segunda-feira, 25 de março de 2013

Io Sono Li (2011)

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Io Sono Li de Andrea Segre e a sua primeira longa-metragem de ficção que no passado ano venceu não só o David da Academia Italiana de Cinema de Melhor Actriz como também o prestigiado prémio LUX atribuído pelo Parlamento Europeu, é mais um dos filmes presentes na secção competitiva da 6ª edição da Festa do Cinema Italiano.
Shun Li (Zhao Tao) é uma imigrante chinesa em Itália que trabalha numa fábrica têxtil nos arredores de Roma com o objectivo de pagar não só as suas dívidas como também de trazer para o país o seu filho de outo anos. Sujeita aos caprichos dos seus patrões, Shun Li é informada que tem de viajar para a pequena cidade de Chioggia onde irá trabalhar num café propriedade dos seus patrões.
É neste local, ponto de encontro de alguns dos residentes da pequena cidade, que Shun Li conhece Bepi (Rade Serbedzija), um pescador de origem eslava residente em Itália há décadas, a quem todos carinhosamente chamam de "Poeta", e é com ele que estabelece uma invulgar amizade que os dois sentem como genuína por perceberem bem a condição um do outro enquanto imigrantes num país que não é o seu.
No entanto, enquanto esta amizade lhes garante um conforto há muito não sentido, começa também a provocar os seus incómodos não só na própria comunidade chinesa que havia alertado Shun Li a não estabelecer qualquer proximidade com nenhum italiano, como também na própria comunidade de Chioggia que considera esta amizade inapropriada para os costumes mais conservadores da mesma.
Andrea Segre que aqui se estreia na ficção, não perdendo no entanto o registo documental que esta obra tem e que podemos constatar através das pequenas reflexões sobre a vida e o espaço feitas pelas narrações de "Shun Li" bem como pela forma como as imagens exactas são captadas ao longo desta história, escreveu também este argumento em parceria com Marco Pettenello, e ambos deram origem a uma simples mas poética história que reflecte sobre as experiências de vida daqueles que se encontram afastados do seu espaço natural ao mesmo tempo que abre portas para um entendimento sobre todas aquelas pequenas questões que estão invariavelmente ligadas a um novo início como a solidão sentida, as pessoas que se conhecem e os potenciais elos que se criam a elas como também ao espaço que, podendo ser radicalmente diferente daquele de origem, consegue normalmente criar pontos de referência com os quais cada um se identifica. A manutenção de costumes antigos e a abertura aos novos modelos de vida existentes no local que se escolheu para esse novo caminho sendo que, não estando só presentes os aspectos mais positivos, há que também equacionar os entraves e dificuldades colocadas a um estrangeiro de uma cultura tão distinta como a chinesa da europeia.
Acima de uma qualquer história romântica, que não o é, este filme é um belo poema contado através de imagens sobre o poder da amizade. A amizade verdadeira. E a forma como ela se pode manifestar em primeiro lugar por aqueles que, como nós, se encontram afastados do seu lugar natural e com os quais estabelecemos uma inicial e espontânea ligação pois por muito adaptados a um local que se esteja, apenas um estrangeiro pode identificar as fraquezas de outro num espaço que não lhe é natural como aqui é estabelecido através da relação criada entre "Shun Li" e "Bepi", e finalmente a forma como essa mesma amizade se pode manifestar de forma silenciosa pois para praticarmos o maior acto de auxílio não precisamos necessariamente de o dar a conhecer ao mundo, facto que é também aqui retratado no pequeno grande gesto que une de forma inequívoca "Lian" (Yuan Wang) a "Shun Li" que, não tendo uma amizade declarada e expressa (pelo menos não para o espectador), acabam por criar um elo mais forte do que imaginado quando a primeira trata da chegada do filho de "Li" que agora vê finalmente o seu desejo concretizado.
A amizade, que é essencialmente o que vemos celebrar neste filme, é aqui magnificamente retrada através das duas inspiradas interpretações principais, nas quais os pequenos gestos e os pequenos rituais que vão aproximando dois indivíduos acabam por se tornar a fonte de uma vida adormecida pela qual ambos passavam. A pesca tradicional e o mar primeiramente seguidos da poesia como forma de expressar os mais nobres pensamentos pela palavra, transformam-se assim nas mais puras formas de ligação entre os Homens que através deles encontram não só a comunicação como a identidade que os faz encontrar o seu lugar de pertença.
Finalmente uma breve referência não só à fotografia de Luca Bigazzi que transforma esta pequena comunidade num local muito particular e aparentemente isolado de todo um restante mundo, como também para a sensível e sentida banda-sonora de Pascal Couturier nomeada para o European Film Award, que é de uma sensibilidade intensa que expressa na perfeição os sentimentos e os momentos particulares de cada uma destas igualmente poéticas personagens. Um filme a não perder.
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7 / 10
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