A Rapariga no Comboio de Tate Taylor é uma longa-metragem norte-americana e a mais recente obra do realizador de The Help (2011).
Rachel (Emily Blunt) é uma mulher que todos os dias estabelece a mesma rotina. A caminho do seu trabalho em Nova York, Rachel passa pela casa onde vivera com o seu marido e que este agora partilha com a sua nova mulher e filho. Neste percurso, Rachel observa a casa ao lado onde idealiza a vida perfeita de Megan (Haley Bennett) e Scott (Luke Evans) que, mais tarde, confirma mais não ser do que a sua imaginação.
Quando Rachel acorda de um pesado sonho e sem recordar o dia anterior, as turvas memórias confundem-se com uma realidade distorcida colocando-a no centro de todo um conjunto de assustadoras revelações.
O argumento de Erin Cressida Wilson baseado no romance homónimo de Paula Hawkins recupera o género do típco thriller psicológico matrimonial no qual um casal é aparentemente desfeito pela espiral de decadência mental pelo qual um dos cônjuges se deixa levar. No entanto, aquilo que é lentamente desvendado pelos três segmentos de The Girl on the Train - Rachel, Megan e Anna - é uma história que está para lá do que alguns conhecimentos revelam sobre o carácter de uma "Rachel" aparentemente instável.
Emily Blunt dá corpo a esta "Rachel", uma mulher amargurada pela impossibilidade de ser mãe. Quando o desejo extremo dá lugar a um desgosto igualmente forte, a relação do "eu" e dos outros - neste caso para com "Tom" (Justin Theroux) - entra num conflito imediato de violência de degradação provocados pelo elevado consumo de alcoól (dela) e a eventos que não só não consegue controlar como são afectados pela perda de memória que a fazem ignorar o seu comportamento. "Rachel" vive na sombra da mulher que pode ter sido - o espectador nunca o descobre - e, ao mesmo tempo, refém de memórias que não são suas. Quando os pequenos detalhes se confundem com a deturpação de uma realidade que desconhece e quando destes depende a justificação não só da sua inocência como também da reposição de uma verdade perdida, "Rachel" socorre-se de uma imaginação fértil e prolífera na narração de factos que, na prática, desconhece. No fundo, o que aconteceria se por detrás de um comportamento violento e erróneo se esconde-se uma verdade que ninguém ousa questionar?
Tendo em mente o comportamento de "Rachel" que nos é dado a conhecer pelos relatos de "Tom" e, de seguida, pela sugestão que as imagens nos provocam, The Girl on the Train assume em dois distintos segmentos, as realidades das outras duas mulheres da vida de "Tom". A primeira é a sua babysitter - "Megan" - e a realidade que envolve o seu estranho desaparecimento no qual "Rachel" é imediatamente envolvida graças à sua imaginação propícia à narração de acontecimentos que poderão - ou não - ter acontecido. A segunda - "Anna" - é a nova mulher de "Tom" com quem este se casara depois de deixar uma "Rachel" violenta e mentalmente instável. Estando e actuando estas duas mulher como meros "apêndices" da história de "Rachel" - uma por ser a actual esposa do seu ex-marido e a outra por ser aquela por quem desenvolve uma estranha e quase mórbida obsessão -, o espectador vê-se envolvido num conto onde os factos nem sempre são o que parecem e os pequenos detalham adquirem uma importância crucial na descoberta daquilo que os olhos por vezes não querem observar... por vezes ver e olhar são dois distintos sentidos e em The Girl on the Train estes são questionados como determinantes para aquilo que realmente observamos ou aquilo que a sugestão nos leva a crer sobre o comportamento alheio.
Com elementos que oscilam entre Gaslight (1944), de George Cukor - que valeu a Ingrid Bergman o seu primeiro Oscar - e de Gone Girl (2014) ,de David Fincher - que deu a Rosamund Pike a sua primeira nomeação ao referido troféu - The Girl on the Train tem sido apontado como a grande confirmação de Emily Blunt para o mesmo e a esperada surpresa para esta temporada de prémios que se aproxima. No entanto, e contrariamente aos dois desempenhos anteriormente referido, Blunt consegue ser a personagem principal de um filme que se perde pelos relatos das histórias paralelas conferindo-lhes - a essas - o protagonismo que se esperaria para a actriz britânica. Num eterno crescendo que parece não ter fim à vista, Emily Blunt é, desde o primeiro instante, o rosto de uma mulher atormentada por um passado recente que a consumiu... Incapaz de ver concretizada a sua maternidade, abandonada pelo marido e com um registo de distúrbios provocados pela sua dependência de alcoól, Blunt confere à sua "Rachel" a instabilidade emocional necessária para que o espectador cria-se uma empatia com a mesma... Por sua vez, e contrariamente àquilo que se sente pela já mencionadas Bergman e Pike nas obras em que participaram, Blunt não consegue criar o esperado domínio e controlo sobre o filme que interpreta, deixando o espectador especular e criar uma empatia mais intensa com as personagens secundárias mesmo que, de um ponto de vista social, essas sejam assumidamente destrutivas - uma ex-amante que se torna esposa, e uma jovem mulher que desde a adolescência controlou e manipulou os homens que quis ter fruto de um desgosto também ele transformador - ficando a sua "Rachel" "sentada à espera" do seu momento de revelação já bem perto de um final onde o espectador se entregou aos secundários - não esquecer um Luke Evans pouco explorado e um Edgar Ramírez quase figurante - e através deles perceber quem ela realmente é.
Porque as histórias se interligam - nem sempre com o melhor elo - e porque nem sempre o "olhar" é o mesmo que o "ver", The Girl on the Train cria uma interessante atmosfera sobre esta premissa bem como sobre os preconceitos que criamos a respeito daqueles que exibem comportamentos borderline, ignorando o seu passado, os seus motivos e essencialmente a sua perspectiva dos mesmos acontecimentos que presenciamos. No entanto, deixando de lado uma boa parte do suspense, da intensidade dramática e, por vezes, subtilmente revelando aquilo que se espera dos reais rostos das personagens que nos são apresentadas, The Girl on the Train está aquém do intenso drama/thriller que fora anunciado e ainda mais longe de se tornar "naquele" filme que irá marcar o devido lugar de Emily Blunt (não que ele esteja em causa) destacando, por outro lado, uma pouco empática Haley Bennett que com a sua frieza de (se) encarar o mundo revela aquilo que é, de facto, uma pessoa a quem o dito "mundo exterior" já não conseguirá afectar. Haley Bennett que - a ser promovido este filme para os prémios que se avizinham - será certamente uma interessante e segura aposta para os mesmos validando a própria premissa já aqui referida... Ver - uma semi-apagada Blunt (quase um sacrilégio dizer isto!) pois nem sempre um pouco de caracterização, ou sua ausência, resultam para criar a esperada intensidade dramática - ou olhar - Haley Bennett - para aquele que é sim... o mais forte e intuitivo desempenho de The Girl on the Train...
O argumento de Erin Cressida Wilson baseado no romance homónimo de Paula Hawkins recupera o género do típco thriller psicológico matrimonial no qual um casal é aparentemente desfeito pela espiral de decadência mental pelo qual um dos cônjuges se deixa levar. No entanto, aquilo que é lentamente desvendado pelos três segmentos de The Girl on the Train - Rachel, Megan e Anna - é uma história que está para lá do que alguns conhecimentos revelam sobre o carácter de uma "Rachel" aparentemente instável.
Emily Blunt dá corpo a esta "Rachel", uma mulher amargurada pela impossibilidade de ser mãe. Quando o desejo extremo dá lugar a um desgosto igualmente forte, a relação do "eu" e dos outros - neste caso para com "Tom" (Justin Theroux) - entra num conflito imediato de violência de degradação provocados pelo elevado consumo de alcoól (dela) e a eventos que não só não consegue controlar como são afectados pela perda de memória que a fazem ignorar o seu comportamento. "Rachel" vive na sombra da mulher que pode ter sido - o espectador nunca o descobre - e, ao mesmo tempo, refém de memórias que não são suas. Quando os pequenos detalhes se confundem com a deturpação de uma realidade que desconhece e quando destes depende a justificação não só da sua inocência como também da reposição de uma verdade perdida, "Rachel" socorre-se de uma imaginação fértil e prolífera na narração de factos que, na prática, desconhece. No fundo, o que aconteceria se por detrás de um comportamento violento e erróneo se esconde-se uma verdade que ninguém ousa questionar?
Tendo em mente o comportamento de "Rachel" que nos é dado a conhecer pelos relatos de "Tom" e, de seguida, pela sugestão que as imagens nos provocam, The Girl on the Train assume em dois distintos segmentos, as realidades das outras duas mulheres da vida de "Tom". A primeira é a sua babysitter - "Megan" - e a realidade que envolve o seu estranho desaparecimento no qual "Rachel" é imediatamente envolvida graças à sua imaginação propícia à narração de acontecimentos que poderão - ou não - ter acontecido. A segunda - "Anna" - é a nova mulher de "Tom" com quem este se casara depois de deixar uma "Rachel" violenta e mentalmente instável. Estando e actuando estas duas mulher como meros "apêndices" da história de "Rachel" - uma por ser a actual esposa do seu ex-marido e a outra por ser aquela por quem desenvolve uma estranha e quase mórbida obsessão -, o espectador vê-se envolvido num conto onde os factos nem sempre são o que parecem e os pequenos detalham adquirem uma importância crucial na descoberta daquilo que os olhos por vezes não querem observar... por vezes ver e olhar são dois distintos sentidos e em The Girl on the Train estes são questionados como determinantes para aquilo que realmente observamos ou aquilo que a sugestão nos leva a crer sobre o comportamento alheio.
Com elementos que oscilam entre Gaslight (1944), de George Cukor - que valeu a Ingrid Bergman o seu primeiro Oscar - e de Gone Girl (2014) ,de David Fincher - que deu a Rosamund Pike a sua primeira nomeação ao referido troféu - The Girl on the Train tem sido apontado como a grande confirmação de Emily Blunt para o mesmo e a esperada surpresa para esta temporada de prémios que se aproxima. No entanto, e contrariamente aos dois desempenhos anteriormente referido, Blunt consegue ser a personagem principal de um filme que se perde pelos relatos das histórias paralelas conferindo-lhes - a essas - o protagonismo que se esperaria para a actriz britânica. Num eterno crescendo que parece não ter fim à vista, Emily Blunt é, desde o primeiro instante, o rosto de uma mulher atormentada por um passado recente que a consumiu... Incapaz de ver concretizada a sua maternidade, abandonada pelo marido e com um registo de distúrbios provocados pela sua dependência de alcoól, Blunt confere à sua "Rachel" a instabilidade emocional necessária para que o espectador cria-se uma empatia com a mesma... Por sua vez, e contrariamente àquilo que se sente pela já mencionadas Bergman e Pike nas obras em que participaram, Blunt não consegue criar o esperado domínio e controlo sobre o filme que interpreta, deixando o espectador especular e criar uma empatia mais intensa com as personagens secundárias mesmo que, de um ponto de vista social, essas sejam assumidamente destrutivas - uma ex-amante que se torna esposa, e uma jovem mulher que desde a adolescência controlou e manipulou os homens que quis ter fruto de um desgosto também ele transformador - ficando a sua "Rachel" "sentada à espera" do seu momento de revelação já bem perto de um final onde o espectador se entregou aos secundários - não esquecer um Luke Evans pouco explorado e um Edgar Ramírez quase figurante - e através deles perceber quem ela realmente é.
Porque as histórias se interligam - nem sempre com o melhor elo - e porque nem sempre o "olhar" é o mesmo que o "ver", The Girl on the Train cria uma interessante atmosfera sobre esta premissa bem como sobre os preconceitos que criamos a respeito daqueles que exibem comportamentos borderline, ignorando o seu passado, os seus motivos e essencialmente a sua perspectiva dos mesmos acontecimentos que presenciamos. No entanto, deixando de lado uma boa parte do suspense, da intensidade dramática e, por vezes, subtilmente revelando aquilo que se espera dos reais rostos das personagens que nos são apresentadas, The Girl on the Train está aquém do intenso drama/thriller que fora anunciado e ainda mais longe de se tornar "naquele" filme que irá marcar o devido lugar de Emily Blunt (não que ele esteja em causa) destacando, por outro lado, uma pouco empática Haley Bennett que com a sua frieza de (se) encarar o mundo revela aquilo que é, de facto, uma pessoa a quem o dito "mundo exterior" já não conseguirá afectar. Haley Bennett que - a ser promovido este filme para os prémios que se avizinham - será certamente uma interessante e segura aposta para os mesmos validando a própria premissa já aqui referida... Ver - uma semi-apagada Blunt (quase um sacrilégio dizer isto!) pois nem sempre um pouco de caracterização, ou sua ausência, resultam para criar a esperada intensidade dramática - ou olhar - Haley Bennett - para aquele que é sim... o mais forte e intuitivo desempenho de The Girl on the Train...
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