quarta-feira, 12 de agosto de 2015

Irène (2002)

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Irène de Ivan Calbérac é uma longa-metragem francesa protagonizada por Cécile de France, um mulher a ultrapassar os trinta anos de idade e que ainda não encontrou o seu par perfeito.
Irène (de France) é uma mulher nos trinta anos que dedicou toda a sua vida aos estudos e a uma carreira de jurista com a qual parece já não se identificar.
Chegada a um novo apartamento que tem de renovar, Irène conhece François (Bruno Putzulu) que lhe irá remendar a casa e tentar remendar-lhe o coração enquanto ela parece mais centrada em Luca (Olivier Sitruk), um colega do trabalho.
Tida como uma das actrizes maiores do cinema francófono - Cécile de France é belga - Cécile de France cria uma personagem cómica retraída com a sua "Irène". Típica de um meio burgês de classe média alta, "Irène" é uma mulher a quem escasseiam amigos e principalmente o tal homem que fala o seu coração vibrar. Vítima da pressão parental desejosa de saber que o ambiente sentimental da filha está saudável e recomendado, enquanto pelos amigos parecem divergir as opiniões sobre as vantagens e desvantagens de uma relação, "Irène" parece isolar-se cada vez mais dentro do seu pequeno mundo até conhecer alguém que é literalmente o seu oposto. "François" - numa interpretação secundária de Bruno Putzulu - que está nos seus antípodas. Divertido, bem disposto e com um sorriso no rosto mesmo face às tempestivas respostas de "Irène", ambos parecem complementar-se de uma estranha e divertida forma levando o espectador a perguntar-se se esta relação poderá (ou conseguirá) sobreviver.
Mas por detrás das eventuais boas relações entre dois perfeitos estranhos, Irène - o filme - mais não é do que uma mostra (não tão sensível) das pressões sociais a que cada um de nós está sujeito nesta nova sociedade do século XXI onde, para lá de todas as inovações e modernizações, os velhos valores continuam bem presentes. Se algures no tempo pareceu indispensável ter uma boa formação académica para procurar e ter uma boa carreira profissional, é também certo que certas pressões familiares e dos "pares" continuam de olhos postos - e fixamente - apenas num único aspecto.. as relações pessoais e sentimentais. "Irène", agora nos trinta's, é uma mulher bem sucedida profissionalmente mas as questões dos que a rodeiam centram-se única e exclusivamente num único aspecto... "quando é que leva o namorado lá a casa?" ou "quando é que se casa?"... Esqueçam-se repentinamente todos os sucessos extra... o que interessa é que ninguém a vê numa relação duradoura.
E, é exactamente neste momento, que o espectador encontra um segundo aspecto, ou seja, como encontrar essa relação num momento em que todos vivem de acasos e instantes provocados e proporcionados numa via cibernética em expansão onde o toque, a convivência e um conhecimento in loco dão lugar a uma nova forma de expressar "interesse" - nunca sentimentos ou afectos - e onde tudo termina à distância de um click?
Numa constante incerteza entre o profissional e o pessoal nesta já referida mudança dos "tempos" (ou talvez a sua evolução não necessariamente positiva - "Irène" terá de encontrar uma resposta para duas importantes questões... quem é ela e qual o seu verdadeiro lugar neste mundo do qual parece estar francamente distante perdida no pensamento que vagueia por um eventual "nada".
Se Cécile de France é a protagonista e aquela que o espectador acompanha para a perceber e saber que opções toma é, no entanto, em Bruno Putzulu que encontra o mais equilibrado de todos (os mundos?)... O seu "François" é não só um homem estabelecido - e já pai - que, apesar de uma relação sentimental falhada consegue encontrar a força necessária para enfrentar o mundo... sem um trabalho fixo e que lhe pague bem tem, por sua vez, trabalho sempre que precisa e que lhe chega para viver uma vida feliz, com sonhos e eventuais projectos não estando, no entanto, condicionado por todo um conjunto de obrigações que parecem "chover" vindas de trabalhos de secretaria. "François" não se limita à tal "passagem" mas sim a viver plenamente encontrando, nesse percurso, espaço para tudo e todos com quem ou por onde se cruza. "Irène" está, por sua vez, concentrada numa compreensão hérculea sobre como estar no mundo agradando a todos tentando, pelo meio, compreender quem ela verdadeiramente é. Cécile de France dá-lhe alguns toques de contemporaneidade mas uma que é neurótica, obsessiva, impulsiva e principalmente descontrolada na medida em que tudo é um problema quando não decorre milimetricamente a seu gosto.
Com alguns propósitos sentimentais - mas pouco sentimentalistas - Irène é uma reflexão sobre o mundo moderno, as relações contemporâneas e sobretudo sobre a forma como o indivíduo resiste no seio de um mundo em constante mutação e no qual dificilmente se encontra a tal réstia de humanidade que lhe permita criar empatia, envolvimento e uma vida... a dois. Capaz de fazer sorrir e manter (ou criar) alguma empatia com o espectador, esta longa-metragens de Ivan Calbérac foi, no fundo, uma ainda ingénua reflexão sobre o mundo e como ele era no início do século confirmando, também, que as pressões sociais existentes então não iriam abrandar mas que sim estavam apenas no seu início tendo o indivíduo de lhes resistir ou nelas lamentavelmente se perder.
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6 / 10
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