quinta-feira, 14 de maio de 2015

Plein Soleil (2014)

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Plein Soleil de Frédéric Castadot é uma curta-metragem de ficção belga presente na secção Internacional da sexta edição do Piélagos en Corto - Festival Internacional de Cortometrajes de Ficción que decorreu até ao passado dia 9 de Maio na Cantábria, em Espanha.
Eric (Aurélien Labruyère) não consegue dormir e o seu bébé não pára de chorar. Sob um calor abrasador, o stress de um potencial atraso para uma importante reunião levam-no a ficar impaciente para tudo quanto o rodeia. Pára o carro. Corre para a reunião. Mas, Eric percebe tarde que se esqueceu de algo!
Castadot, também autor do argumento de Plein Soleil leva o espectador a uma desesperante viagem onde desde o primeiro instante se espera a tragédia. Aquela tragédia laboral que, por sua vez, lança o mote para a familiar e sabemos - ou pelo menos percebemos - aquilo que nos espera. No entanto, e ainda que o espectador consiga reter alguma linha condutora desta história, é também verdade que não lhe encontramos o final tão cedo quanto aquilo que pensamos.
Com o claro intuito de reflectir sobre o admirável mundo novo onde as ligações e a comunicação entre os Homens está presa por uma linha muito ténue, Plein Soleil fá-lo de forma inteligente e, ao mesmo tempo, adicionando pequenos elementos de cinema fantástico que poderiam à partida ser impróprios para este tipo de história. Se por um lado encontramos uma família abafada - pelo tempo quente e pelas dificuldades económicas - cujo pai - "Eric" - tenta desesperadamente manter com o nível de vida a que estão habituados, não é menos verdade que a pressão sentida para que tudo corra bem leva-o numa espiral de esquecimento sobre aquilo que realmente importa na sua vida.
Num ambiente que aperta a cada instante e onde se percebe que aquele dia será "o" dia, "Eric" é um homem que caminha por uma linha muito fina prestes a perder tudo aquilo que mais significado tem na sua vida e pelo qual luta - a família. Esquecido que fica o seu filho dentro de um automóvel que fica debaixo de um sol abrasador, farão sentido os seus esforços se pode perder aquilo que mais preza graças a um acto irreflectido?!
Castadot aborda assim de forma crua e algo agreste as vicissitudes de um mundo moderno onde o material se sobrepõe ao pessoal, fazendo esquecer a importância das relações humanas mesmo quando estas têm uma proximidade tão grande. O que será do Homem se perde o seu rumo e neste caso até a sua própria descendência limitando desta forma a sua perpetuação? Estará o mundo entregue ao poder das máquinas?! Ao mesmo tempo, Castadot leva o espectador também a pensar na forma como as redes humanas interagem (ou não) quando no centro de uma rua movimentada e por onde se encontram algumas crianças, todos os ruídos e comportamentos acabam por ser abafados pelo desinteresse e desatenção que todos ignoram. Num mundo cada vez mais abafado por questões de segurança, de isolamento e, como consequência, falta de ligações e impessoal, Plein Soleil faz questionar se realmente estamos no rumo no qual nos queremos encontrar.
Se até aqui Plein Soleil é portanto uma reflexão sobre o lado social e humano da sociedade, não é menos verdade que à medida que nos aproximamos do final estamos perante uma história que ganha contornos mais negros e do género fantástico relegando para aqueles jovens intérpretes o papel de um juíz que observa na sombra as acções negligentes de um pai que tem - literalmente - a corda na garganta. Tido em silêncio mas com um sentido claramente inquisidor, este "julgamento" de Plein Soleil é não só para a personagem interpretada de forma sentida por Aurélien Labruyère mas também para o espectador que é obrigado a pensar se está realmente a prestar atenção àquilo que é importante na sua própria vida.
Patrice Michaux - o director de fotografia - é um dos principais responsáveis pela manutenção de um ambiente tenso e praticamente surreal onde todos os sentimentos e sentidos estão à flor da pele. As cores e luzes captadas remetem o espectador para um insuportável dia de Verão onde a única coisa que se espera é estar debaixo de água a retirar todas as impurezas físicas e psicológicas que um dia invulgar depositaram em cima das costas de "Eric". O dia, que parece não ter fim, assume contornos fantasmagóricos quando se percebe - e sente - que estamos num patamar da realidade que desconhecemos e onde as sombras começam estranhamente a apoderar-se de todos os nossos sentidos e sentimentos. Sabemos que estamos perante um erro. Um daqueles erros que transformam de forma irreparável toda uma vida mas que, quando reconhecidos, são não o sinal do fim mas de uma sentida e profunda mudança.
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9 / 10
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