segunda-feira, 8 de novembro de 2010

Vincere (2009)

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Vencer de Marco Bellocchio é um excelente drama histórico sobre a vida secreta do ditador italiano Benito Mussolini, deste igualmente grande realizador italiano que conta com as participações de Giovanna Mezzogiorno e Filippo Timi nos principais papéis.
Este magnífico filme inicia-se vários anos antes de Mussolini (Filippo Timi) chegar de facto ao poder. Assistimos à sua vida ainda como militante socialista bem como ao seu período como jornalista onde denunciava os crimes e atrocidades que eram cometidos na sociedade italiana, assim como o seu forte empenho anti-Monarquia.
Um dia conhece Ida Dalser (Mezzogiorno) que ganha uma obsessão quase doentia pela sua figura. Tudo o que ele faz ou diz é encarado por Ida como sendo feito por um deus. Mais tarde casam-se e têm um filho Benito Albino (mais tarde também interpretado por Filippo Timi). Assistimos então à ascenção meteórica de Mussolini ao poder e, ao mesmo tempo, à negação desta etapa da sua vida, de Ida e do seu filho.
Inicialmente Ida faz tudo por tudo para obter o reconhecimento legal por parte de Mussolini, que já era casado, escrevendo para o próprio, para o Papa e para os tribunais, fazendo apenas com que a ira deste político cada vez mais sedento de poder se virasse contra ela e a lançasse numa espiral de desespero e no consequente esquecimento, numa vida de clausura num convento para ela e para o seu filho onde ambos viriam a morrer.
Marco Bellocchio depois de magníficos filmes tais como Buongiorno, Notte e L'Ora di Religione, presenteia-nos com mais um estrondoso filme sobre a vida do ditador italiano num estilo francamente interessante que ora junta imagens de ficção onde os actores dão vida a estas personagens que ficaram na História de um período negro não só de Itália como da Europa, ora temos imagens de época que nos ilustram um pouco do ambiente e do clima que se vivia então. Esta junção de ambas as situações, que dão um ar de documentário ao próprio filme conseguem criar uma atmosfera interessante na medida em que para nós espectadores é ilustrada, e inserida num contexto específico e real, os verdadeiros acontecimentos a que assistimos ao longo do filme. É à custa desta situação que percebemos, como exemplo, o quão vã era a acção de Ida ao escrever cartas para o Papa sobre a sua situação com Mussolini, quando o mesmo Papa havia assinado nessa mesma altura, o Tratado de Latrão que conferia ao Vaticano a independência.
Os actores foram também brilhantemente escolhidos. Refiro-me, como é óbvio, aos dois que preenchem na sua quase totalidade os ecrãs, ou seja, Giovanna Mezzogiorno e Filippo Timi, que com estas magníficas interpretações conseguiram ser nomeados e vencer inúmeros prémios de cinema. nomeadamente a nomeação que ambos conquistaram para os Donatello de Actores Principais e no caso de Filippo Timi ainda a nomeação a Melhor Actor nos Prémios de Cinema Europeu.
Filippo Timi é francamente bom no retrato que faz de Mussolini nos seus anos de revolucionário, mas consegue ser a representar Benito Albino, filho não reconhecido do ditador italiano, que Timi é realmente "assustador"... O retrato de um jovem adulto à beira da loucura é no mínimo assombroso e percebemos muito claramente que estamos perante um enorme talento representativo.
E o mesmo se pode dizer em relação a Giovanna Mezzogiorno que com o seu fabuloso retrato de Ida Dalser comprova uma vez mais que não só é uma das melhores jovens actrizes italianas como é uma das melhores a nível Europeu e mundial. Mezzogiorno tem com este seu retrato, um trabalho digno de ser nomeado a Oscar e é, sem qualquer margem para dúvidas, a grande força de todo o filme, a quem se aplica sem reservas o próprio título... Vincere.
Igualmente em termos técnicos este filme sai vencedor. A execução dos espaços em que os vários acontecimentos relatados é muito boa e credível. As salas onde se reuniam a discutir se Itália entraria na Primeira Grande Guerra... e especialmente o convento. Convento que mais parecia um manicómio ou melhor, uma prisão para aqueles que eram considerados uma ameaça ao Estado e à integridade do ditador. Os espaços são bastante credíveis e o trabalho de fotografia de Daniele Ciprì, vencedor do Donatello na respectiva categoria, confere um ambiente ainda mais pesado que caracteriza na perfeição aquilo que nós imaginamos terem sido os pesados anos que foram.
Também de parabéns está o magnífico trabalho de guarda-roupa da autoria de Sergio Ballo, igualmente vencedor do Donatello, que se transforma de um vestuário elegante, discreto e cuidado na primeira metade do filme, para algo que de certa forma acompanha o real estado de espírito das personagens, que é como quem diz descuidado, pobre (do ponto de vista simples e não relacionado com uma possível riqueza) e que retrata o próprio desespero que Ida Dalser terá sentido ao perceber que nada nem ninguém iriam resolver o seu problema e tratar do seu reconhecimento.
Entre muitos, Vincere é um soberbo filme italiano que não só emociona e comove pela percepção da desumanidade que as pessoas atingem em épocas de poder e em que querem esconder um passado, como também nos dá um magnífico retrato histórico de uma Itália perdida e cujo único rumo seria a própria aniquilação em anos de ditadura e numa guerra que lançaria o país no caos e na miséria. Filme este que venceu os Donatello de Realizador, Fotografia, Design de Produção, Guarda-Roupa, Caracterização e Penteado, Montagem e Efeitos Especiais Visuais.
Um filme que ninguém deve perder quer pelo fantástico trabalho técnico quer pela História, bem como pelo magnífico leque de actores que apresentam um brilhante conjunto de interpretações dignas de figurar entre as melhores do ano.
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10 / 10
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