz desencadear todo um passado com a ausência de explicações sobre o mesmo.
A encarnar estas três extremamente ricas personagens temos um lote de actores que, passo a expressão, falam por si. Ryan Gosling é o tal "Luke" dito marginal com o qual todos sabemos simpatizar. A sua postura despreocupada face a um mundo tão ou mais marginal que ele conquista-nos de imediato e faz-nos desejar saber mais sobre ele... de onde veio e o que o tornou tão desligado da realidade que o rodeia ou mesmo o que terá acontecido para ele e "Romina" nunca vingarem enquanto um casal, são algumas das questões que lentamente nos vão sendo recorrentes. Por sua vez Eva Mendes mostra-nos essencialmente com a sua "Romina" que é dona de uma espantosa mutação física que sem esconder o seu lado feminino sedutor, ela é muito mais do que aquilo que sistematicamente nos tem sido fornecido sobre si e capaz de entregar sentidas interpretações dramáticas que têm muito ainda por explorar. E o mesmo sucede com Bradley Cooper de quem se pode seguramente afirmar que no último ano e meio tem vindo a demonstrar que está muito para além do tradicional filme de comédia que pode ou não cair no esquecimento dos espectadores, catapultando-se para seguras e honestas interpretações dramáticas que nos irão ficar na memória muito para além do tempo de filme decorrido.
O potencial e a química entre este trio de actores é de tal forma intenso, seguro e interligado que mesmo partilhando o ecrã em escassos momentos em comum, sentimos que o seu crescendo emocional está presente e que uns dependem das acções dos outros. Nenhum deles é "independente" das acções dos demais e só através delas conseguirão encontrar o seu próprio espaço e desenvolvimento, sendo igualmente curioso como o tal lugar de redenção dos dois protagonistas acaba por ser o mesmo ainda que de formas diferentes. Enquanto é no meio daqueles pinheiros que "Luke" encontra a sua paz, é também naqueles pinheiros que "Avery" se depara olhos nos olhos com a morte das duas vezes que entra naquele espaço.
Destaque ainda para as interpretações secundárias de Rose Byrne ou Ray Liotta que não sendo fundamentais para o desenvolvimento da história, não deixam de ter a sua quota parte de importância para a resolução de alguns tópicos que ajudaram para definir principalmente a personagem interpretada por Cooper, com Byrne pela forma como encarava a sua família e através de Liotta para mostrar o seu lado profissional mais "animal".
Tecnicamente, The Place Beyond the Pines é igualmente um trunfo seguro. A envolvência da fotografia de Sean Bobbitt faz-nos ser espectadores activos sem nos encontrarmos no espaço, isto é, os lugares quase se tornam familiares como se de uma memória distante se tratassem, aspecto reforçado pela música original de Mike Patton, e do qual só sentimos um declarado afastamento graças ao espaço em si que, pelas mãos de Inbal Weinberg, Michael Ahern e Jasmine E. Ballou, não deixa de ser uma memória mas de algo decadente e perdido no tempo e no espaço e do qual nos preferimos esquecer.
No seu título original este filme remete-nos exactamente para a mensagem que pretende transmitir... o tal lugar de redenção e de busca de uma qualquer paz que parecia perdida, e todo o seu ritmo para isso nos transporta mesmo quando apesar da tensão das imagens ou daquilo que esperamos poder vir a colapsar, não deixa de se apresentar num ritmo tranquilo, sereno e fácil de digerir permitindo-nos ficar numa estranha tranquilidade mesmo quando sabemos que um conjunto invariável de injustiças está prestes a acontecer. Não é o "novo" Drive de que tantos falam e esperam apesar de com ele se "encontrar" em aspectos tão simples como o seu ritmo que aproxima as suas personagens do mesmo violento destino, mas é também um filme diferente que merece ser apreciado pela beleza e força da sua mensagem, tendo o seu lugar próprio e constituindo também um marco nas carreiras dos três actores protagonistas que não deve ser ignorado. Se o futuro não o esquecer, este é um dos filmes do ano.
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"Robin: If you ride like lightning, you're going to crash like thunder."
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9 / 10
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domingo, 23 de junho de 2013

L'Uomo dei Sogni (2013)

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L'Uomo dei Sogni de Giuseppe Ferlito é uma curta-metragem italiana de suspense e mistério que nos dá a conhecer as noites traumáticas de uma jovem (Valentina Romero) que rapidamente descobrimos ter realizado uma operação de transplante de coração.
Entre os seus constantes pesadelos e a preocupação de uma mãe que está atenta a todos os seus passos, esta jovem decide descobrir quem foi a pessoa cujo coração recebeu. Aquilo que não imaginava é que nesta busca por algo que agora faz parte dela própria, iria descobrir um passado bem mais preocupante do que aquele que alguma vez imaginou, especialmente sobre o homem (Fabio Morelli) que atormenta os seus sonhos todas as noites.
Num registo que atravessa o drama e o cruza com algum suspense, esta curta-metragem garante-nos ainda alguns interessantes planos de uma viagem de auto-descoberta e de percepção da própria identidade agora "reforçada" com a quase constante presença da memória de outra pessoa, bem como nos permite testemunhar algumas interessantes filmagens e planos de uma floresta enigmática e obscura tocando levemente o género do fantástico ao estabelecer uma certa relação entre a sua vida e uma estranha atracção que a levam para aquele local.
É assim um filme interessante não só pelas abordagens que dá aos géneros representados mas também pela forma que tem em estabelecer o princípio de que o próprio coração, o sentimento e o dito "irracional" sejam, também eles, detentores da capacidade de reter memória.
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7 / 10
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sábado, 22 de junho de 2013

Viagens (2013)

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Viagens de Rúben Ferreira é uma curta-metragem de ficção deste jovem realizador que aqui se demarca dos seus habituais trabalhos de terror e comédia, lançando-se na bem sucedida aventura de contar uma história dramática mas não menos tensa que as anteriores.
O que acontece por detrás de uma porta fechada? É uma certeza que a curiosidade de todos nós nos faz pensar sobre o que está para lá daquilo que não conseguimos ver.
Um tiro. Um morto (José Marques). Uma mulher (Elisabete Ferreira) completamente descontrolada numa viagem da qual ela própria não sabe regressar e que a leva a uma espiral de violência e auto-destruição que, em breves instantes, definirá toda a sua vida.
O argumento que a própria Elisabete Ferreira escreveu, e ao qual dá vida com uma muito sólida interpretação, obriga-nos a acompanhá-la na sua viagem à dependência, à loucura e à morte. Independentemente de sabermos ou não o que a levou àquele momento, uma coisa é certa... o seu vício. A sua dependência de droga que invariavelmente a levou à loucura e a uma extrema violência que não poderia terminar em bom porto e que, tal como a nós, arrastaria todos aqueles que se cruzariam com ela.
No entanto, não deixa também de ser um facto que existe curiosidade em saber o que está por detrás da tal porta fechada, dos tais segredos e momentos ocultos pois queremos saber qual a relação que estas duas pessoas tinham e o que a levou àquele acto desesperado... Simplesmente a dependência ou existiria um historial de violência física ou psicológica entre ambos que a isso a obrigou? Quem eram estas duas pessoas antes deste acto fatal, causado por uma viagem que sabemos antecipadamente não ter qualquer retorno possível?
Rúben Ferreira, que já nos habituou às suas intensas histórias de comédia e de terror que seduziram (e seduzem) uma igualmente extensa legião de fãs, prova aqui que está muito para além das mesmas e consegue adaptar-se com excelência a histórias mais sérias e complexas, mostrando uma realidade que escondendo-se por detrás de inúmeras portas fechadas consegue estar bem mais presente do que aquilo que desejaríamos. A dependência, a loucura, a vingança e a morte conseguem nesta sua curta-metragem co-existir, ironicamente, em harmonia transformando assim esta sua última obra numa, senão a mais forte da sua ainda curta (mas será longa) carreira.
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8 / 10
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sexta-feira, 21 de junho de 2013

O Cheiro das Velas (2012)

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O Cheiro das Velas de Adriana Martins da Silva é uma curta-metragem portuguesa de ficção que nos permite entrar na tensa e invulgar relação entre Sara (Joana Brandão) e Gabriela (Oceana Basílio), duas irmãs que se reúnem para o aniversário da sua mãe, anos após da sua própria relação se ter afastado e degradado ao ponto de pouco comunicarem ou até mesmo se conhecerem.
No entanto, Sara pouco conformada com este estranho distanciamento da sua irmã, aos pouco tenta perceber o que a levou a ignorá-la ao ponto de mal se falarem para aquela que seria uma invulgar descoberta da sua juventude e principalmente da mulher que ela própria é mas que, até então, recusou aceitar.
O argumento escrito por Pedro Martins e Adriana Martins da Silva consegue colocar-nos num ambiente tenso ao ponto de quase nos parecer carnal em diversos momentos, e capta a relação não necessariamente entre duas irmãs mas sim entre duas mulheres que conhecendo-se são essencialmente duas estranhas com curiosidade sobre quem será a "outra" com quem se deparam. Assim, de um início repleto de silêncios incomodativos e quase cortantes, passamos para uma auto e mútua descoberta sobre o passado desta duas irmãs próximas e amigas mas que são agora duas misteriosas e sedutoras mulheres que se desconhecem. Assim, se inicialmente a sua relação é tensa e impessoal, muito rapidamente temos entre ambas um clima sedutor quase carnal onde aparentemente se sentem incapazes de estar afastadas, tal a curiosidade.
Mas não é só o argumento que transmite uma força. A dupla de actrizes Oceana Basílio e Joana Brandão são por si só o seu veículo. Enquanto Brandão é um elemento silencioso mas curioso prestes a entrar numa viagem de auto-descoberta, Basílio é o motor que faz essa viagem ter o seu começo. Viagem essa para a qual coloca à disposição toda a sua natural sensualidade que consegue dominar o filme a todo o momento, e evidenciar a clara química que existe entre as duas actrizes que se entregam, com dedicação, às suas personagens que assim dominam o espaço e principalmente o tempo que passa sem que dele demos conta.
Tecnicamente há que referir a perfeita sintonia entre a direcção de arte de Sofia Nunes e a fotografia de Miguel Robalo que nos colocam num espaço que por momentos pensamos não existir na medida em que estamos perfeitamente concentrados na dinâmica criada entre "Sara" e "Gabriela" esquecendo que à nossa volta existe todo um mundo onde elas se encontram.
Gostei particularmente desta interessante curta-metragem pela possibilidade que ela nos dá de viajar para além daquele breve encontro entre as duas irmãs, ou seja, pelo facto de ter potencial para ser uma longa-metragem onde poderia ser explorada a dinâmica das duas enquanto crianças, bem como a relação com a mãe que, sendo fisicamente ausente nesta curta-metragem (ou presente por breves segundos), é uma presença quase sempre constante nas memórias das duas irmãs e que teria com certeza a sua própria história a contar sobre a relação que por um lado tem com as suas filhas como por outro, a relação que percebeu ter existido entre ambas.
Iremos assim ter a hipótese de poder ver mais?
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8 / 10
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quinta-feira, 20 de junho de 2013

Alogicamente (2011)

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Alogicamente de André Viuvens e Nuno Martini é uma curta-metragem portuguesa de comédia e aquele que é um dos mais fortes trabalhos que vi este ano.
O que acontece quando se funde a ficção com a realidade? A resposta é simples... resulta numa hilariante e bem estruturada curta-metragem que surpreende pela originalidade e pelo divertimento nem sempre habituais.
Um realizador (Viuvens) e uma produtora (Catarina Guimarães) em reunião decidem qual das actrizes que passou pelo seu casting irá ser a protagonista do seu próximo filme. Depois dessa conturbada reunião terminar decidem ir a casa da jovem actriz que parece incontactável e falarem com ela sobre a sua disponibilidade e começarem assim as gravações.
No entanto, quando a alucinada mãe (Rita Sales) revela ser tão ou mais problemática que o próprio realizador graças a uma muito forte "amizade" que tem com o alcoól, e quando se descobre que afinal a jovem foi raptada, nada de bom poderia acontecer nos destinos destas figuras. Nada, a não ser uma enorme surpresa que nós espectadores temos já no final desta curta...
André Viuvens é a força motora deste filme ao produzir, co-realizar, escrever, compôr a música e interpretar numa bem disposta e também ela alucinada personagem que dava por si só um filme próprio completamente centrado em si. Não basta esta sua personagem dizer tudo quanto lhe vai pela alma da forma mais inesperada possível revelando assim ser uma daquelas personagens que, a ser real, seria bem complicado de se lidar, como também o faz com uma graça e humor que conquista a boa disposição dos espectadores logo no primeiro instante em que fala e é disso representativo aquela tão sui generis reunião com que este filme se inicia.
A seu lado temos uma muito controlada "produtora", aqui interpretada por Catarina Guimarães que tenta quase no limite das suas forças manter algum tipo de sanidade onde ela já se perdeu há muito. Com uma personagem tanto quanto possível tranquila, é interessante verificar como consegue manter o mesm equilíbrio do início até ao final da sua participação sem vacilar um único instante para um momento em que, também ela, perdesse o controle do seu rumo.
E se já não bastava a alucinação que é a interpretação de Viuvens, a meio caminho temos ainda a efusiva prestação de Rita Sales que não tem um único elemento de sanidade na composição da sua personagem (e ainda bem). Se já nos rimos com Viuvens, é impossível parar com a "mãe" composta por Sales que é do mais genial que vi nos últimos tempos. Não falo só da sua já referida amizade com o alcoól mas também da simples presença que tem... Desde o cabelo, ao discurso e a forma como se apresenta e encarna a sua personagem tudo, sem excepção, encontra um lugar certo no meio de toda a desordem.
E falar das personagens sem falar do raptor interpretado por Hugo Cunha seria praticamente uma injustiça. A dinâmica criada entre o seu "Raptor" e o "Realizador" de Viuvens é de tal forma harmoniosa que, não fossem opostos entre um suposto bem e o mal, mais parecia que estas eram de facto almas gémeas que, algures na sua vida se haviam separado, e para o confirmar basta vermos o diálogo entre ambos onde se tentam no nível de linguagem utilizada.
No final damos por nós a pensar num importante elemento que teria sido genial nesta curta-metragem... a presença dos castings na mesma... Se a reunião entre "Produtora" e "Realizador" foi tão verbal e fisicamente produtiva, o que seria se aqui estivessem presentes os castings que devem ter sido verdadeiras provas de fogo para as "actrizes" envolvidas.
Uma curta forte, consistente e com doses de humor capazes de criar a sua própria legião de fãs que fazem dela uma das mais fortes e intensas dos últimos tempos. E quanto à lógica... ela de facto não é precisa quando se apresenta algo tão consistente como aquilo que aqui temos.
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9 / 10
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quarta-feira, 19 de junho de 2013

James Gandolfini

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1961 - 2013
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After Earth (2013)

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Depois da Terra de M. Night Shyamalan é o mais recente filme de Will Smith que escreve o argumento em parceria com o realizador e com Gary Whitta, e protagoniza na companhia do seu filho Jaden Smith.
A história ocorre mil anos depois de um conjunto de eventos cataclísmicos terem devastado o planeta Terra forçando assim toda a sua população a abandoná-lo.
Mil anos depois encontramo-nos em Nova Prime, o novo lar dos terráqueos que no fundo já não o são, à qual regressa depois da sua última missão, o lendário general Cypher Raige (Will Smith) que agora precisa de assumir o papel de pai e educar o seu filho Kitai (Jaden Smith) que pretende seguir as suas pisadas e ser um destacado explorar e militar.
Quando em viagem, um asteróide danifica a nave em que se encontram e Cypher e Kitai são os únicos sobreviventes da mesma que se despenha num planeta desconhecido e hóstil ao qual ninguém pretendia regressar. É então que descobrimos estar de volta à Terra que sem qualquer sinal de uma civilização perdida se encontra agora tão selvagem como nos seus primórdios, e onde Kitai necessita ter a sua maior prova de fogo não só para poder de lá sair com o seu pai como também salvá-lo dos graves ferimentos de que sofre depois do embate.
Este filme que prometia ser um interessante regresso de M. Night Shyamalan a interessantes e intensas histórias cuja mensagem vai muito para além daquilo que inicialmente nos é transmitido pelas imagens, mais não é do que uma história com inúmeras pontas soltas e um conjunto de premissas por explorar que claramente só têm dois fins possíveis. O primeiro prende-se com a possibilidade do filme ser um tal desastre de bilheteira que mais ninguém queira saber da sua existência... o segundo e mais plausível considerando que Will Smith atrai sempre muitos fãs para os seus filmes, é a possibilidade de uma sequela que responda a alguns destes temas que ficaram em aberto.
Senão vejamos... inicialmente temos um conjunto de imagens que nos mostram a decadência de um Planeta Terra que entre poluíção, guerras e miséria ia sendo destruído pela sua população aos poucos, não conseguindo sequer renovar a vida aqui existente. Os problemas ambientais existem e degradam a qualidade de vida e eis que surge um novo planeta para onde a população pode "emigrar", qual êxodo, mas... de onde veio esse planeta? Já havia tecnologia suficiente para ir repovoá-lo? Estava sem vida nativa com a qual os terrestres pudessem entrar em conflito? E o porquê de se vetar ao abandono todo um planeta durante um milénio sem lá tentar voltar ou resolver todos os seus problemas ambientais e ali regressar? After all... there's no place like home!
Mas mais importante ainda que tudo isto é o súbito aparecimento de uma raça alienígena que devora as nossas emoções e medos e persegue os humanos como sua única fonte de alimento. Assim, do nada somos levados a "conviver" com uma nova entidade que, sem qualquer explicação aparente, se lembrou que na Terra havia carninha fresca. Assim, o seu inexplicável aparecimento torna-se mais um grande mistério, talvez resolvido na sequela pensada, se se realizar, ou então mais não é do que o motivo que irá justificar o intenso (mais ou menos) conflito no final deste filme.
Will Smith que aqui assume várias vertentes desde intérprete a argumentista e produtor, não é nem de longe o actor de intensos filmes de acção e fantasia a que em tempos nos habituou, e na prática mais não é do que o veículo de projecção de Jaden Smith, o seu próprio filho, que aqui sim tem a interpretação principal mas que, no entanto, não consegue agarrar ao seu potencial máximo limitando-se ambos a um conjunto de clichés e momentos quase "patrióticos" e previsíveis que em nada ajudam a dinamizar o enredo, e nem mesmo a participação de uma sempre carismática Sophie Okonedo, que aqui é meramente decorativa, consegue dinamizar a nossa atenção.
Assim, a juntar à falta de credibilidade que esta história e interpretações têm, junta-se-lhe a fraca promoção do jovem actor que é claramente pretendida com este filme, pois o mesmo não consegue ter uma interpretação suficientemente credível ou convincente independentemente de algumas sequências de acção que protagoniza e que conseguem elevar minimamente o interesse do filme nunca chegando, no entanto, à fasquia positiva, salvando-se apenas desta mesma história uma certa componente pró-ambiente que é pretendida logo pelo início mas que, como já referi, fica aquém do desenvolvimento pretendido.
Interessante pela atmosfera selvagem da Terra, e da qual gostaríamos de ter visto mais, que a fotografia de Peter Suschitzky recria, bem como pelo conjunto de efeitos especiais que transforma o nosso planeta num espaço familiarmente desconhecido mas que, ainda assim, não funcionam como elementos suficientes para tornar este Depois da Terra naquele grande filme de acção de Verão que poderia ter sido com mais cuidado às pontas soltas que deixa, nem tão pouco é o grande regresso de Shyamalan espera desde o seu magnífico O Sexto Sentido.
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4 / 10
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terça-feira, 18 de junho de 2013

Porto 7 - Oporto International Short Film Festival 2013: os vencedores

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Curta-Metragem Internacional: No On'e Land, de Babak Amini
Ficção Nacional: 50 Pesos Argentinos, de Bernardo Cabral
Intérprete: Anna Van Der Heide, Man in Suit
Argumento: Lucas Figueroa, Prologo
Prémio Porto Tour Documentário: The Story of the Modlins, de Sergio Oksman
Animação: Kermando, de Hamed Akrami
Music Video: After, de Pepe Abalos Galcerá, interpretado por Siesta
Videoclip Nacional Hiphop: Falsa Fama, de André Tentúgal, interpretado por Porte
Menção Honrosa do Júri: A Luz da Terra Antiga, de Luís Oliveira Santos e The Theft, de Mohammad Farahani
Menção Honrosa da Direcção do Festival: Human Beings, de Mashallah Mohamadi
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Sonata (2013)

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Sonata de Jon Ander Tomás é uma curta-metragem espanhola de ficção baseada na obra A Sonata de Kreutzer de Tolstoi que nos insere nos meandros da sedução entre um homem (Javier Server) e uma mulher (Marina San José) passando pelo seu casamento, falsamento satisfatório e um simples meio de conquistar uma "presa", e consequente vida conjugal.
Da sedução à conquista passando pelo sentimento de posse e pelo ciúme, esta curta-metragem com argumento escrito também por Jon Ander Tomás, tem uma interessante abordagem à perspectiva que cada um dos seus intervenientes tem sobre o amor. Se para Ele, a conquista, o desejo e o prazer carnal são os únicos motores da relação que passa depois a um degradar do sentimento, para Ela a relação inicial é apenas a porta de entrada para a dedicação, a entrega e o sentimento mais nobre de todos... o amor.
Assim, com perspectivas tão singulares e dispares sobre aquilo que cada um representa para o outro, qual o real destino que a relação destas duas pessoas poderá vir a confirmar?
Por muito que seja desejado por Ele que o amor apenas o seja como uma forma de satisfazer os seus desejos carnais mais imediatos. Desejo esse que será a forma mais eficaz de a matar, usando-a e afastando-a não querendo assim criar nenhuma relação mais íntima sentimentalmente mas que, ao mesmo tempo, confirma a conquista e o interesse, dissipando-os no exacto momento dessa confirmação, não deixando assim de ser menos verdade que durante toda esta curta-metragem se sinta uma ora interessante ora intensa e estranha química entre os dois intervenientes que confirma que o desejo/amor e vontade de sedução/posse estão intimamente ligados dependendo uns dos outros como se de uma sobrevivência animal se tratasse.
A química existente entre Server e San José é evidente, e apesar de muitos momentos os dois não se encontrarem fisicamente próximos, não deixa de ser menos verdade que todos os seus actos ocorrem em função daquilo que esperam a que o outro reaja, numa relação que aos poucos se anuncia destrutiva e que consome as respectivas energias.
Se Tomás compõe uma interessante história que apenas peca pela sua curta duração (aos poucos percebemos que queremos mais da intimidade e proximidade daquelas duas personagens), não é menos verdade que tecnicamente esta curta-metragem apresenta uns quantos aspectos dignos de destaque e excelência. Por um lado a direcção de arte pelas mãos de Jone Vitoria Sola e Beatriz Montares que recria na perfeição um ambiente dito de "época" que se realça e distingue pela caracterização de Marina Salvá, Irune Alfonso, Ainhoa Fernández e Ayshe Misheva que faz-nos sentir estar numa atmosfera moderna apesar da história ter mais de um século.
De destacar ainda a excelente direcção de fotografia por José Luís Bernal que capta os tons quentes e envolventes do ambiente geral dando-lhes um elevado cariz erótico (mas sério), que denota a tensão existente entre as duas personagens principais, não deixando de lado a constante imagem de que muito rapidamente aquela relação terá um fim trágico.
Uma interessante e bem elaborado filme que nos deixa uma vontade de que a sua duração pudesse ser mais longa e, como tal, as personagens fossem ainda mais exploradas juntamente com os seus vícios e elos de aproximação por muito pouco saudáveis que eles possam ser.
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7 / 10
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domingo, 16 de junho de 2013

Sophia 2013: as curtas-metragens pré-seleccionadas

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Foram divulgadas as curtas-metragens pré-seleccionadas para as categorias de Ficção, Documentário e Animação para os prémios Sophia da Academia Portuguesa de Cinema a atribuir no próximo mês de Setembro sendo as finalistas anunciadas no início do mesmo mês.
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Ficção:
A Mesa Ferida, de Marcos Barbosa
Cerro Negro, de João Salaviza
Land of My Dreams, de Yann Gonzalez
Luz da Manhã, de Cláudia Varejão
O Dia Mais Feliz da Tua Vida, de Adriano Luz
O Fascínora, de Paulo Abreu
O Nylon da Minha Aldeia, de Possidónio Cachapa
O Que Arde Cura, de João Rui Guerra da Mata
O Reino, de Paulo Castilho
Sob, de Nuno Prudêncio
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Documentário:
A Comunidade, de Salomé Lamas
A Luz da Terra Antiga, de Luís Oliveira Santos
A Rua da Estrada, de Graça Castanheira
El Cartero, de Cláudia Alves
Johnson, de Nuno Cibrão
Raul Brandão Era Um Grande Escritor, de João Canijo
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Animação:
A Ria, a Água, o Homem..., de Manuel Matos Barbosa
Do Céu e da Terra, de Isabel Aboim Inglez
Kali, o Pequeno Vampiro, de Regina Pessoa
Lágrimas de um Palhaço, de Cláudio Sá
Mulher Sombra, de Joana Imaginário
My Music, de Tiago Albuquerque e João Bráz
Sanguetinta, de Filipe Abranches
Sem Querer, de João Fazenda
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48 Grados (2012)

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48 Grados de Noël Gallardo é uma curta-metragem espanhola de ficção que nos apresenta uma história de um mundo à beira de um apocalipse graças a um vírus que infecta boa parte da população, juntando-lhe um drama pessoal que nos tenta aproximar um pouco mais do enredo.
A United Pharmacs é uma empresa que se dedica à preservação do meio ambiente e que investiga uma estranha infecção causada por uma misteriosa bactéria que graças ao rápido aquecimento global entrou em mutação, alastrando rapidamente por toda a população.
Um dos investigadores da United Pharmacs que luta para encontrar a cura é Mario Evans (Toni Lucas) que passa grande parte do seu tempo nos laboratórios, sem qualquer contacto com o mundo exterior, que vê toda a sua vida alterada quando ele próprio fica infectado com este vírus, e que descobre ao mesmo tempo os métodos utilizados pela UP para controlar a propagação do vírus.
Numa altura em que não só luta pela sua vida contra o vírus como também contra aqueles que o perseguem sem qualquer piedade, Mario foge ao encontro da sua família apenas para descobrir que nem a sua vida nem a do mundo voltará a ser como fora anteriormente.
Apesar de pertencer a um género já muito explorado no domínio das curtas-metragens, a temática apocalipse nas suas mais variadas vertentes (zombie, nuclear, epidémico...) continua a suscitar a mais acentuada curiosidade não só nos profissionais que as criam como também no espectador ávido de ver mais um filme do género onde a Humanidade vai definhando mais ou menos lentamente.
Aqui temos esta mesma abordagem pelas mãos de uma empresa que investiga (será que criou?) o vírus que consome a Humanidade, ao mesmo tempo que tenta silenciar aqueles que descobrem os seus métodos pouco ortodoxos e ainda as sistemáticas crises climáticas de que o próprio planeta já tem vindo a ser vítima. Tudo isto misturado numa curta-metragem de escassa duração e que se pretendia ver desenvolvidos estes vários aspectos que lança na sua concepção.
Se por um lado Toni Lucas tem inicialmente uma presença carismática e que o transforma no protagonista ideal desta curta-metragem, não é menos verdade que à medida que a trama se desenvolve, o seu "Mario Evans" entre num declínio emocional inversamente proporcional ao crescendo da acção, não conseguindo captar o lado desolador da personagem mas sim o lado "estou completamente perdido" que se espera de um impacto inicial onde ainda se lida com o desconhecido.
Não deixando assim de ser uma curta interessante e com um potencial promissor graças às mais variadas vertentes que expõe, não deixa ao mesmo tempo de ser um filme que não tem o seu correcto desenvolvimento e que poderia ver a sua duração triplicada para os poder resolver.
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6 / 10
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sábado, 15 de junho de 2013

Dear God (1996)

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Querido Deus de Garry Marshall, típico realizador de comédias românticas e que aqui nos apresenta uma longa-metragem com uma interessante premissa... O que aconteceria se os milhares de cartas endereçadas a Deus fossem finalmente respondidas?
Tom Turner (Greg Kinnear) é um vulgar vigarista que tudo faz para ganhar alguns dólares e ir passando pelos dias sem grandes preocupações. Quando num dos seus esquemas tenta vigarizar um polícia à paisana, Tom é detido e levado a julgamento onde tem de decidir entre uma de duas sentenças... ou cumpre pena de prisão ou encontra um trabalho honesto.
Quando decide encontrar um trabalho, longe estaria de pensar que seria no Posto dos Correios que o iria encontrar desiludindo-se quando percebe que vai para o departamento de correio impossível de entregar e cujos destinatários se encontram entidades tão variadas como o Pai Natal, o Coelho da Páscoa ou Deus. Quando Tom decide responder a uma das cartas cujo remetente é Deus e obtém a ajuda de alguns dos seus colegas, longe estaria de pensar que iria iniciar um movimento que para além de lhes dar algum conforto momentâneo, iria principalmente responder a alguns dos desejos de pessoas que se encontram sós e isoladas no mundo.
Mas neste mesmo mundo onde todos desconfiam das boas intenções alheias, Tom encontra-se uma vez mais a cumprir a sua tarefa de sempre... a vigarice.
Warren Leight e Ed Kaplan escreveram um interessante argumento que, em tons de comédia mais ou menos bem conseguida, disserta sobre problemas bem actuais das sociedades modernas, independentemente do facto deste filme já ter quase vinte anos. À sobrevivência nas sociedades actuais e principalmente nas grandes cidades onde tudo parece quase sempre tão impessoal e distante que faz com que todos os esquemas e modos de vida sejam "aceites" ou pelo menos tolerados, é ainda referência aquele que talvez seja o principal e mais preocupante problemas destas mesmas sociedades... a solidão. Nas grandes metrópoles espalhadas um pouco por todo o mundo, densamente povoadas e movimentadas durante as vinte e quatro horas que percorrem cada dia, é curioso encontrar aqueles que (sobre)vivendo no seu meio passam quase despercebidos dos olhares de todos os outros, dando assim "vida" à ideia de que estamos sózinhos no meio de tanta gente e que a ninguém podemos recorrer no meio de um qualquer problema. Daí ao vazio, ao desespero e a encontrar no suicídio como a única solução para uma vida sem sentido vai um pequeno passo que é igualmente abordado neste filme.
No entanto, apesar de temas tão sérios e delicados serem aqui abordados, não deixa igualmente de ser verdade que se tenta expô-los através de um olhar menos sério ou fatal, mas sim como uma etapa mais complicada mas da qual todos acabam por poder sair e por isso a comédia presente alivia a sensação de que estamos perante um filme onde a desgraça é senhora. Não obstante, e como forma deste filme poder ter resultado brilhantemente, seria necessário que a comédia aqui presente tivesse sido levada ao limite e onde a dinâmica entre as várias personagens presentes fosse suficientemente convincente para nos sentirmos "bem" com a mensagem de fundo.
Assim, aquilo que se verifica na sua maioria no presente filme, são um conjunto de momentos feito unicamente para evidenciar os talentos de um Greg Kinnear em franca ascenção mas que, na prática, pouco mais serve para além disso. A sua dinâmica com os restantes actores é quase nula, e nem mesmo o facto destes começarem a actuar em parceria com o seu "Tom" nos faz pensar que a certa altura esta química irá existir. Eles de facto actuam entre si e preenchem os espaços em branco que circulam perante as interpretações mas, no entanto, esta química ou dinâmica estão sempre ausentes da interacção que deveria existir entre as diversas personagens e actores. Todos estão lá, todos a querer ter graça mas, na prática, cada um puxa para seu lado e o filme é pequeno demais para que se pense que vai existir no momento seguinte essa confirmação.
O potencial existe e a personagem "Tom" de Kinnear é suficientemente interessante nesta dinâmica para nos fazer querer que este filme funcione, no entanto, algo fica perdido e à deriva durante a sua execução que não chegando a cumprir-se nos deixa com uma certa insatisfação perante aquilo que é e aquilo que queríamos que este filme tivesse sido, servindo assim na sua essência como um simpático filme de entretenimento mas não como aquela história agridoce sobre as sociedades, ou populações, contemporâneas solitárias e amarguradas que apenas tentam passar e sobreviver.
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5 / 10
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