Um Punk Chamado Ribas de Paulo Antunes (Portugal) é um dos documentários presentes no IndieMusic da décima-sexta edição do IndieLisboa - Festival Internacional de Cinema de Lisboa a decorrer até ao próximo dia 12 de Maio em diversas salas de cinema da capital.
Nascia neste dia, em 1965, João Ribas, músico, cantor, compositor e letrista do punk português e membro fundador das bandas Ku de Judas, Censurados e Tara Perdida. Da sua influência para outros músicos ao seu carácter genuíno enquanto artista e idealista, vários são os testemunhos que passam por este documentário que nos dão a conhecer um pouco mais do homem por detrás da lenda.
Por entre um conjunto de observações sobre João Ribas, o primeiro de todos é efectuado pela irmã Isabel, que o caracteriza como alguém diferente à primeira vista mas que, depois de alguém privar com ele encontrava uma pessoa afável e dócil capaz de seduzir pela sua simpatia. De um início profissional no teatro à música, a sua grande paixão e à qual se entregou de alma e coração, Ribas transformara-se no mito incontornável no panorama musical português principalmente ao longo da década de '80.
Os testemunhos sucedem-se na primeira pessoa passando por João Pedro Almendra (Despe & Siga), Miguel Newton (Mata Ratos), Eduardo Pinela (Capitão Fantasma), Aurora Pinheiro que fora sua manager, Rui Costa (Tara Perdida), diversas amigas e também pelo sobrinho João Diogo Ribas de quem saem algumas das mais emocionadas palavras sobre o tio e sobre a influência e amizade que lhe reconhece.
Um Punk Chamado Ribas é assim um documentário que se apresenta, em diversos momentos, como um documento pessoal onde o espectador conhece, para lá da lenda musical, o homem e uma boa parte da sua personalidade - pelo menos aquela que nos é facultada pelos entrevistados -, e descobre alguém com uma sensibilidade francamente diferente do que aquela que se poderia adivinhar através da sua imagem de palco forte, aguerrida e dominante. Várias são as fotografias que são partilhadas bem como aquele que seria possivelmente o lugar mais mítico de Ribas e daqueles que o conheceram... o seu quarto que servia de sala de ensaios e de reuniões de e com as dezenas de pessoas que conhecera. Para lá de um simples local de prática, o seu quarto foi o verdadeiro estúdio de ensaio e improviso, de criação e inspiração (sua e das bandas a que pertencera), fazendo do mesmo uma espécie de lugar de culto. Das histórias com a vizinhança que nunca interferira, e para quem o "barulho" nunca foi um incómodo (pelo menos não um que fosse verbalizado), João Ribas chega mesmo a ser caracterizado com um elemento fundamental - senão o principal - de toda uma geração que encontrou na música um espaço não só de rebeldia como também de denuncia e do próprio direito à diferença que tanto, e tantas vezes, se reclama e se pretende conquistar. Símbolo de uma geração em que a imagem da noite, da droga e da violência urbana caracterizaram a própria e, até mesmo, uma Lisboa que se dividia (e assumia) nas diferenças evidentes dos bairros e dos seus habitantes desejando, o próprio ainda que inconscientemente, que a aceitação por esse referida diferença fosse uma marca do seu tempo como que de um legado se tratasse.
Com o recurso a muitas imagens de arquivo como um competente documento histórico, Um Punk hamado Ribas é igualmente um testemunho, súbtil e livre de preconceito, da transformação do homem e das suas diversas etapas que, sendo elas de maior ou menor êxtase e excessos, nunca julgou ou condenou prestando-se sempre a uma aceitação do outro e do seu contributo para a arte que com ele poderiam partilhar.
Evidente em todos aqueles que partilharam aqui os seus testemunhos está a constante comoção e emoção ao falarem no amigo que conheceram... aquele alguém que decidiram partilhar com o mundo mesmo sendo alguém só "seu"... alguém de quem ainda lhes custa falar apesar do imenso prazer que têm em recordar todos os momentos mais ou menos privados que partilharam... alguém a quem reconhecem uma educação extrema e memória exemplar mesmo que tenham sido dezenas, centenas ou até mesmo milhares aqueles com quem se havia cruzado... alguém dado ao mundo, à cidade, ao seu bairro e a todos aqueles que resolviam "perder" alguns minutos de conversa... um "punk diplomático" como é caracterizado pelo seu sobrinho.
Desaparecido a 23 de Março de 2014, João Ribas fica não só com o nome marcado ao movimento do rock punk português como também como um, arriscarei dizer, humanista pela forma como encarava o "outro" tão bem caracterizado pelos seus amigos, sempre disponível para uma palavra a toda a gente e também como um vulto maior do panorama musical nacional mesmo com todos os potenciais altos e baixos da vida... característicos de qualquer um de nós... transformando este sentido documentário numa importante peça do cinema português do género e num documento imprescindível para a contextualização não só do homem mas também da música para a qual deixou uma importante marca e parte de si.
.
.
.
7 / 10
.
.
Sem comentários:
Enviar um comentário