Noite sem Distância de Lois Patiño é uma curta-metragem luso-espanhola de animação cujo centro da sua história se desenvolve na fronteira entre os dois países e nos idos tempos em que o contrabando era uma forma de vida e de subsistência.
A memória. É disso que fala Noite sem Distância de Lois Patiño, enquanto divaga por um conjunto de imagens e momentos silenciosos da história da região norte de Portugal e da Galiza, profundamente marcadas - como aliás toda a demais fronteira com Espanha - pelos movimentos de contrabando de vários produtos que garantiam a sobrevivência das populações da chamada raia.
Esta História é feita de histórias, de memórias, recordações e momentos. De pessoas. Mas também de lugares, de caminhos, das rochas que cruzam fronteiras e testemunharam a passagem de muitos que mantinham o seu - e de outros - nível de vida - ou sobrevivência - conferindo-lhes doses dos pequenos bens que de um ou outro lado da fronteiras escasseavam.
Essencialmente centrado nas histórias espanholas muito mais afectadas pelo peso da proibição destes bens que poderiam ir do café a enlatados e até sal, Lois Patiño relata momentos de conversas tidas no silêncio dos remoínhos de vento, no segredo possível entre quatro paredes - não podemos esquecer que nos encontramos durante um dos mais conturbados períodos da História recente dos dois países que viveram conjuntamente uma ditadura - e cujos actos eram apenas testemunhados por uma paisagem constante e serena apenas assolada pela sua presença.
Noite sem Distância é imediatamente apresentada com um pensamento de Teixeira de Pascoaes... "Há rastos de alma na paisagem". Por entre o silêncio de uma paisagem que testemunhou a História e que se mantém inalterada sendo um marco entre o passado, o presente e o futuro, a mesma mantém a memória dos Homens sendo estes (apenas mais) um elemento de todo o espaço envolvente. Esta paisagem que serviu de camuflagem - aglutinando o contrabandista fugido da polícia - e de porto de segurança uma vez ultrapassada uma fronteira escapando daqueles que (eventualmente) os perseguiam.
Num registo animado diferente do habitual, em Noite sem Distância o espectador observa não o Homem como a sua personagem principal mas sim a Natureza como o elemento fundamental de toda a narrativa onde o primeiro mais não é do que um seu acessório, e esta última através das rochas, das árvores, dos riachos e da vegetação natural, o elemento fundamental que vive ao longo desta história transformando o seu silêncio na comunicação não verbal mas sim visual que predomina e se assume como fio condutor da mesma. Esta Natureza, a noite, o escuro e o seu silêncio tudo escondem, camuflam e fazem desaparecer sendo toda a actividade humana exercida nos seus limites.
A noite encurta a distância, transforma-a num elemento indiferente à realidade vivida. Ela funde-se com a Natureza e com o Homem, vivendo e deixando viver aqueles que nela co-habitam tornando-os silenciosos e principalmente invisíveis aos olhares dos demais... No fundo, esta noite é como uma consciência natural que se transforma e permite que a vida - e a actividade - nela se propaguem.
À semelhança do que já havia filmado com Costa da Morte (2013), Lois Patiño consegue com Noite sem Distância entregar mais uma perspectiva sobre a terra e as suas gentes, as suas actividades e o seu modo de vida fazendo destes o elemento unificador do Homem com a Terra.
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8 / 10
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