quinta-feira, 20 de setembro de 2018

Anjo (2018)

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Anjo de Miguel Nunes (Portugal) - também argumentista e intérprete protagonista - é uma das curtas-metragens presentes na secção Panorama da vigésima-segunda edição do Queer Lisboa - Festival Internacional de Cinema Queer a decorrer no Cinema São Jorge e que revela uma Lisboa estival testemunha de uma paixão abruptamente interrompida.
Miguel (Nunes) encontra-se numa entrevista para entrada nos Estados Unidos. Pretende encontrar um amigo. Revela a sua paixão. De seguida encontramos o seu apartamento onde, compreendemos, sucedem-se as festas, as reuniões de amigos e a presença d'Ele (Edgar Morais), com quem vive momentos de entrega, cumplicidade e paixão, faz-se sentir na sua memória e nos seus pensamentos.
Da curta-metragem de Miguel Nunes surgem de imediato não só o seu nome enquanto realizador, argumentista, actor e produtor da mesma como também a presença de Joana de Verona e Edgar Morais como seus actores e rostos de uma nova geração de intérpretes portugueses com um percurso cinematográfico já confirmado para conquistarem um novo público para as salas. Se este elemento não fosse por si já suficiente, eis que o espectador encontra na sinopse aquele que poderá ser uma história de amor numa Lisboa contemporânea onde esta nova geração dos 30's ruma sem um destino certo ou vínculos firmes para lá daqueles que são firmados pela lealdade para com a tribo.
Seja nos palcos de um qualquer festival de cinema, nos telhados vizinhos observando uma Lisboa nocturna ou nas inúmeras festas que, não observadas, ocupam longas madrugadas, Anjo centra-se numa dessas figuras... a de "Miguel". Tudo começa com uma entrevista de entrada nos Estados Unidos onde ficamos a saber que ele pretende passar duas semanas da sua vida à procura de um amigo... de uma paixão. A tal paixão estival que lhe ficou na memória e que, por motivos que o espectador desconhece, terminou repentinamente. "Ele" (Edgar Morais) partiu. Os breves momentos que passam juntos são de paixão intensa, de entrega e de cumplicidade. De olhares e pequenas conversas banais entre quem, compreendemos, já se conhece ao ponto de tudo se poder dizer através do nada. Dos passeios pelas ruas aos pequenos silêncios que se partilham, "Ele" e "Miguel" entregam-se nos braços um do outro. Instala-se então a dúvida no espectador que se questiona sobre os porquês desta separação. Não terá sido nada de tão importante como aparentava? Terá "Miguel" sentido algo mais que na realidade nunca existira? Porque se terá confirmado esta distanciamento? Existe um endereço do outro lado do Atlântico mas... será que ainda permanece a tal cumplicidade?!
Interessante do ponto de vista dos tais "ses" que se instalam e mantêm na mente do espectador, a Anjo falta, no entanto, o tal aproveitamento da intenção narrativa para transformar o tal sofrimento da paixão distante, a dinâmica da proximidade dos amigos e o sentimento de busca pelo que já não lhe (a "Miguel") lhe pertence - ou possui - e transformá-lo num drama moderno sobre a procura do amor nesta geração dos 30's ainda tão pouco explorada em cinema. Habituados que estamos a encontrar filmes mais juvenis que exploram a temática do amor - não de forma condescendente mas sobre a tal geração ainda livre de grandes responsabilidades que estejam para lá de aproveitarem a respectiva juventude -, Anjo (tal como Verão Danado (2017), de Pedro Cabeleira que é, curiosamente, da mesma produtora ou mesmo Uma Rapariga da sua Idade (2015), de Márcio Laranjeira) tem todo o potencial para explorar esta dinâmica de uma geração que ainda procura o seu lugar num mundo que parece ter fechado a porta na altura em que a mesma se preparava para sair "de casa" mas, ao mesmo tempo, privou-se de o fazer deixando o espectador com uma mão cheia de incertezas, questões, dúvidas e pensamentos sobre a (não) concretização dessa busca... terá "Miguel" ido para os Estados Unidos... terá "Ele" (Morais) ainda correspondido à tal paixão? Pergunta que é, aliás, levantada pela entrevistadora (deduzimos que na Embaixada) quando "Miguel" revela que não sabe ao certo onde o amigo vive... Ou será que tudo mais não é do que uma reflexão tardia sobre uma busca e um amor que, não tendo sido correspondido, permanece como algo bonito e inalterado na mente daquele que realmente amou?!
Inteligente e perspicaz pela forma como filma esta (já não tão nova) geração que parece procurar, acima de uma estabilidade financeira, uma que também seja emocional, Anjo é, para lá de uma simpática estreia do actor enquanto realizador, um filme ensaio com potencial suficiente para explorar todas as dinâmicas da vida (apresentada) de "Miguel" - com os amigos, com o amor, com a vida de uma forma geral - sob a forma de ma longa-metragem... talvez com um resultado (sobre essa mesma geração) emocionalmente não tão feliz... mas real, crua e ligeiramente esperançosa sobre o tal "dia de amanhã" que a sua personagem aqui aparenta procurar.
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6 / 10
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