quinta-feira, 9 de julho de 2020

Altitude (2019)

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Altitude de Nicole Scherer (Áustria) é uma das curtas-metragens presentes na competição oficial de Ficção da sétima edição do Leiria Film Fest.
Sarah e Thomas escalam uma montanha. À medida que a altitude é maior, os seus pensamentos desviam-se para uma realidade que desconheciam. Irão eles conseguir chegar ao seu destino?!
"O caminho da mente é o desvio"... assim começa esta história que inicialmente se apresenta como um potencial conto sobre os altos e baixos de uma relação amorosa, cedo se revela e transforma num relato assombroso sobre a descida - ironia à parte - às profundezas da mesma, da mente humana... ou até do (seu) próprio Inferno.
Tudo começa com uma escalada. Aqui acompanhamos um casal enquanto tentam chegar a uma cabana para um fim-de-semana (julgamos) romântico. Lentamos, e pela percepção que ambas as personagens nos transmitem, percebemos que esta escalada atravessa os limites pensados... a cabana nunca mais está ao seu alcance ainda que a altitude em que se encontram seja cada vez maior. Lentamente não só a paciência como o cansaço - físico e mental - manifestam-se e dão lugar a um sentido desespero que nenhum consegue esconder. Nas parcas palavras que trocam nota-se algum desdém e saturação e fisicamente compreende o espectador que o corpo (e a mente) começa a dar os primeiros sinais de um desgaste acentuado. A altitude - geográfica - permite que a sua imaginação comece a trabalhar por vontade própria e as alucinações ganham a sua própria forma manifestando-se cada vez mais violentas ao ponto de "Sarah" e "Thomas" - e até mesmo o espectador - se questionarem se aquilo que estão a ver e sentir será ou não real...
Num misto de terror paranormal e terror psicológico, Altitude manifesta várias questões que o espectador identifica ao longo do decorrer de factos que funcionam como sinais de alerta... Por um lado é fácil recorrer à ideia de que todos os acontecimentos surgem como sinal de uma privação de oxigénio (pela altitude) que provoca reacções no cérebro das duas personagens... privados de um pensamento racional e momentaneamente alheados da realidade, ambos reagem conforme aquele pouco "juízo" que lhes resta dado o momento, a situação e o ambiente em que se encontram. No entanto, nem só de racionalidade (ou falta dela) chega uma explicação plausível... poderá este casal aparentemente feliz pretender um fim-de-semana longe da vida dita "real" para resolver problemas conjugais latentes e que podemos - pelos acontecimentos do momento - justificar como traumas para ali levados? Poderá esta viagem ser mais do que um simples retiro? Poderá ser ela o último reduto de algo que está prestes a terminar? E se terminar... de que forma se irá manifestar?
Finalmente, e porque nem sempre a lógica funciona como uma história potencialmente "normal" no seio de uma relação, Altitude deixa a margem de manobra suficiente para que o espectador se sinta inserido numa história de terror tradicional onde por detrás de todas as sombras e recantos de uma montanha - e da floresta que se encontra ao seu redor -, esconde-se um "mal antigo" prestes a "ocupar" um hospedeiro mais frágil dando lugar a todo um conjunto de momentos e perturbações que nele, e através dele , se manifestem seduzindo os inocentes e levando-os para o outro lado da luz... sabendo que tudo "termina" pela confirmação de algo mais óbvio que tanto eles (como nós) procurávamos afinal... esta curta-metragem confirma que existe um desfecho preparado para cada um de nós dependendo da sua mais ou menos imediata compreensão daquilo que pequenos sinais deixam transparecer.
Terror psicológico/real versus terror paranormal... a cada espectador de decidir aquilo que as suas próprias memórias de grandes filmes ou séries de culto o fazem recordar transformando toda a experiência de Altitude como uma celebração desses demónios que sobrevivem nos filmes do género e que nós enquanto fãs dos mesmos recordamos e aos quais damos "vida".
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8 / 10
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