Amigos Amigos, Telemóveis à Parte de Paolo Genovese é a mais recente longa-metragem do realizador de Una Famiglia Perfetta (2012) que aqui reúne, uma vez mais, alguns dos nomes mais fortes do cinema italiano nomeadamente Valerio Mastandrea, Giuseppe Battiston e Alba Rohrwacher entre outros.
Quando um grupo de amigos de longa data decide, durante um jantar, partilhar o conteúdo de todas as mensagens, telefonemas e e-mail's que recebem, longe estariam de pensar que conheciam tão pouco sobre aqueles que conhecem desde jovens. As mentiras desvendam-se e as verdades ressurgem como que punitivas de uma amizade que, afinal, não era tão extensa como todos eles pensavam.
Longe de ser uma longa-metragem de acção ou uma comédia fácil resultante de um conjunto de cómicos de situação sobre a vida marital, Perfetti Sconosciuti é, acima de tudo, um perfeito exemplo do que um bom argumento e um bom elenco faz por um filme que é tudo menos banal. Aliás, Filippo Bologna, Paolo Genovese, Paolo Costella, Paolo Mammini e Rolando Ravello são exímios na busca de pequenos grandes momentos e potenciais segredos que todos fazem por ocultar e disfarçar, lançando-os para o ringue das feras na esperança que delas saiam as mais variadas reacções... e saem!
Mas, começando por uma breve apresentação do elenco deste filme onde seis das suas personagens interagem enquanto membros de três sólidos e felizes casais, o jantar decorre na casa de "Rocco" (Marco Giallini) e "Eva" (Kasia Smutniak) que vivem um aparente silêncio quanto à sua felicidade centrando-se (ela) quase exclusivamente em "Sofia", uma filha adolescente que teima em não a respeitar. À sua casa chegam "Carlotta" (Anna Foglietta) e "Lele" (Mastandrea) cuja relação se torna evidente estar a passar por uma fase menos positiva e sem o tal "sal" que seria de esperar da mesma. Finalmente, o último dos casais chega através de "Cosimo" (Edoardo Leo) e "Bianca" (Rohrwacher), o mais recente dos casais e a quem tudo parecer correr em perfeita sintonia. O último dos amigos, e aquele por quem todos esperam por ser aquele que falta "casar" é "Peppe" (Battiston), o bonacheirão de serviço que todos gostam de ter por perto quando é para divertir.
Este elenco dá então corpo a uma história que se inicia como todas as reuniões de amigos... Sorrisos, partilha de momentos recentes bem passados onde todos parecem ter vidas fantásticas que, não sendo de inveja, transmitem uma ideia de um sucesso que é, no fundo, motivo suficiente para que todos se orgulhem do grupo que se mantém unido e, basicamente, feliz. No entanto, aquilo que inicialmente parecia um inofensivo debate sobre confiança, segredos e histórias não contadas dá "alma" a um jogo onde a "caixa negra" reconhecida nas vidas de todos - o telemóvel - despolete um sem fim de histórias por contar, de segredos comprometedores e verdades que nenhum deles esperava ou queria ouvir. De repente, o que seria se todos eles ficassem a saber que um atropelou um homem que veio a falecer.. se soubessem que outro tem um amante... se descobrissem que o marido espera um filho de outra mulher, que a filha de um dos casais não suporta a mãe e a sua presença ou mesmo se um do grupo viril e másculo fosse, afinal, homossexual?!
Aos poucos Perfetti Sconosciuti é um retrato de todas as amizades. Todas aquelas onde tudo aparenta ser de conhecimento "público" e onde a boa e velha camaradagem fosse o elixir suficiente para manter forte e controlada uma amizade de décadas. Mas o que acontece quando lentamente se descobre que afinal o tal elixir está fora de prazo e que as realidades tal como elas são fazem revelar velhos preconceitos e verdades que, afinal, não queriam ser escutadas? O que acontece quando se descobre que afinal aqueles casamentos não são assim tão perfeitos, que existem relações extra conjugais ou até mesmo que uma sexualidade diferente da "aceite" por alguns elementos do grupo fosse motivo suficiente para destruir aquilo que fora, durante anos, construída em plena confiança e dedicação? O que será então desta amizade quando, face à realidade, se descobre que nem todos são tão evoluídos e de mente aberta quanto se haviam revelado durante anos?! No fundo, aquilo que torna o argumento de Perfetti Sconosciuti tão único prende-se essencialmente com uma simples questão... como enfrentar o mundo e os seus preconceitos quando, dentro da nossa zona de conforto, aqueles que tantos nos conhecem são afinal... perfeitos estranhos?!
Com dinâmicas muito próprias, cada casal cruza as suas histórias com os demais numa perfeita sintonia. Genovese dirige estes actores ao ponto de se entregarem não só às suas histórias "pessoais", mas também aos dos seus colegas e amigos como que se os problemas de um afectassem directamente todos os demais que se encontram naquela mesa. Giallini e Smutniak encarnam de forma magestral o casal bem sucedido mas que tem os seus próprios esqueletos no armário. Refugiados numa vida familiar que afinal se apresenta, também ela disfuncional, residirá o problema apenas nas suas personagens ou também num desejo de ter e alcançar algo mais do que aquilo que já se tem seguro? Mastandrea e Foglietta representam o tal casal para quem a rotina e o banal já conquistaram lugares cativos mantendo-se um casal aparentemente feliz para os demais mas que, a nível interno, já se socorrem de pequenos jogos virtuais extra-matrimoniais para manterem uma certa chama acesa... mas não entre si. Por sua vez, Leo e Rohrwacher são o casal mais "jovem" para quem tudo parece perfeito e a correr de forma organizada e espontânea mas que, na prática, sobrevive graças a uma mentira extra-matrimonial que irá trazer uma surpresa à vida do casal talvez... em ruptura. E finalmente Battiston com o seu divertido "Peppe" que a todos anima, mas que na realidade se mantém como o eterno solteirão cuja sexualidade não foi - em todos os anos de amizade - francamente revelada e consumada, mantendo-se portanto, como o eterno "tio" que vive um amor na sombra escondido dos olhares dos seus próprios amigos.
Sete actores para sete histórias pessoais. Sete vidas que se transformam em instantes dando a conhecer todo um conjunto de pessoas que apesar de se conhecerem há anos... escondem outras pessoas que agora se revelam... ou talvez não! Os instantes finais de Perfetti Sconosciuti são do mais delicioso possível, desmistificando toda a realidade que o espectador conhecera até então e revelando que afinal nem tudo é como aparenta... tal como as histórias e revelações que acabara de assistir momentos antes lançando a eterna questão... até que ponto conhecemos, ou queremos conhecer, os nossos amigos ou, por outras palavras, queremos realmente saber na totalidade quem são aquelas pessoas que connosco partilham - e partilhamos - os momentos mais importantes de toda a nossa vida?!
Inteligente, honesto, franco e suficientemente mordaz para provocar no espectador a ânsia de saber um pouco mais sobre os seus amigos, Perfetti Sconosciuti é um filme intenso que não deve ser perdido... Naquelas sete breves histórias e naqueles sete intensos silêncios... muitas verdades são reveladas e segredos (por saber) ocultados. Bravo! Bravo, Paolo Genovese!
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8 / 10
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