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Je Me Suis Fait Tout Petit de Cécilia Rouaud segundo filme a que assisti nesta edição da Festa do Cinema Francês, transformou-se numa grande e agradável surpresa que me deixou fã de um grande Denis Ménochet, actor que até à data só tinha visto em Inglourious Basterds.
Yvan (Ménochet) é professor, pai de duas adolescentes e um homem aparentemente rude e desligado. A sua mulher abandonou-o e a sua irmã e cunhada cuidam das suas filhas por ele se revelar demasiadamente despreocupado com tudo o que o rodeia, encarando tudo e todos com amargura e desgosto.
Quando a sua irmã Ariane (Léa Drucker) o convida para um inesperado jantar, Yvan estava longe de pensar que a sua ex-mulher tinha um novo filho e que o tinha abandonado na casa de Ariane para esta cuidar dele juntamente com as suas duas irmãs. Yvan que ainda não se havia esquecido nem tão pouco recuperado do desgosto de amor iria opôr-se firmemente a esta condição mas através dela, irá ele próprio redescobrir-se enquanto pai e homem.
Vou começar pelo que é assumidamente o ponto forte de todo o filme... Denis Ménochet. Este actor de quem como referi, apenas conhecia do filme de Tarantino, tem uma interpretação que nos revela o bom e o mau da vida de um homem. O grande amor, a constituição de família, a sua perda e a consequente queda num abismo onde expressar sentimentos pelos outros é tão impossível quanto manter o pouco de dignidade que lhe poderia existir. Só, auto-exilado de qualquer tipo de relação humanas que não fossem os ocasionais e fortuitos encontros sexuais, o seu "Yvan" não consegue estabelecer nenhum tipo de elo com aqueles que lhe são próximos. Gosta deles, ama-os e depende deles, mas a proximidade é dolorosa demais para poder ser suportada pois, para ele, existe sempre o risco de ser novamente abandonado.
Temos então aquilo que se pode chamar de uma força da natureza. Percebemos que ele tem uma incontrolável vontade de se exprimir. Vontade esta que é, no entanto, reprimida de tal forma que passa, aos olhares alheios, como um homem rude, bruto, desinteressante e sem educação. Alguém que é desligado do mundo não por opção mas sim porque é rude demais para que alguém lide com ele. Só com o tempo iremos perceber que afinal há muito mais para saber sobre este homem.
Mas não se pense que todo este filme é apenas um conjunto de momentos mais dramáticos e de puxar à lágrima. Pelo contrário. Estes surgem apenas em pontuais momentos onde a sua própria personagem percebe que se tem isolado incorectamente do mundo e que dessa forma tem perdido não só tempo na sua vida como na daqueles a quem mais quer. Este filme é acima de tudo uma comédia recheada de sentimentos. De bons momentos. E principalmente de humor. De humor agradável, sentimental, corrosivo, triste e trágico mas que consegue em todos os momentos trazer não só o melhor daqueles personagens, algumas até bem excêntricas, mas especialmente o melhor de nós que as sentimos a viver momentos mais ou menos comuns (mas não banais) que os fazem crescer, evoluir e atravessar novas etapas nas suas vidas.
Agradável é igualmente Léa Drucker, como a irmã de "Yvan" que, na impossibilidade de ter a sua própria família cria as suas duas sobrinhas como se suas filhas fossem. É a personagem que serve de "cola" unificadora de toda a família e que sem assumir um protagonismo óbvio, acaba por ser a matriarca que a todos quer ver bem. Sempre recheada de bom humor e disposição contagiante, Drucker acaba por ser aquele membro da família que todos queremos ter. Não só por ser a matriarca mas também por em toda a sua responsabilidade se assumir como uma mulher desconcertante e que ela própria respeita poucas regras... exceptuando aquelas que servem para garantir a união da sua família.
E por falar em desconcertante seria impossível não referir Vanessa Paradis que aqui ao encarnar "Emmanuelle", uma professora da mesma escola onde "Yvan" lecciona, se assume como um verdadeiro desastre ambulante. Mas um desastre necessário. É ela que com a sua simplicidade e graça consegue fazer renascer "Yvan". É ela que lhe mostra que o amor é possível, fiel e paciente. É ela que espera encontrar a outra pessoa que lhe dê algum equilibrio fazendo assim com que os dois se complementem.
Desde a comédia ao drama em doses bem equilibradas, este filme consegue ser terno e sentimental sem ser um veículo para alguém verter lágrimas. É um filme sobre momentos e situações que afectam profundamente a vida de um Homem. Mas se calhar para melhor o descrever... Imaginem que têm um objecto que muito estimam e um dia pensam tê-lo perdido... Imaginem agora que anos mais tarde o reencontram e se lembram de todos os bons momentos ou situações em que esteve presente e as memórias (de infância, adolescência...) que vos tráz. É assim que nos sentimos quando terminamos de ver este filme... "Reencontrados".
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9 / 10
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