Kuru de Francisco Antunez é uma curta-metragem portuguesa de ficção presente em competição no Shortcutz Viseu e que nos apresenta Joana (Sara Barros Leitão), Maria (Inês Aires Pereira) e Sofia (Jani Zhao), três amigas que se preparam para uma noite de diversão e que por entre algum consumo de alcoól e droga encontram um misterioso Homem (José Mata) em diversos locais por onde passam.
Entre este Homem e Joana nasce uma imediata atracção... Poderá ela resistir-lhe?
Miguel Braga dá corpo a uma história que poderia muito facilmente ser um daqueles casos bizarros aos quais os espectadores pouca importância dão nos noticiários mas que, ocasionalmente, fazem tremer o imaginário colectivo sobre uma qualquer realidade mais obscura que qualquer um de nós prefere nem equacionar. Inicialmente temos o grupo de amigas que se preparam para uma noite de "despedida" de uma delas e, como tal, os abusos e as loucuras de uma jovem idade impõem-se. Esses mesmos abusos parecem estar lentamente a criar todo um espaço psicológico de menor discernimento e de um certo risco que se instala silenciosamente.
Num ritmo relativamente descontraído que mescla sensualidade e alguma sexualidade nas personagens que dão corpo a esta história, Kuru - nome de uma variante da doença Creutzfeldt-Jakob que seguramente a maioria dos espectadores desconhece - começa a desvendar que algo de perigoso se esconde por detrás de rostos mais ou menos inocentes mas que escapam ao imaginário daquilo que o público espera do seu potencial desfecho. Por outras palavras, Miguel Braga induz o espectador a imaginar aquilo que "vai ver" estando, no entanto, longe desta concretização que se perfila para outros domínios que seguramente qualquer um considera mais macabro.
As conversas entre o grupo de amigas são banais... Aliás, banais de mais considerando que se centram apenas em histórias do (seu) passado e momentos de flirt semi-inocente que apenas o calor da noite consegue fazer despoletar com mais intensidade. Aquilo que o espectador recebe de Kuru é, na sua essência, uma história sobre a noite de um grupo de amigas igual a tantas outras jovens mulheres que apenas querem viver a sua jovem idade. É, no entanto, graças a um misterioso José Mata - que parece perfilar-se (e bem) como o novo vilão de serviço - que a real dimensão da vida de uma delas se revela.
Ao assistirmos a Kuru e aos comportamentos das três jovens, pensamentos como tráfico de orgãos ou até um eventual abuso sexual parecem quase instintivamente ser as "realidades" que esperamos encontrar fruto de sucessivos noticiários que propagam estas situações a um ritmo que se perfila como absurdamente anormal. No entanto, aquilo que Miguel Braga consegue com o seu argumento é instalar toda uma nova realidade - e surpresa - mantendo o potencial destino de "Joana" como uma nova realidade ainda abominável demais para a considerarmos como eventual. Tal é esta (ir)realidade que o espectador nem tão pouco associa o nome desta curta-metragem a algo... real.
Sara Barros Leitão recentemente saída de Pecado Fatal (2013) e de Marta (2015) - longa e curta-metragem onde revela e firma todo o seu potencial enquanto jovem actriz - é o foco de Kuru no qual, no entanto, parece deixar muito por revelar da sua personagem. Temos todo um início que não explora a sua vontade de "conhecer o mundo" ou tão pouco a potencial "aventura" com o predador que a persegue - como a encontrou ou porque motivo a escolheu - e, por sua vez, o próprio José Mata fica com toda uma consumada fuga e eventual "sobrevivência" que gostaríamos de conhecer deixando apenas como momento mais frágil a revelação das verdadeiras intenções do "Homem" a quem dá corpo.
Com Sofia Grilo, Filipe Vargas, Pedro Hossi e Luciano Gomes como secundários, Kuru destaca-se ainda pela sua direcção de fotografia de Gonçalo Roquette que capta as cores e o calor de uma noite de Verão que tudo tem para acabar da pior forma e pela conseguida tensão que recria na segunda metade da sua narrativa deixando, no entanto, muito que poderia ter sido explorado.
.
.
7 / 10
.
Sem comentários:
Enviar um comentário