Purgatório de Pau Teixidor é uma longa-metragem espanhola presente na secção Serviço de Quarto da nona edição do MOTELx - Festival Internacional de Cinema de Terror de Lisboa a decorrer até amanhã no Cinema São Jorge.
Marta (Oona Chaplin) e Luís (Andrés Gertrúdix) mudam-se para um apartamento num prédio praticamente vazio. Logo na primeira noite no apartamento fica sózinha e tudo aparente estar calmo até que Ana (Ana Fernández), uma vizinha, lhe pede para ficar com o filho Daniel (Sergi Méndez).
Ao longo da noite Daniel parece denotar um comportamento cada vez mais estranho e irracional, insistindo até que está outra criança dentro daquela casa. Estará ele a dizer a verdade ou será Marta que já não distingue a realidade?
Luis Moreno escreve um argumento onde a tensão e a dúvida vivem alegremente de mãos dadas. Desde os instantes iniciais em que "Marta" chega à garagem do seu novo prédio que percebemos existir algo que a acompanha e que se faz anunciar mais ou menos claramente para o seu próprio espanto e eventual descrédito.
É, no entanto, quando chega ao seu novo lar que o espectador começa a perceber a tragédia de um passado recente, e a lacuna que a mesma criou entre o casal que parece ter encontrado nesta mudança uma esperança de poder sobreviver aos acontecimentos que tudo tinham para os separar. E se inicialmente achamos que a tensão existente entre o casal pode derivar de um qualquer caso extra-matrimonial, cedo também percebemos que algo mais se passa entre os mesmos.
Mas, ainda que esta dinâmica se torne importante para a história de fundo de Purgatorio, não é menos verdade que aquela estabelecida entre "Marta" e o jovem "Daniel" se assume como a indispensável para que tudo ganhe uma nova perspectiva e realidade - ainda que dentro do género fantástico. O jovem parece retirado de um qualquer local fantasmagórico e o próprio parece circular por aquela casa como se ninguém conseguisse dar por si e pelos seus movimentos. Se num momento pensamos que ele pode mais não ser do que uma partida da mente de "Marta", não é menos real que é quando ele denota um comportamento mais humano numa total oscilação do que havia revelado até então, que o espectador percebe que se calhar algo mais existe entre ambos que os condiciona nas suas próprias manifestações.
Longe de receio daquilo que o "outro" pode ser, Purgatorio lança o inuendo e a suspeita sobre aquilo que realmente se encontra ao nosso lado sem que nenhum de nós consiga perspectivar ou até mesmo observar. Se todos nós somos energia... para onde irá ela depois do nosso corpo físico morrer? Ao entrar então neste campo do desconhecido, o espectador observa as limitações e fragilidades de "Marta" como aquelas manifestadas por alguém que tem no seu íntimo a perfeita noção do que é a perda. Quando a perda se une a um desejo intenso, conseguirá "Marta" expiar as suas emoções ou, por sua vez, dar-lhes a perfeita desculpa para se manifestarem de outra forma?
Com uma música original de Aaron Rux que recria uma atmosfera fantasmagórica num prédio já de si deserto, Purgatorio confere a Oona Chaplin o seu primeiro grande desempenho enquanto protagonista e recria com algum cuidado o bom e "velho" género da casa assombrada manifestando ainda alguns elementos místicos e/ou simbólicos como as almas presas em espelhos que todos observamos sem conseguir ver, objectos que prendem os espírito ao espaço terreno tornando toda uma história densa e assombrosa mas que se revela como a manifestação de um amor próximo e intenso que nem a morte consegue separar.
Purgatorio consegue fazer de um pequeno apartamento num grande prédio um espaço onde as presenças são mais do que aquelas que inicialmente vemos e fazer ainda do poder da sugestão um dos seus maiores trunfos... afinal, o que mete mais medo será aquilo que vemos ou o que suspeitamos "estar lá" sem que seja observado?
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