Turbo Kid de François Simard, Anouk Whisell e Yoann-Karl Whissell é uma longa-metragem em co-produção canadiana-neo-zelandesa presente na secção Serviço de Quarto da nona edição do MOTELx - Festival Internacional de Cinema de Terror de Lisboa a decorrer no Cinema São Jorge até ao próximo dia 13 de Setembro.
1997. Um futuro apocalíptico. A água escasseia. The Kid (Munro Chambers) vasculha os escombros da antiga sociedade à procura de pequenos objectos para ter no pequeno espaço que conhece como lar. Fã de comics, The Kid depara-se numa das suas incursões com Apple (Laurence Leboeuf) uma animada e muito positiva sobrevivente que é seguidamente raptada por Zeus (Michael Ironside), o poderoso senhor do crime que The Kid irá tentar destruir.
Numa viagem pós-apocalíptica que junta os melhores elementos de Mad Max e até de uma inteligentíssima curta-metragem exibida no último ano no MOTELx de seu nome Nightsatan and the Loops of Doom, Turbo Kid exala por todos os seus poros o melhor do género acção, comédia, apocalipse, romance e ainda uma pesada presença de ficção científica electrónica que cativam o espectador de forma inesperada.
Um dos elementos mais interessantes deste filme prende-se logo com o momento do "futuro apocalíptico" não nesse desconhecido futuro mais ou menos distante mas sim numa data que até nos é - presentemente - já passada - 1997 - e não deixando de com ela piscar mais ou menos discretamente o olho a outro grande franchising como o é o de Terminator com Arnold Schwarzenegger, com o qual a personagem "Zeus" de Michael Ironside parece ter bebido inspiração - é preciso ver para perceber - ou até mesmo a ideia de que os ciborg já caminham "entre nós". É nesse futuro já passado de 1997 que o mundo entrou numa decadência abismal onde a própria água é agora uma raridade - Turbo Kid não se esquece deste grande problema ecológico pelo qual já vários Estados atravessam - e onde a ditadura de um que comanda a anarquia alheia dominaram toda a civilização ou ideal que a mesma deixou.
Mas não é tanto deste apocalipse que Turbo Kid se trata, afinal dele só sabemos que originou toda a ruína como então a conhecemos, mas sim da improvável amizade gerada entre o Homem e a Máquina numa simbiose perfeita de compreensão e humanização que a muitos dos ditos Homens já não chega. Levanta-se então a questão, o que será da sociedade - da comunidade antes dito - quando a máquina consegue ser mais humana e protectora do que o próprio Homem... É graças a "Apple", numa excêntrica e cómica interpretação de Laurence Lebeouf, que o espectador se revê com maior entusiasmo... Ou seja, nem mesmo no meio de um perigo iminente ou a sua destruição é quase certa, deixa de ter aquela positividade e disposição para encontrar o melhor no e do pior.
Mas Turbo Kid é um pouco mais. Retrata o caos dessa sociedade que se assemelha aos piores momentos retratados na obra de culto Mad Max sendo que, no entanto, enquanto nesse as motos eram de morte, em Turbo Kid de morte só mesmo as bicicletas que orgulhosamente todos conduzem como se nada mais no mundo conseguisse ser conduzido. E quando pensamos que não podem existir perseguições a alta velocidade... eis que Turbo Kid nos surpreende.
No entanto, e para lá de todas as pequenas grandes mensagens escondidas e homenagens que o trio de realizadores presta às obras de culto que obviamente os inspiraram, não é menos verdade que Turbo Kid reune ainda interessantes elementos que o tornam único nomeadamente a tal positividade já referida bem como a extensa componente gore que rapidamente exibe para deleite de todos os fãs do género fantástico e terror tendo inclusive nas interpretações interessantes registos de personagens bem construídas como a já referida (vivacidade) "Apple" de Laurence Lebeouf, o "Zeus" de Michael Ironside que prima também por viver no seu próprio Olimpo - literalmente falando - em mais um vilão muito característico para juntar à sua já extensa galeria de "maus da fita", e ainda o jovem Munro Chambers como "Turbo Kid", um jovem que tinha tudo para poder falhar no mundo agreste como sempre o conhecera mas que graças a essas mesmas fragilidades se tornou no mais improvável herói da Humanidade e que, muito certamente, irá voltar aos ecrãs nos próximos anos... afinal, tem todo o potencial para tal.
Interessante ainda pela dinâmica repleta de intencionais defeitos que o colocam como um daqueles filmes série B que povoaram o imaginário de muitos cinéfilos nos idos anos 70, Turbo Kid assume-se como uma longa-metragem vencedora ainda no que diz respeito ao seu original e excêntrico guarda-roupa da autoria de Eric Poirier, a óbvia caracterização sem a qual um filme deste género jamais sairia bem sucedido e uma sentida vontade de transformar muitos dos objectos - K7's de música e VHS por exemplo - do agora nosso passado como aqueles de um futuro que não se chegou a cumprir.
Impossível não referir a personagem não física mas francamente presente de Turbo Kid que é a sua música original criada pelas mãos de Jean-Philippe Bernier, Jean-Nicolas Leupi e Le Matos e que dão uma certa vida e cor a esta obra transformando-a num sentido exemplo de cinema simples cujo conteúdo é entreter o espectador mas que, ao mesmo tempo, consegue conquistar aquele espaço enquanto filme de culto (a ser).
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8 / 10
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