À medida que o cinema português vai aparecendo mais são as agradáveis surpresas com que me deparo. Fico satisfeito por perceber que a qualidade do nosso cinema vai aumentando de dia para dia e este filme de Margarida Cardoso é disso uma excelente prova.
A acção de
A Costa dos Murmúrios decorre durante a era colonial portuguesa em Moçambique onde, sem assistir a conflitos propriamente ditos vamos tendo relatos dos mesmos.
Nunca li o livro de Lídia Jorge em que o filme se baseou e como tal não posso comparar se a intensidade dramática das quatro personagens principais é fiel no filme, no entanto aquilo que posso afirmar é que se corresponder a obra será decerto muito boa.
Começando pela personagem interpretada por Beatriz Batarda (que desempenha o papel de Evita francamente bem e parabéns pela sua vitória como Melhor Actriz nos Globos de Ouro), ela demonstra a vivacidade algo perdida de uma jovem mulher que abandona Lisboa para se casar com o seu namorado que é militar em África. Uma mulher opinativa com presença e que não se deixa dominar pelos padrões de vida estabelecidos. Gostei de a ver. Foi este aliás o primeiro papel que vi desta actriz e afirmo que está muito bom.
Como seu marido temos o actor Filipe Duarte como o jovem militar que perde (ou abdica) com a guerra de todos os seus sonhos de juventude. As suas paixões esmorecem. Pede que se esqueça o passado. De apaixonado passa a desinteressado. Escolhi esta foto das muitas que vi na internet que mostra exactamente aquilo que ele sente no filme... Enquanto os pássaros voam livres para um lado ele vê-os do chão mas virado para outro lado como que resistindo ainda aos ventos de mudança que se avizinhavam (justamente nomeado ao Globo de Ouro de Melhor Actor).
Os dois papéis mais secundários (nem tanto) pertencem a Adriano Luz como o capitão totalitário que ambiciona dominador tudo e todos com as suas ordens, e no papel da sua reprimida, dominada e obediente mulher Mónica Calle (também nomeada ao Globo de Ouro de Melhor Actriz) em total contradição com o papel de Beatriz Batarda.
Quatro boas interpretações que nos mostram não só correntes de pensamento diferentes numa era do Portugal ditatorial e colonizador.
Temos de tudo... as ilusões perdidas e as desilusões constantes. As mentiras típicas de um regime que se extingue mas ainda se quer mentalizar da continuidade. A decadência do Homem e dos seus sonhos. A percepção de que o Mundo à volta mudou e não existe um rumo definido.
Este é (foi) uma boa surpresa (mais uma) no cinema português que confesso não ser à partida fácil de digerir por ser pouco ritmado de início (não esperava tiros e explosões apenas uma narrativa mais desenvolta, não vão os críticos pensar que estou a denegrir o filme), mas uma vez que a acção se desenrola capta e prende-nos a atenção.
De destacar ainda a banda sonora algo minimalista mas perfeita que Bernardo Sassetti compôs para o filme.
8 / 10
Sem comentários:
Enviar um comentário