segunda-feira, 20 de março de 2017

A Canção de Lisboa (2016)

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A Canção de Lisboa de Pedro Varela é uma longa-metragem portuguesa que encerra a trilogia de remakes de grandes clássicos do cinema português do século XX que se iniciou com O Pátio das Cantigas (2015) e foi seguido por O Leão da Estrela (2015).
Vasco (César Mourão) é o que se pode chamar de bon vivant... Estudante cábula e desinteressado já de idade avançada demais para ainda se manter no mesmo local, Vasco vive à custa da mesada das tias Maria José (Maria Vieira) e Margot (São José Lapa) que patrocinam todos os seus caprichos estando, também elas, a atravessar uma crise financeira sem precedentes.
Mas quando Vasco se vê envolvido numa relação política com José Caetano (Miguel Guilherme) e amorosa com Alice (Luana Martau), a filha deste, ao mesmo tempo que as tias resolvem fazer uma inesperada visita, ele terá de finalmente enfrentar a realidade e o mundo... tal como ele é.
Pedro Varela recupera o espírito - ou parte dele - do original de 1933 de Cottinelli Telmo trazendo para a Lisboa do século XXI uma certa ingenuidade de há oitenta anos sem que, no entanto, se queira perceber que a mesma... já há muito se perdeu. Da Lisboa conservadora dos idos anos 30 onde tudo podia aparentar ser de uma tranquilidade e passividade inerentes do povo - afinal, ignorância era felicidade - àquela dos nossos dias que não só é uma cidade assumidamente europeia e multicultural como palco dessa ingenuidade já perdida onde se disputam jogos políticos e trapaças palacianas, esta A Canção de Lisboa perde em relação ao seu homónimo na graciosidade, humor e originalidade que haviam sido apresentadas na referida época.
O actor César Mourão não é nenhum Vasco Santana nem no seu humor nem na fisicalidade apresentada com a sua presença "em palco" que conquistavam o espectador no imediato momento em que se apresentava. Hoje - e mais ainda (calculo) na época - o grande mestre Vasco Santana era por si só a confirmação de que o público iria de imediato concentrar-se nos seus comportamentos, nas suas falas e principalmente numa facilidade inata de com ele se conectar. Mourão - mérito lhe seja dado - recorre a uma certa "verve ginga" que, forçada ou não, o deixam simplesmente a executar um conjunto de piadas pré-fabricadas que não seduzem ou tão pouco encantam. Se a isto juntarmos a noção tentada de que estamos perante um galã que todas as "moçoilas" desejam conhecer intimamente... então o caso começa a estar seriamente perdido e esta Canção... desafinou.
Das personagens estilizadas e pré-concebidas de e noutros tempos a uma constante alegria de viver - tão pouco típica nos portugueses dos dias que hoje vivemos - sem esquecer a trapaça política que está tão presente neste Portugal actual onde o povo deixou de ter qualquer empatia com os políticos que mais não fazem que recorrer a um qualquer lado sentimental que sabem ainda poder ser vencedor (ou talvez não) e para tal basta termos atenção ao partido do "José Caetano" de Miguel Guilherme - o CSDP - Coligação Social Democrata Popular.... (pois!!) - , A Canção de Lisboa perde-se numa revitalização dos conceitos de outros tempos nestes dias tão sem graça e onde o espectador quer rir sim... mas de algo que tenha realmente graça.
O realizador Pedro Varela vem de Anestesia (2010) - premiado aqui no CinEuphoria no ano seguinte enquanto parte integrante do telefilme O Dez (2010) -, de Tempo Final (2011) e de Os Filhos do Rock (2013-2014), oscilando entre o interessante registo do cinema em formato curto e a televisão de qualidade, embarcando aqui num formato já conhecido mas de qualidade mais duvidosa, que prima por um conjunto de bons actores como os já referidos e aos quais se acrescentam Carla Vasconcelos, Dinarte de Freitas, Dmitry Bogomolov, Ruy de Carvalho, Rita Lello, Nuria Mencia e Jani Zhao todos eles, infelizmente, em desempenhos meramente decorativos que pouco (ou quase nada) fazem justiça ao seu enorme talento e que, se pensarmos com calma e tranquilidade, se reúnem numa obra que em pouco ou nada acrescenta aos seus curriculums enquanto actores e realizador. Foi (e ficou) feito... "picou-se o ponto"...
Da Portugalidade além fronteiras - ou daquilo que ela foi - que agora reside (ou tenta) neste rectângulo à beira-mar plantado e com dinheiro fresco, da já referida multiculturalidade de uma cidade sempre virada para o mundo, da nobreza outrora endinheirada e agora falida, da homossexualidade encapotada de outras gerações ao preconceito que renega "nuestros hermanos" para uma classe de donos de pensões muito duvidosas e imigrantes do leste europeu para motoristas com look gangster, A Canção de Lisboa perde-se num vazio no qual o espectador se divide sobre a tentativa de ter graça ou no facto de a ter (?) de facto que não parece abraçar a diferença tal como ela é mas sim ilustrar uma certa "aceitação" não deixando de referir que "estão aí... e nós sabemos que sim".
Longe de ser um remake, apenas utilizando do original algumas das personagens "actualizadas" e uns momentos chave do mesmo que tentam com ele criar um elo, o momento mais simpático de A Canção de Lisboa acaba por ser o seu instante final onde parece que se tenta abraçar a ideia de uma comédia musical mas que... perdeu a comédia. Considerando os actores - referências na comédia portuguesa - e um sólido percurso do realizador Pedro Varela... resta-me apenas deixar-lhe(s) uma saudação... mas desta infelizmente... não convencem.
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